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Estética e anestética: uma reconsideração de A obra de arte de Walter Benjamin*
Susan Buck-Morss
ensaio de Walter Benjamin intitulado A obra de arte na era da sua reprodutibilidade técnica' é tido, em geral, como uma afirmação da cultura de massas e das novas tecnologias por meio das quais ela é disseminada. Com razão. Benjamin enaltece o potencial cognitivo e, portanto, politico da experiência cultural mediada pela tecnologia, privilegiando particularmente o cinema. Todavia, a última seção desse ensaio de 1936 reverte o tom otimista e faz soar um alerta. O fascismo é uma "violação do aparato técnico", paralela à sua violenta "tentativa de organizar as massas recém-proletarizadas" — não por lhes dar o que lhes é devido, mas por "permitir que se expressem".' "O resultado lógico' do fascismo é a introdução da estética na vida política." Benjamin raras vezes faz condenações generalizadas, mas, nesse ponto, afirma em tom categórico: "Todos os esforços para estetizar a política culminam em um só lugar: a guerra."' Ele escrevia na fase inicial do aventureirismo militar fascista — a guerra colonial da Itália na Etiópia e a intervenção da Alemanha na guerra civil espanhola. Mas Benjamin reconhece que a justificação estética dessa política já se havia instaurado no começo do século. Foram os futuristas que, pouco antes da Primeira Guerra Mundial, articularam pela primeira vez o culto da guerra como uma forma de estética. Benjamin cita o manifesto deles: A guerra é bela, pois graças às máscaras de gás, aos megafones assustadores, aos lança-chamas e aos tanques ela afirma a supremacia do homem sobre a máquina. A guerra é bela porque MauA autora agradece a joan Sage pela ajuda com as fotografias para este trabalho. Artigo publicado em October, v. 62, outono de 1992, p. 3-41. Tradução de Vera Ribeiro.
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gura a sonhada metalização do corpo humano. A guerra é bela porque adorna os prados com as orquídeas flamejantes das metralhadoras. A guerra é bela porque reúne em uma sinfonia a fuzilaria, os canhonaços, os cessar-fogo, os perfumes e os odores da decomposição. A guerra é bela porque cria novas arquiteturas, como a dos grandes tanques, a das esquadrilhas aéreas e a das espirais de fumaça sobre aldeias incendiadas, entre outras coisas...6 Benjamin conclui: "Fiat arts — pereat mundos"; diz o fascismo. Como confessava Marinetti, ele deseja que a guerra proporcione satisfação artística a uma percepção sensível modificada pela técnica. Aí está, evidentemente, a mais perfeita forma de l'art pour Part. A humanidade, que na época de Homero era um espetáculo para os deuses do Olimpo, agora se transforma em um espetáculo para si mesma. Sua autoalienação chegou a um ponto que lhe permite vivenciar a própria destruição como um prazer estético de primeira ordem. Essa é a situação em que se encontra a estetização da política empreendida pelo fascismo. A resposta do comunismo é a politização da arte.'
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Esse parágrafo esteve presente em minha mente durante os cerca de vinte anos em que venho lendo A obra de arte — um período em que a política como espetáculo (inclusive o espetáculo estetizado da guerra) tornou-se lugar-comum em nosso mundo televisual. BenjamM diz que a alienação sensorial encontra-se na origem da estetização da política, a qual o fascismo não cria, apenas "maneja" [betreibt]. Devemos presumir que a alienação e a política estetizada, como condições sensoriais da modernidade, sobrevivem ao fascismo — e o mesmo ocorre, portanto, com o gozo experimentado na visão de nossa própria destruição. A resposta comunista a essa crise é "politizar a arte", o que implica... o quê? Com certeza, Benjamin deve querer dizer mais do que meramente fazer da cultura um veículo da propaganda comunista.' Ele exige da arte uma tarefa muito mais difícil: desfazer a alienação do sensório corporal, restaurar a força instintiva dos sentidos corporais humanos em prol da autopreservação da humanidade, e fazê-lo não evitando as novas tecnologias, mas perpassando-as.
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O problema de interpretar a seção que encerra o texto de Benjamin está em que, mais ou menos na metade dessa reflexão final (política estetizada, arte politizada), ele altera a constelação na qual são expostos seus termos conceituais (política, arte, estética) e, com isso, o significado deles. Se realmente "politizássemos a arte" da maneira radical que ele sugere, a arte deixaria de ser arte tal como a conhecemos. Além disso, o sentido do termo-chave "estética" daria uma guinada de 180 graus. A "estética" seria transformada — a rigor, redimida — de modo que, ironicamente (ou dialeticamente), ela descreveria o campo em que o antídoto ao fascismo se manifesta como resposta política. Esse ponto talvez pareça trivial ou desnecessariamente sofístico. Mas, se lhe é permitido desenvolver-se, ele modifica toda a ordem conceituai da modernidade. É essa a minha afirmação. A concepção crítica benjaminiana de sociedade de massas rompe com a tradição do modernismo (de maneira muito mais radical, a propósito, do que faz seu contemporâneo Martin Heidegger) ao explodir a constelação de arte, política e estética na qual, no século XX, essa tradição se havia cristalizado. II O que não tentarei fazer é conduzir os leitores por toda a história da metafísica ocidental, para demonstrar as permutações dessa constelação em termos do desenvolvimento histórico intrínseco da filosofia, de uma "vida mental" descontextualizada. Outros já o fizeram com brilhantismo suficiente para deixar clara a improdutividade dessa abordagem para o problema com que estamos lidando, pois ela pressupõe justamente a continuidade da tradição cultural que Benjamin queria romper.10 Mas será útil, sim, recordar o significado etimológico original da palavra "estética", porque a revolução de Benjamin nos remete precisamente a essa origem. Aisthitikos é a antiga palavra grega que designa o que é "percebido pela sensação". Aisthisis é a experiência sensorial da percepção. O campo original da estética não é a arte, mas a realidade — a natureza material, corpórea. Como escreve Terry Eagleton, "a estética nasce como um discurso do corpo"." Ela é uma forma
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de cognição obtida por meio do paladar, do tato, da audição, da e do olfato — de todo o sensório corporal. Os terminais de todos sentidos — nariz, olhos, ouvidos, boca e algumas das áreas mais s veis da pele — localizam-se na superfície do corpo, na fronteira me dota entre o interno e o externo. Esse aparato físico-cognitivo, seus sensores qualitativamente autônomos e não intercambiáveis ouvidos não podem sentir cheiros, a boca não pode ver), fica "na te" da mente, encontrando-se com o mundo de forma pré-linguísti anterior, portanto, não apenas à lógica, mas ao próprio significad claro que todos os sentidos podem ser aculturados — essa é a ideia interesse filosófico pela "estética" na era modema.13 Contudo, mais rigorosamente que se treinem os sentidos (como sensibili moral, refinamento do "gosto", sensibilidade às normas culturais beleza), tudo isso vem a posteriori. Os sentidos conservam um incivilizado e incivilizável, um núcleo de resistência à domestic cultural»Pois seu objetivo imediato é servir a necessidades instin — calor, nutrição, segurança, sociabilidade;15 em suma, eles contin a fazer parte do aparato biológico indispensável à autopreserv tanto do indivíduo quanto do grupo social. III Intrinsecamente, a estética tem tão pouco a ver com a trindade fi sófica formada por Arte, Beleza c Verdade, que mais poderíamos situá-la no campo dos instintos animais» Justamente isso deixou os filósofos desconfiados do "estético". Mesmo ao articular a "estética" pela primeira vez como um campo autônomo de investigação, Alexander Baumgarten sabia que "poderiam acusá-lo de se preocupar com coisas indignas de um filósofo" •17 Exatamente como, no decorrer da era moderna, o termo "estética" sofreu tal inversão de sentido que, na época de Benjamin, pass a ser aplicado predominantemente à arte — a formas culturais, não experiência sensorial; ao imaginário, não ao empírico; ao ilusório, não ao real —, não constitui um dado evidente. Exige uma explicação crítica e exotérica do contexto socioeconômico e político em que o discurso do estético foi usado, como recentemente demonstrou Terry
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ton em A ideologia da estética. Eagleton levanta as implicações ogicas desse conceito durante sua acidentada carreira na era rna — sua maneira de quicar como uma bola entre diferentes ões filosóficas, passando de conotações crítico-materialistas, na lação original de Baumgarten, para um significado de base ista na obra de Shaftesbury e Burke, como estética da "sensibie", estilo moral aristocrático, e daí para a Alemanha. Ao longo toda a tradição do idealismo alemão, ele foi reconhecido, com ;graus variáveis de cautela, como uma modalidade cognitiva legítima, porém sempre fatalmente ligada ao sensorial, ao heterônomo, ao fietycio, até acabar, nos esquemas neokantianos de Habermas (para citar Fredric Jameson), como "uma espécie de caixa de areia à qual se destinam todas as coisas vagas [...] na categoria do irracional [...] [onde] elas possam ser monitoradas e, se necessário, controladas (o estético, de qualquer modo, é concebido como uma espécie de álvula de segurança para impulsos irracionais) "•18 É mesmo uma história incrível, particularmente quando se consia o leitrnotiv que perpassa todas essas alterações, o terreno a pardo qual o "estético" avança em suas diversas formas. Trata-se do ma da autogeração, decerto um dos mitos mais persistentes de toda a história da modernidade (e, antes disso, do pensamento político ocidental, poderíamos acrescentar).'9 Superando a imaculada natividade, o homem moderno, homo autotelus, literalmente produz a si mesmo, gera a si mesmo, para citar Eagleton, "milagrosamente, a partir de [sua] própria substância" •20 O que parece fascinar o "homem" moderno nesse mito é a ilusão narcisista do controle total. O fato de se poder imaginar algo que não é extrapola-se na fantasia de que é possível (re)criar o mundo de acordo com um plano (um grau de controle que é impossível, por exemplo, na criação de uma criança humana viva, que respire). Trata-se da promessa de conto de fadas da realização dos desejos — sem a sabedoria, revelada nesses mesmos contos, de que as consequências podem ser desastrosas. Devemos admitir que esse mito da imaginação criativa teve efeitos salutares, pois está intimamente entrelaçado com a ideia de liberdade na história ocidental. Por essa razão (uma excelente razão), ele tem sido ferrenhamente defendido e altamente louvado.21
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No entanto, a atual consciência feminista no campo do saber revelou a que ponto esse constructo mítico pode ser temeroso do poder biológico das mulheres» O ser verdadeiramente autogerado é inteiramente autônomo. Se é que tem corpo, este deve ser impermeável aos sentidos e, por conseguinte, protegido do controle externo. Sua potência encontra-se em sua falta de resposta corporal. Ao abandonar os sentidos, ele abre mão do sexo, é claro. Coisa curiosa: é precisamente nessa forma castrada que o ser é gerado como masculino — como se„ não tendo nada tão embaraçosamente imprevisível ou racionalmente incontrolável quanto um pênis sensorialmente sensível, ele pudes afirmar com confiança que é o falo. É essa protuberância não sens e anestética que constitui este artefato: o homem moderno. Consideremos a visão de Kant do sublime. Ele escreve que, di de uma natureza intimidante e ameaçadora — penhascos gigantes um vulcão cuspindo fogo, um mar tempestuoso —, nosso prim impulso, ligado (não insensatamente) à autopreservação,23 é se medo. Nossos sentidos nos dizem que, diante do poder da natur "nossa capacidade de resistir transforma-se numa banalidade i nificante".24 Mas, diz Kant, existe um padrão diferente, mais "se to" (!), que adquirimos ao avistar essas forças assombrosas de lugar "seguro", a partir do qual a natureza é pequena e nossa s rioridade é imensa: Embora a irresistibilidade do poder da natureza nos leve, consid rados como seres naturais, a reconhecer nossa impotência física ela revela em nós, ao mesmo tempo, uma capacidade de nos julgarmos independentes da natureza e revela em nós uma superioridade em relação à natureza que é a base de uma autopreserv ção de tipo bem diferente.25 Nesse ponto do texto cristaliza-se a constelação moderna tica, política e guerra, vinculando o destino desses três ele O exemplo kantiano do homem mais digno de respeito é o gu impermeável a todas as suas informações sensoriais do perigo tanto, ao comparar o estadista com o general, não importa q possa discutir qual deles merece respeito maior, um juízo [sic] decide em favor do general."26 O estadista e o general são
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s por Kant em mais alta estima "estética" do que o artista, uma vez que os dois, ao moldarem a realidade, e não suas representações, iirnitam o protótipo autogerador, o Deus judaico-cristão produtor da litatureza e de Si mesmo. Se, na terceira Crítica, o "estético" nos juízos é despojado de seus sentidos, na segunda Crítica os sentidos não desempenham nenhum papel. O ser moral é indiferente aos sentidos desde o começo. Mais uma vez, o ideal de Kant é a autogeração. A vontade moral, expurgada de qualquer contaminação dos sentidos (os quais, na primeira Crítica, são a fonte de toda cognição), instaura sua própria dominação como norma universal. A razão produz a si mesma na moral kantiana — de maneira ainda mais "sublime" quando a própria vida é sacrificada à ideia. "Quanto mais Kant avança", escreve Ernst Cassirer, "mais se livra [...] do sentimentalismo dominante" da "Era da Sensibilidade" 27 Para sermos historicamente exatos, convém reconhecermos que essa sensibilidade, enormemente influenciada pela concepção de helenismo de Johann Winckelmann, era homofílica. Afirmava, antes de qualquer outra coisa, a beleza estética do corpo masculino. Com efeito, é possível que a sensualidade homoerótica tenha sido ainda mais ameaçadora para a psique modernista emergente do que a sexualidade reprodutiva das mulheres.28 O sujeito transcendental de Kant purifica-se dos sentidos, que põem em perigo a autonomia, não só porque o enredam de forma inevitável no mundo, mas também, especificamente, porque o tornam passivo ("lânguido" [schmelzend], na palavra de Kant), em vez de ativo ("vigoroso" [wacker])," susceptível, como os "orientais voluptuários",3° à comiseração e às lágrimas. Cassirer escreve que essa foi a reação do modo de pensar completamente viril de Kant à efeminação e à suavidade exagerada que ele via no controle de tudo que o cercava. Foi nesse sentido, com efeito, que ele veio a ser compreendido. [...] Não apenas Schiller, que, numa carta a Kant, lamentou explicitamente que ele houvesse assumido por um momento a "aparência de um adversário", mas também Wilhelm von Humbolt, Goethe e Hëlderlin concordam nesse julgamento. Goethe enaltece como um "préstimo imortal" de Kant o fato de
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ele haver libertado a moral do estado frágil e servil em que ela havia caído, por meio do cálculo bruto da felicidade, e com isso "nos trazido a todos de volta da efeminação [Weichlichkeit] em que nos espojávamos"." O tema do sujeito autônomo e autotélico como indiferente aos sentidos, e, por essa razão, um criador viril, um iniciador de si mesmo, sublimemente autossuficiente,32 aparece ao longo de todo o século XIX — assim como a associação da "estética" desse criador com o guerreiro e, por conseguinte, com a guerra. No fim do século, com Nietzsche, houve uma nova afirmação do corpo, mas este continuou autossuficiente, extraindo o máximo prazer de suas próprias emanações biofísicas. O ideal nietzschiano do artista-filósofo, encarnação da vontade de poder, manifesta os valores elitistas do guerreiro,33 talvez "tão distante de outros homens que é capaz de formá-los".1.' Essa combinação de sexualidade autoerótica e exercício de poder sobre os outros é o que Heidegger chama de "Mannesaesthetik" nietzschiana." Vem para substituir o que o próprio Nietzsche chama de "Weibesaesthetik" 36 — a "estética feminina" da receptividade às sensações vindas de fora. Poderíamos continuar a documentar essa fantasia solipsista com frequência, realmente tola — do falo, essa história de reprodução inteiramente masculina, da arte mágica da criação ex nihilo. Contudo, embora o tema venha a retornar adiante, quero defender a fecundidade filosófica de uma abordagem diferente, que se coaduna mais, com o método do próprio Benjamin em A obra de arte. E esta con siste em levantar o desenvolvimento não do significado de termo mas do próprio sensório humano. IV Os sentidos são efeitos do sistema nervoso, composto de centenas d bilhões de neurônios que se estendem das superfícies corporais, passando pela medula espinhal, até o cérebro. O cérebro, convém dizer, dá à reflexão filosófica um senso da estranheza. Em nossos momentos mais empiristas, gostaríamos de considerar que a matéria cere-
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Cérebro de Sonja Kovalevskaya, matemática russa (1840-1901).
ral é a mente. (O que poderia ser mais apropriado que o cérebro esdando o cérebro?) Mas parece haver tamanho abismo entre nós, os vos, tal como olhamos para o mundo, e aquela massa branco-acinntada gelatinosa, com suas convoluções de couve-flor, que é o cérebro (e cuja bioquímica não difere, qualitativamente, da de uma lesma-do-mar), que, intuitivamente, resistimos a chamá-los de idênticos. Se esse "eu" que examina o cérebro não é nada senão o cérebro, como sinto uma estranheza tão perplexa na sua presença?37 Portanto, Hegel tem a intuição do seu lado, nos ataques que desfere contra os observadores do cérebro. Se você quer compreender o pensamento humano, diz ele em Fenomenologia do espírito, não ponha o cérebro numa mesa de dissecação nem apalpe as bossas da cabeça, em busca de informações frenológicas. Se você quer saber o que é a mente, examine o que ela faz — portanto, desvie a filosofia da ciência natural para o estudo da cultura humana e da história humana. A partir daí, os dois discursos seguiram caminhos separados: a filosofia da mente e a fisiologia do cérebro mantiveram-se, na maior parte do tempo, tão cegas para as atividades uma da outra quanto os dois hemisférios de um paciente de "cérebro bipartido" são indiferentes ao funcionamento um do outro — em detrimento de ambos, pode-se argumentar."
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Vincent van Gogh, Bétulas podadas, 1885.
O sistema nervoso não está contido nos limites do corpo. O cifillOi cuito que vai da percepção sensorial à reação motora começa e te minano mundo. Portanto, o cérebro não é um corpo anatôm isolável, mas parte de um sistema que passa pela pessoa e por meio (culturalmente específico e historicamente transitório). Co fonte dos estímulos e arena das respostas motoras, o mundo exte deve ser incluído para completar o circuito sensorial. (A priva sensorial causa a degeneração dos componentes internos do s' ma.) O campo do circuito sensorial, portanto, corresponde ao "experiência", no sentido filosófico clássico de uma mediação e sujeito e objeto, mas sua própria composição torna simplesm irrelevante a chamada cisão entre sujeito e objeto (que foi a p constante da filosofia clássica). Para diferenciar nossa descrição concepção tradicional e mais limitada do sistema nervoso hu que isola artificialmente a biologia humana do seu meio anil)" daremos a esse sistema estético de consciência sensorial, descen do sujeito clássico — no qual as percepções sensoriais exte
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Ilustração
de células
descritas por Vladimir Betz.
unem às imagens internas da memória e da expectativa —, o nome de sistema sinestésico"." Esse sistema sinestésico é "aberto" no sentido mais extremo. Não apenas se abre para o mundo, através dos órgãos sensoriais, como as células nervosas no interior do corpo formam uma rede que, em si mesma, é descontínua. Elas buscam outras células nervosas em pontos chamados sinapses, onde as cargas elétricas atravessam o espaço existente entre elas. Enquanto nos vasos sanguíneos um vazamento é lamentável, nas redes entre os feixes neuronais tudo "vaza". Qualquer imagem em corte dos níveis do cérebro mostra essa descontinuidade arquitetônica e a morfologia dentrítica de suas extensões. A camada gigantesca de células do córtex cerebral, semelhante a uma pirâmide, foi descrita pela primeira vez em 1874 pelo anatomista ucraniano Vladimir Betz.4° Por coincidência, uma década depois, Vincent van Gogh, quando era paciente psiquiátrico em St. Remy, encontrou essa forma reproduzida no mundo externo.
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V Resistamos por um momento ao abandono da fisiologia por H para acompanhar as investigações neurológicas de um de seus temporâneos, o anatomista escocês Sir Charles Bell. Tendo form em pintura, bem como em medicina cirúrgica, Bell estudou grande entusiasmo o quinto nervo, o "grande nervo da expres confiando em que "o semblante é o indicador da mente".' A expressão facial, com efeito, é uma maravilha de síntese, ta dividual quanto uma impressão digital, mas coletivamente legível senso comum. Nela, os três aspectos do sistema sinestésico — sen física, reação motora e significado psíquico — convergem em sin gestos que compõem uma linguagem mimética. O que essa lingu diz é tudo, menos o conceito. Escrita na superfície do corpo como convergência entre a impressão do mundo externo e a expressã sentimento subjetivo, a linguagem desse sistema ameaça trair a li gem da razão, solapando sua soberania filosófica.
"O quinto nervo", de Sir Charles Bell, On the Nerves, 1821.
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Ao escrever A fenomenologia do espírito em seu estúdio de Jena, em 1806, Hegel interpretou o avanço do exército de Napoleão (cujos canhões ele podia ouvir rugirem ao longe) como a realização impremeditada da Razão. Sir Charles Bell, que, como médico de campanha praticando amputações de membros, esteve fisicamente presente na batalha de Waterloo, uma década depois, teve uma interpretação muito diferente: É uma lástima que nossos sentimentos estejam em discrepância com o sentimento universal. Mas as honras de Waterloo, a meu ver, estarão para sempre associadas aos sinais chocantes do infortúnio: para meus ouvidos, às ênfases de intensidade, ao clamor do peito masculino, às expressões violentas e entrecortadas dos moribundos — e a cheiros nauseabundos. Preciso mostrar-lhes o meu caderno de notas [com esboços dos feridos], pois [...] talvez ele transmita uma justificativa para esse excesso de sentimentos.42 O "excesso" de sentimentos de Bell não significava emotividade. Ele constatou ter "a mente calma, em meio a tamanha variedade de sofrimentos".43 E seria grotesco interpretar "sentimento", nesse contexto, como tendo alguma coisa a ver com "gosto". O excesso era de acuidade perceptiva, de uma consciência material que escapava ao controle da vontade ou da intelecção conscientes. Não era uma categoria psicológica de solidariedade ou compaixão, de compreensão do ponto de vista do outro pela perspectiva do significado intencional, mas, antes, uma categoria fisiológica — uma mimese sensorial, uma reação do sistema nervoso a estímulos externos que era "excessiva", porque o que ele estava apreendendo era involuntário, no sentido de resistir à compreensão intelectual. Era impossível atribuir-lhe um sentido. A categoria da racionalidade só poderia ser aplicada a essas percepções fisiológicas no sentido da racionalização." VI A compreensão da experiência moderna por Walter Benjamin é neurológica. Centraliza-se no choque. Nesse ponto, como em raros outros textos, Benjamin apoia-se numa descoberta freudiana específica:
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a ideia de que a consciência é um escudo que protege o org estímulos — "energias excessivas"" — provenientes de fora, irn do a retenção deles, sua gravação na memória. Escreve Ben¡ "A ameaça dessas energias é de choques. Quanto mais pronta a consciência registra esses choques, menos provável é que el tam um efeito traumático."46 Sob tensão extrema, o eu usa a co ência como um amortecedor, bloqueando a abertura do sistema nestésico47 e, desse modo, isolando a consciência presente e memória passada. Sem a profundidade da memória, a experi fica empobrecida." O problema é que, nas condições do choque demo — os choques cotidianos do mundo moderno —, respond estímulos sem pensar tornou-se necessário à sobrevivência. Benjamin queria investigar a "fecundidade" da hipótese fre na de que a consciência barra os choques, impedindo que eles trem suficientemente a fundo para deixar um vestígio permanente memória, mediante sua aplicação a "situações muito distantes quelas que Freud tinha em mente".49 Freud estava interessado neuroses de guerra, no trauma dos "choques nervosos" e dos aci tes catastróficos que atormentaram os soldados na Primeira Gu Mundial. Benjamin afirmava que essa experiência de choque campo de batalha "tornou-se a norma" da vida moderna." Per ções que antes ocasionavam uma reflexão consciente são hoje f de impulsos de choque que a consciência precisa rechaçar. Tanto produção industrial quanto na guerra moderna, nas multidões rua e nos encontros eróticos, nos parques de diversão e nos cass o choque é a própria essência da experiência moderna. O ambi tecnologicamente alterado expõe o sensório humano a choques cos que encontram correspondência no choque psíquico, como t munha a poesia de Baudelaire. Registrar a "decomposição" da e riência era a "missão" da poesia de Baudelaire: ele "situa experiência de choque bem no centro de sua obra artística" .51 As respostas motoras de mudanças bruscas de posição, o sac nos movimentos de uma máquina, tudo isso tem sua contrap psíquica no "fracionamento do tempo"52 em uma sequência de mentos repetitivos sem desenvolvimento. O efeito disso no sis sinestésico" é brutal. As aptidões miméticas, não a incorporaç
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do externo como uma forma de capacitação, ou "inervação",54 usadas como um bloqueio contra ele. O sorriso que aparece auaticamente nos passantes evita o contato, um reflexo que "funna como um amortecedor mimético de choques".55 Em parte alguma a mimese, como reflexo defensivo, é mais evidendo que na fábrica, onde (Benjamin cita Marx) "os trabalhadores rendem a coordenar seus próprios 'movimentos com o movimento 'forme e incessante de um autômato'".56 "Independentemente da ção do trabalhador, o artigo sendo trabalhado entra em sua faixa ação e se afasta dele com a mesma arbitrariedade."57 A exploração e ser entendida, aqui, como uma categoria cognitiva, não econômio sistema fabril, ao danificar cada um dos sentidos humanos, paraa imaginação do trabalhador.58 O trabalho dele ou dela fica "isoo da experiência"; a memória é substituída pela resposta dicionada, a aprendizagem, pelo "exercício", a habilidade, pela petição: "a prática não tem valor algum" .59 A percepção só se transforma em experiência quando se liga a lembranças sensoriais do passado; mas o "olho protetor" que rechaça as impressões "não se entrega a devaneios com coisas distantes" 60 Sofrer uma "extorsão da experiência" tornou-se a situação gera1,6' à medida que o sistema sinestésico é posicionado para repelir os estímulos tecnológicos, a fim de proteger o corpo do trauma do acidente e a psique do trauma do choque perceptual. Como resultado, o sistema inverte seu papel. Sua meta é entorpecer o organismo, embotar os sentidos, reprimir a memória: o sistema cognitivo da sinestesia torna-se, antes, de anestesia. Nessa situação de "crise na percepção", a questão já não é educar o ouvido rude para ouvir música, mas devolver a audição. Já não se trata de treinar o olho para ver a beleza, mas de restabelecer a "perceptibilidade".62 O aparato técnico da câmera, incapaz de "retribuir nosso olhar", capta a apatia dos olhos que confrontam a máquina — olhos que "perderam a capacidade de olhar".3 É claro que os olhos ainda veem. Bombardeados por impressões fragmentadas, veem demais — e não registram nada. Assim, a simultaneidade entre a estimulação excessiva e o torpor é característica da nova organização sinestésica como anestesia. Essa inversão dialética, pela qual a estética passa de
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um modo cognitivo de estar "em contato" com a realidade par modo de bloquear a realidade, destrói a capacidade do orga humano de reagir politicamente, mesmo quando está em jogo topreservação: quem "deixou para trás a experiência" já "não paz de distinguir [...] o amigo fiel [...] do inimigo mortal" •64 VII A anestesia tornou-se uma técnica esmerada na última parte do lo XIX. Enquanto as defesas autoanestesiantes do corpo são pr minantemente involuntárias, esses métodos envolveram a manip ção consciente e intencional do sistema sinestésico. Às fo narcóticas já existentes no Iluminismo — café, tabaco, chá e beb alcoólicas — acrescentou-se um vasto arsenal de drogas e prática rapêuticas, desde o ópio, o éter e a cocaína até a hipnose, a hidr rapia e o eletrochoque. Técnicas anestésicas eram receitadas por médicos contra a d chamada "neurastenia", identificada em 1869 como um const patológico.65 Chama atenção, nas descrições oitocentistas dos efe da neurastenia, a desintegração da capacidade de vivenciar — pr mente como na descrição benjaminiana do choque. As metáf dominantes em relação à doença são reflexos disso: nervos "em galhos", "colapso" nervoso, "despedaçar-se", "fragmentação" psique. O distúrbio era causado por um "excesso de estimula [estenial e pela "incapacidade de reagir a ele" [astenia]. A neur nia podia ser acarretada pelo "excesso de trabalho", pelo "desga da vida moderna, pelo trauma físico de um acidente ferroviário, "exigência crescente" da civilização moderna "ao cérebro e seus butários", ou pelos "efeitos nocivos mórbidos atribuídos [...] à valência do sistema fabril" 66 Os remédios para a neurastenia podiam incluir banhos qu ou uma viagem à beira-mar, porém o tratamento mais comum e os medicamentos. A "principal" dentre todas as drogas usadas o "esgotamento nervoso" era o ópio, por seu impacto duplo: excita e estimula por um breve período as células cerebrais, e de as deixa num estado de tranquilidade que é o que melhor se a
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sua nutrição e restauração".67 Os opiáceos foram "o principal remédio das crianças ao longo de todo o século XIX" •68 As mães que trabalhavam nas fábricas drogavam os filhos como uma forma de serviço de creche. Receitavam-se anestésicos como soníferos na insônia e tranquilizantes para os doentes mentais.69 A compra de opiáceos não era regulamentada: os remédios patenteados (tônicos para os nervos e toda sorte de analgésicos) eram produtos transnacionais lucrativos, negociados e vendidos sem qualquer controle governanental.7° A cocaína, extraída pela primeira vez da coca peruana em 1859 pelo europeu Albert Niemann, passou a ser largamente usada no fim do século.71 Havia seringas hipodérmicas disponíveis para as injeções subcutâneas a partir da década de 1860.72 O uso de anestésicos na cirurgia médica data, não por acaso,73 lesse mesmo período de manipulação experimental dos componentes do sistema sinestésico. As "folias do éter", versão oitocentista da prática de cheirar cola, eram um jogo de salão em que se inalava "gás hilariante" (óxido nitroso), produzindo "sensações voluptuosas", "deslumbrantes impressões visuais", "uma sensação de extensão palpável e sumamente prazerosa em todos os membros", "visões extasiantes", "um mundo de sensações novas", ou um novo "universo composto de impressões, ideias, prazeres e dor".'4 Somente em meados do século XIX é que se elaboraram as implicações práticas para a cirurgia. Isso aconteceu nos Estados Unidos, quando, de modo independente, estudantes de medicina da Geórgia e de Massachusetts participaram dessas "folias". Um cirurgião da Geórgia, Crawford W. Long, notou que as pessoas que se machucavam nessas festas não sentiam dor. Numa festa em Massachusetts, estudantes de medicina deram éter a ratos em doses suficientemente altas para deixá-los imóveis, produzindo uma insensibilidade total. Crawford Long usou anestésicos com sucesso em operações feitas em 1842. Em 1844, um dentista da cidade de Hartford, em Connecticut, realizou extrações dentárias com óxido nitroso. Em 1846— numa atmosfera muito mais sóbria e legitimadora que a das "folias do éter" —, fez-se a primeira demonstração pública da anestesia geral, no Hospital Geral de Massachusetts,75 de onde essa "descoberta maravilhosa" espalhou-se rapidamente para a Europa.
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Nainor The PE OPIli 'REMEDY Anúncio de medicamento patenteado do fim do século XIX.
Caricatura de uma folia do óxido nitroso (ou do éter).
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VIII No século XIX, não era incomum os cirurgiões se viciarem em drogas.'" A experimentação pessoal de Freud com a cocaína é famosa. Elizabeth Barrett Browning era morfinômana desde o fim da juventude. Samuel Coleridge iniciou seu vício da vida inteira aos 24 anos. Charles Baudelaire usava ópio. Em meados do século XIX, o consumo habitual de drogas "campeava entre os pobres" e "se espalhava" entre os "ricos, até mesmo na realeza".78 O vício em drogas é característico da modernidade. É o correlato e a contrapartida do choque. Mas o problema social desse vício não é idêntico ao problema (neuro)psicológico, pois uma adaptação aos choques sem drogas nem amortecimento pode ser fatal.'" Mas o problema cognitivo (e, portanto, político) reside em outro lugar. A experiência da inebriação não se limita a transformações bioquímicas induzidas por drogas. A partir do século XIX, a própria realidade foi transformada em narcótico. A palavra-chave desse fenômeno é fantasmagoria. O termo originou-se na Inglaterra, em 1802, como nome de uma exposição de ilusões de óptica produzidas por lanternas mágicas. Descreve uma aparência de realidade que engana os sentidos, mediante a manipulação técnica. À medida que as novas tecnologias se multiplicaram no século XIX, o mesmo se deu com o potencial dos efeitos fantasmagóricos." Nos interiores burgueses do século XIX, o mobiliário fornecia uma fantasmagoria de texturas, tons e prazer sensorial que imergia o morador da casa num ambiente total, num mundo privatizado, de fantasia, que funcionava como um escudo protetor para os sentidos e sensibilidades dessa nova classe dominante. Em Passagens, Benjamin documenta a disseminação das formas fantasmagóricas no espaço público: as galerias parisienses de compras, onde as fileiras de vitrines de lojas criavam uma fantasmagoria das mercadorias em exposição; panoramas e dioramas que tragavam o espectador numa simulação de ambiente total em miniatura; e as exposições mundiais, que expandiam esse princípio da fantasmagoria em áreas do tamanho de pequenas cidades. Essas formas oitocentistas foram as precursoras dos atuais shoppings, parques temáticos e fliperamas, assim como do ambiente
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totalmente controlado dos aviões (em que o sujeito sentado fica à imagem, ao som e ao serviço de bordo), do fenômeno da turística" (no qual todas as "vivências" do viajante são monito controladas de antemão), do ambiente audiossensorial individ do do walkman, da fantasmagoria visual da propaganda ou do rio tátil de uma academia repleta de equipamentos Nautilus. As fantasmagorias são uma tecnoestética. As percepções que cem são bastante "reais" — seu impacto nos sentidos e nervos "natural", do ponto de vista neurofísico. Mas sua função social é pensatória em cada um desses casos. O objetivo é a manipula sistema sinestésico pelo controle dos estímulos ambientais. 5 efeito de anestesiar o organismo, não pelo entorpecimento, mas uma inundação dos sentidos. Esses sensórios simulados alte consciência, tal como faz a droga, porém o fazem mediante a dis sensorial, em vez da alteração química, e — o que é o mais significa — seus efeitos são experimentados na coletividade, não individual te. Todos veem o mesmo mundo alterado, vivenciam o mesmo biente total. Como resultado, ao contrário do que acontece co drogas, a fantasmagoria assume a posição de uma realidade o Enquanto os viciados em drogas enfrentam uma sociedade que tiona a realidade de suas percepções alteradas, a própria emb da fantasmagoria torna-se a norma social. O vício sensorial numa lidade compensatória converte-se num meio de controle social. Nesse fenômeno, o papel da "arte" é ambivalente. Nessas c ções, torna-se difícil sustentar a definição de "arte" como expen sensorial que se distingue precisamente por sua separação da " dade". Grande parte da "arte" entra no campo fantasmagórico c entretenimento, como parte do mundo das mercadorias. Os efeitos fantasmagoria existem em níveis múltiplos, como fica visível quadro de Franz Skarbina datado da passagem do século XIX p XX." A vista é da Exposição Mundial de Paris de 1901, retratada forma duplamente ilusória proporcionada pela iluminação nor O quadro é um Stimmungsbild, uma "pintura da atmosfera amb" tal", um gênero que estava em voga na época e visava a retratar "clima" ou uma atmosfera, mais que um sujeito. Apesar da profu dade da paisagem, o prazer visual é proporcionado pela supe
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Franz Skarbina, Vista do Sena e Paris à noite, 1901.
nosa da pintura, que cintila sobre a cena como um véu. John plicka escreveu: a cidade fica "reduzida a um estado de ânimo do tador. [...] A experiência do lugar [...] é mais emocional que raal. [...] Há uma negação sutil da cidade como artifício [...] e um dono sutil da responsabilidade da humanidade por haver criado ambiente" 82 Benjamin descreve o flanador como um autodidata nessa capacie de se distanciar, transformando a realidade numa fantasmago: em vez de ser apanhado na multidão, ele afrouxa o passo e a erva, transformando a superfície dela num padrão. Vê a multidão o um reflexo de seu estado de espírito onírico, uma "ernbria" dos sentidos. O sentido da visão foi privilegiado nesse sensório fantasmagórico modernidade. Mas a visão não foi a única a ser afetada. As perfuias floresceram no século XIX, com seus produtos dominando sentido olfativo de uma população já assediada pelos odores da ade.83 O romance O paraíso das damas, de Zola, descreve a fan-
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tasmagoria das lojas de departamentos como uma orgia de er táctil, na qual as mulheres abriam caminho tateando as file balcões repletos de pilhas de tecidos e roupas. No tocante ao p os refinamentos gustativos de Paris já haviam atingido um ni quintado, na França pós-revolucionária, à medida que ex-coz ros da nobreza buscaram emprego nos restaurantes. É signifi para os efeitos anestésicos dessas experiências, que a singular' de um sentido para urna estimulação intensa tem o efeito de ent cer os demais.81 A tentativa artística mais monumental de criar um ambiente foi a concepção do drama musical de Richard Wagner como u sammtkunstwerk [obra de arte total], na qual a poesia, a músi teatro se combinavam para criar, como escrevéu Adorno, uma são inebriante" (que supera o desenvolvimento desigual dos senti os reúne).85 O drama musical wagneriano inunda os sentidos c os de como uma "fantasmagoria consoladora", num "convite perma te à embriaguez, como uma forma de regressão oceânica".56 Ele "perfeição da ilusão de que a obra de arte é uma realidade sui g ris":87 "Tal como Nietzsehe e, posteriormente, a art nouveau, que antecipou em muitos aspectos, [Wagner] gostaria de dar vida sozi a uma totalidade estética, lançando um feitiço e demonstrando desafiadora despreocupação com a ausência das condições sociais cessarias à sobrevivência dela." É essa pseudototalização que, Adorno, faz da ópera wagneriana uma fantasmagoria. Sua unidade superposta. Enquanto "nas condições da modernidade", na "e. riência contingente do indivíduo" fora do teatro de ópera, "os se dos separados não se unem" numa percepção unificada, aqui "pr sos díspares são simplesmente agregados, de modo a fazê-los parecer coletivamente vinculados"." Em vez da lógica musical interna, a ó wagneriana evoca uma "unidade estilística" superficial, que opr por não parar para respirar." A unidade é uma mera duplicação, q "substitui o protesto";" "a música repete o que as palavras já di ram"; os temas musicais se repetem como um tema de propaganda; inebriação, o êxtase que poderia afirmar a sensualidade, fica reduzi a uma sensação superficial, enquanto o conteúdo dos dramas é a gação da vida: "a ação culmina na decisão de morrer".92
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Gesammtkunstwerk de Wagner, "intimamente relacionada o desencantamento do mundo"," é uma tentativa de produzir mentalmente uma metafísica totalizante, por meio de todos os sos tecnológicos disponíveis. Em Bayreuth, a orquestra — meio produção dos efeitos musicais — fica escondida do público, pela rução de um fosso abaixo da linha de visão da plateia. Supostate "integrando as artes individuais", a apresentação das óperas Wagner "acaba conseguindo uma divisão do trabalho sem precetes na história da música".94
quinas de nadar em ação em Das Rheingold.
áquinas de nadar tal como vistas pela plateia.
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Marx tornou famoso o termo "fantasmagoria" ao usá descrever o mundo das mercadorias, as quais, em sua mera visível, ocultam todos os vestígios do trabalho que as prod encobrem o processo de produção e — como os quadros de de espírito — incentivam os que as fitam a identificá-las co sias subjetivas e sonhos. Adorno comenta, a propósito marxista das mercadorias, que a fantasmagoria delas " subjetividade, ao confrontar o sujeito com o produto de se lho, porém de um modo que o trabalho investido nele já nã tificável"; em vez disso, "o sonhador depara de forma i com sua imagem".99 Adorno afirma que a ilusão enganosa da Wagner é aná1oga.96 A tarefa de sua música era esconder a a e a fragmentação, a solidão e o empobrecimento sensorial moderna, que era o material de que ela se compunha: "a música [de Wagner] é aquecer as relações alienadas e reifi homem e fazer parecer que elas ainda são humanas"." O Wagner falava em "curar as feridas com que o bisturi an retalhou o corpo da fala".99
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IX A fábrica era a contrapartida, no mundo do trabalho, do t ópera — uma espécie de contrafantasmagoria que se baseava cípio da fragmentação, não na ilusão da inteireza. O ca Marx (escrito na década de 1860 e, por conseguinte, parte da era das óperas de Wagner), descreve a fábrica como um meio Todo órgão dos sentidos é igualmente lesado pela elevação cial da temperatura, pela atmosfera empoeirada, pelo ba ensurdecedor, para não falar no perigo existente para a vida e membros em meio à maquinaria densamente compactada, com a regularidade das estações, divulga suas listas de mor feridos na batalha industrial." Aprendemos em escritos recentes sobre a história soci médicos ficavam "uniformemente horrorizados com a contagem de vítimas fatais da Revolução Industrial" .'00 os,
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lesões decorrentes de acidentes nas fábricas e ferrovias no sécuXIX faziam as alas cirúrgicas parecerem hospitais de campanha. Hospital Geral de Massachusetts, em meados do século (após a odução da anestesia geral), quase 7% de todos os pacientes inados sofriam amputações.'" Como a maioria dos pacientes hoslares era proveniente de instituições de caridade, esse grupo se ginava principalmente na classe baixa."2 0s corpos ameaçados, os mbros destroçados, a catástrofe física — essas realidades da moniidade eram o lado avesso da estética técnica das fantasmagorias mo ambientes totais de conforto corporal. O cirurgião — cuja tareera, literalmente, juntar os pedaços das vítimas da industrialização ganhou um novo destaque social. A prática da medicina foi profisnalizada em meados do século XIX,103 e os médicos tornaram-se o otótipo de uma nova elite de especialistas técnicos. A anestesia foi central para essa evolução. É que não era apenas o ciente que se aliviava da dor com os anestésicos. O efeito era igualmente profundo nos cirurgiões. O esforço para se dessensibilizar da experiência da dor alheia deixou de ser necessário. Enquanto, até então, os cirurgiões tinham que treinar para reprimir a identificação empática com o sofrimento dos pacienttes, nesse momento eles passaram a ter de se confrontar apenas com uma massa inerte e insensibilizada, na qual podiam mexer sem qualquer envolvimento emocional. Esses desdobramentos acarretaram uma transformação cultural da medicina — e do discurso sobre o corpo, em geral —, como é claramente exemplificado nos casos de amputação de membros. Em 1639, o cirurgião naval britânico John Woodall recomendava a oração antes da "lamentável" cirurgia de amputação: "Pois não é nada pequena a pretensão de Desmembrar a Imagem de Deus.""4Em 1806 (a era de Charles Bell), a atitude do cirurgião evocava os termos iluministas do estoicismo, da glorificação da razão e da santidade da vida individual. Mas, com a introdução da anestesia geral, o American Journal of Medical Sciences pôde informar, em 1852, que era "muito gratificante para o cirurgião e os espectadores que o paciente se mantenha como um sujeito tranquilo e passivo, em vez de se debater e, quem sabe, soltar gritos e gemidos enquanto o bisturi funciona"." O controle proporcionado ao cirurgião pelo paciente "tranquilamente dó-
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cil" permitia que a operação procedesse com um rigor técni precedentes e com "toda a deliberação conveniente")" É cl não se trata aqui, em absoluto, de criticar os avanços cirúrgicos,. de documentar uma transformação da percepção cujas imp ultrapassaram em muito o cenário da operação cirúrgica. A fenomenologia usa o termo hylé — a matéria "bruta", in ciada — para descrever aquilo que é percebido, mas não "inten mente pretendido". O exemplo dado por Husserl é a gravura era deira que Dürer fez de um cavaleiro montado. Embora a madeira percebida juntamente com a imagem do cavaleiro, não é ela o cado da percepção. Se alguém lhe perguntasse o que você está você diria "um cavaleiro" (isto é, a imagem na superfície), não pedaço de madeira". A matéria desaparece por trás da intenção significado da imagem.107 Husserl, o fundador da fenomenologia derna, escreveu na virada para o século XX, na era em que a pro nafização, a perícia técnica, a divisão do trabalho e a raciona dos métodos estavam transformando as práticas sociais. As po ções industriais urbanas começaram a ser percebidas como consu do, elas próprias, uma "massa" — indiferenciada, potencialmente gosa, um corpo coletivo que precisava ser controlado e moldado forma significativa. Em certo sentido, isso foi uma continuaça mito autotélico da criação ex nihilo, na qual o "homem" trans a natureza material, moldando-a de acordo com sua vontade. houve de novo foi o tema da coletividade social e a divisão do tra a que o processo criativo passou a se submeter. Para Kant, a dominação da natureza foi internalizada: a vo subjetiva, o corpo material e disciplinado e o eu autônomo pr do em decorrência disso, todos estavam dentro do (mesmo) ia duo. Na autogeração do começo da modernidade, o sujeito aut mo produzia a si mesmo. Todavia, no final do século XIX, funções foram divididas: o "homem que se faz sozinho" era o e sário de uma grande companhia; o "guerreiro" era o general de máquina de guerra tecnologicamente sofisticada; o príncipe g nante era o chefe de uma burocracia em expansão; e até o revol nário social tinha-se tornado líder e configurador de uma discip da organização partidária de massa.
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1806: Frontispício de Sir Charles Bell, The Principies of Surgery, "Quem perderia, por medo da dor, esse ser intelectual?"
A tecnologia afetou o imaginário social. As novas teorias de HerSpencer e Émile Durkheim perceberam a sociedade como um orsmo: literalmente, um "corpo" político em que as práticas sociais instituições (não, como na Europa pré-moderna, as camadas so^s dos indivíduos) desempenhavam as várias funções dos órgãos.1" pecialização do trabalho, a racionalização e a integração das funsociais criaram um corpo técnico da sociedade, e ele foi imaginacomo tão insensível à dor quanto o corpo do indivíduo sob anesgeral, de modo que era possível praticar um sem-número de
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Essa separação dos elementos da experiência sinestésica seria incebível num texto de Kant. A descrição de Husserl é uma obsero técnica, na qual a experiência corporal é separada da cognitie a experiência do agente, por sua vez, é separada de ambas. Um anho senso de autoalienação resulta dessa cisão perceptual. Algo clhante aconteceu, na época, na sala de cirurgia. A prática iluminista de realizar procedimentos cirúrgicos num anfiteatro (cuja amplitude rivalizava com a do palco wagneriano) passou por uma alteração radical quando a anestesia geral foi introduzida. O impacto inicial foi acentuar o efeito de teatro, pois (como assinalamos) nem o cirurgião nem a plateia tinham que se incomodar com os timentos do paciente insensível. Eis a descrição de uma das primeiamputações feitas sob anestesia geral: O [bisturi] Catlin, reluzindo por um momento acima da cabeça do operador, foi mergulhado no membro e, com um volteio artístico, cortou os retalhos ou concluiu uma amputação circular. Após vários giros aéreos, a serra cortou o osso como se fosse movida a eletricidade. A queda da parte amputada foi saudada por tumultuosos aplausos dos estudantes empolgados. O operador agradeceu o cumprimento com uma reverência formal."°
Diagrama de um teatro cirúrgico, 1890.
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No fim do século deu-se uma alteração radical, quando as bertas feitas na teoria microbiana e na antissepsia transform sala de operações, fazendo-a passar de palco teatral a um a de ladrilho e mármore, esfregado e esterilizado. No X Co Internacional de Medicina, em 1890, J. Baladin, de São Peters descreveu a primeira utilização de uma divisória de vidro para rar alunos e visitantes da arena cirúrgica.133A janela de vidro -se uma tela de projeção: uma série de espelhos fornecia ima formativas do procedimento. Nesse caso, a divisão tripa perspectiva perceptual — agente, matéria e observador — to paralela à novíssima experiência contemporânea do cine A obra de arte, Walter Benjamin discute o cirurgião e o opera câmera (contrastados com o mágico e o pintor). Os proced. do cirurgião e do operador de câmera são não auráticos: "pen no ser humano; em contraste, o mágico e o pintor confrontam tra pessoa intersubjetivamente, ou, como escreve Benjamin, "d mem para homem".112 X O escritor alemão Ernst Jünger, ferido várias vezes durante a ra Guerra Mundial, escreveu posteriormente que os "sacrifíci tos à destruição tecnológica — não apenas as baixas de guer também os acidentes industriais e de trânsito — ocorriam ago previsibilidade estatística."3 Tornaram-se aceitáveis como racterística compreensível da vida, com isso fazendo o "tra dor", como o novo "tipo" moderno, desenvolver uma "s consciência": "Essa segunda consciência, mais fria, é indi capacidade cada vez mais desenvolvida de o indivíduo ver a mo como um objeto."114 Enquanto a "autorrefiexão", caract da psicologia do "estilo antigo", tomava como seu objeto "o mano sensível", essa segunda consciência "voltava-se para um tuado fora da zona de dor" •115 Jünger ligou essa perspectiva à fotografia, aquele "olho artificial" que "detém a bala em voo, como detém o ser humano no instante de ser despedaçado p explosão"."6 Os órgãos sensoriais da tecnologia, poderosamen
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'cos, passaram a ser o novo "eu" de um sistema sinestésico transrmado. Agora, eles forneciam a superfície porosa entre o interno e externo, o órgão da percepção e o mecanismo de defesa. A tecnogia, como instrumento e como arma, ampliou o poder humano — o mesmo tempo intensificando a vulnerabilidade do que Benjamin amava de "o pequenino e frágil corpo humano"117 —, produzindo sim uma necessidade contrária: a de usar a tecnologia como um cudo protetor contra a "ordem mais fria" criada por ela. Jünger reveu que os uniformes militares sempre tiveram um "caráter de fesa", protetor, mas agora "a tecnologia é nosso uniforme": Ele é a própria ordem tecnológica, esse grande espelho em que as crescentes objetificações de nossa vida aparecem com mais clareza, e que se veda contra as garras da dor de maneira especial. [...] Mas nós estamos muito profundamente inseridos no processo para ver isso. [...] Isto se dá ainda mais na medida em que o caráter de consolo [leia-se função fantasmagórica] de nossa tecnologia funde-se, de maneira cada vez mais inequívoca, com sua característica de poder instrumenta1.118 No "grande espelho" da tecnologia, a imagem que retorna é deslocaria, refletida num plano diferente, no qual o sujeito vê a si meso como um corpo físico separado da vulnerabilidade sensorial — m corpo estatístico cujo comportamento pode ser calculado; um corpo atuante cujas ações podem ser cotejadas com a "norma"; um corpo virtual, capaz de suportar sem dor os choques da modernidade. Como escreveu Jünger: "É quase como se o ser humano se empenhasse em criar um espaço em que a dor [...] pudesse ser vista como uma ilusão.""9 Vimos que Adorno identificou a art nouveau como uma continuação da fantasmagoria wagneriana de cunho mercadológico. Também aqui, uma unidade superficial proporcionou o efeito fantasmagórico. Pouco antes da guerra, esse movimento negou a experiência de fragmentação, representando o corpo como uma superfície ornamental, orno que refletida a partir do interior do campo protetor da tecnologia. A eclosão da guerra fez com que essa negação não mais fosse possível. O Manifesto Dadaísta de Berlim, de 1918, anunciou: "A arte
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superior será aquela que, em seu conteúdo consciente, apr problemas mil vezes multiplicados da época, essa arte que foi mente destroçada pelas explosões da última semana, que fica mente tentando recolher seus membros depois do desastre tem."120 É possível ler os retratos dos pintores expressionistas relacionados com a superfície do rosto, sem blindagem e ex impressão material desse esfacelamento tecnológico. (Isso se interpretação fascista do expressionismo como arte degenera ontolog'za a aparência superficial e reduz a história à biologia. goroso movimento de fotomontagem do após-guerra também corpo fragmentado a sua matéria e a sua substância.121 Mas o e juntar de novo os fragmentos em imagens que parecem impe dor. Por exemplo, na montagem de Hannah Hóch de 1926, da Monumento II: Vaidade, a imagem é unificada com precisão. _ do uma superfície coerente (ainda que perturbadora) — mas Serr. dade superposta do fantasmagórico.
De Erast ji-mge4 The Trans formed World, 1933: "A face da terra: cidade, campo".
Ao mesmo tempo, o padrão superficial, como representa trata da razão, da coerência e da ordem, tornou-se a forma do te de retratar o corpo social criado pela tecnologia — e que, não podia ser percebido de outra maneira. Em 1933, Jünger a introdução de um livro de fotografias no qual cidades e alemães formam um desenho superficial de ordeirismo abstr é a marca registrada da tecnologia instrumental. A mesma e visível no "plano" soviético: seu organograma de 1924 m
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sociedade inteira, vista pela perspectiva do poder central, em termos de suas unidades produtoras — de aço a palitos de fósforo. A estética da superfície dessas imagens devolve ao observador uma percepção tranquilizadora da racionalidade de todo o corpo social, o qual, quando visto de seu próprio corpo pessoal, é percebido como uma ameaça à integridade. No entanto, se o indivíduo realmente encontra uma perspectiva a partir da qual possa ver a si mesmo como inteiro, o tecnocorpo social desaparece de vista. No fascismo (e isso é fundamental para a estética fascista), esse dilema da percepção é superado por uma fantasmagoria do indivíduo como parte de uma multidão que forma, ela própria, um todo integrado — um "ornamento de massas", para usar a expressão de Siegfried Kracauer, que agrada como estética da superfície, um padrão desindividualizado, formal e regular — exatamente corno o plano soviético. A Urform [forma originária] dessa estética já está presente, nas óperas de Wagner, na disposição cênica do coro, que antecipa a saudação das massas a Hitler. Mas, para não esquecermos que o fascismo em si não é responsável pela percepção transformada, as produções musicais da década de 1930 usavam esse mesmo motif em sua concepção (Hitler era um aficionado dos musicais norte-americanos). g —i+Iktme '47; .4'11 g `. ""
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Apresentação de Wagner em Bayreuth em 1930.
Hitler no Reichstag.
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XI Depois de um longo desvio, estamos de volta às preocupações de Benjamin no fim dc A obra de arte: a crise da experiência cognitiva causada pela alienação dos sentidos, que possibilita à humanidade ver sua própria destruição com prazer. Lembremos que esse ensaio foi originalmente publicado em 1936. No mesmo ano, Jacques Lacan foi a Marienbad apresentar à Associação Psicanalítica Internacional um artigo em que formulou pela primeira vez a teoria do "estádio do espelho" .122 O texto descreveu o momento em que a criança de seis a dezoito meses reconhece triunfalmente sua imagem no espelho e se identifica com ela como uma unidade corporal imaginária. Essa vivência narcísica do eu como "reflexo" especular é de des(re) conhecimento. O sujeito se identifica com a imagem como a "forma" [Gestalt] do eu, de um modo que esconde sua própria falta. Ela leva, retroativamente, a uma fantasia do "corpo despedaçado" [corps morcelé]. Hal Foster situou essa teoria no contexto histórico dos primórdios do fascismo e assinalou as ligações pessoais entre Lacan e os pintores surrealistas que faziam do corpo despedaçado o seu tema.123 Creio que se pode levar muito longe a importância dessa contextualização: o estádio do espelho pode ser interpretado como uma teoria do fascismo. A experiência descrita por Lacan pode (ou não) ser uma etapa universal na psicologia do desenvolvimento, mas sua importância em termos psicanalíticos só vem a posteriori, como uma retroação [Nachtrdglichkeit], quando algo da situação atual desencadeia na memória do adulto a lembrança dessa fantasia infantil. Portanto, a importância da teoria lacaniana só emerge no contexto histórico da modernidade como a experiência do corpo frágil e dos perigos representados para ele pela fragmentação que reproduz o trauma do evento infantil original (a fantasia do corps morcelé). O próprio Lacan reconheceu a especificidade histórica dos distúrbios narcísicos ao comentar que o grande trabalho de Freud sobre o narcisismo, não por acaso, "data do início da guerra de 1914, e é muito comovente pensar que foi nessa época que Freud estava desenvolvendo essa construção".124
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Um dia depois de apresentar seu trabalho em Marienbad, abandonou o congresso e pegou um trem para assistir aos Olímpicos em Berlim.'25 Numa nota em A obra de arte, Ben comentou essa Olimpíada moderna, que, em suas palavras, de seus antigos protótipos, na medida em que foi menos uma di que um processo de medição tecnológica exata, mais uma forma teste que uma competição.126 Baseando-se em Jünger, Foster a lou que o fascismo exibia o corpo físico como uma espécie de b gem contra a fragmentação e a dor. O corpo blindado e mecan com sua superfície galvanizada e seu rosto metálico de ângulos tilados, proporciona a ilusão de invulnerabilidade. É o corpo o do ponto de vista da "segunda consciência", descrita por como "entorpecida" contra o sentimento. (A palavra narcisismo a mesma raiz que narcótico!) Mas, se o fascismo prosperou com na representação do corpo como blindado, essa não foi sua forma estética importante para esta problemática. XII
Ao concluir, eu gostaria de considerar duas autodefinições do mo. A primeira é uma descrição feita por Joseph Goebbels n carta de 1933: "Nós, que moldamos a moderna política alemã, timo-nos pessoas de talento artístico, às quais foi confiada a gra responsabilidade de formar, a partir da matéria-prima das mas uma estrutura sólida e bem trabalhada de um Volk [povo]." i27 Essa a versão tecnologizada do mito da autogeração, com sua divisão tre o agente (no caso, os líderes fascistas) e as massas (a hylé in renciada sobre a qual se exerce a ação). Estamos lembrados de essa divisão é tripartite. Há também o observador, que "sabe" observação. A genialidade da propaganda fascista foi dar às ma um papel duplo, de observadoras e de massa inerte que era for e moldada. No entanto, em função de um deslocamento do lugar dor, graças a um consequente des(re)conhecimento, as massas co plateias mantêm-se, de algum modo, imperturbáveis diante do es táculo de sua própria manipulação — tal como Husserl cortando dedo. Num filme de Leni Riefenstahl de 1935, O triunfo da vonta
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(que Benjamin certamente conhecia quando escreveu A obra de arte), as massas mobilizadas ocupam o terreno do estádio de Nuremberg da tela de cinema, de modo que os padrões superficiais proporcionam uma concepção agradável do conjunto, fazendo o espectador esquecer a finalidade daquela exibição, a militarização da sociedade para a teleologia de fazer a guerra. A estética permite uma anestesia da recepção, uma visão da "cena" com um prazer desinteressado, ainda que essa cena seja a preparação de toda uma sociedade, por meio de um ritual, para o sacrifício sem questionamento e, em última instância, a destruição, o assassinato e a morte. Em O triunfo da vontade, Rudolf Hess grita para a multidão reunida na arena: "A Alemanha é Hitler e Hitler é a Alemanha!" Assim chegamos à segunda autodefinição do fascismo. O significado intencional é que Hitler encarna todo o poder da nação alemã. Mas, se virarmos a câmera para Hitler de maneira não aurática, isto é, se usarmos esse aparato tecnológico como um auxiliar da compreensão sensorial do mundo externo, não como uma fuga fantasmagórica ou narcísica dele, veremos algo muito diferente. Sabemos que, em 1932 (sob a orientação do cantor de ópera Paul Devrient), Hitler treinou suas expressões faciais diante de um espelha"' a fim de surtir o que julgava ser o efeito apropriado. Há razão para crer que esse efeito não era expressivo, mas reflexivo, devolvendo ao homem da multidão sua própria imagem — a imagem narcísica do eu intacto, construída em oposição ao medo do corpo despedaçado."' Em 1872, Charles Darwin publicou A expressão das emoções no homem e nos animais, onde manifesta sua dívida para com a obra de Charles Bell. O livro de Darwin foi o primeiro de sua elas- se a recorrer a fotografias em vez de desenhos, o que permitiu maior precisão na análise das expressões faciais das emoções humanas. Se compararmos as fotografias das expressões faciais de Hitler, exercitando-se diante de um espelho, com as fotos do livro de Darwin, talvez esperemos constatar que suas expressões denotam emoções agressivas — raiva e ódio. Ou então seria possível supor que Hitler tentasse projetar o rosto impermeável e "blindado" que Jünger descrevera, e que era tão típico da arte nazista. Mas, na verdade, as
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duas emoções descritas por Darwin que combinam com as fias de Hitler são bem diferentes dessas. A primeira emoção é o medo. Vejamos a descrição de D medida que o medo cresce, numa agonia de pavor [...], das narinas ficam extremamente dilatadas [...] há um arq um movimento convulsivo dos lábios, um tremor na cavid bochecha E.. .1 os globos oculares fixam-se no objeto de pav os músculos do corpo podem enrijecer-se [...] as mãos ficam nadamente cerradas e abertas [...] [o]s braços podem proj como que para evitar um perigo assustador, ou ser violent jogados para cima da cabeça."° Há uma segunda emoção identificável nos gestos de que Darwin chama de "sofrimento do corpo e da mente: As fotografias pertinentes são, especificamente, os rostos que gritam e choram. Darwin escreve: A elevação do lábio superior repuxa para cima a carne das superiores das faces e produz uma dobra fortemente ace em cada bochecha - a dobra nasolabial -, que desce das ções das asas das narinas até os cantos da boca e abaixo Essa dobra ou sulco, que pode ser vista em todas as fotog muito característica da expressão da criança chorando [-IA câmera pode nos ajudar no conhecimento do fasc proporciona uma vivência "estética" que é não aurática, cri "testadora",132 e capta com sua "óptica inconsciente" 33 pr a dinâmica do narcisismo de que depende a dinâmica do mas que é escondida por sua estética aurática. Esse co não é historicista. A justaposição de fotografias do rosto ilustrações de Darwin não responde às complexidades da de von Ranke sobre "como era realmente a situação" na nem o que determinou a singularidade de sua história. A sição cria uma experiência sintética que tem ressonância sa própria época, fornecendo-nos hoje um duplo reco - primeiro, de nossa infância, na qual, para muitos de n de Hitler parecia a encarnação do mal, o bicho-papão
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Acima e abaixo: de Charles Darwin, A expressão das emoções no homem e nos animais, 1872.
Acima e abaixo: de Heinrich Hoffman,
Pose oratória de Hitler, 1932.
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temores infantis. Segundo, ela nos traz num choque a co que o narcisismo que desenvolvemos quando adultos, qu como uma tática anestesiante contra o choque da cxperiê na — e à qual se apela diariamente através da fantasmag gens da cultura de massas —, é o terreno do qual pode b mente o fascismo. Para citar Benjamin: "Ao barrar a ex era inóspita e ofuscante do industrialismo em larga es percebe uma experiência de natureza complementar, sob a sua pós-imagem espontânea."134 O fascismo é essa pós-. seu espelho refletor nós nos reconhecemos.
Notas The Work of Art in the Age of Mechanical Reproduction é a tradução nal em língua inglesa (ver Illuminations, org. Hannah Arendt, trad. Har York: Schocken Books, 1969). A tradução literal do título alemão é si. diferente: "A obra de arte na era da sua reprodutibilidade técnica" [ter duzierbarkeit]. Contornei o problema usando uma forma abreviada: A 2
A melhor leitura de A obra de arte, de Benjamin, ainda é o ensaio de "Benjamin, cinema e experiência: 'A flor azul na terra da tecnologia", Critique 40 (inverno de 1987).
3
"As massas têm direito a uma mudança nas relações de propriedade; o ra dar-lhes uma fôrma de expressão preservando essas relações" (Benj tions, p. 241, tradução modificada). Ibid.
5
Ibid.
7
Uma distorção do original barroco "Faça-se justiça e transforme-se o messa eleitoral do imperador Ferdinando 1(1563). Ver Walter Benja Schriften 1.3, org. Rolf Tiedemann e Hermann Schweppenhãuser, Fra Verlag, 1974, p. 1.055.
Ibid, p. 242 (tradução modificada).
s Benjamin, Illuminations, p. 242 (tradução modificada). 9 Caso contrário, as duas situações, a crise e a resposta, se revelariam uma atraída para a política (não menos a política comunista que a fascista), arte deixar de se colocar a serviço dela, assim cedendo a política seus pr.' artísticos, isto é, "estetizando a política"? ° Heidegger manifestou um interesse especial pelas perambulações fil.mo fundamental "estética" na filosofia do Ocidente (ver, por exemplo,
1
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1936-1937, contemporâneas do ensaio de Benjamin intitulado Nietzsche: Der Wille zur Macht ais Kunst, v. 43 de Martin I Ieidegger, Gesammtausgabe Abteilung: Vorlesungen, 1923-76, Frankfurt: Vittorio Klostermann, 1985). Para uma exposição provocantemente crítica e contextualizada do discurso do "estético" na era moderna da cultura europeia, ver Terry Eagleton, "lhe ldeology of the Aesihetic (Londres: Basil Blackwell, 1990 [A ideologia da estética, trad. Mauro Sá Rego Costa, Rio de Janeiro: J. Zahar, 1993]). Para uma excelente história intelectual da ligação entre a estética e a política no pensamento alemão que frisa a importância do helenismo em geral e de Winckelmann em particular (omitida na exposição de Eagleton), ou seja, a ideia dos gregos como um povo "estético" e "cultural", em contraste com a Roma imperial e materialista, ver Josef Chytry, The Aesthetic State: A Quest in Modern German Thought (Berkeley: University of California Press, 1989). Eagleton, Ideology of the Aesthetic, p. 13. Eagleton lida com o nascimento histórico da estética como um discurso moderno (especificamente, na obra do filósofo alemão Alexander Baumgarten, de meados do século XVIII), e descreve as implicações políticas desse foco anticartesiano no "denso e fervilhante território" externo à mente, que abrange "nada menos que a totalidade de nossa vida sensorial em comum", como as "vibrações primeiras de um materialismo primitivo — da longa e inarticulada revolta do corpo contra a tirania do teórico" (p. 13). Esse era seu significado para Baumgarten, que foi o primeiro a desenvolver a "estética" como uma temática autônoma na filosofia. Todavia, Eagleton acerta ao assinalar que a afirmação da experiência sensorial rem vida curta na teoria de Baumgarten: "Se a sua Estética (1750) inaugura, com um gesto inovador, todo o terreno da sensação, aquilo que ela descortina é, com efeito, a colonização da razão" (Eagleton, ldeology of the Aesthetic, p. 15). Ver, por exemplo, a discussão da educação dos sentidos feita por Rousseau em Emílio. Baumgarten distingue a aesthetica artificialis (à qual dedica a maior parte de seu texto) da aesthetica naturalis, tal como observada nas brincadeiras infantis. A sociabilidade é não apenas uma categoria histórico-cultural, mas parte da nossa "natureza". Há que se reconhecer essa visão na sociobiologia (e em Aristóteles e Marx, aliás). O erro está em supor que as sociedades de hoje sejam expressões exatas desse instinto biológico. Seria possível argumentar, por exemplo, que, precisamente em seu aspecto mais biológico (a reprodução da espécie), a família privatizada é antissocial. Também aqui, arelaaçs relação dialética: s como sempre enem oindividual nem o sot.la l jama is existem m o urna “ sguda e n como «na a eza ( poztanto eui tu p ralmente construída), é igualmente verdadeiro que nem o "individual" nem o "social" entram no mundo culturalmente construído sem deixarem um resto, um substrato biológico que é capaz de fornecer a base da resistência. Benedetto Croce, citado em Hans Rudolf Schweizer, Aesthetik ais Philosophie cler Sinalichen Erkenntnis (Basil: Schwabc and Co., 1973), p. 33. Schweizer afirma, opondo-se a Croce, que Baumgarten não estava excessivamente preocupado nem se desculpando, e que o verdadeiro preconceito contra o estético foi um fenômeno posterior. Fredric Jameson, Late Marxism: Adorno, ar, the Persistence of the Dialec c (Nova York: Verso, 1990), p. 232.
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19
O "nascimento" da polis é atribuído, precisamente, à assombr homem é capaz de produzir a si mesmo ex nihilo. A polis torna "homem" em que ele pode gerar, como uma realidade material, superior. De modo similar, Maquiavel enalteceu em seus escritos maneira autocriativa, funda um novo principado e liga esse ato a da virilidade.
20 Eagleton, ideology of the Aesthetic, p. 64. 21 Ver
Carlos Castoriades, The Imaginary Institution of Society, trad. (Cambridge, Mass.: MIT Press, 1987).
22
Ver, por exemplo, a obra de Luce lrigaray. Para uma excelente cl. tros do debate feminista, ver os artigos de Seyla Benhabib, Judith B em Praxis International 2 (julho de 1991), p. 137-177.
23
Esse "primeiro impulso", na verdade, poderia ser considerado su creve em tom condescendente sobre o camponês saboiano que, ao tasiado turista burguês, "não hesita em chamar de tolo qualquer montanhas geladas" (Irnmanuel Kant, Critique of judgement, trad. Indianápolis: Hackett, 1987, p. 124 [Crítica da faculdade de ju Botelho B. Guedes, São Paulo: ícone, 2009]).
24
Kant, Critique of Judgement, p. 120-121. Por outro lado, de uma ca, essa não é uma reação tola.
25
Ibid.
36 Ibid., p. 121-122. 27
Ernst Cassircr, Kant's Life and Thought, trad. James Haden, introd 'Córner (New Haven: Yale University Preso, 1981), p. 269.
28
Terá sido por mera coincidência que Kant enalteceu como sublimes, aqueles Alpes suíços cujas dimensões e cuja aparência vertiginosa ate ckelmann a tal ponto que, ao avistá-los em 1768, ele abandonou o te' java à Alemanha e voltou para a Itália?
29
Kant, Critique of ludgement, p. 133.
30 Ibid., p. 134. 31
Cassirer, Kant's Life and Thought, p. 270. Essa é uma citação de Ca rio feito por Goethe ao chanceler von Muller, em abril de 1818. (A de Cassirer tem uma carga mais acentuada de gênero que o texto de a Alexandra Cook por mc haver assinalado isso.) O famoso estudo de Winckelmann (1805) o enaltece por ele ter levado uma vida próxima helênico. Isso incluía, explicitamente, suas relações sensuais com belos Crítica da faculdade de julgar, de Kant, que "cativou" Goethe (Cassirer„
32
"Bastar a si mesmo e, portanto, não ter necessidade de companhia, ciável, isto é, sem evitar o convívio social, é algo que se aproxima do qualquer situação em que ponhamos de lado as nossas necessida Judgement, p. 136).
33
O trabalho dos guerreiros "é uma criação e imposição instintiva não sabem o que é culpa, responsabilidade ou consideração 1.-1 e
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mente calma, em meio a tamanha variedade de sofrimentos. Mas dar a tos acesso aos próprios sentimentos seria deixar-se emascular pelo cum dever. Era menos doloroso olhar para o todo do que contemplar ap em Zimmerman e Veith, p. 414). 44
Numa fase posterior da vida, Bell viria a dotar essa resistência de débil significado teológico, ao descrever sua aversão à vivissecção de reconhecendo seu grande valor para o progresso da arte da medicina e cirurgia: "Eu deveria estar redigindo um terceiro artigo sobre os posso prosseguir sem realizar alguns experimentos, os quais são tão d fazer, que eu os adio. Talvez me considerem tolo, mas não consigo co feitamente de que estou autorizado, ria natureza ou na religião, a fazer — para quê? Para nada além de um pequeno egoísmo ou autoengran entanto, o que são meus experimentos, em comparação com os que riamente, e feitos diariamente para nada?" (Gordon-Taylor e Walls, p. 111). Observe-s que esse comentário só foi feito depois de ele já haver exemplo, os nervos faciais de um asno vivo. Bcnjamin cita Freud: "Para um organismo vivo, a proteção contra uma função quase mais importante que a recepção de estímulos; o é equipado com sua própria reserva de energia [...] [que atua] contra energias excessivas em ação no mundo externo [...]" (Charles Baude Zohn, Londres: Verso, 1983, p. 115). O texto de Freud é Além do p (1921), que retorna a um dos primeiros esquemas freudianos do ps jeto de 1895, que ele descreveu corno uma "psicologia para neurolo postumamente publicado como Entwurf einer Psychologie !Projeto logia científica]. O ensaio de 1921 é o único texto de Freud conside min nesse trabalho.
46
Benjamin, Baudelaire, p. 115. A concepção do "sistema sincstésico" é compatível com a compre do eu como "derivado, em última instância, de sensações corporais, que provêm da superfície do corpo", do lugar do qual "podem brotar externas e internas"; assim, o eu "pode ser considerado uma proj superfície do corpo" (Freud, The Ego and the Id [1923], trad. Joan York: W. W. Norton, 1960, p. 15 e 16n).
48
"A lembrança é [...] um fenômeno elementar que almeja dar-nos tempo a recepção de estímulos que inicialmente nos faltavam" (Paul Valéry, mm, Baudelaire, p. 116).
49 Benjamin,
Baudelaire, p. 114.
5° Ibid., p. 116. 51 Ibid., p. 139, 116-117. "Baudelairc fala de um homem que merg
como num reservatório de energia elétrica. Circunscrevendo a vivência chama a isso 'um caleidoscópio dotado de consciência" (p. 132). 52
Ibid., p. 139.
53
Benjamin usa o termo "sinestesia", nesse ponto, em conexão com a pondências (ibid., p. 139). Talvez ele tivesse conhecimento de que ore
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fisiologia para descrever uma sensação numa parte do corpo quando outra é estimulada, e, na psicologia, para descrever a situação em que um estímulo sensorial (como a cor) evoca outro (como o cheiro). Meu uso de "sinestésico" aproxima-se desses: identifica a sincronia mimética entre estímulos externos (percepção) e estímulos internos (sensações corporais, inclusive lembranças sensoriais) como o elemento crucial da cognição estética. "Inervação" é o termo benjaminiano para uma recepção mimética do mundo externo, uma recepção capacitadora, em contraste com uma adaptação mimética defensiva que protege, ao preço de paralisar o organismo, roubando-lhe sua capacidade de imaginação e, portanto, de resposta ativa. Benjamin, Baudelaire, p. 133. Ibid. Benjamin continua (citando O capital): "'Todo tipo de produção capitalista [...] tem em comum [...] não ser o trabalhador quem emprega os instrumentos de trabalho, mas os instrumentos de trabalho que empregam o trabalhador. Mas é somente no sistema fabril que essa inversão adquire pela primeira vez uma realidade técnica e palpável" (p. 132). 57
Ibid., p. 133.
58
Nos manuscritos de 1844, Marx observa: "A formação dos cinco sentidos é um trabalho de toda a história do mundo, até o presente." Para Marx, a vida sensorial é "real"; o homem deve "afirmar-se no mundo ativo não apenas no ato de pensar, mas com todos os seus sentidos". Ao equiparar a realidade à vida sensorial, é o materialista Marx que "estetiza" a política, no sentido autêntico do termo. Benjamin aproxima-se de Marx nesse ponto.
59
Benjamin, Baudelaire, p. 133.
60 Ibid., p. 151. A observação de Benjamin está inteiramente de acordo com as pesquisas neurológicas. O neurologista Frederick Mettler descreve "uma contradição" entre a calma reflexiva necessária para que o indivíduo seja criativo (e invente máquinas) e a destruição desse meio sereno "pelas próprias máquinas e pelo aumento de produtividade que a mente reflexiva cria". Ele observa que basta ao indivíduo estar presente para dirigir um automóvel, ao passo que a reflexão criativa é "distraída" (Culture and the Structural Evolution of the Neural System, Nova York: The American Museum of Natural History, 1956, p. 51). 61
Benjamin, Baudelaire, p. 137.
62
Ibid., p. 147-148. Nesse contexto, o cinema reconstitui a experiência, estabelecendo a "percepção sob a forma de choques" como seu "princípio formal" (p. 132). O modo como um filme é construído, se ele irrompe pelo escudo entorpecedor da consciência, ou meramente proporciona um "exercício" para o fortalecimento de suas defesas, torna-se uma questão de importância política central.
63
Ibid., p. 147-149.
64
Ibid., p. 143.
65
O termo "neurastenia" foi divulgado por um médico de Nova York, George Miller Beard. Na década de 1880, já havia ocupado um lugar de destaque nas discussões europeias. Beard sofria pessoalmente de debilitação nervosa, e aplicou a si mesmo a
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199
eletroterapia (choques) "para repor as reservas esgotadas de força Oppenheim, Shattered Nerves:Doctors,Patients and Depressiotz in V Nova York: Oxford University- Press, 1991, p. 120). 66
Citados em Oppenheim, Shattered Nerves, p. 44, 87, 95, 96, 101 e 105.
67
Thomas Dowse (década de 1880), citado em Oppenheim, p. 114415.
58
Oppenheim, Shattered Nerves, p. 113.
69
Martin S. Pernick, A Caladus of Suffering: Pain, Professionalism, and Nineteenth-Century America, Nova York: Columbia University Presa, 19
70
Os controles (como a Lei de Farmácia e Venenos, criada na Inglaterra vieram a ser aprovados sob a forma de lei no século XX. Owen H. Wangensteen e Sarah D. Wangensteen, The Rise of Surgery: Craft Co Scientific Discipline (Mineapolis: University of Minnesota Press, 1
72
Oppenheim, Shattered Nerves, p. 114.
'3
Não encontrei referências à prática de Charles Bell nas cirurgias, ma lente francês, Larry, cirurgião do exército napoleônico, usava gelo para membros a serem amputados, ou deixava o paciente inconsciente com Larry mostrou-se disposto a fazer experiências com o óxido nitroso, que em sua época, mas a maioria dos integrantes da Real Academia fran que a sugestão beirava o crime (Frederick Prescott, The Control of P The English Universities Presa, 1964, p. 18-28). Efeitos do óxido nitroso descritos em Prescotr, p. 19. Ver Wangensteen e Wangensteen, The Rise of Surgery, p. 277-279. Prescott, p. 28. A aceitação da anestesia não se deu sem resistência. A c rural do significado da dor incluía uma sólida tradição, que sustentava "natural" ou pretendida por Deus (especialmente no parto) e que era ben cura. A resistência à insensibilidade da anestesia geral também foi política Cady Stanton "objetou a que uma mulher entregasse sua consciência e seu médico do sexo masculino" (Pernick, p. 16-61). "Muito depois de 1846, alcoólico ainda continuava a ser um anódino cirúrgico aceitável" (ibid., p. 1" Wangensteen e Wangensteen, The Rise of Surgery, p. 293. Oppenheim, Shattered Nerves, p. 113.
79
Ver Hans Selye, The Stress of Life (Nova York: McGraw-Hill, 2' ed. rev., 197 Num artigo publicado no mesmo ano de A obra de arte (1936), Selye foi o definir a "síndrome do estresse" como uma "doença da adaptação", isto é, pacidade de o organismo atender com reações adaptativas adequadas a uma, (inespecífica) feita a ele. O estresse era "o denominador comum de todas adaptativas do corpo". Passava por três fases, quando persistia a exigên sem diminuição: reação de alarme (resistência geral à exigência), adaptação ( exitosa a curto prazo, de coexistir com ela) e, por último, esgotamento, res passividade (falta de resistência e, possivelmente, morte).
° A tecnologia desenvolve-se, portanto, com uma dupla função. Por um lado, os sentidos humanos, aumentando a acuidade da percepção, e obriga o un
8
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abrir à penetração do aparelho sensorial humano. Por outro, exatamente porque essa ampliação tecnológica deixa os sentidos expostos, a tecnologia reverte para os sentidos como uma proteção, sob a forma da ilusão, assumindo o papel do eu para fornecer um isolamento defensivo. O desenvolvimento da máquina como ferramenta encontra seu correlato no desenvolvimento da máquina como armadura (ver adiante). Decorre daí que o sistema sinestésico não é uma constante na história. Ele amplia seu alcance, e é por meio da tecnologia que ocorre essa ampliação. Ver a discussão de John Czaplicka sobre esse quadro em "Pictures of a City at Work, Berlin, circa 1890-1930: Visual Reflections ou Social Structures and Technology in the Modern Urban Construct", em Charles W. Haxthausen c Heidrun Suhr (orgs.), Culture and Metropolis (Mineápolis: University of Minnesota Press, 1990), p. 12-16. Agradeço ao autor por assinalar a importância do Stimmungsbild para a discussão em pauta. Ibid., p. 15. Ver Benjamin: "O reconhecimento de um aroma J.1 entorpece profundamente o sentido do tempo" (Baudelaire, p. 143). Ver Marshall McLuhan, Understanding Media: The Extensions of Man (Nova York: McGraw-I Iill, 1964), p. 53. Essa especialização da estimulação sensorial provoca um desenvolvimento desigual dos sentidos; nas sociedades industriais, eles sofrem transformações em ritmos diferentes. Theodor Adorno, In Search of Wagner, trad. Rodney I.ivingstone (Londres: NI_B, 1981), p. 100. Adorno frisa que "na civilização burguesa avançada, cada órgão sensorial apreende [...] um mundo diferente" (p. 104). ibid., p. 87, 100. Ibid., p. 85. Ibid., p. 101. "A ideia básica é de totalidade: o Anel tenta, sem maior alvoroço, nada menos do que encapsular o processo mundial como um todo". Ibid., p. 102. " Ibid. "O estilo torna-se a soma de todos os estímulos registrados pela totalidade dos sentidos." 91 Ibid.,
p. 112. "A estética da duplicação substitui o protesto, uma mera amplificação da expressão subjetiva que é anulada por sua própria veemência."
92
Ibid., p. 102-103.
93
Ibid., p. 107.
" Ibid., p. 109. Adorno cita "provas do círculo imediato de Wagner": "Em 23 de março de 1890, ou seja, muito antes da invenção do cinema, Chamberlain escreveu a Cosima sobre a sinfonia Dante, de Liszt, que pode representar aqui toda essa tendência. 'Execute esta sinfonia num salão escurecido, com a orquestra afundada, e exiba ao fundo imagens em movimento — e você verá como todos os Levis e todos os vizinhos frios de hoje, cuja natureza insensível causa tanta dor a um pobre coração, entrarão em êxtase" (p. 107). '5 Ibid., p. 91.
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% A obra wagneriana assemelhava-se "aos bens de consumo do século conheciam ambição maior do que ocultar todos os sinais do trabalho in talvez porque tais vestígios lembrassem às pessoas, com demasiada veemê priação do trabalho alheio, uma injustiça que ainda se podia sentir" (ibid., 97
Ibid., p. 100.
88
Citado em ibid., p. 89. Nesse contexto, podemos compreender o elogio de Baudelaire (contemporâneo de Wagner e Marx), por ele haver conf tamente o choque moderno e ter sido capaz de registrar, em sua poesia, p a sensualidade fragmentada e irritante, até dolorosa, da experiência m um modo que perfurava o véu fantasmagórico. Escreveu Benjamin que estabelecimento da prova de que a poesia [de Baudelaire] transcreve venciados sob o efeito do haxixe não invalida, dc modo algum, esta int (Das PassagenWerk, v. 5, Gesammelte Schriften, org. Rolf Tiedemann, Suhrkamp Verlag, 1992, p. 71). (Sobre os experimentos do próprio Benj haxixe, ver Gesammelte Schriften, v. 6.) Aliás, numa era de entorpccimen como defesa cognitiva, Benjamin alegou que o discernimento da verda riência moderna "raramente [podia] ser obtido em estado de sobriedade".
99
Marx, O capital, v. 1, cap. 15, seção 4.
1°°
Pernick, A Calculas of Suffering, p. 218.
101 Ibid., 102
1"
p. 211.
Até a descoberta da importância da antissepsia, as cirurgias da classe al ticadas em casa, sendo a anestesia administrada com "uma garrafa e (ibid., p. 223).
A Associação Norte-Americana de Medicina foi criada em meados do séc disso, não havia nenhuma regulamentação a respeito de quem estava au praticar cirurgias.
106
Citado em Wangensteen e Wangensteen, The Rise of Surgery, p. 181.
1°'
Citado em Pernick, A Calculas of Suffering, p. 83.
1°6
Citado em ibid., p. 83.
107
Discuto a ligação entre a concepção husserliana e os primórdios do c Anthony Vidicr (org.), Territorial Myths, Princeton: Princeton University Pre
108
Spencer escreveu, em 1851: "É bastante comum compararmos uma nação a nismo vivo. Falamos no 'corpo político', nas funções de suas diversas partes, crescimento e suas doenças, como se ela fosse uma criatura. Mas em geral emp essas expressões como metáforas, mal suspeitando de quão próxima é a a de quão longe ela pode ser levada. No entanto, a sociedade é tão completa ganizada com base no mesmo sistema que o ser individual, que quase pode que há algo mais que uma analogia entre eles" (citado em Robert M. Youn Brazn and Adaptation in the Nineteenth Century, Nova York: Oxford Universi 2a ed., 1990, p. 160).
109
Edmund Husserl, Ideas Pertaining to a Pure Phenomenology and to a Ph logical Philosophy, v. 1, trad. R. Rojcewicz e A. Schuvver (Boston: Kluwer A Publishers, 1989), p. 168.
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Citado em Wangensteen e Wangensteen, The Rise of Surgery, p. 462. Ibid., p. 466. Benjamin, Illuminations, p. 233. Como parte da "profissionalização" da medicina e da despersonalização do paciente, a estatística estabeleceu normas de prática cirúrgica e, ao fim do século XIX, graças a esses conhecimentos estatísticos, as empresas de seguros de saúde tornaram-se uma possibilidade histórica. Elas permitiram que o sofrimento humano fosse calculado: "Quem morre não é importante; trata-se de uma questão da proporção entre os acidentes e as responsabilidades da companhia" (Theodor W. Adorno e Max Horkheimer, Dialectic of Enlightenment, trad. john Cumming, Londres: Verso, 1979, p. 84 [Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos, trad. Cuido A. de Almeida, Rio de Janeiro: J. Zahar Editor, 2" ed., 1986]). Ernst Junge, "Über deu Schmerz" (1932), Samlliche Werke, v. 7: Essays I: Betrachtungen zur Zeit, Stuttgart: Klett-Cotta, 1980, p. 181. Tradução parcial em Christopher Philips (org.), Photography ia the Modera Era (Nova York: The Metropolitan Mu' seum of Art, 1989). Ibid. ° Ibid., p. 182. 87 Em
"O narrador", ele escreveu sobre o empobrecimento da experiência, em função da Primeira Guerra Mundial: "Uma geração que tinha ido à escola num bonde puxado a cavalo viu-se agora sob o céu aberto, numa zona rural em que nada se mantinha inalterado senão as nuvens, e, sob essas nuvens, num campo de força de torrentes e explosões destrutivas, estava o pequenino e frágil corpo humano" (Benjamin, Illuminations, p. 84).
118 Ibid.,
p. 174.
Jünger, p. 184. 12°
Citado em Robert Hughes, The Shock of cite New, Nova York: Alfred A. Knopf, ed. rev., 1991, p. 68.
'21 No
ensaio sobre Baudelaire, Benjamin fala positivamente da montagem cinematográfica como algo que transforma a fragmentação num princípio construtivo.
122
Na verdade, esse trabalho nunca foi publicado. Uma versão diferente, aqui mencionada, foi lançada em 1949.
122
Ver Foster, "Armor Fou", October 57 (primavera de 19911. Esta seção tem urna profunda dívida para com as visões de Foster.
124
The Seminars of Jacques Lacan, Book I: Preud's Papers on Technique, 1953-54, org. Jacques-Alain Miller e trad. John Forrester (Nova York: W. W. Norton & Company, 1988, p. 118 [O Seminário, livro 1, Os escritos técnicos de Freud, versão bras. Betzy Milan, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1979]). David Macey, Lacan in Contexts (Nova York: Verso, 1988), para urna descrição da viagem de Cacau a Marienbad/Berlim.
125 Ver
126
Benjamin, Gesammelte Schriften I, p. 1.039.
127
Citado em Rainer Stoilman, "Fascist Politics as a Total Work of Art", New German Critique 14 (primavera de 1978), p. 47.
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1"
Hitler havia forçado a tal ponto seus órgãos vocais em 1932, que um recomendou que treinasse a voz com Devrient (nascido Paul Stieber-W Hitler fez entre abril e novembro daquele ano, durante sua viagem da eleitoral (ver Werner Maser, Adolf Hitler: Legende Mythos Wirklichkeit, Bechrle Verlag, 1976, p. 294n).
129 Max Picard fala, por experiência direta, da "nulidade" absoluta que era Hitler, "um rosto não de quem lidera, mas de quem precisa ser liderado Hitler in Ourselves, trad. Heinrich Hauscr, Hinsdale, Illinois: Henry Regm pany, 1947, p. 78). '3° Charles Darwin, The Expression of the Emotions in Man and Animais, Konrad Lorenz (Chicago: University of Chicago Press, 1963, p. 291 [A exp emoções no homem e nos animais, trad. Lcon S. Lobo Garcia, 2 reimpr., Si Companhia das Letras, 2000]). 31 Ibid., 132 33
p. 149.
Benjamin, Illuminations, p. 229. Ibid., p. 237.
'34 Benjamin, Baudelaire, p. 111.
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