59 0 29MB
D. JEAN CLANDININ F. MICHAEL CONNELLY
Pesquisa Narrativa Experiência e História em Pesquisa
Qualitativa
EDUFU
UNIVERSIDADE
FEDERAL
DE
UBERLANDIA
REITOR Fernandes Neto Alfredo Júlio VICE-REITOR Darizon Alves
de Andrade
DIRETOR DA EDUFU
Humberto Guido
CONSELHO EDITORIAL
CONSELHEIROS
Alessandro Alves Santana Santos Benvinda Rosalina dos Carlos
Henrique de
Carvalho
Souza Daurea Abadia de
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Editoraçã0
Ivan da Silva Lima
EDUFU itora da Universidade Federal de Uberlândia Av. João Naves de Avila, 2121 - Campus Santa Mônica - Bloco 1S- Térreo Cep 38408-100 Uberlândia - Minas Gerais
Tel: (34) 3239-4293 e-mail: [email protected] www.edufu.ufu.br
D. Jean Clandinin
F. Michael Connelly
Pesquisa Narrativa
Experiencias e História na Pesquisa Qualitativa
Tradução: GPNEP
Grupo de Pesquisa
Narrativa e Educação de Professores
ILEEL/UFU
EDUFU 2011
EDUFU Federal de Lditora da l niversidade
Uberlindia
Editora da Universidade Fed &Edutu - E CopvTight para Lingua Portuguesa proibida a reprodução parcial direitos Ieservados.
Uberlindia MG. Todos os dos editores. total sem ppermissåo
Titulo do original: Narrative Inquiry: experiCice and story i1 qualitative rescarh
2004
Edição em
lingua inglesa publicada por:
Jossey-Bass A Wiley Company 989 Market Street São Francisco, CA 94103-1741
Direitos Autorais John Wiley & Sons, Inc. Jossey-Bass é uma marca registrada da empresa John Wiley & Sons, Inc.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Maria Salete de Freitas Pinheiro CRB6 1262 C587p Clandinin, D. Jean.
Pesquisa narrativa: experincias
e
história
na
pesquisa qualitativa
/D. Jean Clandinin, F. Michael Connelly; tradução: Grupo de Pesquisa Narrativa e Educação de Professores ILEEL/UFU. -
Uberlándia: EDUFU, 2011. 250 p.
Inclui bibliografia e índice. ISBN 978-85-7078-279-3 1.
Pesquisa educacional Metodologia.
2. Pesquisa qualitativa. 3. Narrativa (Retórica) 4. Cièncias sociais Pesquisa. I. Titulo. II. Connelly, F. Michael. -
-
CDU: 37.012.85
ou
Apresentação da tradução A idéia de traduzir esta obra nasceu quando comecei a estudar a
pesquisa narrativa, em 1996, durante meu mestrado. Desde então, persegui essa meta e tentei, por diferentes caminhos, atingir o alvo estabelecido. Inicialmente entrei em contato com os autores, Jean Clandinin e Michael Connelly que, desde essa abordagem inicial, concordaram em contribuir para que essa tradução se tornasse realidade. Depois, tentei reunir amigos da academia para a execução desse trabalho e também conseguir verba para o pagamento dos direitos autorais devidos. Mas, foi em 2005, quando cheguei à Universidade Federal de Uberlândia (UFU), que o sonho de ter
o livro Pesquisa Narrativa traduzido para a língua portuguesa começou de fato a se concretizar. E isso ocorreu devido à existência do Núcleo de Estudos Canadenses (NEC) dessa Universidade. Assim que me tornei professora da UFU, passei a coordenar o NEC
e, ao estudar os programas de incentivo do Governo Canadense, percede bi que seria possível o pagamento dos direitos autorais para tradução obras de autores canadenses. Assim, entrei em contato com os editores e o
2010 conseguimos fechar detentores desses direitos e, finalmente, em e a Wiley Company. Direitos contrato entre a Editora da UFU (EDUFU)
conquistados,
partimos para a execução do trabalho.
Considerando
os
complexidade na tradução de uma obra sobre um envolver to termos de pesquisa qualitativa, resolvi
inovador, em membros do Grupo de Pesquisa
tema tão
dos
a
Narrativa e
Educação de Professores
Foi assim que o livro Pesquisa Narrativa: (GPNEP) nessa delicada tarefa. começou a nascer Experiência e História na Pesquisa Qualitativa Passamos dezessete
meses
trabalhando arduamente. Tínhamos
Pesquisa narrativa 5
ansiedades,
muitas dúvidas,
nada
com vários
orientandos, sempre pensamento
dois
todas contribuição. Em
Vivenciando o
cisoes arriscadas
em
encontroc
melhor
Jean Clandinin
oportunidades,
discutimos
relação
a
alguns
movimentos e
dos
de
o
tros
en co n tr o
e
concei
termos,
tomamos
intraduzibilidade,
desafio da
us
valiosa ajuda
agradecemos a
quais
cou.
traduzir
compreender e
oportunidade
também, a
e
várias deda
termos
pes-
m a n t e r a palavra puzzle em Decidimos, por exemplo, Isso porque a idéia de n o s s a traduçao. m o m e n t o s de em vários encaixam de uma única de peças que se busca a como concebida
narrativa.
inglês, puzzle,
expressa a
forma, não
pesquisa
na
pensada que puzzle
idéia de problematização, narrativa. Os
Após
pesquisa
social, mas busca
e o
um
a
esse
palavra puzzle, o
oposto
interior
que
no
língua portualguns momen-
da
em
de introspectivo, deIsso porque
é simplesmente voltar
achado foram baseados
Travaglia (ILEEL UFU),
estrutura
palavra extrospectivo.
o eu
questio-
situar
orações pareciam
todas as
manter a
narrativa não
olhar para
e
livro
pelo
muita busca para acharmos
cidimos, também, cunhar fora" da
problematização
aquela
considerando-se a
guesa. Então, optamos por tos e em outros no.
autores comentam no
momento vivido sêmica para esse
mas nem
pesquisador narrativo, sentido adequadamente,
questionamento como
Talvez enigma perspectivas de pesquisa.
ótima representação
uma
próprios
não seria simplesmente
outras namento existente em
fosse
de
autores, aos essas
Profa.
com a
dificuldades etc.
tos, forma,
quisa
intuito
narrativo. Tivemos,
com os
presenciais
também
narrativa.
vídeo conferência) coi o
teórico. co-
os presSupostos
Realizamos
e
(e-mail
e aprofundar
para ler
da pesquisa
-metodológicos virtuais
encontros
POr isso, Iniclamos nossa ior.
preocupaçoe..
o
o
"para
olhar para
social. Cabe ressaltar que
em uma
consulta
explicou e apoiou a
ao
prof.
o
essa
Luiz Carlos
necessidade de
criação
desse neo-logismo. Esses foram só alguns dos muitos desafios que vivemos nessa jornada de tradução. Tendo em vista o trabalho em equipe, decidimos respei
tar a re-leitura de cada um envolvido na tradução dos diferentes capítulos do livro. Assim, de certa forma, apresentamos aqui uma (re)leitura da pes
quisa narrativa feita por diferentes e variados olhares. Aguardamos, ago ra, a sua (re)leitura e o seu olhar para que, quem sabe na próxima edição dessa tradução, possamos incorporar as sugestões que certamente serao
enviadas ao nosso GPNEP
6
D.
Jean Clandinin | E. Michael Connely
Bem, como característico na pesquisa narrativa, vivemos umalonga experiênciae compusemos sentido da experiência detradução vivida. Foi um trabalho exaustivo, mas muito apaixonante e gratificante. Estudamos muito, aprendemos muito e construímos uma história de pesquisa narra
tiva em lingua portuguesa. Mas, essa história não está acabada, embora tenha um final provisório. Estamos in the midst (no entremeio ou no entre hugar) daquilo que se faz como pesquisa narrativa no Canadá e do que fazemos como pesquisa narrativa no Brasil. E assim seguimos em frente, atentos ao movimento de inserção desta obra, e dessa perspectiva teórico-
-metodológica de pesquisa, em nossa paisagem acadmica. Dilma Mello (Líder do GPNEP no CNPq)
Pesquisa narrativa 7
-
Agradecimentos
Muitas pessoas viajaram conosco em nossa jornada de experiências
de narrativa, e devemos, o melhor que pudemos, honrar e dar dito para esses companheiros de viagem. Por alguma razão relacionada a
cré
e
tempo, lugar ou circunstâncias acadêmicas, encontramos alguns através de seus escritos. Outros, talvez nem mesmo pesquisadores narrativos, nos deram suporte através de escritas relatadas que nos ajudaram a imaginar possibilidades de pesquisa narrativa. Contamos, também, com alguns pesquisadores em formação de escolas, universidades, faculdades e instituições da área da saúde, que nos permitiram inserção em suas vidas profissionais, durante diversos momentos do desenvolvimento de vários de nossos estudos. Muitos outros viajantes de nossa jornada foram alunos que fizeram nossos cursos e nos ensinaram como ensinar narrativa e como ensinar narrativamente. Outros eram mestrandos e doutorandos, pessoas de diferentes culturas e diferentes nichos sociais e profissionais,
estudando e escrevendo sobre uma infinidade de tópicos, todos concer nentes a uma agenda de pesquisa narrativa. Talvez o mais importante de tudo para o nosso dia-a-dia de pensamento sobre a pesquisa narrativa, tenha sido os nossos alunos de doutorado que participaram de nosso grupo de pesquisa e que uniram seus
trabalhos com os nossos de uma forma que no final era impossível fazer separações e dar o devido crédito a cada momento de autoria e de con-
tribuição. Tentamos ao longo do livro agradecer cada contribuição significativa que esses "outros" nos deram para o desenvolvimento de nossas ideias sobre pesquisa narrativa. Pesquisa narrativa é, sempre, um mergulho de muitas possibili-
dades
e
sucumbir. Para mostrar um pouco desca nmuitos ternminam por ninho das histórias contadas, vividac
complexidade co-compostas mos nos
e
da
qualidade
e eventualmente
no
narradas
em um texto
de pesquisa, tenta.
nossos co-pesquisadores, posicionar ao lado de
nossos
nos poSicionamos e
alunos do
posicionamos
doutorado. Fazendo isso, programa de desses doutorandos e seus lado com as pesquisas nossa pesquisa lado a nós como autorecs Esse grupo de personagens
participantes de pesquisa. desse livro, de
os
pesquisa
mas e
-
membros de formamos
um
enigmas-dirigidos de Como
Pyper, que
nosso
seus participantes grupo de pesquisae texturizado de vidas, histórias, enig-
espaço
pesquisa narrativa.
em nossos outros
livros,
temos um débito de
os cuidadosamente trabalhou com
postas, pareceres
e
gratidão a Garv
mültiplos rascunhos,
revisões, fazendo habilidoso
uso
dos
res-
recursos tecno-
lógicos disponíveis.
D.J.C.
FM.C
Os Os autores D. Jean Clandinin é professora e diretora do Centro de Pesquisa para Educação e Desenvolvimento de Professores, da Universidade de Alberta. Conquistou seu bacharelado em Psicologia e História na Universidade de Alberta, seu mestrado em Educação também nessa universidade e seu dou torado na Universidade de Toronto. Ela é uma experiente professora, orientadora e psicóloga na área de Educaç o.
E autora ou co-autora de muitos
artigos pubicados em revistas académicas tais como Curriculum Inquiry,
Teaching and Teacher Education
e
Cambridge Journal of Education.
Seus
mais recentes livros, publicados com a coautoria de E Michael Connelly pela
Teachers College Press, foram Teahers' Professional Knowledge Landscapes vice(1995) e Shaping a Professional ldentity (1999). Clandinin já foi -presidente da Associação de Pesquisa Educacional Americana (American Educational Research Association - AERA) e foi agraciada com o titulo de
"Desenvolvimento Profissional do ano de 1993, por essa Associação.
F.
Michael
Connelly
estudou
na
de
Universidade
Alberta,
Universidade de Colúmbia e Universidade de Chicago. Concluiu seu Bacharelado e Mestrado em Ciências e seu Bacharelado em Educaçâão Universidade Universidade de Alberta. Seu doutorado foi feito na Desenvolvimento de de Chicago. E professor e diretor do Centro para Instituto Ontário para Estudos em Educação, a Universidade na
Professores, do
de Toronto. Foi
professor de
escola secundária
emn
Alberta
e
lecionou
em
de Alberta, Illinois e Chicago. Coordenou o estudo Ciência lnternacional, é edi sobre Componentes Canadenses da Segunda diretores do Curriculum Inquiry e membro do quadro de outras Universidades
tor da revista
instituto Sociedade
Junto
coma
Cultura. para Estudo sobre Educaçäo e Clandinin, é co-diretor de um estudo longitudinal
John Dewey
professora
Pesquisa narrativa
11
pessoal de protessores sobre conhecimento prático e
de professores. de conhecimento profissional autores
Curiculum do livro Teachers as
inúmeros artigos (1988), além de
Connelly
foi
o
homenageado
e
pela
e sobre as
paisagens
Connelly e Clandinin sãoco
Planners: Narrative
capítulos publicados
of Experience
em outras
Sociedade Canadense para
o
obras,
Estudo
Proeminente Pesquisador recebendo o título de 1987, da Educação, da Associação de Educação Em 1991, recebeu, do Currículo Canadense. área de Pesquisa em Educação sua atuação na Canadense, premiação por Eterno da Divisäo B, pela AERA. de Conquistador e, em 1999, o titulo em
Sumário Prefácio 17
Prólogo 21 Capítulo 1 Por que Narrativa? 29
Introdução 29 John Dewey 30 Mark Johnson and Alasdair Macintyre 31 Novas formas de pensamento: a contribuição da pesquisa 32 Clifford Geertz, after the fact: dois países, quatro décadas, um antropólogo 34 Mary Catherine Bateson, visões periféricas: aprendendo ao longo do caminho 36
Bárbara Czarniawska, narrando a organização: dramas de identidade institucional 39 Robert Coles, a chamada por histórias: ensino e imaginação moral 41 Donald Polkinghorne, conhecimento narrativo e as ciências humanas 45 Trazendo esses autores para a Pesquisa Narrativa 47 Por que a virada para a Narrativa? 48 Começando a pesquisar narrativamente 50 Capítulo 2 Pensando narrativamente
um caso nas fronteiras 53
Introdução 53 A taxonomia de Bloom 54 Trabalhando com o grupo da Taxonomia 57
Respostas
para
uma
revisão narrativa 60
A Pesquisa e a vida nas fronteiras 62 Temporalidade 62 Pessoas 63 Ação 64
Certeza 65
Contexto 65 Resumo 66
Capitulo 3 Pensando narrativamente
-
fronteiras reducionista
formalista 67
e
Introdução 68 As ideias de Schön, Oakeshott e Johnson 68 71 O pensamento narrativo na fronteira formalista da vida na fronteira formalista 73 A
investigação
O lugar da teoria 73 O equilíbrio da teoria 76 Pessoas 77 0 lugar do pesquisador 79 Resumo 80 Capítulo 4 0 que fazem os pesquisadores narrativos? 83 Introdução 84
Termos da Pesquisa Narrativa e espaço da Pesquisa Narrativa 84 Uma história de traballho em um espaço tridimensional de Pesquisa Narrativa com Ming Fang He 86 0 espaço tridimensional da Pesquisa Narrativa 89 Uma história de trabalho em um espaço tridimensional de
Pesquisa Narrativa com Karen Whelan 92 Uma nota reflexiva 96
Capítulo 5 O
pesquisador entrando no campo de pesquisa
caminhando por entre as histórias 99 Introdução 99 Começando no meio do caminho 99 Começando no meio das histórias na escola da Rua Baía 100 Estar
meio do caminho é diferente para cada
no
um
104
Vivendo, contando, recontando e revivendo histórias 107 O que fazemos agora que estamos
no
Negociando relacionamentos 108 Negociando propósitos 110 Negociando transições 111
campo de
pesquisa
108
Negociando um modo de ser útil 112 A
construção da intimidade entre pesquisador e
Vivendo
a
vida
na
paisagem
115
participante 114
Capitulo 6 Do campo para
os
textos de campo estando
no
lugar das histórias 119 Introduçao 119
Apaixonando-se, escorregando para observação fria 120 Relembrando
esboço, deslizando em detalhes Verdade narrativa e relativismo narrativo 125 Virando para dentro, olhando para fora 126 um
123
A ambiguidade do trabalho no espaço tridimensional da pesquisa 129 Capítulo 7
Compondo textos de campo 133 Introdução 133 Compor textos de campo é um processo interpretativo 134 Escrever textos de campo que expressam a relação entre pesquisador e participante 136 Textos de campo em um espaço de Textos de campo entrelaçados 137
pesquisa tridimensional
136
Histórias de professor como texto de campo 139 Escrita autobiográfica como texto de campo 143 Escrita de diários como textos de campo 144 Notas de campo como textos de campo 147 Cartas como textos de campo 149 Conversa como texto de campo 151 Entrevista de pesquisa como texto de campo 153 Histórias de família e histórias das familias como textos de campo 156 Documentos como textos de campo 157 Fotografias, caixa de memória e outros artefatos pessoal-familiar-social como texto de campo 157
Experiência de vida como fonte de textos de campo 158 O que é importante que os pesquisadores saibam sobre os textos de campo? 159 Capítulo 8
Dos textos de campo aos textos de pesquisa Compondo o sentido da experiência 163
Introdução 163 O que fazem os pesquisadores narrativos? 164 Justificativa (por que)? 165 Fenómeno (o quê)? 169 Método (como?) 172 Considerações teóricas 173 Texto de campo
prático
-
considerações
orientadas 175
Considerações analítico-interpretativas 176
Teoria e Literatura 182
Tipo
de
texto
pretendido
183
Capitulo 9
Compondo textos
de
pesquisa
185
Introduçào 185 Experimentando
as tensðes no começo
da escrita 186 187
Escrevendo texto
pesquisa nas fronteiras fornmalista 187 de pesquisa na fironteira 188 de pesquisa na fronteira reducionista
Escrita, memória
e textos
Escrevendo textos de Escrevendo texto
de
pesquisa
Escrevendo textos de pesquisa
em
191
meio às
incertezas
192
Voz 195 Assinatura 195 Audiência 197
Tensoes entre voz, assinatura e público 197 Forma narrativa 199 Forma narativa na tese de Ming Fang He 205 Formas narrativas na dissertação de Rose 208 Procurando a forma narrativa 211 Lendo outras teses e livros narrativos 211 Procurando uma metáfora 212 Percebendo as preferências de leitura 213 Experimentando a forma 214 Mantendo a ideia de trabalho em curso 217 A audiencia e a composição de textos de pesquisa 218
Capítulo 10
Preocupaçôes que persistem em relação à pesquisa narrativa 219 Introdução 219
Etica 220 Etica e anonimato 225
Propriedade e responsabilidades da relação 227 Como somos historiados/narrados 229 como pesquisadores 229
Fato e ficção 230
Riscos, perigos e abusos: "eu, o crítico" 233 Despertabilidade - estado de alerta 236
Referências 239
índice Remissivo 245
Prefácio Este livro, Pesquisa Narrativa: experiência e história em pesquisa
qualitativa, designa-se a levar os leitoresa compreender a abordagem da pesquisa narrativa para o desenvolvimento de pesquisas, o que é issoe como funciona. Acreditamos que as histórias ilustram a importância de aprender e pensar de forma narrativa quando se desenham os problemas de pesquisa, quando se entra no campo de pesquisa e quando se compõe os textos de campo e os textos de pesquisa. Nossa abordagem não é a de dizer a você leitor(a) o que é a pesquisa narrativa definindo-a, mas, sim, criando uma definição a partir da contextualização pelo recontar do que os pesquisadores de narrativa fazem. Os próximos capítulos estão repletos de exemplos historiados que encaminham variados temas concernentes a esse caminho de pesquisa. Começamos com nossas próprias histórias e em seguida incluímos histórias representativas da jornada de outros pes-
quisadores sobre esse caminho de pesquisa narrativa. Para explicar um pouco da jornada que nos leva a pesquisa narrativa, trazemos um breve exemplo, no capítulo um, de algumas influencias em nosso trabalho e discutimos como as experiências de outros pesquisadores têm contribuído para nossa própria visão sobre a pesquisa narrativa. Começamos com John Dewey, a grande infuência de todo nosso trabalho, que acreditava que estudar uma experiência de vida seria a palaVra-chave para a Educação. Examinamos a influência do traballho contemporáneo sobre metáforas incorporadas e unidade narrativa. Discutimos, também, o impacto nas novas formas de pesquisa em outras áreas, tais como, Antropologia, Psicologia, Psicoterapia e Teoria Organizacional, e
como essas áreas têm influenciado nosso trabalho.
Pesquisa narrativa 17
No capitulo so
da pesquisa
vés de
um
dois,
narrativa e o
olhar sobre
as
abordagem
uma
No
Encaminhamos as
perspectivas.
subprocessos
lugar da
como o
uma
dominante, atra-
tivemos em uma
taxonomia
de
Bloom.
abordagem,
mais
Identificamos
ideias,
duas
diferente
área de
inevitavelmente
pesquisadores que
prática
surgem
trabalham em
fronteiras ao pensarmos
conceitos e teorias
experi.
abordagem da
a
diretamente a
equipe de
Nossa
com uma outra a frente
tensões que
narrativos e
pesquisas cionais (formalísticas) e
frente
focalizamos
formuladas com
res
revisar a
narrativa
ponto vantajo-
0
mais tradicional.
tre os pesquisadores rentes
era
se encontra
capítulo três,
profissional.
da
experiència que
tensões geradas quando
pesquisa narrativa,
diferenças entre
ponto vantajoso
uma
tarefa
pesquisacdores cuja ência ilustra
examinamos as
en-
dife-
sobre as
dominantes, tradi
em termos de partes, fatopesquisas formuladas tensões especificas, tais (reducionistas). Exploramos e
teoria
e a natureza
do
papel
das pessoas
em
cada uma
dessas fronteiras.
No
capítulo quatro,
de
narrativa fazem. Nossa
va,
mas
mostrar a
mostrar o que os começamos a
intenção é
pesquisa
narrativa
a
pesquisadores
de não definir pesquisa narrati-
pelo
recontar do que os
interessados
nos termos
da
pesquisa-
pesquisa
dores de narrativa fazem. Estamos narrativa e como eles definem e entrelaçam todo o processo de pesquisa. Discutimos, então, os termos que
usamos
para auxiliar a dar forma
as nos-
sas pesquisas. Aqui, introduzimos à estrutura de nossa pesquisa, o espaço
tridimensional. Também disponibilizamos dois exemplos de nosso próprio trabalho que ilustram como a pesquisa narrativa é vivida na prática. 0 capítulo cinco nos leva para o campo com os pesquisadores. Vemos em primeira mão como uma verdadeira pesquisa narrativa é um processo dinâmico de viver e contar histórias, e reviver e recontar histórias, não somente aquelas que os participantes contam, mas aquelas tam-
bém dos pesquisadores. Também olhamos os desafios específicos com os quais os pesquisadores precisam aprender a negociar através do próprio processo de pesquisa. 0 capítulo seis lida com os desafios associados com a escrita dos textos de campo. Este capítulo discute as dificuldades que os pesquisa-
dores encontram quando eles pensam que esto
perdendo sua objetivi
dade e aponta como os textos de campo podem ajudar a clarificar suas posições. Textos de campo são clareadores da memória e preenchem os espaços de ocorrências esquecidas (experiências extrospectivas) e sen-
18.
D. Jean Clandinin |E.Michael Connely
timentos (experièncias introspectivas). O
podem os
capítulo
ser
sete
criados
descreve
os
pelos pesquisadores
vários aspectos da
tos de
tipos
aos
uma
cuidadoso e sensível em relação
integridade
para
como a
campo que
representar
qualidade
do
dá forma à natureza dos texde textos de campo que são criados.
exploração do aos
textos de
participantes
experiência e participante
campos, assim como Concluimos o capítulo com a
e
de campo. Vemos
relacionamento pesquisador
para
variados tipos de
tipos
como um
posicionamento
de texto de campo é
final do trabalho realizado.
importante
Inicialmente os pesquisadores de narrativa encontram o movimento entre textos de campo para textos de pesquisa como uma das mais dificeis fases de transição de todas as vividas no processo investigativo. O capítulo oito ressalta vários tópicos que precisam ser cuidadosamente
considerados e habilidosamente acenados no "produto" final - o texto de pesquisa. No capitulo nove, continuamos a examinar as complexidades asso-
ciadas com a escrita dos textos de pesquisa. Olhamos como o processo traz o pesquisador de volta para as fronteiras do reducionismo e do formalis-
enfrentadas no início do processo de pesquisa. Exploramos os mentos de dúvida e de insegurança sobre o propósito do texto de
mo
senti pesqui
sa, que quase inevitavelmente retornam ao pesquisador nesse estágio de pesquisa, e de como isso é mais do que provável quando o texto de pesqui sa esta sendo escrito, pois o pesquisador terá refinado ou mesmo modifcado alguns de seus objetivos que pareciam claros no início da pesquisa. O capítulo é concluído com uma discussão sobre as muitas considerações sobre a escolha da melhor forma narrativa para um texto de pesquisa.
Finalmente,
o
capítulo
dez
apresenta questões que devem
ser
en-
caradas com uma base de ir e vir durante o curso da pesquisa, desde o momento em que a ideia da pesquisa é concebida até o texto final de pesquisa ser composto, questões como ética, autoria, anonimato. Fechamos o
capítulo dez discutindo os critérios que para nós são muito significativos para pesquisadores narrativos -a manutenção dadespertabilidade.
Edmonton, Canadá
D. Jean Clandinin
Toronto, Canadá
F. Michael Connelly
Agosto/1999.
Pesquisa narrativa 19
Prólogo Estamos em uma sala de reunião da Universidade das Filipinas. Um ano antes o grupo havia se encontrado no Japão; um ano depois tinha-
mos nos agendado para um encontro em uma região de vinhos da Itália.
Terminamos um ótimo almoço oferecido pela universidade e estávamos ansiosos por uma série de viagens para parte do dia ou para o dia inteiro, em Manilae adjacências. Todos, e certamente Michael, pareciam ter gostado da cozinha local e da chance de explorar novos lugares. Estávamos em Manila durante nossa participação no Segundo Estudo Internacional de Ciências da Associação lnternacional para Avaliação de Realizações Educacionais, um estudo internacional comparativo sobre Educação de, até certo ponto, mais de 40 nações. Isso foi no final dos anos 80. Com o mundo aparentemente aberto e em busca de uma variedade de acordos internacionais, com o mundo quase todo em paz (ou pelo menos não engajado em eventos denominados guerras mundiais), e com um
crescente reconhecimento (ou pelo menos assim parecia para Michael) do
impacto
de
uma
parte do mundo
sobre
dos produtos manufaturados de Alem es
a
outra,
o sucesso
de
marketing
e
e Japoneses, a influência política
americana, o aparente despertar da China e a competição que às vezes vem com esses reconhecimentos, a Educação como é praticada, o que as
escolas aparentam ser, o que as pessoas aprendem em diferentes culturas tinham se tornado tópicos interessantes. Novos relatórios mostravam preocupação com os contínuos sucessos do sistema educacional japonês; outros refletiam sobre o papel da Educação no tão chamado terceiro nundo e países em desenvolvimento.
Pesquisanarrativa 21
Para Michael, alguém educado em um contexto particular, em uma asa no oeste do Canadá, a ideia de Ecducação e seu lugar na vida das pessoas que previamente existiam somente em imaginação, nos Atlas, globos geográficos, jornais e rädios, era lascinante. Visitamos escolas em Manila,
escolas cuidadosamente escolhidas, como ficamos sabendo, por sua disci
plina e rigor. Vimos vidas contrastantes, tais como crianças quue nos vendiam objetos quando nosso carro parou em um cruzamento a caminho das escolas.
Em nossa sala de reunião, nos debruçávamos sobre o trabalho e passaríamos o dia, e duas semanas do evento, questionando sobre os corretos, os mais viáveis caminhos para tabular comparativamente e representar as respostas de múltipla escolha dos alunos para os itens da prova dada em tres niveis da graduação em países participantes dareu nião. Michael pensava em sentimentos doces e irrelevantes à medida que a
reunião ia ocorrendo, suficientemente experiente para saber o que estava
acontecendo, razoavelmente indiferente e de uma forma inarticulada, e ao mesmo tempo contente por estar ali e ter a chance de aprender um pouco sobre vida e Educação em uma outra parte do mundo. O que aconteceu dias
depois
é
quentemente
naquela sala naqueles
dias
e em
outras reuniðes
que frequentemente acontece, pelo menos mais bem fredo que gostaríamos, no campo da pesquisa em
o
Educação. Educação terminavam se tornando gerenciáveis, minúsculas realidades para os pesquisadores; os interesses pessoais dos pesquisadores submergiam em prol da precisão dos dados de uma pesInteresses
públicos
em
quisa.
Educadores estão interessados a
na
aprendizagem e
metáfora de
interessados tes, e
as
em
atitudes
estruturas
no
ensino
saber lidar
diferentes,
e no
em
vidas. Vida,
pegando emprestaJohn Dewey, é Educação. Educadores estão interessados
da
e no como esse
com as
as
como eles
processo ocorre; eles estão
vidas
diferentes, os valores diferen sistemas sociais, as instituições
crenças, estão todos unidos para os
aprender ensinar. Pesquisadores da área de Educação são, primeiro, educadores e estamos também interessados nas Esses pessoas. pesquisadores, com seus interes ses voltados as para
pessoas, não são diferentes nesse sentido que desenvolvem pesquisa na área das ciências sociais. Essas so cias das A vida pessoas. das pessoas e
como
e
daqueles as
ciên-
elas são
éo que nos interessava compostas e vividas observar, participar, pensar sobre, dizer e escrever sobre o fazer e o ir e vir de nossos
colegas, seres humanos. A falação
22
D.Jean Clandinin |E. Michael Connely
na-
quela sala de reunião de Manilla era mortalmente chata. Mas, se nosso interesse como pesquisadores é a experiència vivida, quer dizer, as vidas e como elas såo vividas, de que forma nossas conversas de pesquisa virariam seu foco para a forma de medição das respostas
dos alunos? De que forma a experiência educacional tornou-se algo que poderia ser medido daquele jeito? A medida que fomos entendendo todas aquelas coisas, pessoas e
eventos, percebemos que a redução do estudo da experiência às consi derações sobre questões de medição é parte de um cenário contínuo, um poderoso cenário para a história da Educação, talvez para a pesquisa na årea das cièncias sociais. Aquelas reunióes em Manilla não eram eventos
isolados. Elas eram parte de uma dominante e tradicional narrativa da pesquisa em Educação. Lagemann (1996) aponta algo similar em seus ensaios. "Contestava
Terrais: A História da Pesquisa em Educação nos Estados Unidos, 1890 1990" um ensaio extraído de seu livro em desenvolvimento, A Derrota de John Dewey: Estudando Educação na Pesquisa Universitária 1890-1990.
O título do livro, por si só, já conta como a ideia da experiência (palavra-chave para as noções de Educação de Dewey) tem sido perdida nos estu-
dos e pesquisas sobre Educação. observa que
Lagemann
Educação emergiu
em um
no
início dos
anos
clima de "crescente crença
90,
pesquisa
a
comum nos
em
valores
derivados das generalizações de dados empíricos e um grande desdém sobre o conhecimento de base lógica ou especulativa" (1996, p.5). Os primeiros estudos de perar, para
esse
pesquisa
clima,
a ser
Educação tenderam, como poderia se esinvestigações razoavelmente compreensíveis em
0 que possibilitava esses estudos iiciais eram testes e engenhocas estatísticas que, de acordo com Lagemann, "permitiam que e em
os
forma de
censo.
pesquisadores pudessenm
medir o
sucesso
dos alunos
os custos
e
partir de análises estatisticas comparativas, seriam aparentemente as mais efetivas, dia determinar quais práticas Educação,
assim
planilhas de
se
e
a
custos mais baixas e,
O cenário emergente
na
portanto,
pesquisa
as
em
mais eficientes"
poque
(1996, p.6). no contexto
Educação surgia
números". 0 que
com uma "reveréncia aos pesquisa de ciências sociais, ciéncia social estava como pesquisa em começava a contar
de
levando-nos
Manilla nos discutida na sala de conterència em
pesquisa c o m o aquela idos dos a n o s 80. 0s testes quisa realizada em Manilla
a
da
e mecanismos
possível
e
estatísticos faziam
era um
torte
apelo
para
Pesquisa
aquela as
pes-
agèncias
narrativa
.
23
políticos
governamentais,
vestigação. Experiência torma antes
que
vida
os
tinham
testes
tipo de inser estudadas daquela
engajarem
começado a
nesse
estudos comparativos estupesquisadores de
aprendizagem dos alunos,
dassem a
dos dos
mesmo
e
se e pesquisadores
países
em
de múltipla-escolha. Esse
era o
diferentes,
cenário para
em muitas das pesquisas Educação, cenário para 1900. belecidas nos idos dos anos de a pesquisa Se imaginarmos, como fez Dewey,
pelos resultaa
ciências
pesquisa sociais,
em
esta-
o
periência, qual poderia ser o
cenário para
a
como o
pesquisa em
estudo da
ex-
ciência social? As
humanos e suas relações com os seres ciências sociais estão relacionadas sociais são ambiente. Assim, as ciëncias e com seu meio Com si
próprios
fundadas
com o
ponto inicial e Em
foco
o termo
nosso
experiência. Experiëncia é, portanto, Ciência Social. chave para todas as pesquisas em
no
estudo da
trabalho,
mantemos a
experiència
nesse
o
caminho que
exemperiódicos dos escritos de Dewey (por e Para Dewey, Educação, experiència vida plo, 1916, 1961, 1934, 1938). questiona inextricavelmente inter-relacionadas. Quando alguém
vem
sobre
pelos
e
retornos
estão
em geral, estudar a significa estudar Educação, a resposta é, é o estudo da vida. experiencia. Seguindo Dewey, o estudo em Educação metáforas, e todas as Por exemplo, o estudo das epifanias, rituais, rotinas, sobre a vida, ações do dia-a-dia. Aprendemos sobre Educação pensando Esta atenção voltada e aprendemos sobre a vida pensando em Educação. sobre Educação como experiência é para a experiência e o pensamento
sobre
o
que
parte do
que
os
educadores fazem
nas
escolas.
Ambos trabalhamos como educadores em escolas. Jean trabalhou por
alguns
anos como
orientadora
em
duas escolas de ensino funda
mental, onde passou seus dias ouvindo as crianças, seus pais e seus pro-
fessores contar sobre suas vidas e sobre o que era importante para eles. No meio desses relatos, Jean descobriu sua necessidade de pesquisare partiu para seu mestrado. Sua intenção era fazer algo relacionado ao que
ela vivia em sua prática diária. Porque ela estava "vivendo a vida dela" como uma educadora entre crianças, professores, que também estavam "vivendo suas vidas" na escola. Jean imaginava se seria possível relacionar o viver com o estudo sobre o viver Um problema constante que ela enfrentava era o como trabaIhar com crianças que estavam vivenciando dificuldades de leitura.
Usualmente, esses problemas de "leitura" tornavam-se aparentes para os professores e para os pais por volta dos níveis da escola fundamental, e
24. D. Jean Clandinin | F. Michael
Connely
um sentimento comum expresso era de que quäo bon seria ser capaz de
prever quais crianças viveriam esse problema. Parecia fazer sentido estudar essas experièncias. A questão era como estudar as experiências das Crianças e como conmeçar o trabalho mais intensivamente e antes que as
Crianças começassem a enfrentar o problema da leitura. 0 que ficou aparente foi que a experiência com as crianças precisava ser reduzida para
algo que pudesse ser medido portestes emecanismos estatísticos a fim de se tornar pesquisável. A pesquisa, como se tornou, era um estudo no qual a experiència das crianças era medida por um conhecido teste de inteli
gencia e um inventário de leitura comumente administrado. Certamente, havia uma relação e uma forma de prever aqueles que teriam uma alta
probabilidade de experimentar/vivenciar dificuldades de leitura. Embora Jean tenha estudado aquelas pessoas que viviam nas escolas com ela, tudo parecia muito distante da vida dessas pessoas e de Sua própría vida. As experiências das crianças eram reduzidas a scores ad-
vindos de dois testes, scores que eram correlacionados, e com base nessa
correlação, algo sobre o como aquelas crianças experienciariam a escola se tornava conhecido, compreendido. Para Jean, algo acontecia enquanto lia e relia as correlações estatísticas feitas. Ela conhecia aquelas crianças, sabia algo sobre suas histórias de acordo como as próprias crianças contavam e sabia algo sobre as histórias de seus professores e pais contadas por eles mesmos. Eles eram muito mais do que aqueles scores. Suas vidas eram permeadas por complexidades, esperanças, sonhos, desejos e intenções. Apesar da comunidade científica, com suas reverências aos números com foco nas correlações, Jean pensou sobre as vidas das crianças. Havia uma criança cujo score não funcionava da forma prevista. Ela era uma "aberração" nos testes. Para a pesquisa, ela era uma exceção, fora do nível padrão aceitável. Jean escreveu uma linha sobre o aluno em seu texto de pesquisa. Na vida, na escola, Jean passou muito mais horas tentando entender as complexidades de sua experiência. Ambas as histórias, vividas em tempos diferentes e em diferentes lugares, são embebidas em uma história mais ampla sobre a pesquisa em
Educação. Na primeira história (a de Michael), um pesquisador com inte resses pessoais educacionais e de vida ajuda a desenhar itens e múltipla-
-escolha e estratégias para uma avaliação educacional comparativa. Na outra história (a de Jean), uma professora interessada na vida de seus alunos, vive, durante seus estudos no programa de mestrado, e vÁ a vida das crianças como correlações entre seus testes e scores. Mas, essas histórias
Pesquisanarrativa 25
vão bem além de nossas próprias histórias pessoais de aprender o como traduzir nossos interesses de ensino e de pesquisa em experiências de es.
tratégias para medir
e
gerenciar dentro do campo da certeza, da verdade
e da estimativa de erros. Nossas histórias ressoam por toda a pesquisa
em ciència social. Essa é a fornma como pesquisadores têm sido formados Essa é a forma como os pesquisadores desenvolvem seus trabalhos; Essa é a forma como os professores foram ensinados a pensar sobre o papel da
pesquisa em suas vidas.
Lagemann (1989) escreveu, "Eu tenho frequentemente questionado os alunos, em parte somente para ser perverso, que ninguém pode entender a história da Educação nos Estados Unidos durante o século 20 sem que se perceba que Edward L. Thorndike ganhou e John Dewey perdeu"
(1989, p.185). Thorndike era um psicólogo da Educação que popularizou a ideia de uma ciencia da Educação baseada na observação do comportamento. De acordo com Cuban (1992), ele era uma figura de liderança no pensamento em pesquisa na América do Norte. Doyle (1992) observava que Thorndike proveu a base psicológica para o movimento de eficiência social associado ao Rice e a Taylor em Sociologia, nos negócios e na profissionalização. Vemos a competição entre Deweye Thorndike como uma competição entre duas histórias de como fazer pesquisa em ciência social. O roteiro de história escrita por Thorndike tornou-se pervasivo, tão tomado como certo, como a única história válida, que a chamamos de a
"narrativa dominante" da pesquisa em ciência social. Ao longo da construção de nossas carreiras no campo da pesquisa
em Educação, fomos situados nesse caminho de distanciamento da experiéncia (embora não percebêssemos isso naquela época). Descobrimo-nos quantificando o que nos interessava, e é claro, à medida que quantificávamos a experiència, sua riqueza e expressão eram estripadas fora. No entanto, por quaisquer que sejam as razões, seja pela Educação formal,
apresentada, seja pela forma como cada um de nós levava sua vida, ou seja por outras razões ou combinações de razões, nossos interesses pela
experiencia se manteve vivo. Sabemos que havia pouco em nossos estudos de
psicologla, sociologia, administração
ou
filosofia, campos que
se
pare
ciam muito mais com nossos estudos em Educação, que sustentava nosso
interesse continuo em tentar entender a experiência em nossas vidas e em nossa pesquisa.
Eventualmente, um pouco do que explicamos no capítulo um, a narrativa tornou-se
26
D.
um
caminho para
o
entendimento da experiência. Nossa
Jean Clandinin | F. Michael Connely
excitação e interesse pela narrativa têm sua origem em nosso interesse na
experiència. Tendo a narrativa como nossa posição estratégica, temos um ponto de referëncia, a vida e um chão, uma base de suporte ou para imagl narmos o gue a experiência é e para imaginar como ela pode ser estudada
e representada em textos de pesquisa. Nessa perspectiva, experiëncias são as histórias que as pessoas vivem. As pessoas vivem histórias e no contar dessas histórias se reafirmam. Modificam-se e criam novas histórias. As
histórias vividas e contadas educam a nós mesmos e aos outros, incluindo os jovens e os recém-pesquisadores em suas comunidades (Clandinin;
Connelly, 1994).
Pesquisa narrativa
27
CAPITULO 1
Por que Narrativa?
ponto de partida
osso
tigação
sobre ensino
neste livro
é
própria inves
do professor. Nas últimas três dédiferentes e em diferentes linhas de
conhecimento
e
posicionamos e m lugares nos colocamos histórias da paisagem educacional,
cadas,
nossa
nos
na
posição de
profes
universitários pesquiprofessores educadores, professores têm nossos enigmas de pesquisa sadores em Educação. Nossas questões, e como
sores,
mantido e
seu
aprendem,
ao
tempo)
foco
na
ampla questão
no como a
o como os
indivíduos ensinam
tudo temporalidade (contextualizando
conecta-se com
instituições interferem
sobre
transformação
e
aprendizagem
em
relação
e no como as
em n o s s a s vidas.
Introdução Neste
capítulo,
auxiliaram na
revemos
fornmação de
tiva, começando
algumas das
sobre a nossa visã0
c o m nossa
principal
contemporâneas-o
influéncias
foras corporificadas
e
Examinamos, também,
Traduzido
por:
o o
influências históricas
que
jorada na pesquisa
influencia,
John Dewey.
trabalho de Johnsone
nos
narra-
Discutimos
Lakotf sobre met
narrativa. sobre unidade trabalho de Maclntyre de pesquisa em outros das n o v a s formas
inpacto
NEC-UFU) de Mello (ILEEL, Dilma Marla Pesquisa narrativa
29
na trabalhode Geertz e Bateson
darevisão do camposa partir Coles Polkinghorne na Psicologia,
sobre
as
na
Organizações. Concluímos
conceitual
sobre
o
que
a
pesquisa
capítulo
narrativa
teoria
e Czarniawska na
Psicoterapia
este
Antropologia,
com um
amplo trabalho
é para nós.
John Dewey Nosso trabalho é fortemente influenciado por John Dewey, o pro-
eminente pensador na área de Educação. Dewey conduziu questõöes que vemos como centrais para nosso trabalho e para as quais continuamente
retornamos. Ao longo dos anos, nossos interesses de pesquisa mudaram do tópico alunos e aprendizagem de alunos, como primeiro plano de nosso
interesse, para professores e ensino; paisagem da rotina escolar; ritmos, valores e pessoas; transformações e reformas da escola. No entanto, medida que íamos mudando nosso foco, colocando algumas questöes em
primeiro plano e deixando outras de lado, os escritos de Dewey, sobre a natureza da experiência, continuavam a ser nosso contexto imaginativo e conceitual.
Experiência é um termo chave nessas diversas pesquisas. Para nós, Dewey transforma o termo comum, experiência, de nossa linguagem de educadores, em unm termo de pesquisa e, assim, nos dá um termo que permite um melhor entendimento da vida no campo da Educação. Para Dewey, a experiência é pessoal e social. Tanto o pessoal quanto o social estão sempre presentes. As pessoas são indivíduos e didos como tal, mas eles não ser entendidos
víduos. Eles estão sempre O termo
experiência
ser
enten-
somente como
em um
em
a
meio
a
outras
indi-
contexto social.
ajuda pensar por meio de questões tais individual de crianças quando também nos
aprendizagem aprendizagem ocorre a
podem interaçäão, sempre
em
precisam
como
entendemos que
crianças,
profesor, sala de aula, em uma comunidade e assim por diante. Além disso, Dewey entende um que critério da experiência é a continuidade, nomeadamente, a noção de que a se uma
com um
em
experiência
partir de outras experiéncias e de que experièncias levam a desenvolve outras experi éncias. Onde quer que alguém se posicione nesse continuum o imaginado agora, algo imaginado no passado, ou um imaginado futuro cada a
-
tem uma
experiéncia passada como base e
éncia futura. Esse é,
cada
-
ponto leva
também, um pensamento-chave
30D. Jean Clandinin
| E. Michael Connely
para
ponto
a uma
nossas
experi-
reflexões
sobre Educação porque à nmedida que pensamos sobreo aprendizado de uma criança, sobre a escola, ou sobre uma política em particular, há sempre uma história, que está sempre mudando e sempre encaminhand0-se
para algum outro lugar. Em meio a empecilhos e caminhos práticos de investigação, uma ou outra pesquisa específica pode ter seu foco em um ou
outro
aspecto dessa
todas essas
questöes
ampla
em
teoria da
mente à
experiência. Tentamos abranger
medida que refletíamos sobre
os
enig
mas educacionais e problemas em nosso caminhar investigativo de vida.
Aprendemos a nos mover para trás (retrospectivamente) e para frente
(Prospectivamente) entre o pessoal e o social, simultaneamente pensando sobre o passado, o presente e o futuro, e assim agir em todos os milieus sOciais em expansão.
Mark Johnson and Alasdair Macintyre No início dos anos 80, quando estávamos atentando para o campo de
conhecimento individual de professores, encontramos Mark Johnson, um filósofo cujo trabalho sobre metáforas experienciais e corporificadas atraiu nossa atenção. Naquela época, estávamos tentando entender o papel que as imagens experienciais têm no conhecimento dos professores e sua expres-
são na prática de sala de aula. Na época, tínhamos completado um estudo de três anos com dois professores, Stephanie e Aileen. Conhecíamos esses dois professores, tínhamos passado temp0 em suas classes, conversado com eles e escrito e conversado com e sobre eles. Nosso foco era muito mais tentar
entender o que chamávamos conhecimento prático pessoal. Um de nossos caminhos centrais de entendinmento do conhecimento deles era a pesquisa sobre a natureza de suas imagens sobre ensinar. No entanto, à medida que
escrevíamos sobre as imagens de Stephanie e Aileen, ficávamos particular mente preocupados porque muito do foco analitico sobre o que poderiam ser imagens discretas poderia nos fazer perder o senso holístico de uma
pessoa individual e de seu conhecimento experiencial. Nosso puzzle, noiní cio, parecia o de representação. Foi o nosso interesse pelos caminhos de pensamento sobre o conhecimento experiencial quue nos levou ao trabalho de Mark Johnson e seu colaborador, George Lakoff. O trabalho sobre metá foras de Johnson e Lakoff parecia diretamente conectado ao nosso foco experiencial e relacionado - em nosso pensamento - como trabalho de Dewey
(Lakoff e Johnson, 1980).
Pesquisa narrativa
31
Com um
dia
Em
ou
dois
coversa
mais sobre uma
a
conosco
com
o como
1983).
do hotel, ele
Como
de unidade
noção
narrativa" na unidade essas
breves
narrativa.
tudo
"dizer
personificado, inserido em
(conversa
palaVras escritas
o trabalho
apresentou
passar
pensar sobre
nos desafiou a
hotel local, ele
conhecimento como
vocè vê
nos
em um
Johnson para
ajudar a
nos
para
em Toronto,
Johnson,
cultura, com base
Fevereiro, tas
questoes
essas
convidamos
mente,
em
com
autores, 17 de
em um
bloco de no
de Alasdair Maclntyre
(1981) e
nos deu uma forma de A unidade narrativa sobre o construto geral e informativa
maneira mais detalhada pensar de tornou-se para nós individuos. Continuidade da continuidade na vida dos de ideias e possibilidanarrativa que abriu uma porta uma construção de sobre narrativa e sobre outra literatura nossa atenção para Voltamos des. vida.
alguns
com a conexão autores que trabalhavam
Temos
este trabalho
prosseguido
estrito va com um senso
método de estudo. Vemos
de narrativa
sob
narrativa e
título de
conhecimento o ensino e o
à medida que
entramos na
sobre
em
campo. Essa
terminologia é
narrati-
do professor
como
corporificadas, e pensamos relação de pesquisa com os
criamos textos de camp0 e professores, à medida que é nosso vidas educacionais. (Texto de campo
coletados
pesquisa
fenômeno sob estudo e um
como
histórias sociais e individuais expressos em narrativamente
o
-
discutida
escrevemos
histórias
termo para os dados
no
capítulo sete.).
Novas formas de pensamento: contribuição da pesquisa Olhando para vinte
nós
mesmos, nos anos
ou
iniciais,
mais
anos
como
que
atrás, temos um sentido de frequentemente trabalhando
área. tradições de pesquisa estabelecidas em nossa ficamos Mas, agora, olhando para nossa área, os estudos em Educação, do impactados com o fato de a pesquisa narrativa ter se tornado parte discurso vigente. Pesquisadores em Educação, de diferentes formações, às margens das
afirmam usar narrativa, e muitos, dos que não a utilizam, oferecem suas
críticas. O mesmo ocorre no campo da ciência social. Quando olhamos tex
tos de disciplinas tais como Antropologia, Psicologia e Psiquiatria nos sur preendemos com a mudança que tem ocorrido nessas áreas em relaç o
as
pesquisas semelhantemente reflexivas e suas contribuições para o conhe
32
D.Jean Clandinin | F. Michael Connely
cimento de tenömeno nessas áreas. Clifford Geertz (1995) After the Fact (Após o Fato), Mary Catherine Bateson (1994) Peripheral Visions (Visões
Periféricas), Norman Denzin (1997) Interpretive Ethnography (Etnografia
Interpretativista). Donald Polkinghorne (1988) Narrative Knowing and the Human Sciences
(0 Conhecimento Narativo e as Ciências Sociais), Roy Schafer (1992) Retelling a Life (Recontando uma Vida), Robert Coles (1989) Call of Stories (Chamada para Histórias), e Barbara Czarniawska (1997) Narrativa em Organizações, såo todos ilustrativos dessa nossa sen-
sação de ampliação dos estudos nesse caminho. Apesar de o nosso interesse ser principalmente nas ciências sociais, algo similar parece estar acontecendo na área de humanas. Por exem-
plo, consideremos Donald Spence (1982) Narrative Truth and Historical Method (Narrativa da Verdade e Método Historic), David Carr (1986) Time, Narrative and History (Tempo, Narrativa e História), e Carolyn Heilbrun
(1988) Writing a Woman's Life (Escrevendo a Vida de uma Mulher). Esses autores também olham suas áreas para trazer novos caminhos de se pensar sobre a transformação do fenômeno e da pesquisa. Essas abordagens
relativamente recentes, algumas deliberadamente de formas históricas,
outras mais de forma narrativa ou em formato de anedotas, apresentam um retrato de campos em transição com novas formas de pesquisa em surgimento. Em 1986, Marcus e Fischer escreveram (em seus títulos) que
esse é um "momento experimental" na vida da pesquisa em ciências humanas, uma ideia que ecoou em Denzin e Lincoln (1994), que apresentam o
tempo de pesquisa como "o quinto momento"
(página 11).
Tem sido instrutivo, para nós, ler em outras ciências sociais e na área de humanas na busca de insights sobre essas mudanças de pesquisa e transformação dos fenônmenos, os quais ressoam e informam nossas próprias pesquisas narrativas. Nos propomos a ler esses textos a fim de construir um senso da abordagem desses autores sobre a história de seus campos de pesquisa e sobre o que é isso que eles desejavam apresentar a
seus campos (se houvesse algo) eo porquê. Nas próximas seções, selecionamos certos textos - Geertz e Bateson
na Antroplogia, Polkinghorne em Psicologia, Coles em Psicoterapia e C z a r n i a w s k a n a Teoria Organizacional -
e
analisamos todos atentamente
para tentar formar um retrato do que e do como esses autores vêenn as mudanças ocorridas em suas áreas. A medida que fazemos isso, trazemos insights que podem informar nossas pesquisas narrativasS em estudos sobre Educação.
Pesquisa narrativa
33
Clifford Geertz, after the fact: dois países, quatro
décadas, um antropólogo Na obra
After the Fact,
Geertz
(1995)
reflete sobre
seus
quarenta
ele revisita seu trabalho de pesquisas antropológicas à medida que Indonésia e Marrocos. Ao duas cidades, Pare e Sefrou, em dois países,
anos em
conduzir
sua
pesquisa retrospectiva,
ele comenta:
0 problema é que muito mudou, e muito se desconectou, mais do que qualAs duas cidades muda pudesse imaginar em um primeiro olhar. em outras profundamente. claro, de muitas formas superficialmente,
quer pessoa ram,
também mudou tanto quanto. Assim também como mudaram a disciplina em que o antropólogo trabalha, o panorama intelectual
Mas,
o
antropólogo
no qual essa disciplina existe e as bases morais nas quais se sustenta. Os dois
países
também mudaram assim
como
mudou
o
mundo internacional que os
compreende. Assim também ocorreu com o senso de todos em relação ao que a vida disponibiliza.. Quando tudo muda, do pequeno e imediato para o vas-
to e abstrato - o objeto de estudo, o mundo imediatamente ao seu redor, os alunos, o
mundo a
sua volta e
o
mundo mais amplo a
volta de tudo -
parece
não haver lugar para apoio de forma que se possa localizar o que realmente mudou e de que forma essa mudança ocorreu. (p.1-2)
0 que imediatamente chama nossa atenção nesta citação é o tom
de instabilidade e transformação. Para Geertz, mudança é o indicativo: não somente mudaram as duas cidades, os dois países e o mundo, como mudou o pesquisador. Não somente transformou-se a disciplina, mas também suas bases morais. E não é só a disciplina e suas bases morais,
mas principalmente o que Geertz chama de seu "panorama intelectual" - o que podemos chamar de sua perspectiva, seu ponto de vista ou estrutura substantiva -
que mudou também. Tudo isso parece complicado
para Geertz enquanto pesquisador, pois não mais parece claro para ele em que poderia se basear para tentar entender as transformações ocor
ridas. O lugar do antropólogo nesse mundo em transformação e a possi bilidade de estudo antropológico sobre essa mudança parecem incertos para Geertz. Transformação - transformação no mundo, na pesquisa, no pes
quisador, na perspectiva ou ponto de vista, nos resultados - é o que Geertz percebe em sua reflexão. Isso é o que ele chama de "o problema'"
34.D. Jean Clandinin
| E Michael Conely
Com
esse
problema estabelecido,
que Geertz oferece para
sua investigação? Para começar, ele diz: "0 que podemos construir, se manter as o
notas de campo e sobreviver são os relatos de das coisas que parecem ter acontecido:
aprendizagem das conexðes pedacinhos unidos de testes pa-
drðes, após os fatos... Isso aponta o quão particular os eventos além de únicas, um encontro aqui e um desenvolvimento acolá, tecidos
com uma
variedade de fatos
produzir sentido do
e unma
bateria de
ocasiðes
podem
ser
interpretações para
coisas ocorrem, têm ocorrido
como as
te ocorrerão" (p.2-3).
e
eprovavelmen-
Ao ler essas duas observações de Geertz é possível perceber seu
estado de ambiguidade sobre o que é possível eo que se deve fazer em uma
pesquisa. Ele quer que
antropólogo seja um observador cuidadoso colete uma variedade de textos de que campo na esperança de oferecer re sultados das conexöes das coisas. Mesmo aqui, ao invés de dizer que essas coisas realmente O trabalho dos
o
aconteceram, ele
"que parecem ter acontecido". antropólogos, para Geertz, "ad hoce ad ínterim, é remendar escreve
histórias de milhares de anos com massacres de trés semanas, conflitos internacionais com as ecologias municipais. A economia do arroz ou das azeitonas, a políticas da etnia ou da religião, o trabalho da língua ou da
guerra, devem, de certa forma, serem soldadas em uma construção final. Assim devem fazer a geografia, o mundo dos negócios, a arte e a
tecnolo
gia. O resultado final, inevitavelmente, é insatisfatório, destruidor, instável e
mal formado: Para
grande cilada" (p.20). Geertz, "o antropólogo estuda uma
rantir que tenham
coisas que
ninguém pode gaacontecido; estabelece conexões que pode prover links,
produzir uma história relativamente compreensiva que, longe de ter precisão
teórica, é
uma
grande armadilha'".
Para Geertz, o que quer que seja que o antropólogo produza é, na melhor das hipóteses, algo "destruidor,
instável e mal formado". Como são construídas essas grandes histórias, esses tratados an-
tropológicos? E nesse espaço que a compreensão da pesquisa narrativa é importante. Fotografias, prefácios e apêndices são "muito inadequados", e diz Geertz, "marginalizam o que deveria ser central. O que é preciso, ou de
qualquer forma pode servir, são as cenas, as historietas, as parábolas, os contos: mini-narrativas com o narrador presente nelas" (p.65).
Pesquisa narrativa 35
Mary Catherine Bateson, visões periféricas:
aprendendo ao longo do caminho A vida de Bateson, como antropóloga, se sobrepõe temporariamente a um amplo nível dos estudos de Geertz, e em Visöes Periféricas (1994) a autora assume uma tarefa semelhante àquela de Geertz. Ela também escreve uma reflexäo sobre sua vida como antropóloga. Bateson também
parte para a narrativa como forma de investigação mais apropriada para a Antropologia, e lemos essa autora para construir insights sobre nosso trabalho com pesquisa narrativa, em nossos estudos sobre Educação. 0 foco de Bateson está na aprendizagem e ela cuidado samente acena em seus livros sobre temas como continuidade e improvisação. A autora escreve sobre improvisação como caracterização "mais e mais vidas hoje, vividas na incerteza, repletas de vagas noções de alternativas... A adap-
tação surge do encontro de uma novidade que pode parecer caótica. Ao tentarmos adaptar, talvez seja preciso nos desviar dos valores estimados, comportando-nos de forma que mal vemos, como que atando tudo a partir
de pistas
fragmentadas" (p.8).
Para Bateson, improvisação é uma resposta para as incertezas da vida, novidades que podem até parecer sem sentido, inexplicáveis, "caóticas" Com esse sentido da vida em efervescência, e com a improvisaçäão como uma resposta necessária, como é possível ver a continuidade como de
centrais? Continuidade é possível para Bateson porque aprendizagem é um esforço humano. Não há dúvida de que para Bateson, um
seus temas
como para Geertz, transtormação é uma das características da vida.
Bateson, no entanto, transformação e continuidade são postas juntas pela agência humana. Improvisação e adaptação à mudança permitem que Para
o passado seja conectado e tenha continuidade com o futuro.
Este livro é um livro sobre transformação, transformação que vem com a
aprendizagem.
nuidade é
o
Para
Bateson, aprender é transformar-se. A conti
resultado porque
as
pessoas
zer, elas aprendem.
Está claro que
improvisame adaptanm, quer di-
mundo de Bateson, assim comoo de Gertz, é um mundo de transformação. Mas à medida que eles constroem, para os leito-
res, uma
da
o
ideia do que é
a
transformação, e
pesquisa antropológica,
sua
importância para o campo
fica claro que eles enfatizam muitos aspectos diferentes de transformação. Em ambos os textos de Bateson e Geertz, tudo
est 36
em
transformação
-
o
fenômeno, a disciplina, o agente, os métodos e
D.Jean Clandinin | E. Michael Connely
os
resultados. Enquanto Geertz enfatiza
transformação
transformação do fenômeno, a pelo antropólogo, Bateson enfatizaa participante, às vezes pesquisador, nessa sempre a
do mundo estudado
pessoa, que é às
vezes
impossibilidade
de
separação dos dois. O ponto inicial dessas duas obras destaca formas diferentes de compreensão da transformaçãoe de seu papel na Antropologia. Geertz começa com a transformação em seu espaço de pesquisa antropológica após 40 anos. Ele pondera sobre como descre ver as mudanças ocorridas naqueles espaços. Bateson começa com a filha dela
jardim Persa. A medida que ela conta, vários anos depois, uma história sobre como ensinar a própria filha e como entender esse ensino, Bateson pondera sobre a transformação ocorrida, considerando sua perspectiva de compreensão e a de sua filha, durante a experiência vivida e em seu momento de presente interpretação da época e a de agora. Geertz em um
tem
seu
foco
seu
foco
no
entendimento do mundo em transformação; Bateson tem entendimento do como alguém compreende um mundo em no
transformação.
Geertz considera a transformação ele constrói sua de noção pesquisa nesse
caminho de
como sua
antropológica
pesquisa
sobre
a
palavra-chave e e o
transformação.
assim papel da narrativa Bateson muda sua
palavra-chave para aprendizagem, mas ela também chega à narrativa. Ela diz, "Nossa espécie pensa
(p.11).
Há
um
antropólogo
paralelo, vida
em
metáforas
e
aprende através
de
histórias" vida enquanto um
identidade, entre Bateson, a pesquisa
mesmo uma
geral. na Antropologia adaptação e aprendizagem. Ou seja, ela diz especialmente adequada para um mundo de transformação. Uma sociedade de muitas tradições e culturas pode ser uma escola da vida" (p. 7-8). E a narrativa que permite que Bateson, como antropóloga, possa e aprender sua narrativa também nos permite aprender. Mas o que ela e
em
está encontrando diferença, "uma forma de ser,
Para
quer dizer com narrativas separadas/distantes do aprendizado "através de histórias"? Ela quer dizer muito mais do que aqueles que simplesmente assumem que nos comunicamos uns com os outros através de histórias, e que nossas experièncias são gravadas e transmitidas em formato de história. Para Bateson está claro que os e todos
antropólogos, nós, tivemos também historiada. paisagem Esta perspectiva de pesquisa é uma de perspectiva vida, sobre histórias e seus enredos como um todo, o bom e o ruim, os provocadores da As
vidas historiadas
histórias podem
em uma
"enganar"(p.83), podem
transfornmação.
transformar
e
tornarem-
Pesquisa narrativa 37
se
"mais
complicadas
significado" (p.11) como verdade". (p.84)
com
nenhuma "única
e
"ter mais de um
podem
interpretação que
se
posto, para
estrutura e vivamente narrativo em
usar uma
frase de Geertz, de
narrador presente nelas. Bateson também oferece
uma
lições sobre
série de
como
chamar
mini-narrativas com
ir para
o
trabalho de
forma de pesqui-
uma
pesquisa antropológica, que podemos é a atitude do pesquisador sa narrativa. O mais importante aos seus
participantes,
Essencialmente, zes, conforme uma
apresente
nossa
dizer. Seu livro é
o
ambíguas" (p.83);
em Antropologia posexploração sobre o que a pesquisa do que por seu mais com seu exemplo aprendemos Bateson, para conteúdo. Ele é com-
Em
sa ser
e
os
uma
atitude que irá promover
antropólogos são participantes
Bateson, mais
um
dissonáncia irá atravessar e
que
o
relação
aprendizagem.
observadores, às
outro. A autora
puxá-lo para
a
em
"As
escreve
um envolvimento
ve-
vezes
intenso"
do participante de pes a (p.5); e às vezes irá empurrá-lo para perspectiva de ob-
do pesquisador, o quisa. Para que a aprendizagem ocorra, papel servador ambiguo sempre em deslocamento, é o de encontrar diferenças os
valores,
permitindo que as diferenças desafiem as certezas, às diferenças, e desse ças; é o de improvisar e adaptar-se
e as cren-
modo
aprender
como antropólogo narrativo.
Através da rota, pelo menos da rota conceitual ao texto final, para há di-
investigação, aquilo que o pesquisador tem a dizer no fim de novamente. ferenças entre Geertz e Bateson, mas há semelhanças sua
Para
Bateson, "ambiguidade é a urdidura da vida, nada a ser eliminado" (p.9).
Certeza não é o objetivo. A autora escreve que o antropólogo, assim como
todos, precisa rejeitar a retórica do meramente, a retórica que
trata
o
tri-
vial com o que quer que seja reconhecido como um produto das mentes
humanas em interação" e "aceitar a ambiguidade, permitindo a apren dizagem ao longo do caminho" (p.235). Para Geertz, também, a certeza
não é um objetivo e precisão teórica não é possível. Para ele, o antropólogo cria grandes verdades escorregadias e derrapantes. Para Bateson, o que é escrito, finalmente, é a construção dos agentes de pesquisa: é um "Eu" documento. E um "Eu" que escreve as construções porque essa voz
de autoria se reduz ao que ela denomina de "infinita autoridade: É isto" (p. 75-76) ea resistência a uma "tentação a ser categórico" (p. 75-76). Um antropólogo narrativo também oferece um "Eu", o "Eu" que se desenvolve da ambiguidade, da mudança frente ao relacionamento na obser-
38. D. Jean Clandinin | F.Michael Connely
vação
dos
participantes;
"Eu" que aprende ao ver e contar histórias ao longo processo vivido e que escreve histórias de relacionamentos. Hå uma temporalidade e um situar para a escrita do antropólogo: relações com o "Eu" do pesquisador que implicam polarizações, e o
do
aprendizagens particulares nas quais o pesquisador fora perspectivas capaz de se engajar. Assim, embora Bateson não afirme
qualidade compreensiva, relativizada,
com
todas
as
letras, há
uma
pode imaginar esperar da escrita final do trabalho de um antropólogo. Para Geertz, a construçãão do antropólogo recai na tentativa de conexões entre os eventos observados e as explicações oferecidas. Para
logo
recai
no
"Eu" do agente
e no
incertezas da aprendizagem.
que
se
Bateson,
e
a
tudo que isso
Bárbara Czarniawska, narrando
construção do antropóimplica pela virtude das
a
organização:
dramas de identidade institucional1 Bárbara
Czarniawska,
uma
pesquisadora
do
mundo
das
Organizações, reflete sobre a natureza e intensidade das transformações institucionais visíveis no início dos anos 90. Segundo a autora, "As coisas estavam explodindo de suas nomenclaturas, e palavras cresciam pouco dos
eventos. Tentativas preocupantes de interpretação estavam se multiplican do" (1997, p.1). Como pesquisadora, Czarniawska se vê frente a um vazio
para dar conta dessas transformações usando vocabulário existente, aparatos conceituais e metáforas em relação as teorias da Administração. Em face das mudanças de seu mundo organizacional e da necessidade de uma nova metáfora, a autora se volta, então, para uma pesquisa interdisciplinar e para as disciplinas de Antropologia, Teoria Literária e a escola institucional Sociologia. Diferente de Geertz e Bateson - cuja abordagem é olhar o fe-
nomeno em transformação, para eles mesmos como pesquisadores subme-
tendo-se a mudanças e para a disciplina em transformação como inspiração - A estratégia de Czarniawska é emprestar e misturar metáforas de outras disciplinas. E o que ela toma emprestado e a narrativa. Narrativa está, para Czarniawska, longe de ser inserida na natureza do fenomeno, como ele é
com Geertze Bateson. Para Czarniawska, narrativa é um mecanismo heurís tico, uma metáfora útil para a compreensão das Organizaçðes. Considerando a
n a r r a t i v a como b a s e teórica -
umaestrutura metafórica
Czarniawska a
ou pelo m e n o s como
aplica para
o
estudo do
Pesquisa narrativa
setor
39
público da Suécia. Ao aplicar mento na
de
da adnministração
a narrativa,
pública
-
"Unn
contabilidade em uma cidade
ela cria très histórias de gerencianovo
grande",
e
orçamento
"Reforma de
uma
nova roti.
Impostos"
"Os históe
c o m o títulos de suas de reabilitação'" Com e s s e s ditos, termos narrativos, de cada u m a delas usando rias, ela conduz uma análise paradoxos e interrupçôes, mecanismos de produção de tensões,
programas
tais
como,
Ela
temas: conecta essas histórias aos
pessoal, a comunicação e as séries e computadorização, de descentralizaçöes institucionais, "compani-zação" de processo de ergonografia. Ela denomina toda essa análise narrativa Czarniawska se modifica. Como Geertz e Bateson, a pesquisa de No entanto,
transformação
a
metodologia
-
uma
em sua
pesquisadora
em seu trabalho porque est
pesquisa é guiada pela mudança de
narrativa que
se
engaja diferentemente
usando uma nova metáfora. Para Geertz e
Bateson, a pesquisadora, junto com o
fenômeno, jáestá em transformação
porque está inserida no fenômeno em transformação. Para Czaniawska,
o pesquisador é um tipo de crítico literário, longe, porém, de ser removido do papel de analista dos sistemas, mas também em um papel distinto
daquele de
um
escritor. Um crítico literário
presta atenção à realidade,
e
nesse caso a realidade da vida nas organizações, já que pode estar livre de limitações que um analista teria. Não obstante, Czarniawska diz: "Os pesquisadores em uma
Organização vivem para sempre em um terreno inseguro, trêmulo, tanto que eles se dividem entre os autores organizacionais e os teóricos da academia... Praticantes e consultores estão ocupados escrevendo seus textos e se tornando autores de vários trabalhos. 0 papel dos pesquisadores é in-
terpretar esses textos (embora isso requeira a criação de um outro texto). Eles constroem mundos; nós inspecionamos a construço
(embora isso
requeira a construção de um outro mundo)" (p. 203-204).
O mundo das transformações organizacionais que Czarniawska obseva e o papel modificado do pesquisador agora um pesquisador narrativo) leva a "uma redefinição do que uma pesquisa produz" (p.20).
Czarniawska organiza essa questão em termos de fatos e ficção. Tomando emprestado da Teoria Literária, isso significa que, para a autora, no hà "diferenças claras entre fato e ficção" (p.203). Os documentos produzidos pela narrativa organizacional do pesquisador são parte fato, parte ficção, e
de forma
inseparável.
Por
exemplo,
em sua
história sobre "Um
novo o r
çamento e uma nova rotina em uma Cidade Grande", há um forte senso
de
40
aplicação
D.
à estrutura da
história.
Uma cena é
Jean Clandinin | E. Michael Connely
posta,
um
problemaé
introduzido, personagens são descritos, tensão é introduzida para criar um enredo a ser desenvolvido, e há um tipo de clímax e resolução final. Há um senso diferente do como ela vê os resultados de pesquisa em seu trabalho, no trabalho de Geertz e no de Bateson, para quem as estruturas seriam provisórias, sujeitas a transformação e frouxamente formadas.
Assim, para Czarniawska,
o
trabalho produzido adquire
qualidade ficcio
nal, é mais suave, tem menos bordas ásperas e uma aplicação mais limpa de estruturas narrativas.
Robert Coles, a chamada por histórias: ensino e imaginação moral "A chamada por Histórias" de Robert Coles (1989) é um livro que mistura vida, ensino e a prática da Psiquiatria. Coles diz que essa é uma pesquisa sobre as respostas de estudantes à literatura; um estudo sobre ensino e aprendizagem. Muito semelhante a Bateson e um pouco a Geertz, mas de jeito algum parecido como trabalho de Czarniawska em suas disciplinas, a reflexão continua no trabalho de Coles, que unifica Psiquiatria com vida e ensino. Coles constrói conhecimento sobre a vida - morte, ca-
samento, moralidade - com seus pacientes e seus estudantes. Ele aprende
e ensina as mesmas coisas da Literatura. Vida, ensino e Psiquiatria são todos inter-relacionados como formas de ensino-aprendizagem. Para nossos propósitos, claro, nos mantemos em nosso tema ao pensarmos a
Psiquiatria como uma investigação e os perguntamos como é que Coles chegou à narrativa - uma leitura um tanto quanto unidimensional de um texto multidimensional. Mas, o trabalho de Coles é mais rico do que as
implicações de
nosso
simples questionamento.
Transformação - a força guiadora no raciocínio que leva Geertz, Bateson e Czarniawska a narrativa - não exerce nenlhum notável papel em
"A chamada por Histórias". Um mundo em transformação não
faz sentido
para o autor e nem as teorias e ideias, uma vez bem sucedidas, que parecem se desfazer e carecer de reposiç o.
Neste sentido, a qualidade tem-
circunstancial dos campos de pesquisa, tào evidentes em nossos outros autores, não se apresenta como questão para Coles. Há, sim, um
poral
e
senso moral e persuasivo que a Psiquiatria tem que produzir em harmonia com a vida Porém, uma harmonia a ser contrastada com os procedimentos da Psiquiatria e pela aplicação das teorias da Psiquiatria.
Pesquisanarrativa
41
pela vida nào é algo
e
narrativa
Coles chega à
narrativa
ele, dizagem. Para Czarniawska,
Em
livro,
seu
para
Psiquiatria. Na
cuja tarefa ver
para
ser
aplicada abre
era
ocorreu
que
época, ele
ajudá-lo
a
o
capítulo
durante o
com seus
de categorizações
cobrava sintomas e
Dr: dromes; o outro,
Ludwig,
ouvir, Coles
"Eu
escreve
professor:
um
período
é
uma
toi para
de
história
residencia
Dr. Ludwig
comportamentos
de estudo. de ensino-
de Coles na e
Dr.
Binger
e m termos
de sín-
relação
a esse
Em Coles a ouvir.
impulsionado
'ouvindo a eles
conmo
os
encorajava
estava
e apren-
precisava escreprotocolos que supervisor, Dr. Binger pacientes. Um
refletir sobre
relatar o trabalho
ensino
em um campo
supervisores,
tinha dois
de
descoberto,
a ser
metaforicamente
a história que
-aprendizagem
pelo processo
mesmos
a deixar
paciente que cada
pode ensiná-lo,
por meio de
um bom instrutor as lições que aprenderão os pacientes suas narrativas, de aprender e ansiotorna um aluno desejoso se apenas aprende quando "0 que deve ser ensinou Coles que, Dr. Ludwig ensinado" (p.22). so a ser u m a confirmação ao invés de desenvolver de uma vida
fosse
um
interessante...
que
um
é
o
registro provê
trinta e três
anos
para
após
alguma teoria" (p.22).
acreditava sua residência e
"estava, supervisor de orientação narrativa, as
ordens
menores
revolução que te importam, cujos significados -
tou uma
verdade, lutando por
aquelas cujas palavras
uma
realmen-
são considerados interessantes"
(p22).
no pensatransformação não seja uma força guiadora a narrativa represenleva para a narrativa, Coles acredita que
Assim, embora mento que o
são
na
publicou seu livro seu que Dr. Ludwig,
Coles
a
mudança
revolucionária
na
prática da Psiquiatria.
Considerando
seu campo de estudo, narrativa para Coles não é o resultado da mudança, mas sua origem. O que Coles aprendeu em sua residência, na área da Psiquiatria, foi algo que ele já tinha aprendido com seus pais. A introdução de seu livro
descreve seus pais como contadores de histórias. Não somente havia leitura, mas igualmente importante para a ideia de narrativa, como aplicou na Psiquiatria, foram as discussões em família, que ocorriam em torno das
histórias contadas por seus pais. Sua mäe e seu pai liam um para o outro, discutiam o que tinham lido e discutiam com Coles não somente o que eles haviam
discutido, mas o porquê de terem discutido sobre tal tema. Coles lembra seu pai dizendo "Sua måe e eu nos sentimos salvos esses livros. Nós
por
lemos com
gratificação. Você será grato aos autores um dia" (p. xii). O que Dr. Ludwig ensinou a Coles sobre o como se engajar na pesquisa, na área de Psiquiatria, era uma os
expressão
42 D . Jean
Clandinin | F. Michael Connely
do que ele
já havia
aprendido e
e,
em troca, o com ele descreve seu próprio ensinar e o trabalho com seus
pacientes. O que, em detalhes, é a pesquisa narrativa para Coles? Como Czarniawska, a ideia de Coles sobre narrativa vem, terminologicamente, de fora da literatura. O livro "Chamada por histórias" discute, do início ao fim, as relações entre leitor, autor, texto, paciente e vida. Especificamente,
novamente referindo-se ao Dr. Ludwig, Coles escreve, "Ele me impulsionou a ser um bom ouvinte do jeito especial que uma história requer: observe a forma de apresentação; o desenvolvimento do enredo, os personagens, a adição de uma nova sequência dramática; a ênfase dada a uma imagem ou a outra no recital; e o grau de entusiasmo, de coerência, que o narrador
dá a sua história" (p.23). Da confiança de Coles na literatura para o ensino e para a práti-
ca da Psiquiatria, pode-se razoavelmente imaginar que a teoria literáTia era um importante recurso em seu pensamento sobre narrativa. No
entanto, teóricos literários têm um papel pouco evidente em seu livro. Diferentemente de Czarniawska, que se baseia fortemente nos termos
da teoria literária existente, Coles parece construir sua própria estrutura teórica para a narrativa. Somente porque Coles quer que todos nós aprendamos com a vida, ele aprende sobre narrativa a partir da literatura, literatura que, para ele, parece ter sido originaria das histórias de seus pais e da literatura na área de Medicina, especialmente a de William Carlos Williams. Coles aprende também sobre narrativa a partir das histórias contadas em seu trabalho como psiquiatra e a partir de sua práti-
ca docente. As histórias dos alunos, dos pacientes e as da literatura são os mestres de narrativa para Coles. William Carlos Williams, por exem-
conexões, quando Coles ouve de cuidadosa para o que dizemos. 0 Williams, "Temos que prestar atenção dizem nos leva a pensar sobre o que os fere; e o que os
plo,
tem o crédito
que
algumas
dessas
pacientes
dizemos
tamos
por
informam
pensando,
a
eles
eo
o
que
que pode
esta
acontecendo
conosco
estar errado conosco...Suas nos
carregamos
fazemos, e devemos isso uns aprender a partir delas" (p.30).
aos
Outros; respeitar
-
é
o
que
o
que
histórias,
conosco nessa
que todos
suas, as minhas
-
nossas
es-
as
viagem
histórias
e
intimidade do pesquisador e do paciente que está a estudando juntos e palavra-chave para Coles. Aprendizes protesores estudando juntos seus sobre seus textos, psiquiatras e seus pacientes Assim, é
textos
na
não somente
o
texto do
paciente,
mas,
enfatiza Coles, também
Pesquisa narrativa
43
m e r a m e n t e no interesse do nada disso está ele, Para o do psiquiatra. aprendizagem e contrário, narrativa é vida, método narrativo. Ao n e s s e campo do conhecimento. mera metáfora para avançar Não é ção. a construção da pesquisa narrativa
fic
o
Qual a produção,
na
Psiquiatria?
resultado,
Estamos, claro, de
alguma
forma
território
em um
nossos outros autores.
Coles escreve
do de Coles, comparando com enquanto Bateon, sobre a prática da Psiquiatria como pesquisa, rente
e
intermediários sobre Czarniawska oferecem textos
áreas. Coles não
escreve um
texto sobre
pesquisa
como ser um
dife
Geertz
em suas
psiquiatra-pes-
trabalho do psiquiatra. N o obstante, quisador, entre outros afazeres do nosso propóósito. Além disparalelos são aparentes e importantes para suas próprias construções. Professor so, psiquiatras produzem coisas,
Ludwig novamente tem
mérito de nos contar o que podem ser os re-
sultados e construções psiquiátricas. Conforme Coles: "Eu devo escrever breves biografias dos pacientes ao invés de vir para o consultório com
uma lista das reclamações dos pacientes. Eu também devo fazer uma lista de ' m o m e n t o s clínicos i n t e r e s s a n t e s ' n a s e n t r e v i s t a s -
p o n t o s q u e eu
julgo importantes. Para que propósito? 0 professor não estava específico ou convenientemente certo da resposta; ele simplesmente contou-me que algo ocorre quando encorajamos nosso paciente a contar uma
história ou duas sobre sua vida e 'devemos o relato naquela direção' em bora rapidamente adicione 'não tão rigorosamente ou de um jeito muito
organizado" (p.14). Assim, o texto biográfico é criado, de forma que
como os tex-
tos propostos por Geertz e Bateson, mas diferentemente dos textos propostos por Czarniawska - haja um senso de provisório, de adivinhação
sobre o mesmo. Essas biografias têm a qualidade que Coles se pegou descrevendo, quando chegou a seguinte questão: Como os estudantes respondem à teoria? Pensando inicialmente que os estudantes da Medicina poderiam responder aos textos de uma forma e os da área de
Administração de outra, ele diz ser 'ingênuo e de certa forma absurdo fa-
generalizações" (p.190). Ao invés disso, Coles encontrou "um eston teante número de p0ssibilidades de respostas" e percebeu que "o pont
zer
decisivo é o como a imaginaç o
do professor se engaja com o texto
um
prelúdio, naturalmente, para o engajamento dos alunos" (p.190). Em resumo, essas
inicial
reflexão,
44
biografias, escritas
o "prelúdio" uma
história,
do
como
psiquiatra
uma
produtos,
para
biografia.
D.Jean Clandinin | FE. Michael Connely
engajar
são os
um
tipo de ponto
pacientes
em
ua
Donald Polkinghorne, conhecimento narrativo e as ciências humanas Polkinghorne começa o
livro Conhecimento Narrativo e as
Ciências Humanas com "seu próprio sentimento de inquietude sobre a integração da pesquisa com a prática" (1988, p. ix). Ao refletir sobre seu trabalho como pesquisador na academia e sua prática como psicoterapeuta, ele descobre que a pesquisa em sua área não está em contato com os problemas práticos da área. Como clínico, ele se sente incapaz de fazer uso da pesquisa e, como pesquisador, ele acha que
os problemas sociais não são favoráveis para aplicação da metodolo-
gia de pesquisa da ciência social e de suas descobertas. Polkinghorne nota, por exemplo, que as agências fomentadoras, seguindo um perí-
pesado
odo de investimento
na
área das ciências humanas da Grande
jornada de pesquisa para a vida menores nessa área. Ele nota, prática. E não é que os problemas sejam crescentemente se voltando para a prátias pessoas est o
Sociedade, não apresentam
da
retorno
ainda, que
ca, nas ciências
consultores
nas empresas.
poderia
aprendido
ser
c o m o uma
psicoterapeutas, conselheiros
tornando-se
sociais,
partir
a
observação
Esta
pesquisa poderia
e
Polkinghorne olha de
seus
trabalhos.
por
os
ções se
fissão
Professor
com o
termina sua
esforço
para
prática,
o
argumentos,
em seus
passo
percebe
e
e
que
a
narrativa
é
a
base
o
forma que comportam da
também começou
a
entender porque as pessoas
com a
sobre
com as hisautor, "Eles estão preocupados caso e usam explicatrabalham com estudos de
Segundo
para
que
rapidamente. discutidos, que chegaram à nar-
passo
profissionais
tórias das pessoas: eles narrativas
estágios,
prática,
o
(p. x).
diretamente
narrativa
autores Diferentemente dos outros
rativa lentamente
"olhar para
a
desses profissionais da
ser realizada"
Polkinghorne chega à
levou
o
e
se
comportam" narrativa
prática da Ludwig. Mas,
Polkinghorne
se
forma desenvolver u m a
(p. x).
E
quem trabalham
claro,
que Coles
quando aprendeu
diferente
vira da
com
sua
pro-
de Coles, que começa
prática para a
de pesquisa
teoria
narrativa.
e
em um
Ele sublinha
com que possam trabalhar pesquisa de estratégias ter "a importáncia de entender o mundo humano" (p. u s a m para a s pessoas a s n a r r a t i v a s que c o n s i d e r a v e l m e n t e mais "nossa pesquisa seja que ele quer construir u m c o n s t r u t o xi). No final, com efeito, Ele quer, útil" (p. xi).
bem
sucedida e
teórico,
com a
prática,
que
seja
consistente.
Pesquisa narrativa
45
Ao construir como
Czarniawska
sua
nas
versào de teoria narrativa, Polinghorne, assim
ciências dos
negócios,
toma
emprestado de outras
teoria literária
disciplinas, especificamente da História, descubra Psicologia. Embora Polkinghorne
a
narrativa
a
e certas
formas de
partir de práticas
em Conhecimento narrativo eas bem sucedidas, o volume de seus escritos Ciéncias Humanas é devotado para essas três disciplinas e para a tarefa de
organizar "uma teoria humanas" (p.125). Uma
das
Polkinghorne é
o
narrativa para
possibilidades
a
prática
das
disciplinas
interessantes
da construção de
uma
no
na
área de
trabalho
de de
teoria sobre narrativa ou, tal-
da prática narrativa, baseada no que os profissionais fazem. 0 esboço de tal pesquisa pode ser visto no livro de Coles, no
vez, uma teoria
ele aprende sobre narrativa com as histórias de seus pacientes e de seus alunos. Do mesmo modo, o cuidadoso estudo de práticas nar-
qual
rativas bem sucedidas de profissionais em interação com seus clientes seriam, pode se imaginar, uma avenida produtiva para a construção das ideias sobre narrativa. Para Polkinghorne, a pesquisa narrativa pode ser de dois tipos descritiva e explicativa. Em geral, essas duas formas de pesquisa usam os mesmos tipos de dados narrativos, coletados por meios tais como entre-
vistas e análise de documentos. Na narrativa descritiva, o propósito é produzir uma descrição apurada das interpretações de narrativas individuais ou de grupos que costumam fazer sequências de eventos em suas vidas ou
organizações significativas" (p. 161-162). Na narrativa explicativa, o interesse está em fazer conexões entre os eventos, em termos de efeito-causa, para prover uma necessária história narrativa que supra as conexões feitas.
Embora tenha sugestöes
acredita que
a
especificas sobre
essas
linhas, Polkinghorne
pesquisa narrativa é pesquisa que "ainda está
em seu
es
tágio inicial. Isso porque inclui dimensão temporal em sua estrutura de
organizaço
e
é muito diferente da
organização formal
que
põe
os
em categorias" (p.184). 0 autor finaliza
plo
em seu
ser. 0
sua
obra
livro) comentando
leitor é, então, deixado
brevemente, (e não dá nenhum
como o
texto de
'fatos exem-
pesquisa narrativa pode
imaginar se a pesquisa narrativa, para Polkinghorne, cria documentos pessoais, provisórios e descompassados como visto nos trabalhos de Bateson e Geertz, ou se podem ter uma qualidade literária mais
polida
a
de
documentos e de pesquisa, trabalho de Czarniawska.
mos ser
produzido
46
Jean Clandinin | E. Michael Connely
D.
no
o
que imagina
Trazendo esses autores para a
Pesquisa Narrativa Cada
un
desses cinco autores levaram
a narrativa para seus trabahos. Ao fazer isso, ofereceram-nos, como pesquisadores narrativos, novas
dimensöes a serem consideradas. Geertz, em sua retrospectiva, olha para a Antropologia, e para seu lugar nesses quarenta anos, e oferece uma metáfora, a da Parada, que é o seu jeito de capturar a transformação ocorrida no todo no período analisa-
do. Geertz nos lembra que era impossível olhar para um evento ou um certo
olhar o evento ou período aninhado no todo de metafórica. Ele introduz o provisório em nosso pensamento,
periodo
sem
sua
Parada
como
pes-
quisadores narrativos, em pelo menos duas formas. A primeira, o senso de provisório relata a forma em que alguém se posiciona na Parada. Sabemos o que sabemos por causa do lugar que nos posicionamos na Parada. Se
mudarmos de
posição
Parada,
conhecimento muda. O segundo é o senso de que o provisório acontece, diz Geertz, porque se a Parada se na
nosso
transforma, nossos lugares relativos nela também mudam. 0 que sabíamos em um determinado ponto no tempo muda quando a Parada muda
temporalmente para um outro ponto no tempo. Bateson também nos oferece o provisório, mas para ela esse provisório está relacionado ao que nós como pesquisadores podemos escrever sobre as pessoas e sobre os eventos. O que escrevemos é sempre provisório, sempre aberto a revisão. Bateson, mais explicitamente que Geertz, oferece aos pesquisadores uma conexões com a vida. Nessa conexão comn a
vida
e a
pesquisa, ela enfatiza os aspectos relacionais. Com efeito, ela nos
oferece a noção de que para fazer uma boa pesquisa é necessário ser um bom ser human0. Assim como Bateson, Coles nos oferece, como pesquisadores, um crer na
vida,
e nos
encoraja a ouviro
nosso
ensinar, além das histórias
que
nós e aqueles que ensinamos contam.
Czarniawska e Polkinghorne
nos
oferecem
a
possibilidade de
pegar
emprestadas teorias, metáforas, e termos de outras disciplinas conno forma
de construir
pontes entre
Tomando-os
pesquisa e a prática. autores nos oferecem, como pesquisado-
nossa
juntos, esses
narrativos, a possibilidade de conceitos disciplinares, caseiros e nativos (Geertz, Bateson, Coles) e adaptações de outras disciplinas (Czarniawska,
res
Polkinghorne).
Pesquisa narrativa. 47
um
a
Em
Prólogo,
nosso
a Narrativa?
virada para
Por que
e
nos
estado do que foi da narrativa que
nosso
próprio
capitulo, teintamos dar levou a nos virar para ela em
abrimos este
quando
trabalho. Devemos dizer que
se entendemos o
mundo de
estudá-lo de forma narfazemos, então faz sentido nós e para os outros é preenrativa. Para nós, a vida como ela é para em momentos históricos de chida de fragmentos narrativos, decretados termos de unidades narrati e refletidos e entendidos em
forma narrativa,
como
-
-
tempo
espaço,
e
vas e descontinuidades. Abrimos este livro recordando que estávamos nos focalizando para
tentar entender a experiência. Vimos nosso problema de pesquisa como uma tentativa de pensar sobre continuidade e o todo de uma experiência de vida individual. Este problema de pesquisa em nossos estudos sobre Educação eventualmente nos trouxe a narrativa. Então, começamos a re-
fletir sobre o todo das ciências sociais com suas preocupações sobre a experiência humana. Para cientistas sociais, e consequentemente par nós,
experiência é uma palavra-chave. Educação e estudos em Educação são formas de experiéncia. Para nós, narrativa é o melhor modo de representar e entender a experiência. Experiência é o que estudamos, e estudamos a experiência de forma narrativa porque o pensamento narrativo é uma
forma-chave de experiência e um modo-chave de escrever e pensar sobre ela. Cabe dizer que o método narrativo é uma parte ou aspecto do fenomeno
narrativo. Assim, dizemos que
método narrativo é
o
o
fenômeno
e
também o método das ciências sociais. Essa não foi,
entanto, a razão que nos trouxe para a narrativa. Não começamos com uma visäão de experiència da narrativa. Lutamos por anos com os mais modos intuitivos de compreender a vida nas salas de aula, a vida nas escolas e a vida em outras paisagens educacionais. Como a observação dos participantes de Bateson, a narrativa se desenvolveu entre nós como um caminho para representaro que nós, e nossos no
participantes pesquisa, víamos como relacionamento humano saudável e produtivo. Trabalhos teóricos como os de Maclntyre, com sua noção de unidade narrativa, tiveram um de
experiéncia mos no
efeito cascata para
e ao
fazé-lo, estender
a
corrente momento.
Ao
nós, porque podíamos denominar
pesquisa
que
játínhamos ao
que
lermos Geertz, Bateson,
te
Czarniawska, Coles, Polkinghorne outros, reconhecemos que muito de nosso tatear próprio
48
D.
Jean Clandinin | E. Michael
Connely
na
direção
e
da
narrativa
de
várias formas peito pelo fenómen0 em toda sua ocorre
em
outras áreas. Geertz
com seu
res
complexidade, dáum senso de ter sido
inexoravelmente empurrado para sua versão narrativa de uma antropologia ad hoc e ad ínterim. Bateson e Coles, mais que Geertz em "Apos o Fato, Iutam para construir entendimentos em suas áreas que façam sentido da vida de forma mais geral. Eles também parecem estar dizendo
"experiência primeiro
narrativa porque precisamos." Czarniawska Polkinghorne têm, mais que os outros, um senso de um oportunismo metodológico. Eles parecem dizer que a vida e a narrativa estão liga das porque essa conexão parece funcionar. Eles também entendem que a narrativa traz a experiència para suas áreas, mas para eles parece mais após do que antes do fato. As organizações de Czarniawska, quando ree
e
presentadas nos textos de pesquisa são povoadas, embora nós, como leitores, sejamos deixados a imaginar o quanto é a experiência de vida e quanto é construção literária: Quanto sã0 as pessoas e seus lugares trazidos para os textos de pesquisa? Quanto são eles expressões fictícias ou formas literárias?
Embora não pensássemos frequentemente sobre a narrativa nas pesquisas em ciências sociais, da qual nós éramos parte no momento em que começamos nossa pesquisa, esta tornou-se importante para nós, ao tentarmos posicionar nosso trabalho eo trabalho dos outros autores. É de certa forma curioso, pelo menos do ponto de vista de uma perspectiva que assume que ciênciae seus métodos são objetivos e despersonaliza-
dos, refletir sobre o tom moral não somente de nosso próprio argumen to mas também dos argumentos dos demais cinco autores. Nenhum dos cinco meramente descreve sua versão de narrativa, mas ao invés disso, eles dizem (ou pelo menos fortemente implicam) que as coisas deveriam ser feitas narrativamente. Em nosso caso, dissemos que a narrativa
tradicional social de pesquisa, da qual nós éramos parte, era relutante a
experiência e não (inferimos) favorável. Geertz, Coles, e Bateson argumentam naturalisticamente sobre a linha que "esta é a forma que o mundo é, e assimé como deve ser pensada. Nosso argumento parece igual ao
deles. Experiência acontece narrativamente. Pesquisa narrativa é uma
forma de experiência narrativa. Portanto, experiência educacional deve ria ser estudada narrativamente. Czarniawska e Polkinghorne parecem mais utilitários em seus argumentos, embora entre os dois, Czarniawska
é muito mais, quando ela argumenta pela narrativa como mnetáfora lite rária para a ciência da Administração. 0 livro de Polkinghorne é cons-
Pesquisa narrativa
49
público
ria da psicologia pensavame
de
faziam.
No
base
na
ao
vira,
tivesse
naturalístico
argumento
no
que
ele não fica contrário,
temporal. Mas,
também
ela é experienciada
ciada
continuum em um
embebidas
para
ter sido
construçaão
as pessoas, as
as
uma narrativa
as
verdade
da teoriaa como
primeira abordagem, mais
termo-chave
claro, que
uma
que experiëncias
para nós é
a
experiência é
tomadas
coletiva-
as vidas
institucionais,
descobrimos n o s s a s
próprias vidas
vidas das
mais
pessoas,
ampla da pesquisa
escolas, as paisagens
metidas dia-a-dia
ten0-
com a vida entanto, preocupados estamos, no é ao0 ser experiencomo a vida e agora, m a s
como coisas. Exatamente
de
na
i d e i a s importadas,
aqui -
uma
desenvolvido.
um
entendemos,
entendemos
são temporais. Não
vidas das
com a
continuado s u a
poderia
Parcialmente
como
as
os profissionais
mencionado
temporalidade.
mente
que
poderia
que ele
anteriormente,
Como
narrati.
trabalhavam
base
entanto,
e se
notando que
desenvolver
acreditasse
narrativa com
prática Czarniwska. Se ele
com
fez
ele
comece
ele
psicoterapeutas
pelos
estava atraído
embora vamente, e
similar,
modelo
um
truido usando
enbora
educacionais
experiências que são
que
nas ciências estudamos
sociais;
são sub-
contextualizadas e m uma narra-
de dizer agora 0 que podemos ser capazes prazo. tiva histórica, sentido construído em escola ou outros é um sobre uma pessoa ou uma muda com o passar do mais amplo e esse sentido termos de um contexto como tudo que estudaconhecimento de ciência social é, Nosso tempo. escrevem Coles, Czarniawska, e Polkinghorne mos, algo "em passagem. sentimento de e nos deixam mais com o um pouco sobre temporalidade a partir de u m a narrativa é simplesmente que o que é dito e aprendido Certanmente, é este isso. Geertz provê o senso mais forte de temporalidade. em
o seu
longo
termo-chave.
mundo de Mudança ao longo do tempo é uma marca do
Geertz e para ele é essa mudança temporal que é a característica principal
da antropologia.
Começando a pesquisar narrativamente Neste primeiro capítulo, tentamos enfatizar o porquê e de que formas alguns autores, em suas disciplinas - Antropologia, Psicologia e
Administração, chegaram à narrativa. Recordamos nossa própria historia sobre como chegamos à narrativa e tentamos responder a questão para nós mesnos: Por que narrativa?
50
D.
Jean Clandinin | E. Michael Connely
Como rante tem
resultado de
tais
jå passados vinte tornado tão integral
os
se
influências,
aos
de
nosso
discutidas aqui,
como as
trabalho,
a
pesquisa
e
du-
narrativa
em nosso
trabalho que não podemos imaginar sermos pesquisadores de outra forma. Este é um ponto central para nós. Nossa intenção é chegar a "definição" de pesquisa narrativa calmamentee
vagarosamente, neste volume, através do "fazer e
apontar" ao invés de "falar sobre" o que pesquisadores narrativos fazem. Mas, por enquanto, aqui estão algumas características que compõem um conceito de trabalho: pesquisa narrativa é uma forma de E um de compreender a experiência.
tipo
colaboração entre pesquisador e participantes, ao longo de um tempo, em um lugar ou série de lugares, e em interação com milieus. Um entra nessa
matriz
no
durante
pesquisador
e
progride no
mesmo
espírito, concluindo a
pesquisa ainda no meio do viver e do contar, do reviver e recontar, as histórias de
experiências que
perspectivas:
individual
e
compuseram
social.
as
vidas das pessoas,
Simplesmente estabelecido,
em
ambas
como
escre
vemos no prólogo, pesquisa narrativa são histórias vividas e contadas.
No
próximo capitulo, começam0S nossa exploração sobre o apren der a pensar narrativamente. Os capítulos subsequentes examinam o processo narrativo no campo, as complexidades do processo de escrita e os
desafios contínuos que os pesquisadores narrativos enfrentam a cada passo desse caminho.
Pesquisanarrativa 5 1
CAPÍTUL0 2
Pensando
narrativamente um caso nas fronteiras
o
capítulo anterior, exploramos
que nos levou, e levou outros pesquisadores, à pesquisa narrativa como forma de entender a exo
periencia.
Introdução Neste capítulo, começamos a explorar lugares específicos em que
o pensamento sobre pesquisa narrativa chega ao território intelectual de uma outra forma de pensamento. Chamamos esses lugares de fronteiras, e ilustramos "a vida nas fronteiras" através de uma experiência da nossa própria vida. Os dois critérios de experiência de Dewey, continuidade e interação, provêem uma estrutura teórica para identificar as tensões nessas fronteiras. As tensões pertencentes à continuidade, trazidas pe-
las experiências descritas, neste capítulo, såo temporalidade, pessoas ação e certeza. As tensões pertencentes à interação são contexto, pessoas, açães e certeza.
Traduzido por: Dilma Maria de Mello (LEEL, NEC- UFU)
Pesquisa narrativa 5 3
A taxonomia de Bloom Dez anos após a reunião de Manila, na Universidade das Filipinas
um convite, para participar de outro projeto de avaliação relatado, havia chegado. Dessa vez, o convite era para nos juntarmos a um grupo de tra-
balho para a revisão do que é comumente conhecido, em estudos sobre
Educação, como Taxonomia de Bloom (Bloom, 1956). A Taxonomia pode ser razoavelmente considerada como uma conquista amplamente bem sucedida na narrativa dominante da pesquisa em Educação, à qual fazemos
alusão em nosso prólogo; que é a narrativa da pesquisa de Lagemann associada com a luta entre Thorndike e Dewey para a concepção do que seja pesquisa em Educação.
Para recapitular, Thorndike era um psicólogo de orientação quantitativa que popularizou a ideia de uma ciência educacional baseada na
observaçã0 e representação numérica do comportamento. Quando essa forma de olhar os estudos na área de Educação tornou-se "o caminho", passou a ser o que chamamos de narrativa dominante, uma forma inques
tionável de ver as coisas. Bloom, trabalhando com a ideia de Thorndike,
desenvolveu bre
uma
taxonomia de
objetivos educacionais construídos so
comportamentos classificáveis
observáveis. Mais tarde, Bloom, com figura central ao fundar a Associação
e
Taxonomia à mão, tornou-se a Internacional para a Avaliação do Progresso Educacional, uma organização que conduzia estudos comparativos sobre avaliação e que havia levado Michael para um estudo internacional sobre aprendizagem, na ciência da Educação, e eventualmente para o encontro de Manilla. O convite da década seguinte era para nos juntarmos ao grupo cujo propósito era melhorar e modernizar essa Taxonomia. sua
A natureza
status da
e o
Livro Anual de 1994 da O autor escreve:
Taxonomia são capturados no prefácio do Sociedade Nacional para os Estudos em
Educação.
Discutivelmente,
uma
metade
passado, é a Taxonomia de Objetivos Educacionais, A Objetivos Educacionais, Manual 1: domínio cognitivo.
das
monografias
Classificação
de
Aproximadamente quarenta anos após me se
mantém
como
referéncia
avaliação, desenvolvimento sores.
54
em
do século
Uma
pesquisa
de
sua
Educação,
mais
publicação
em
influentes
1956,
o
volu
padrão para discussoes sobre testes currículo, ensino e Educaçào de
do mais recente
D.Jean Clandinin | E. Michael Connely
da
protes
e
Indice de Citaçòes da Ciència Socia
(1992) revelou mais de 150 citações desse manual. Em
te de
uma
aproximadamente duzentos administradores e
reunião recen
professores, o editor sênior desse volume um show provocou de mãos levantadas em resposta à sua pergunta, "Quantos de vocês já ouviram falar da Taxonomia de Bloom?" Realmente todas as pessoas presentes levantaram suas mãos. Poucas blicações na área de Educação alcançaram um reconhecimento tão endente por tanto
tempo. (Anderson e Sosniak, 1994, p. vii)
Mesmo assim ficamos
çoes, e
antes de
tamento sobre
a
embarcar
pu
surpre
impressionados com a contagem desas cita-
nessa
tarefa, conduzimos
extensão do
nosso
próprio
levan-
uso da Taxonomiae descobrimos que livros didáticos gerais (geral em oposição a especifico por disciplina) para professores pré-serviço e livros didáticos gerais para currículo eram, como
reportamos, "carregados" de referências e explicações sobre a Taxonomia de Bloom. De forma interessante e obscura, para o novo grupo de pesquisadores, a Taxonomia era pouco citada em manuais de pesquisas sobre ensino
em
Educaço,
mais recentes
(Wittrock, 1986), Educação
de pro-
fessores (Houston, 1990) e currículo (Jackson, 1992). Concluímos, as-
sim, que as esperanças teóricas de Bloom para a Taxonomia não tinham se realizado. Ele esperava que a Taxonomia fosse a base para a teoria do
comportamento (Bloom, 1956). No entanto, somente sua presença para as aplicações práticas na formação de professores e objetivos da escola pareciam ter sido realizadas. Porque a Taxonomia parecia fazer diferença na
prática, se
não
na
teoria
também, da Educação, pensamos que poderí
amos fazer a diferença participando naquela revisão e nos propusemos a
compor aquele grupo. A Taxonomia é composta de seis níveis de comportamento cogni-
tivo conhecimento, compreensão, aplicação, análise, sintese e avaliação. Conhecimento, por exemplo, é definido como "aqueles comportamentos e situações de teste que enfatizam a memória, seja por reconhecimento
ou relembrança, de ideias, materiais ou fenômenos". (Anderson e Sosniak 1994, p. 18). Síntese, para ilustrar um pouco mais, é definida como "a união de elementos e partes de modo a formar um todo" (p. 23). As categorias são hierarquicamente organizadas do simples para o complexo,
e cada categoria sendo submetida àquela acima dela. As categorias são vistas como "naturais", inerentes na ordem das coisas, daí então, a origem do termo taxonomia e de sua justificativa para o uso de um referente de
taxonomia biológica (Bloom, 1956).
Pesquisa narrativa
. 55
Interpretamos o convite recebido para modernizar a Taxonomia como um convite para introduzir o pensamento narrativo na Taxonomia
e, consequentemente, para inserir uma forma particular de olhar os obie. tivos educacionais adotados pela Taxonomia. Mas, logo nos pegamos re
pensando outras questões. Predominantes entre elas, aquela experiència anterior de usar a Taxonomia para estudar os progressos da ciência culturalmente transposta. Em dado momento, até nos percebemos tomando aquela tarefa como valorosa. Víamos aquela oportunidade como um desafio para repensar as categorias da Taxonomia e seus possíveis usos (como o uso era parte do exercício) em termos de narrativa. Imaginávamos, inicialmente, que nossa tarefa fosse simples. Para nós, a narrativa é central para nosso
entendimento da experiência e deveria, consequentemente, ser central paradocumentos comoa Taxonomia. Vemos os individuos vivendo vidas historiadas, em paisagens historiadas. Compreender a vida e a experiência narrativamente é a nossa pesquisa e nosso projeto de vida. Assim, ao
receber o convite, víamos nossa tarefa como a de uma oferta de dar conta do comportamento e dos objetivos quando eles fossem conceituados nar-
rativamente. Quando começamos, estávamos vagamente cientes de fazer algo diferente, mas foi somente quando estávamos realizando a tarefa que
come
çamos a perceber que estávamos no meio de uma tempestade - um lugar onde a narrativa dominante de pesquisa, em uma das expressões educacionais mais bem sucedidas - que dizer, na construção de um set universal
de
objetivos educacionais encontram um jeito alternativo de pensamento investigativo. Aquele era um local onde a narrativa dominante se confrontava com o pensamento narrativo. Como uma expressão da narrativa -
dominante, a Taxonomia de Bloom é mais que mera aplicação; ela é central para
tudo, não
somente via suas
conexões a Bloom e também por seu pensamento dominante na Educação. Recontamos nossa história de envolvimento com o da
Thorndike,
mas
grupo de revisão
Taxonomia, para prover um senso do contexto em que o pensamento narrativo inevitavelmente, nesse de estágio desenvolvimento das ciências sociais, ocorre. Polanyi (1958), ao falar sobre as estruturas de referência para o conhecimento pessoal, usou o termo "dwelling in" para apontar a
necessidade de
um
lugar intelectual seguro para desenvolver o pensa geral é ecoada, de diversas formas, em toda a
mento coerente. Sua ideia
literatura sobre métodos
56
Kuhn
(1970).
D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
por
exemplo,
com sua
ideia ae
paradigmas e mudanças de paradigmas; Dewey (1916, 1961, 1922), com sua ideia de fazer coisas por hábito ou fazer coisas de forma reflexiva;
Schwab (1960), com sua distinção entre pesquisa fluida e estável. Uma pessoa, trabalhando em um paradigma, por hábito, ou em uma estrutura de pesquisa estável, procede, em geral, sem a necessidade de considerar estruturas
alternativas de referéncia que podem gerar abordagens de pes
quisa diferentes.
Mas a pesquisa narrativa não está confortavelmente assentada,
empoleirada como se estivesse entre uma onda de debates e publicações sobre
os novos
"pós-modernos"
caminhos de
pesquisa,
como
represen-
tantes do mundo das ciências sociais. Certamente, dessa vez, se a pesquisa
narrativa é
paradigmática (ou pelo menos se encaixa em
um
paradigma),
é um paradigma marcado pelos desafios das pesquisas e representação de suposições já aceitas. Schwab (1960) escreveu que, quando as pres-
suposições, hipóteses e estruturas tomadas como certas abrem caminho para questões, dúvidas, incertezas, uma considerável quantidade de viagens em um atrativo fazer de olhos vendados é esperada. Estudantes de
narrativa-especialmente alunos de pós-graduação que frenquentemente aprendem sua prática de pesquisa em comunidades de estudos que dão suporte e conforto a eles - rapidamente aprendem a se defendereaargu-
mentar seus trabalhos em termos de fora da estrutura de suas narrativas de referência. Este aprendizado de pensar narrativamente nas fronteiras entre a narrativa e outras formas de pesquisa é, talvez, a única e mais importante car
cterística do pensamento narrativo bem sucedido.
Trabalhando como grupo da Taxonomia Nós não tivemos problemas em adotar uma linguagem comportamental. Afinal de contas, a Narrativa está relacionada ao(s) fazer(es) e ao andamento desse(s) fazer(es), mas de alguma forma como as alterações efetuadas pelo uso ou remoção de lentes estereoscópicas, o observador observa. O que é o compensamento narrativo altera o que o portamento em uma perspectiva narrativa? Um pesquisador Thorndike na
narrativa dominante ao usar a palavra comportamento quer dizer, e talvez
veja, algo diferente do que veria
um
pesquisador que pensa
narrativamente.
Esta foi nossa prinmeira, ou talvez mais imediata, pergunta ao pensarmos no
convite recebido. 0 que entendemos por comportamento? 0 que entende-
Pesquisa narrativa
. 57
mos por cada nível de comportamento? O que deve ser visto? E visto nOr
gravado? E como tudo deve ser interpretado? Víamos nossas respostas para cada uma dessas perguntas na persdeve ser
quem? O que
pectiva da narrativa. Comportamento, por exemplo, seriam as expressões
das histórias individuais em um contexto particular e em um determinado momento. Porque comportamentos são expressões narrativas, é impor tante considerar os personagens que vivem as histórias; os personagens
que contam essas histórias; o momento em que cada história é vivida; o tempo em que foram ou são contadas; o local no qual as histórias são vividas e contadas; e assim por diante. Ao trabalharmos com a revisão de nossa narrativa em relação aos nossos objetivos especificos (objetivos elaborados por membros do
grupo), lutávamos para não sermos pegos pelos tentáculos da narrativa
dominante que
rodeava
todo momento. Esses
tentáculos pareciam expressos naquele jeito de pensar sobre comportamento quer dizer, pensar em uma linguagem dos objetivos, pensar em termos de comportanos
a
ser
mento
-
observável, pensar numericamente, pensar
perspectiva efeito pensar de forma generalizada como se tivéssemos a perspectiva dos olhos de Deus, uma de uma perspectiva verdade n0 aqui e no agora. Nossa briga para escapar desses tentáculos são e
na
causa,
serem
enfrentados todos
conflitos que acreditamos
os
dias por
dantes de Narrativa.
pesquisadores narrativos e
por
estu-
Ao
trabalharmos em nossa tarefa de levar o pensamento narrativo para a revisão da Taxonomia de Bloom, começamos a pensar sobre objetivos como uma ferramenta na Educação. Como introdução para nossa seção proposta em Curriculo, Instrução e Objetivos, escrevemos: Leitores e usuários deste Manual podem, e certamente irão, relevância dos objetivos para seu trabalho com o currículo e
suas
aulas/escolas.
de
Assim
como tantas outras
formas diferentes para diferentes pessoas, em diferentes contextos. Consideremos a como
o
torno
ou uma serra.
questionara instruções em
ferramentas, em
analogia
Um torno é uma
ferente para diferentes pessoas, contextos. Um torno é útil
em
eles são úteis
momentos diferentes, como uma
ferramenta
momentos diferentes
e
ferranmenta,
útil de forma d-
diferentes serralheiros comerciais, para aqueles que têm um hobby, para a indústria de para serralheiros, para professores, para alunos, entre outros;ferramentas, nas fábricas, em escola, entre outros locais. pequenas lojas, 1a para
58D. Jean
Clandinin | E. Michael Connely
e em
Ao pensarmos na metáfora de um torno como uma ferramenta,
atentávamos para a necessidade de estabelecer um ponto em comum entre nós e nossos leitores. Percebemos que as ideias centrais da narrativa - en-
redo, personagem, cena, lugar, tempo, ponto de vista, entre outros, poderia criar dissonancia para muitos leitores. Nossos primeiros leitores foram
outros membros do grupo de revisão da Taxonomia, os quais, em grande parte, vinham de uma não tradição de pesquisa narrativa. Escolhemos a imagem de um torno porque seria como um ponto de vista livre comoima
ginávamos.
Estávamos tentando estabelecer vários elementos importan tes do pensamento narrativo de forma que pudéssemos todos aceita-los sem a interferência de polarizações de diferentes tradições de pesquisa. A imagem do torno nos deu a possibilidade de ilustrar a noção de que uma
ferramenta poderia ser usada por pessoas diferentes, em diferentes momentos, em diferentes contextos, todos em uma noção fundamentalmente narrativa. Esperávamos que "o torno" nos desse um chão comum para nós mesmos e para nossos leitores, como já dito. Precisávamos desse chão comum porque sentíamos o quão diferente a nossa forma de pensar narrativamente sobre a Taxonomia estava distante do que os demais membros do grupo pensavam. Estávamos tentando encontrar uma forma de explicar o pensamento narrativo. Elaboramos a metáfora ao longo de várias páginas, atentando para vários usos que cada indivíduo poderia dar a um torno, considerando di-
ferentes momentos e diferentes contextos. Por exemplo, em relação ao contexto escrevemos: "além disso, o contexto em que unm torno e a loja
existem faz uma grande diferença de como esse objeto pode ser vistoe utilizado. 0 raciocínio em relação a localização de um torno em uma escola
irá se diferenciar da forma como uma comunidade aborígine isoladao utiliza, comparando com ricas áreas urbanas, ou como cenário de um centro urbano. Não somente as razões de uso se diferenciam nesses contextos
diversos, como mudam também o tipo de criança, os professores, o que se faz com o torno se modifica. Contexto faz toda a diferença" No pensamento narrativo, o contexto faz diferença. Considerando
o
quanto
o contexto
faz diferença
em
relação
ao uso
da ferramenta
no
contexto curricular, assumimos que poderiamos Criar uma compreensão
Ao
no
compartilhada com nossos leitores. tivo, percebíamos que pontos em geral poderiam usar ou
o
pensamento
ecoar
narra-
para outros edu-
cadores. No início, não parecia tão dificil. A metáfora funcionava para nós e acreditávamos que tínhamos estabelecido uma ponte com a narrativa
Pesquisa narrativa
. 59
dominante ou,
pondo de
forma mais prosaica,
a ser criada. a nova taxonomia
uma
ponte
entre a
antiga
e
e
maioria das respostas
era resposta do grupo. A de aceitação e apoio. Mas, ao lermos transmitida no meio de uma paráfrase das respostas, com suas críti a linha, ponto por ponto em detalhes linha
Começanmos
ter
a
Por vezes, questionamos nosso
sugestões, nos sentimos esmagados. estávamos propondo. Tinhamos enpróprio senso em relação aquilo que ou adequadamente? Os tentendido a tarefa? Tínhamos a cumprido bem cas e
pensamento narrativo era de alguma forma ainda menos do que algo aceitável; era algo fraco, suave
táculoscomeçavamanosfazer sentir que
nosso
e estéril; algo sem rigor, precisão e certeza. Poderíamos dar um senso do que foi esse nosso sentimento, trazendo alguns excertos das respostas que
recebemos, mas ainda assim reconhecemos que o senso de insegurança que experienciamos com aquela armadilha parece difícil de ser capturado.
Respostas para uma revisão
narrativa
Um de nossos parágrafos centrais sobre o qual recebemos respos tas era o seguinte: "Reconhecendo que objetivos, como as ferramentas mais amplamente usadas para nos movermos entre expectativas e fins em vista, propomos destacar uma estrutura para pensarmos sobre objetivos como usados por pessoas diferentes, em diferentes momentos, em diferentes contextos. Começamos a explorar o uso dos objetivos considerando os fatores que influenciam seu uso". Com isso, queríamos ilustrar que uma revisão narrativa da Taxonomia iria requerer um senso de movimento no tempo, partindo das expectativas para o alvo a ser atingido. Os objetivos, ao invés de funciona rem como dados preestabelecidos, poderiam servir como uma ferramenta de uso flexível em momentos diferentes. Mais tarde, no artigo escrito, usamos a noção de narrativa para construir uma estrutura de forma a mos trar que objetivos diferem em relação ao momento em que são pensados
(pré-atividades, durante o realizar de atividades e pós-realização delas). Além disso, introduzimos a ideia de que para um desses momentos, ain da há que se considerar a mudança de contextos (contexto rural, urbano
e em
grandes centros),
a
mudança
de
personagens (o editor, o governo, administradores de escolas, professores e avaliadores). já que usariam os objetivos de formas diferenciadas. Consequentemente, dependendo do
60
D.Jean Clandinin |
F. Michael
Connely
momento, do contexto
dos personagens envolvidos, a narrativa na qual os objetivos poderiam ou iriam se encaixar seria diferente. A resposta do grupo foi que tudo era meramente um problema de clareza. Nosso respondente disse que se nós especificássemos "níveis de
objetivos",
o
problema
e
estaria resolvido.
Assinm, considerando que pensávamos que haveria diferentes objetivos para a mesma intenção e que do dependeria momento, do contexto e dos personagens envolvidos, noS so respondente traduziu a questão em termos de hierarquia de objetivos. Para
nosso
respondente, "expectativas"
constituem
um
nível mais alto;
objetivos seriam um nível médio, útil para guiar o currículo. E, ao fundo, estariam os objetivos específicos para tarefas particulares de classe. Nessa
re-interpretação, o respondente removeu a temporalidade e a colocou como
hierarquia independente, de diferentes tipos,
de tempo.
Igualmente
significante, na formação do respondente, contexto é também deslocado, e a aplicação dessa hierarquia seria vista como contextualmente universal. Assim, da noção de aplicação de objetivos para um momento, contexto e
personagens específicos, nosso respondente reformulou a noção de forma a ter um tempo e um contexto universal.
Em outro parágrafo explicativo, escrevemos: "a noção de Dewey
(1938) de 'situação' e 'experiència' torna possível imaginar o professor não somente como um elaborador de currículo, mas como parte dele, além de tornar possível imaginar um lugar para o contexto, para a cultura (a noção de Dewey sobre interação) e temporalidade (passado e futuro de acordo com a noção de continuidade de Dewey). Nessa perspectiva fins e meios, currículo e instrução são tão interligados que desenhar um currículo para professores implementarem com propósitos instrucionais pare
cia irreal, algo como se a carroça estivesse na frente dos bois" Na seção em que esse parágrafo aparecia, estávamos tentando mostrar que a justificativa para cada conjunto particular de objetivos é dada pelo contexto curricular: A releváncia dessa noção é vista em contraste à noção de curriculo definido em termos da narrativa domi-
nante, na qual os professores implementam programas curriculares de forma a atingirem objetivos pré-determinados e para atingirem deter-
minados resultados. Nessa visão, a avaliação do resultado do comportamento do aluno é a medida do sucesso do ensino. Em nossa capitu-
ideia, de que meios e fins podem ser facilmente separados, é danificada. A noção linear de que
lação da narrativa, queríamos objetivos
e
sucesso
mostrar que
seriam medidas
a
pelos professores
e
pelo currícu-
Pesquisanarrativa
61
questao. De acordo o m uma construcão narrativa, o professor não é meramente uma variável filtrável ou m lo estava narrativamente
em
fator a ser considerado como impedimento ou um catalisador para o sucesso dos objetiv0s. Ao contrario, o professor é parte do currículo e consequentemente parte do estabelecimento de objetivos em primeiro lugar e, por conseguinte, também parte do sucesso. Essa noção nar-
rativa de currículo foi central para atentarmos para a introdução do pensamento narrativo na Taxonomia. De certa forma com humor (humor por causa do peso das ponderações que demos para esses pensamentos sobre curriculo), a resposta oi de que a nossa seção estava mais ou menos curta e poderia ir para
uma nota de rodapé. Nosso respondente disse que a seção expressava uma referência abstrusa do interesse somente de poucos leitores, em especial aqueles versados em textos acadêmicos.
A Pesquisa e a vida nas fronteiras Nosso trabalho com ogrupo de revisão da Taxonomia nos levou para inexoráveis fronteiras entre pensamento nos moldes da pesquisa narrativa e o pensamento nos moldes da narrativa dominante. De cada lado dessa
fronteira, um parecia estar se comunicando com os demais do outro lado Pessoas que estão fora do foco; não capazes de falar claramente; e que rendem ideias, pensamentos e sugestões que de alguma forma perdem o ponto de vista. Fomos subjugados por nossos tratamentos dos objetivos.
Achamos que eles foram intransigentes e fechados para mudanças, embora eles, com o peso das opiniõies ao lado deles, provavelmente nos viram como
esotéricos
e
não
engajados
nenhum compromisso. Mas, o que é essa fronteira entre o pensamento narrativo e o pensamento nos termos com
da narrativa dominante que faz a comunicação tão difícil? Nosso trabalho com o grupo de revisão da Taxonomia expõe algumas dessas questões. Iremos a elas agora.
Temporalidade A
da
tensão mais aparente de
Taxonomia centrou-se
na
nosso
trabalho
temporalidade.
62D.Jean Clandinin | E. Michael Connely
No
com o
grupo de revisao
pensamento narrativo,
a
temporalidade é uma questão central. Temos como certo
coisas
tempo éa forma de pensar sobre elas. Quando to, pensamos sobre ele não como algo que aconteceu mas
no
sim
como uma
expressão
de
algo acontecendo um
as
vemos um even-
naquele
Qualquer evento, ou coisa, tem um passado, aparece para nós, e um futuro implicito. Do
que localizar
momento,
longo do tempo. presente, da forma como ao
ponto de vista da narrativa dominante, pelo
menos em nossa
experiencia com o grupo de revisão da Taxonomia, eventos e coisas sao
caracterizadas
em
si mesmas. Elas são
entidades como sendo atemporais. Nossos respondentes percebiam que havia algo em nossa questao sobre a temporalidade, mas preferiram reestruturar isso em termos de níveis de hierarquia de objetivos e assim removeram a noçã0 de tempo. Essa tensão entre ver as coisas no tempo versus vê-las como elas são tornou-se
uma
questão
fronteiras de qualquer lugar que nos virássemos. Havia tensão, também, sobre a noção de diferentes usos
de
objetivos em
momentos
nas
pré-instrucionais, instrucionais e pós-
instrucionais; havia tensão sobre nosso conceito de currículo, com a ideia de que a narrativa de experiência dos professores daria forma ao currículo, havia tensão sobre as histórias narrativas de alunos e professores e o como essas histórias poderiam influenciar a interpretação dos escores obtidos.
Pessoas Uma outra tensão próxima relacionada tinha a ver com pessoas,
ambos, alunos e professores, uma tensão conectada com a de temporali dade. Dávamos por certo que as pessoas, em qualquer ponto no tempo, es-
tão em processo de mudança pessoal e do ponto de vista da Educação, parece importante ser capaz de narrar uma pessoa em termos de processo. S a b e r d e a l g u m a s d a s histórias de Educação de uma criança -
p o r exemplo
- as lições recentemente ensinadas, assim como as maiores histórias nar-
rativas de cada criança quando ela muda do que era, para o que é, e para o que vai
ser no
futuro
-
é central para
o
pensamento educacional narrativo.
Assumimos que o currículo, a formulação de objetos e a medição do suces so
da aprendizagem irão dar suporte
a essas
histórias narrativas sobre
quais pensamos. Em contraste,
a
narrativa dominante
(pelo
menos neste
Pesquisa narrativa
as
caso)
63
levou nossos respondentes para a construção de pessoas essencial.
mente livre de noçðes. Para nuitos do grupo de revisão, um objetiv especificado em determinado nível de pensamento e um certo nivel de
conteúdo para uma certa idade ou série escolar teria que ser universal mente aplicado. As histórias pessoais de cada um seriam irrelevantes e
impossíveis de serem consideradas por aquele grupo.
Ação Uma terceira tensão centraliza-se na forma como uma ação foi
compreendida. Conforme o pensamento narrativo, uma ação é vista como um símbolo narrativo. Em nosso caso, entendemos que ações curriculares são interpretadas como expressões da sala de aula das
histórias narradas por alunos e professores. Por exemplo, o desem penho de uma criança de um certo nível sobre um teste avaliativo é narrativa que simboliza algo. E necessário fazer uma interpretação narrativa daquele sinal antes que o sentido possa ser relacionado uma
a
ela. Sem
compreender a história narrativa da criança, a importância significado daquele desempenho, o símbolo, permanece desconhe-
ou
cido. O progresso dos alunos ou ao
prova não diz muito ao avaliador narrativa da história de aprendizagem do
professor até
em uma
que a aluno é trazida para dar suporte
aquele desempenho. Por exemplo, um desempenho particular pode representar a rota de aplicação de um al goritmo, a aplicação de um conjunto de dicas para a solução de certos
problemas, ou o desempenho de alto nível cognitivo. Em contraste, do ponto de vista da narrativa dominante (em nos sa
experiéência com o
grupo de revisão da Taxonomia), o desempenho do aluno sobre uma avaliação é tomado como uma evidência direta do nível cognitivo obtido pelo aluno: quando mais o
daquele desempenho,
maior
o
nível
Assim, para o grupo da taxonomia, cia
direta. Há
desempenho
uma e
ação é tomada como uma evidnequação relacionando ação e significado, relacionando
nível
cognitivo.
No
caminho interpretativo entre mos de histórias narrativas. um
64
complexo comportamento cognitivo dos objetivos alcançados.
a
uma
pensamento narrativo, ação
D.Jean Clandinin | F. Michael Connely
e o
no
entanto,
a
significado mapeado em ter
Certeza Uma quarta tensão centraliza-se
na
certeza. No
tivo, as interpretações dos eventos Há um senso de provisório, teza, sobre
do aluno
o
na
pensamento narra
podem ter sempre um outro sentido. geralmente expresso como um tipo de incer significado de um evento. Por exemplo, ao medir o progresso discussão sobre
ação,
posto acima, nós mostramos como um desempenho poderia ser interpretado em três diferentes mno dos. Cada interpretação precisaria ser considerada como uma possibilidade provisória. Assim, a atitude em uma perspectiva narrativa é a de fazer o melhor, considerando as circunstâncias, consciente de que há outras a
como
possibilidades, outras interpretações e outros modos de explicar as coisas. Um pesquisador narrativo cria, conforme posto por Geertz, uma com-
preensão de ensino e aprendizagem que é uma construção "instável e mal formada"
(1995, p. 20).
Do ponto de vista de nossa experiência com a narrativa dominante sobre a revisão do grupo, causalidade, com sua subsequente certeza, é a marca
central. No
exemplo acima, sobre o desempenho
de um aluno rela cionado a um teste avaliativo, a equação entre desempenho e nível cognitivo é tida como uma causalidade assumida. Pensando sobre um dado nível cognitivo, causa um determinado desempenho na prova realizada. Esta
relação dá aos professores, aos avaliadores e outros, certos conhecimentos sobre o desempenho do aluno, e como implicação, certo conhecimento sobre o sucesso do currículoe do ensino.
Contexto Uma quinta tensão centraliza-se no contexto. No pensamento nar
rativo, o contexto está sempre presente. Isso inclui noções tais como contexto temporal, espacial e contexto de outras pessoas. O contexto é necessário para dar sentido a qualquer pessoa, evento ou coisa. Por exemplo, de alguma forma nós introduzimos o contexto que em nossa revisão da Taxonomia foi feito pelo uso de uma distinção entre o dentro da sala de
aulae o fora da sala de aula, na paisagem da escola. Essa contextualização nos permitiu mostrar que os objetivos podem ter um papel diferente para as pessoas em uma sala de aula e em um cenårio de ensino do que teria, para pessoas fora da sala de aula,
em outros
cenários.
Pesquisa narrativa 65
Do ponto de vista de nossa experi ncia
com a narrativa dominante.
no grupo da revisåo, o contexto foi assumido pelos outros membros como sendo qualquer lugar. Foi assumido que todos nós temos um só contexto No entanto, embora o contexto tivesse sido reconhecido, os membros do grupo da Taxonomia consideraram um contexto geral. Uma coisa impor-
tante, para aquele grupo, era criar uma Taxonomia que pudesse ser apli-
cada em todos os contextos. Por exemplo, assumir em suas implicações, o nivel cognitivo, pelo qual os alunos tiveram seu desempenho, era de suma
importáncia. As circunstáncias contextuais não foram consideradas im portantes. Na narrativa dominante, mais geralmente, o contexto pode ser
analisado em variáveis e medidas de certeza relacionadas a importância de vários fatores contextuais. Por exemplo, as correlações podem ser estabelecidas entre o desempenho e a variável status socioeconómico. Na narrativa dominante, o caso universal é de grande interesse. No pensamento narrativo, a pessoa em contexto é o que interessa.
Resumo Ao explorarmos os pontos principais das tensões nas fronteiras entre a narrativa dominante e o pensamento narrativo, fomos lembrados
que uma base teórica para identificação das tensões nessas fronteiras vem
de dois critérios sobre
experiência, de Dewey: continuidade
e
inte
ração. Questões sobre continuidade, no trabalho com o grupo da revisäo da Taxonomia, levaram às tensões relacionadas à temporalidade, pessoas, ação e certeza. Questões sobre interação levaram às tensões relacionadas ao contexto, pessoas, ação e certeza. Para Dewey, os dois critérios são in-
separáveis, e ao pensarmos nas fronteiras por meio das tensões, vemos as mesmas não como uma lista de fatores independentes, mas sim como
interconectadas. No próximo capítulo, começamos a explorar outra fronteira entre o
pensamento narrativo e outras formas de pesquisa. Lidamos com o tema sob o amplo título: da fronteira entre o pensamento narrativo e o formalismo.
66
D.
Jean Clandinin |
E Michael
Connely
CAPÍTULO 3
-Pensando narrativamentefronteiras reducionista e formalista
o capítulo dois, compusemos um relato narrativo da nossa experiência de trabalho nas fronteiras, definindo-as com base nas perspectivas de se pensar narrativamente e de se pensar conforme a narrativa dominante. Nosso foco principal até o momento tem recaído, na maior parte do tempo, sob as tensões entre a pesquisa narrativa
ea narrativa dominante. No capítulo dois, porém, fomos e voltamos no que concerne às concepções de narrativa, como pesquisa e como prática profissional, e pesquisa e prática profissional de acordo com a nar-
rativa dominante. Nosso exemplo, de modo geral, realiza-se do ponto de vista da prática profissional. Como expusemos anteriormente, justificamos a participação no grupo de revisão da Taxonomia devido ao fato da Taxonomia ser amplamente utilizada na prática profissional da
Educação.2
Traduzido por: Ana Carolina de Laurentis Brandão (UNEMAT) e por Cássia
Regina Migliorança. Escrevemos sobre
esse
tópico
no
CambridgeJournal ofEducation (1990) e
no
Handhook of Qualitative Research (1994). Pesquisa narrativa 6 7
Introdução da pratica profissiotocar mais diretamente na questäo nal à medida que iniciamos este capítulo, pois quando olhamos para o sig.
Queremos
nificado das fronteiras, do ponto de vista dessa prática e das suas relações com a teoria, a narrativa dominante adquire um foco mais nítido. O capítulo aborda as tensões criadas quando o pensamento nar-
rativo e a experiência de vida como objeto de pesquisa deparam-se
com fronteiras teóricas, reducionista e formalista, principalmente em relação à última. Lançando mão do nosso próprio trabalho como ponto
de referência, identificaremos e discutiremos quatro tensões vivencia das por nós na fronteira entre a pesquisa narrativa e a pesquisa forma lista
o lugar da teoria, o equilíbrio da teoria, as pessoas e o lugar do
pesquisador.
As ideias de Schön, 0akeshott e Johnson Usamos os trabalhos de Shön (1983, 1987,1991) para iniciar nos sa exploração. Schön criou um outro sentido de fronteira gerado pela narrativa dominante para pensar a prática profissional. Racionalismo técnico é o nome dado por Schön ao que chamamos de narrativa dominante. Schön, caso tivesse escrito sobre as fronteiras, teria definido
fronteira como algo que se encontra entre o racionalismo técnico e a reflexão na ação. Ele escreve "Uma vez que colocamos de lado o modelo do
Racionalismo Técnico,
qual
leva a conceber prática inteligente como aplicação do conhecimento em decisões instrumentais, não há
nada de estanho à
com a
o
nos
ideia de que
um
ação inteligente" (1983, p. 50). Para Schön, esse conhecimento
conduz
a uma
epistemologia
é
da
tipo de conhecimento é inerente o
conhecimento
na
ação,
e
isto
o
prática com base na noção de reflexão na descreve a reflexão na ação como a ação. pesquisa em um contexto de prática no qual o pesquisador em ação "não é dependente de catego rias de teoria e técnica estabelecidas, mas constrói uma nova teoria para cada caso específico. Sua pesquisa não se limita a deliberar sobre meios, os quais de dependem um acordo prévio sobre fins. Ele não mantém fins e meios separados, mas define-os interativamente à medida que com poe uma situação problemática. Ele não distingue pensamento e açao. Ele
68.
D.Jean Clandinin | F. Michael Connely
Deste modo, de incerteza
reflexäo
a
ou
ação pode acontecer, até mesmo, em situações singularidade, pois não é delimitada pelas dicotomias do na
Racionalismo Técnico" (1983,
pp. 68-69).
trabalho rapidamente assimilado pela área dos estudos educacionais, bem como por outros campos profissionais. Na O
de Sclhön foi
Educação, gostamos de pensar que a rápida aceitação de Schön resultou do
modo pelo qual suas ideias de prática reflexiva se conectavam aos
vesti
gios de práticas desacreditadas pela narrativa dominante ou, fazendo uso dos termos de Schön,
pelo racionalismo técnico.
Essas
práticasdesacredi
tadas permaneceram no imaginário de professores educadores como um tipo de Educação aceitável no passado, em uma época menos racionalista da Educação de professores. Os livros de Schön conferiram valor moderno a essas memórias profissionais. Schön não usa temporalidade, história e memória para argumentar. Sua lógica consiste na discussão de questões contrárias ao racionalismo técnico, aliada à apresentação de evidências de casos de boa prática educacional em todas as profissões. Entretanto, a explicação sobre o porquê de sua influência retórica na Educação ser desproporcional à consistência de sua discussão pode ser feita de forma narrativa. Schön nos oferece a possibilidade de contar a história de Educação de professores (e de Educação de outros profissionais) de uma maneira oposta à Educação técnica de professores, a qual somos encorajados a bancar e estudar, e também possibilita que a história legitime nossa memória profissional de
prática reflexiva. O que torna possível o recontar dessas histórias é o senso de reducionismo, vinculado à ideia de racionalismo técnico. A imagem da prática
profissional, presente
na
memória profissionale rejeitada pelo
discurso
desvalorizada. Como um racionalista da narrativa dominante, tem sido tem sido reduzida, através do a memória profissional
substancioso, racionalismo técnico,
todo
tar escritas
em u m
O filósofo em uma a
conjunto de regras formuladas (Oakeshott, 1962, p. 12).
a um
livro"
Johnson (1987)
linguagem metafórica,
maneira
como o
redução do
todo
e
objetivismo, definido por ele, "o olhar do grande eu" que revela
como
se
constitui"
conjunto de regras
(p. x)
explicar a implica que.
para
formuladas. Isso
acredite, existe uma que qualquer pessoa Trata-se de uma noção desperverdadeira sobre o mundo.
haependentemente
VIsão correta
es-
usa o termo
mundo realmente
em um
que "devem
daquilo
SOnalizada de verdade
e
em
sentido.
Pesquisa narrativa
69
'olhar do grande eu' se tornou nnos técnico. Oakeshott nos diz que o ra -
Segundo
O0akeshott
e
Schön,
esse
prática -o racionalismo chamado de 'conhe de que o que eu tenho cionalismo técnico é "a afirmação conhecimento, e a afirmação de que cimento prático' não é, de modo algum,
estudos acerca da
existe apropriadamente falando, não
conhecimento
que não
seja conheci
único elemento do conhecimento. O racionalista defende que o conhecimento técnico, tamb m chamado envolvido na atividade humana é o seria insomente um tipo de ignoräncia que de conhecimento prático, que é
mento técico.
significante, se não fosse para
o
racionalista,
prejudicial. A soberania da razão, soberania da técnica. O centro da questão é a
terminantemente
significa a
exatidão"
preocupação do Racionalista com a Johnson observa que o meio de
(1962, p. 11).
que o "olhar do grande eu" eo racionalismo técnico têm separado e desvalorizado é colocar "o corpo reunir
o
mente descorporificada permite de volta à mente (1987, p. xxxvi). Uma certeza necessária do racionalismo técnico. Colocar o corpo de volta na a
mente é enfraquecer a certeza. Emoção, valores, experiências vividas no não se mantêm imómundo, memória e explicações narrativas do passado veis de modo a permitir a certeza.
Os leitores devem notar que a experiência, embora não mencionada até então, é central nas discussões e posições de Schön, Oakeshott e Johnson. Para Schön, a experiência é o coração da sua teoria e a proposta
de prática reflexiva para as profissöes. 0 autor escreve sobre a experiência refletida como saber/conhecer-na-ação, "o modo característico de conhecimento prático usual" (1983, p. 54). Para Oakeshott, as pessoas com seus
preconceitos, influências, perspectivas e atitudes (que são as contrapartes da experiência) são as inimigas da certeza. Para Johnson, o título de seu livro
The Body in the Mind - mostra seu desejo de colocar a experiência,
à qual ele se refere como "o corpo", no centro de sua filosofia. A desconfiança em relação à experiência, presente no racionalismo
técnico, não tem origem científica. Conforme aponta Oakeshott, a ciência, não menos do que a arte, é incapaz de ser reduzida àtécnica e ensinada
através de livros. Os contrários ao estudo da prática- e da diversidade
ge
rada construtivamente e narrativamente que a acompanha - geralmente
definem a prática como a execução de habilidades. Ironicamente, costumam defender que descobrir e nomear as habilidades se constitui como o fazer ciência. Mas isto é reducionismo, e o chamou
que Dewey (1929) (no título) de "a busca pela certeza', que marca o racionalismo técnico,e não o fazer ciência. Fazer ciência é compatível com a narrativa eo estudo
seu
70 D . Jean Clandinin | F. Michael
Connely
da
pråtica em
todas as suas
complexidades imagináveis.
Oakeshott
(1962) diz que "o racionalista possui um interesse ame açador pela Educaço". Ele tem respeito por 'cérebros, uma grande cren em treiná-los, e está certo de que a inteligência deve ser encorajada e deve receber sua recompensa de poder" (p. 32). Isto é ameaçador porque o racionalista "não percebe o acúnulo da experiência, mas somente sua função quando está sendo convertida em uma fórmula: para ele o passado só se cofigura como um estorvo" (p. 2). O racionalismo técnico considera que uma pessoa com experiência possui "uma capacidade negativa
(p.
2). Se a "tábula rasa foi deformada por rabiscos irracionais de ancestrais desprovidos de tradição" (p. 5) (e, acrescentando, por experi ncias vida ate o momento), ent o
de
a primeira tarefa educacional do racionalista
"deve ser a de apagar o passado" (p. 5). O interesse do racionalista técnico pela Educação é ameaçador não porque ignora a experiència, mas porque
a considera um impedimento para a "verdadeira" Educação habilitadora. Partilhando do mesmo sentido composto por Dewey (1938), a reconstrução da experiência como a base da Educação, Oakeshott escreve, "Assim como todos os outros tipos de conhecimento, aprender uma técnica não consiste em livrar-se da ignorância pura, mas em transformar o conhecimento que já está lá" (p. 12). Schön trata desse tema em seu trabalho sobre Educação profissional através da legitimação de nossa memória profissionale da possibilidade de retomar a experiência, não como uma mancha negra na mente, mas como um recurso para a Educação de profissionais.
O pensamento narrativo na
fronteira formalista Schön e Oakeshott nos permitem imaginar um recontar de Johnson do "corpo na mente" e metaforicamente retornar "ascendentemente" para o todo, a partir do mundo reduzido dos racionalistas técnicos. Mas Schön,
Oakeshott e Johnson mantêmo foco de nossa atenção sob a fronteira entre o pensamento narrativo e a narrativa dominante, com a sua qualidade
reducionista. Há outra história de trabalho em outra fronteira com o pensamento narrativo. É uma história "descendente" do todo, a partir de uma análise
sociopolítica pragnmática. Pesquisa narrativa 71
Da mesma forma como o reducionismo transforma o todo em algo
inferior a anlise políitica e sociológica também pode fazê-lo, através do uso da abstração e do formalismo. As disputas entre pesquisadores narra tivos e aqueles inscritos em linhas de pesquisa formalistas não são menos dramáticas, embora menos difundidas, do que aquelas travadas entre pesquisadores narrativos e pesquisadores ligados à narrativa dominante. As iltimas são mais bem reconhecidas por toda literatura referente à pesquisa, em parte porque os pesquisadores narrativos imaginam os envolvidos com a narrativa dominante como os únicos, ou pelo menos os principais,
criticos da inserção da experiência no estudo e na prática das ciéncias sociais. Entretanto, do nosso ponto de vista, experiência e narrativa são tão suspeitas no formalismo quanto o são na narrativa dominante. A discussåo dos formalistas tem recebido apoio de duas fontes di-
ferentes, o estudo da literatura e da ciência da filosofia. Em uma discussão sobre
questões
de
trabalho, Bernstein observa, "Cada vez mais tem se tornado moda referir-se ao nosso tempo como a 'era pós'pós-moderna, as
pós-estruturalista, 'pós-empirista', 'pós-ocidental' e, até mesmo, 'pós-filosófica' mas ninguém parece ser capaz de caracterizar adequadamen-
te essa 'era
pós'
e
-
há
uma
inabilidade
ansiedade em nomeá-la" confusão da mente teórica é
e uma
(1987, pp. 516-517). Bernstein diz que esta "um reflexo do que está acontecendo no nosso cotidiano, no qual há uma expansão de um pluralismo quase selvagem" (p. 517). Pluralismo selvagem é outro modo de nomear o relativismo que incomoda Booth (1986) na críitica literária e é uma expressão do que Popper chama de "mito da estrutura" (Bernstein, 1987, p. 56). Dewey se opunha às consequências do mito da estrutura, o qual "sugere que 'somos prisioneiros da estrutura das nossas teorias, de nossas expectativas, de nossa experiência anterior e de nossa língua" (Bernstein, 1987, p. 51). A "estrutura" é uma visão formalista, é uma visão de que as coisas nunca säo o que säo, mas, ao invés disso, são o que a nossa estrutura ou ponto de vista ou perspectiva ou panorama fazem delas. Além disso, uma vez que nada é o que parece ser, as únicas coisas dignas de serem notadas são os termos, as '
estruturas
formais, por meio das quais as experincias percebidas. pessoas não ensinam, mas reproduzem inconscientemente uma estrutura social; as pessoas não têm
são te
As
intenções emocionalmen-
confiáveis, mas tém expectativas
pré-estabelecidas; as pessoas não tem experiéncias que são propriamente suas, mas
senho
72
contextual. Os formalistas dizem
D.
Jean
Clandinin| E. Michael Connely
que
os
apenas avançam fatos do caso, a
em um de-
experiência
alguém diz possuir, ou os dados
que tas
tem pouco
tam, nunca
outra coisa;
sigificado
podem ver a
coletados por
em suas
asserções.
si mesmas como
especificamente, elas são o
tura
utilizada
uma
reconstrução
na
pesquisa da
de
pesquisadores empiris
pessoas, eles argumensão, porque são sempre alguma
que afirma. E porque
experiência
As
a
ideologia,
a
pesquisa narrativa requer
uma
teoria
ou
estru-
pess0a relação aos outros ambiente social, os formalistas desconfiam que ela não represente o contexto real e a oportuna "era
e ao
Temos mencionado
em
pós".
que
a
experiência e a
narrativa
estão, igualmensuspeita para formalista, como estão o para pesquisador inserido na perspectiva da narrativa dominante. A diferença entre ambos é o lugar dado à experiência. Para o pesquisador da narrativa dominante, a experi-
te, sob
o
encia é
uma marca
parede branca que precisa ser limpa; já o for malista v a experiência como algo a ser ignorado. Para o formalista, não há, enfim, nenhuma ação na experiência, mas somente na forma. Segundo ele, a pessoa meramente age de acordo com as hegemonias políticas, culturais, de gênero e estruturais. negra
na
A investigação da vida
na
fronteira formalista Nossas
considerações sobre a
vida
fronteira entre o pensar narrativamente e o pensar formalista nos levam a enfatizar diversas tensões. Da
na
forma como é com a vida na fronteira entre a pesquisa narrativa e a pesquisa de acordo com a narrativa dominante, aqui também de qualquer lado da fronteira, alguém parece estar se comunicando com mesma
pessoas do outro lado, que estão fora de foco, que não estão muito aptas:
falar claramente, e as quais reproduzem ideias, pensamentos e que, de alguma forma, perdem o foco.
sugestöes
O lugar da teoria Umas das tensões centrais nessa fronteira é o lugar da teoria na pesquisa. Os formalistas começam a pesquisa pela teoria, enquanto os pesquisadores narrativos tendem a começar com a experi ncia
assim
Como é expressa em histórias vividas e contadas. Anteriormente, em nos-
Pesquisa narrativa
. 73
so
trabalho sobre
a
pesquisa
narrativa,
Jean
estava envolvida em uma
aventura conjunta de escrita com um formalista. A tarefa seria escrever
uma resenha de um livro de ensaios. Depois que cada um havia lido o livro. eles se encontraram para discutir os seus métodos de escrita. Jean veio para
o
livro, e
ao
encontro
com
histórias de sala de aula, e argumentou que
sua resenha deveria começar com uma ou mais histórias que se conec-
tassem aos temas que o autor do livro estava tentando desenvolvere que
eles queriam discutir na resenha. 0 colega de Jean veio para a tarefa com a intenção de ir mais adiante, independente do livro, com um construto
teórico de um conhecido filósofo. Jean desejava usar as histórias para pensar sobre as possibilidades da vida escolar a partir das ideias do autor do livro. Seu colega desejava usaro filósofo para estabelecer uma estrutura
interpretativa para analisar as ideias do livro. A tensão resultante na fron teira fez-se presente ao longo daquela tarefa de escrita. Observamos algo similar em nosso trabalho com pesquisadores nar-
rativos iniciantes, quando eles também se prendem à exposição de construtos teóricos para posicionar e começar as suas pesquisas. Escritores como aqueles discutidos no livro de Skinner Return of Grand Theory in the Human Sciences - Althusser, the Annales Historians, Derrida, Foucault,
Gadamer, Habermas, Kuhn, Levi-Strauss, Rawls (1985), são frequentemen te encontrados em pesquisas daqueles que vêm com tradições formalistas para a pesquisa narrativa. A pesquisa narrativa começa, caracteristica-
mente, com a narrativa do pesquisador orientada autobiograficamente, associada ao puzzle (enigma) da pesquisa, denominado, por alguns, como
problema de pesquisa ou questão de pesquisa, como discutido no capítulo oito. A tensão criada, para aqueles que estão se movendo da barreira do
formalismo para a pesquisa narrativa, é expressa, em trabalhos de alunos de graduação, como uma tensão entre o estudante e o orientador, e tam
bém é manifestada por diferentes pareceres dados por diferentes mem bros de bancas: Vá à biblioteca. Que experiências você teve com isto? Leia Gadamer. Vá para uma escola. Esta tensão em relação ao lugar da teoria existe não só no início da
discussões acerca de como escrever uma revisão teórica ou sobre qual notoriedade que um ca
pesquisa,
mas ao
longo dela.
A tensão aparece
em
pítulo, independente de fundamentação teórica, deverá receber na versao
final do texto de pesquisa. Os membros de bancas, frequentemente, dese
jam que a teoria apareça em um capítulo separado, elaborado para estru turar a pesquisa, identificar lacunas de literatura, esboçar linhas teóricas
74 D . Jean Clandinin | F. Michael Connely
essenciais de pensamento e
gerar possibilidades de pesquisas potenciais. próprios alunos de pesquisa narrativa, por outro lado, frequente mente, escrevem dissertações sem um de capítulo específico fundamenta-
Nossos
ção teórica. Eles apresentam a teoria ao longo da dissertação, do início ao
fim, na tentativa de criar incorporada à pesquisa.
uma
ligação contínua entre
a
teoria
e a
práticCa,
A
abordagem padrão de uso da revisão teórica, como estrutura de uma pesquisa, está tão enraizada nas tradições da pesquisa formalista que
pesquisadores narrativos iniciantes facilmente se abalam quando forma listas levantam
questionamentos sobre o lugar da teoria enm seus trabaFrequentemente percebemos a incerteza provocada por essa tensao em reuniões de banca dos alunos quando os docentes, adeptos da metodo-
Ihos.
logia formalista, questionam a metodologia entrelaçada, da qual o aluno lança mo
tensão entre a revisão teórica como uma base estru a revisão teórica como um tipo de conversa entre a teoriaea vida
aparece tural ou,
e
para usar a teoria na pesquisa narrativa. A tensão normalmente como uma
pelo
menos, entre a teoria e as histórias de vida contidas na pesquisa. Essa tensão aparece, mais uma vez, no resultado de uma pesquisa. Um primeiro resultado de uma pesquisa formalista é a sua contribuição para o desenvolvimento de um construto teórico e literatura associada. Um
segundo resultado
é
a
repetição
e
aplicação
da teoria
analisado, por exemplo, no problema de alfabetizaço
no
problema
em uma sala de aula
de nível básico de uma escola do interior. Embora o primeiro possa ser um resultado esperado de pesquisa narrativa, o segundo raramente é. A con-
tribuição de uma pesquisa narrativa está mais no âmbito de apresentar uma nova percepção de sentido e relevância acerca do tópico de pesquisa, do que no de divulgar um conjunto de declarações teóricas que venham somar ao conhecimento na área. Ademais, muitos estudos narrativos são considerados importantes quando se tornam textos literários para serem lidos pelos outros, não tanto pelo conhecimento que abarcam, mas pelo
teste vicário das possibilidades de vida que permitem aos leitores da pes quisa. Esse uso da pesquisa narrativa amplia a conexão educativa da vida, da literatura e do ensino, como anteriormente vista no livro de Cole Call
of Stories O resultado literário da pesquisa narrativa cria uma das tensões de fronteira mais controversas entre pesquisadores narrativos e formalistas. Ainda, como afirma nosso colega Howard Russell, esses usos literários da narrativa em relação ao nosso público são a contraparte do pesquisador
Pesquisa narrativa
. 75
narrativo no prescro ve generalização. O pesquisador bem escritos, ofer mas cria textos que, quando
narrativo para a
aplicações gerais, os seus proprios cem ao leitor um lugar para imaginar usos e
usos e
aplicações
O equilibrio da teoria Uma tensão bastante similar é apreendida na máxima "A Pesquisa
Narrativa não é suticientemente teórica'. Há alguns anos, quando Michael tirou licença, ele participou de discussões sobre o que aconteceria com
seus cursos de pesquisa narrativa. Tais cursos são ministrados concomi
tantemente a muitos outros, os quais possuem orientação teórica fortemente formalista. Em meio a essas discussões, tornou-se aparente que os
cursos de pesquisa narrativa que vinham sendo ministrados por Michael eram vistos por alguns como "não teóricos o bastante. Foi proposto que
se os seus cursos fossem oferecidos, deveriam ser alterados em dois im-
portantes pontos
conteúdo e método de ensino. Os cursos começavam
com pontos iniciais de experiências - conexões autobiográficas dos alunos
com as respectivas pesquisas, gravações de campo e memórias, críticas a
dissertações narrativas e outros estudos. 0 conteúdo do curso enfatizava uma
literatura narrativa diversificada sobre
biografia, autobiografia, me
moria, etnografñia narrativa, estudo de caso e assim por diante, além de literatura acerca de termos-chave para a pesquisa narrativa, como memó ria, fato e ficção, interpretação, história, contexto, imagem e metáfora. Os colegas de Michael propuseram alterações no curso que giravam em torno de conteúdos definidos por autores
como
aqueles encontrados no livro de
Skinner, previamente mencionado. Metodologicamente, o curso modificado
começaria e
seria
autores. Fazendo teriam
ou
um
não feito
está claro que
se
desenvolvido com o foco
na
leitura e análise
daqueles
retrospecto, não fica claro se as experiências
de vida
em seu curso.
Porém,
parte das tais revisões teóricas
eventos da vida estivessem
presentes de alguma forma, ilustração dos termos teóricos produzidos pelos autores. E interessante notar que nas revisões de curso propostas, os teóricos narrativos seriam estudados de modo formalista. Se Propp por exemplo, aparecesse na lista de leituras, o seu trabalho seria(1968). lido seriam encarados
como uma
como
possibilidade
para mostrar a ligação teórica entre os atos, papéis estrutura narrativa. Se exemplos fossem usados, textos literários provavelmente teriam preferência em e
relação
76.
D.
Jean Clandinin | E. Michael Connely
aos
textos
experienciais
e
seriam analisados de acordo Uma
saltar que
o
com o
ato,
papel
o
e a
estrutura.
vez
que estamos discutindo os modos de pensar, convém res trabalho dos teóricos narrativos, como o de Propp, como o
próprio trabalho, ou enfim, qualquer um que tivesse uma história de vida, poderiam ser expressos, revisados e ensinados na perspectiva formalista. O nosso
formalismo pesquisa narrativa.
se
relaciona
a um
modo de pensar, assim
como
a
Pessoas Uma das tensões mais fortes ender o lugar das pessoas na
dizer isto é que
sempre presente é o como comprepesquisa. Um dos modos mais simples de
na
e
pesquisa formalista, pessoas,
se
chegarem
a ser
identi-
ficadas, são consideradas exemplares de uma forma - de uma ideia, uma teoria, uma categoria social. Na pesquisa narrativa, as pessoas são vistas
corporificação
de histórias vividas. Mesmo quando os pesquisadores narrativos estudam narrativas institucionais, como as histórias da como a
escola, as pessoas são encaradas como vidas compostas que constituem e
são costituídas por narrativas sociais
e
culturais. A história de
JoAnn
Phillion (1999) com pesquisa narrativa esclarece a tensão gerada pelo lu-
gar das pessoas em pesquisas formalistas e em pesquisa narrativa. Phillion lecionou
Japä0
e, mais
recentemente, deu aulas para alunos estrangeiros no Canadá. Ela dedicou seu trabalho de mestrado às áreas de linguística e multiculturalismo. Ela fala sobre si mesma, "Sempre no
sinto que aprendo mais com pessoas de outras culturas". Durante seus estudos para o doutorado, ela trabalhou em um programa universitário elaborado para ajudar professores imigrantes a fazerem a transição em sua profissão no Canadá. Sua pesquisa de doutorado começou com a pro-
posta de estudar o trabalho de professores imigrantes em sala de aula. Conforme escrevíamos essa história, ela completava sua pesquisa com
Pam, uma professora com prática no Oeste Indiano. Phillion percebe que algumas das suas crenças, mais alimentadas sobre cultura e sobre como a cultura é expressa no ensino, têm sido desafiadas por seu trabalho na sala de aula de Pam. Phillion trazia visðes
acerca da cultura do oeste indiano; sobre a população do oeste da îndia no Canadá; e sobretudo como uma professora do oeste indiano conduziria suas aulas em uma cidade interiorana. Cultura é, em nossa perspectiva,
Pesquisa narrativa 77
uma categoria formal. Phillion começou sua pesquisa narrativa com essa a categoria em mente e esperou que Pam se apresentasse como uma perso.
nagem modelo com simpatias particulares para as dificuldades de aprendizagem das crianças. Aderindo à categoria formalista de cultura como um guia para interpretar a prática de Pam, Phillion esperou que Pam fosse mais consciente, do que os outros professores, acerca do que significava pessoa do oeste indiano vivendo no Canadá. Ela presumia que Pam mostraria um senso aguçado dos déficits e desvantagens que crian-
ser uma
ças de outras culturas iriam experienciar em um sistema educacional pri mario definido nos termos da classe média branca canadense. Ao iniciar
foi
a
pesquisa
narrativa
em
sala de aula
com
Pam, Phillion
surpreendida ao verificar que as práticas de sala de aula de
Pam eram
diferentes do que ela esperava. Os alunos que se atrasavam para a aula, por exemplo, eram chamados a entrar na sala, manter-se de pé em frente à porta e expor as suas razðes para o atraso. Pam explicou a Phillion a sua filosofia de que os alunos precisam assumir a
responsabilidade
si
por
próprios e por suas ações. Phillion observou muitos exemplos de manifestação da filosofia de Pam no seu relacionamento com as crianças e com a sua aprendizagem, quando ela insistia que os alunos, individualmente, descobrissem as coisas por si próprios, sem muita ajuda. Sua filosofia também era expressa nas atividades nas quais Pam orientava os alunos a de senvolverem projetos em sala de aula.
Na
dade
um
perspectiva tanto
de
Phillion,
improdutiva, ao
problemas sozinhos.
Pam
tolerava o que parecia uma ativi ponto dos alunos terem de lidar com seus
Pam
Uma das regras de Pam é que os alunos deviam percalados antes de serem dispensados da sala para irem, por exempara a aula de Educação física, para a natação, ou para o intervalo.
te,
maior
manecer
plo, a
aguardava que parte
desconfortável
da
os
alunos
se
aquietassem, mesmo que, eventualmenperdida. Phillion se sentiu
atividade programada fosse
com a
aplicação desta regra, especialmente quando pai de um aluno veio para uma reunio o
necessário conversar com
Pam
no
meio de
em uma
tarde
extra-turno. O pai achou
uma sala cheia de crianças que, regra de Pam, não tinham permissão sair. para Phillion conta que (se ela fosse a professora) teria achado dificil e o barulho com o pai ali tolerar presente. Seu impulso teria sido dispensar as crianças, mas Pam
seguindo a
constrangedor
A
ção
surpresa de Phillion,
de que suas
parecia calma.
provavelmente
relação às práticas de Pam, e a práticas de professores do oeste dapercep
em
crenças sobre
India
78
D.Jean Clandinin | E Michael Connely
foram contrariadas, salientam a diferença entre pensar narrativamente e pensar como formalistas. Particularmente em quest o
está o lugar das
pessoas. Phillion, muito comprometida com a pesquisa narrativa, também começou com uma noção sobre como as culturas interagem em um cená-
rio de ensino, orientada de maneira formalista. Ela iniciou sua pesquisa com a ideia de que Pam seria um exemplar de sua cultura e com a ideia de como aquela cultura seria expressa na prática de sala de aula. Na pesquisa narrativa de Phillion, Pam como uma pessoa, como uma corporificação de
histórias vividas, substitui Pam como um exemplar de cultura. E a pessoa, ao invés da categoria formal, que importa para a pesquisa de Phillion.
Além da cultura, outros termos da pesquisa formalista comumente usados são raça, classe, género e poder. Pesquisadores narrativos, ao
desenvolverem ou explicarem o seu trabalho para outros pesquisadores, se encontram quase inevitavelmente na fironteira da pesquisa tormalista,
assim como outros pesquisadores lêem os seus trabalhos do início ao fim em busca da aplicação dos termos formalistas; uma pessoa é um membro de uma raça, de uma classe, de um gênero e, devem afirmar, possui graus variados de poder nas diversas situações. Parte dessa tensão, para um pesquisador narrativo, é reconhecer essas verdades formalistas enquanto lidando com uma agenda de pesquisa completamente diferente.
O lugar do pesquisador A história da pesquisa de Phillion com Pam ressalta uma tensão intimamente relacionada ao lugar do pesquisador na pesquisa. Observamos que Phillion ficou chocada quando percebeu o significado pråtico daquilo que tinha em mente - que Pam era muito mais do que a expressão de
uma categoria formalista. Ela é uma pessoa. Mas Phillion também ficou chocada com a descoberta da tensão dentro dela própria. Ela se viu desen volvendo uma pesquisa narrativa na qual estava tentando compreender o conhecimento prático-pessoal-experiencial de uma professora imigrante.
Ela desejava desenvolver essa pesquisa por um longo período de tempo, com muitas horas de conversa sobre ensinar e sobre a vida em geral. A inicialmente, ela se sentiu desconforsurpresa aparece ao descobrir que, tável com o lugar para onde esse processo narrativo a levava, e descobriu uma fronteira dentro de si própria - uma fronteira criada por sua própria
história narrativa em relação ao pensamento formalista, em termos de cul
Pesquisa narrativa
79
tura, e em relação ao seu objetivo ao desenvolver uma pesquisa narrativa
va.
A experiencia de Plhillion, de tensão nas fronteiras, é importanto para todos nós ao pensarmos sobre as nossas pesquisas narrativas e ao nos tornarmos autobiograficanmente conscientes da nossa reação em re.
lação ao nosso próprio trabalho. Todos nós, pesquisadores iniciantes o experientes, vamos para a pesquisa com perspectivas, atitudes e nodos de pensar sobre a pesquisa. Estas histórias, estas narrativas pessoais de pes.
quisa, devem coincidir com ou ultrapassar uma fronteira, para variar os graus com os quais desenvolvemos nossas pesquisas atuais. Quase todos nós-é quase inimaginável que não fizéssemos isso vamos para a pesquisa narrativa com diversas versões de histórias de pesquisa formalistas e -
reducionistas. Isso étão verdade que estamos sempre nos debatendo com tensões pessoais ao continuarmos nossa pesquisa narrativa. Os conflitos
do próprio Michael, por exemplo, são com as tensões na fronteira reducionista. Näão foi um acidente, mas uma expressäo resultante da sua história
narrativa, ele ter se encontrado em Manila em um estudo científico sobre conclusões de pesquisa e, novamente, empenhado em uma tarefa de revisão da Taxonomia de Bloom. No caso de Phillion, a lição mais geral a ser
aprendida com sua história é que os pesquisadores narrativos precisam reconstruir tas
para
própria narrativa de histórias de pesquisa e estarem aler possíveis tensões entre aquelas histórias narrativas e a pesquisa sua
narrativa que desenvolvem.
Resumo Nos
capítulos dois e três, nos propusemos a explorar
que
o
significa
pensar narrativamente. Fizemos isso a partir da exploração de extremidades
dissonantes,
lugares
por onde o pensamento passa, segundo a pesquisa narrativa, considerando o território intelectual de outros como os
modos de pensar. Referimo-nos a estes lugares como fronteiras e descreOs duas fronteiras principais impostas pelos modos de pensar redu-
cionista e formalista. Usando o trabalho histórico de Langemann, sobre as
funções comparativas
de
John Dewey
e
Edward Thorndike,
apresenta-
mos o modo de pensar reducionista nos termos da narrativa dominante.
Exploramos as fronteiras do nosso próprio pensamento com a narrativa dominante quando trabalhamos com o time de revisão da Taxonomia de Bloom. Descrevemos cinco tensões resultantes na fronteira temporali -
80
D.Jean Clandinin
|
F. Michael
Connely
dade, pessoas, ação, exatidãoe contexto. No capítulo três, usamos vários
exemplos esboçados de acordo com diversos aspectos do nosso trabalho, realizado ao longo dos anos, para identificar quatro tensões na fronteira entre a pesquisa narrativa e a pesquisa formalista - o lugar da teoria, o
equilibrio da teoria, pessoas e o lugar do pesquisador. Não pretendemos sugerir que essas tensões estejam relacionadas exclusivamente a uma ou outra fronteira. Elas refletem o modo como temos experienciado a pesquisa narrativa nessas fronteiras, ao longo dos
anos. Também sabemos que os termos e distinções não são tão exatos e claros de modo a tornar possível oferecer uma lista fixa - cinco tensões com a fronteira reducionista e quatro com a fronteira formalista. Nossa discussäo sobre a tensäo em relação às "pessoas" nas duas fronteiras é ilustrativa. Pessoas, claro, têm lugar especial na pesquisa narrativa, mas, apesar disso, pessoas estão no coração de todas as pesquisas em ciências sociais. Além disso, nossa intenção não é que a lista das tensões seja lida como uma lista exaustiva. Essas tensões são as que nós experienciamos com mais frequência, tanto no nosso trabalho quanto no trabalho com alunos desenvolvendo pesquisa narrativa. São tensões que realçam aspectos importantes sobre o pensar narrativamente. Ao contrário de Czarniawska e Polkinghorne, que emprestam termos teóricos de outras áreas para com-
preender a narrativa, nós, de modo similar a Coles, aprendemos mais so bre a pesquisa narrativa fazendo pesquisa narrativa. Fazer pesquisa narrativa, geralmente nas fronteiras, é a fonte principal do nosso pensamento sobre o que constitui o pensar narrativamente na pesquisa narrativa.
Uma observação final, antes de passarmos para assuntos mais específicos relacionados ao trabalho na área, é notar que nenhuma das tensões e modos de pensar associados são itens isolados e autônomos.
Todos esses tópicos ocorrem na pesquisa narrativa e precisam ser pensa dos como assuntos relacionados que se tornam o foco e deixam de sê-lo, dependendo da circunståncia.
Pesquisa narrativa 81
CAPITULO 4
0
que fazem os
pesquisadores narrativos?
ntes de explicarmos o que fazem os pesquisadores narrativos, tracemos um paralelo. E sempre útil estabelecer um contexto para o propósito. Para isso, é necessário esclarecer o que não será feito
de modo a esclarecer exatamente o que ser feito. Utilizamo-nos do trabalho de Joseph Schwab para ilustrar esse ponto. O artigo de Schwab (1960) intitulado "O que fazem os cientistas?" foi parte de um intenso debate sobre o método científico. Schwab apontava que muito da discussão sobre o método científico e a natureza da ciência era feita sem referência ao fazer da ciência, mas, em vez disso, tendia a tecer consi-
derações sobre a lógica científica e a coerência dos conceitos científi cos. A filosofia analítica, com sua énfase na construção da linguagem, exerceu um papel significativo na literatura do método científico da época. Pelo título de seu texto, Schwab indicava sua intenção de enveredar pela discussão fornecendo uma avaliação do que os cientistas re-
almente faziam. No artigo, isso fica claro, ele no
queria lidar com o que
as pessoas pensavam que os cientistas deveriam fazer, nem pretendia apresentar interpretaçôes lógicas e analiticas em um metanível do que
faziam, muito menos expandir filosoficamente noções derivadas do
Traduzido por: Orlando Vian Junior (UFRN) Pesquisa narrativa 8 3
que
era a
ciêncía. Ele
queria estudar o pensamento cientifico conforme
expressado pelo que os cientistas realnmente faziam.
Introdução Do dar
o
mesmo
tópico
modo, neste capítulo, e por todo o livro, desejamos abor-
sobre
o
que fazem
pesquisadores narrativos. Não lidamos literatura parte moderna e grande parte pós-moderna que discute a narrativa. Um exemplo do que não estamos fazendo é o que Richardson faz em seu capítulo sobre narrativa e sociologia em uma seçãão intitulada "0 que é narrativa?" (1995, p. 200), em que define narrativa. Do mesmo modo que Schwab deixou claro que não estava tentando definir cienciae nem mesmo a da metodologia ciência, queremos deixar claro que não temos a de intenção definir narrativa. Consideramos nossa tarefa semelhante à de Schwab, como a intende ção tentar prover uma resposta para a 0 com a
vasta
os
-
pergunta que fazem os pesquisadores narrativos? Assim como Schwab, estamos interessados nos termos da investigação e os espaços que esses termos criam a mesma. Estamos interessados em explorar como tais termos definem e delimitam
investigações narrativas passa por
evidéncia
defensáveis. Discutimos
e
como
delimitam
determinam
o
pesquisa, o
e
termos que optamos por deweyana da experiência interação). Isso conduz a um
esse
os
moldam o que
textos de
pesquisa
os
espaço
para as quais
fenômenos,
que tornam
que derivam da visão
continuidade
os
usar em nossas
pesquisas, (especificamente: situação, exame de nosso arcabouço de
tridimensional de investigação
arcabouço permite que nossas
trospectivo, extrospectivo,
narrativa e
as
"direções"
investigações caminhem-
retrospectivo, prospectivo e situado em um Finalmente, mostramos como lugar. nosso processo de investigação é com dois exemplos de nosso trabalho. empregado Termos da Pesquisa Narrativa e espaço da Pesquisa Narrativa dos
Quais são os termos da pesquisa narrativa? Os leitores com a literatura narrativa familiariza
84 D. Jean
podem imaginar um gama de termos
Clandinin |F. Michael Connely
der
vados dos escritos modernos e pós-modernos e dos estudos da literatura. Os termos são tão numerosos que há até um dicionário de narratologia (Prince, 1987). Nossos termos não emergem dessa literatura, mas de nossa preocupação conm a experiência e com nosso o propósito - que é pensar
o ato de fazer pesquisa narrativa. Como discutido em capítulos anteriores, os termos que usamos para pensar a pesquisa narrativa estão estreitamente associados à teoria da experiência de Dewey, especificamente às noções
de situação, continuidade e interação. Nossos termos não são extrapolações rigorosas da teoria de Dewey. Por isso, um especialista em Dewey
encontraria muito o que criticar. O trabalho de Dewey sobre a experiência é nossa referència criativa para nos lembrar de que, em nosso trabalho, a resposta para a pergunta "por que narrativa?" é: por causa da experiência. Dewey fornece um esboço para pensarmos a experiência "além da caixa preta", isto é, além da noção de experiência sendo irredutível de forma que
não se pode investigá-la. Com Dewey, pode-se dizer mais, experiencialmente, do que "por causa de sua experiência" quando se responde por que uma pessoa faz o que faz. Definido esse sentido do lugar fundacional de Dewey em nossa con-
cepção sobre a pesquisa narrativa, nossos termos são pessoal e social (interação); passado, presente e futuro (continuidade); combinados à noção de lugar situação). Este conjunto de termos cria um espaço tridimensional para a investigação narrativa, com a temporalidade ao longo da primeira dimensão, o pessoal e o social ao longo da segunda dimensão e o lugar ao longo da terceira. Utilizando esse conjunto de termos, qualquer por este espaço tridimensional: os estudos têm dimensões e abordam assuntos temporais; focam no pessoal
investigação
em
particular é definida
e no social em um balanço adequado para a investigação; e ocorrem em
hugares específicos ou sequências de lugares. Em texto anterior (Clandinin; Connelly, 1994), escrevenmos sobre duas dessas dimensões, seguindo a noção de interação de Dewey, focando no que designamos de as quatro direções de qualquer investigação: introspectivo, extrospectivo, retrospectivo, prospectivo. Por introspectivo,
queremos dizer em direção às condiçðes internas, tais como sentimen tos, esperanças, reações estéticas e disposições morais. Por extrospectiVo, referimo-nos às condições existenciais, isto é, o meio ambiente. Por
retrospectivo e prospectivo, referimo-nos à temporalidade
- passado,
presente e futuro. Escreveos que experienciar uma experiència - isto é, pesquisar sobre uma experiëncia - é experiencià-la simultaneamente nes
Pesquisa narrativa 8 5
quatro direções, fazendo perguntas que apontem para cada caminhos. Assim, quando se posiciona em um desses espaços
sas
nais
em
qualquer investigação,
de campo,
desses
bidimensio-
elaboram-se perguntas, coletam-se notas
derivanm-se interpretações
que atenda tanto
um
e
escreve-se
um
texto de
pesquisa
questões pessoais quanto sociais, olhando-se interna e externamente, abordando questões temporais olhando näão apenas para o a
evento, mas para seu passado e seu futuro. Nesse trabalho anterior, inserimos a dimensão de lugar no meio ambiente. Acreditamos agora que é preferível encarar o lugar como um terceiro termo, que atenda às fronteiras físicas concretas e topológicas das paisagens de pesquisa.
Uma história de trabalho em um espaço tridimensional de Pesquisa Narrativa com
Ming Fang He
Sem que nenhum dos dois soubesse, porta de Michael e perguntou se ela
quando Ming Fang
He bateu à
poderia ser membro do grupo de pes começando uma jornada de doutorado que levaria de volta ao passado: ela, às suas origens nos tempos
quisa dele,
ela estava
ambos cultural na China e Michael por ter crescido cuária oeste do Canadá, onde
pré-revolução
comunidade agropeLong Him administrava o Armazém Long Him na cidade vizinha. A área de criação de gado havia sido estabelecida por imigrantes das Ilhas Britânicas, embora na época em que Michael frea sala de uma escola na zona quentava rural, era comum a presença de europeus vindos da Europa central. Além do mais, todos se pareciam e falavam como Michael e, sendo de uma segunda geração de canadenses, cresceu no em uma
que atualmente parece para ele ter sido uma comunidade culhomogênea. Long Him era, para as lembranças de Michael adulto em 1990, a única pessoa que no se encaixava facilmente na paisagem ral. Long Him falava cultu inglês o suficiente para conduzir seu Ainda criança, Michael acompanhava seus pais à cidade duas negócio. vezes ao mês ou semanalmente para as compras, e embora seus pais fossem fregueses do outro armazém (os donos eram de amigos longa data), eles geralmente tural
visitavam
armazém de Long Him. Ao pensar em seu passado, Michael não sabia quase nada de Long e Him, achava que nem seus pais sabiam. Michael não tinha noção de Long Him, estando integrado à vida da comunidade. vi Quando um o
pregador
86D. Jean Clandinin | F. Michael Connely
sitante iniciou o serviço uma vez ao mês na igreja anglicana, quase todos o assistiam, menos Long Him. Michael na verdade se recorda o q
parecia para ele uma história exótica em desenvolvimento quando Long Him apareceu com uma noiva chinesa exótica em um sábado. A chegada des
sa noiva misteriosa, que não falava inglês, foi explicada por um processo igualmente misterioso de "reembolso postal", Ela não ficou até o fim do primeiro inverno. Michael também se lembra de ficar fascinado pelo enor-
me cachimbo d'água' que Long Him fumava, especialmente se os pais de Michael pedissem que ele o fizesse para agradar às crianças. Michael lembra do armazém, cheio de lugares escuros e secretos como um local
maravilhoso para a brincadeira favorita das crianças: o esconde-esconde. Conhecer Ming Fang e trabalhar em sua tese levou Michael a questionar-se de onde Long Him tinha vindo. Além do mais, seu encontro com Ming Fang levou Michael a questionar-se sobre si mesmo, sua família, sua vida na comunidade e como a história de si mesmo em relação a outras culturas foi moldada pelas histórias da família e da comunidade na paisagem rural. Long Him, sem dúvida, foi deixado em Lundbreck, enquanto a ferrovia era construida com estações a cada seis quilômetros. O Canadá foi formatado como um país pela ferrovia, uma ferrovia construida com a mão-de-obra trazida da China. Michael começou a tentar resolver, agora que Ming Fang concluiu sua tese, quem ele e ela eram, em relação a Long Him. Long Him era, pelo
que Michael pode lembrar, sua primeira experiência multicultural. Em sua memória, não havia outros até que ele fosse para a escola secundária local,
frequentada por membros da reserva indígena Peigan da Nação Blackfoot' Ming Fang trouxe Michael de volta a essas experiências e somente agora ele está começando a tentar resolver suas próprias atitudes, simpatias e visões em relação a pessoas de outros cenários. Tanto Ming Fang quanto
Michael fizeram uma jornada de volta ao início de suas infâncias por meio da investigação dela. A conclusão de sua tese sobre quem ela era auxiliou
Michael a começar a interrogar-se sobre quem ele é em um mundo multicultural. Mas ela também se defrontou com novos enigmas ao passo que
Referencia às chamadas 'noivas por reembolso postal' (mail-order brides), ge ralmente mulheres de países menos desenvolvidos que listavam seus nomes em
catálogos para que pudessem se casar com cidadâos de outros países. Existem diferentes tipos de cachimbo d'água como o narguilê e o bong. por exem plo. Seu principio básico de funcionamento é que a fumaça passe pela água antes de chegar à boca do fumante.
Os Balckfoot são uma das diversas nações dos Peigan localizada em Alberta.
Pesquisa narrativa 87
histórias de Michael sobre Long Him foram trazidas à memória e Fang interroga-se sobre o lugar dos chineses no Ming Canadá. Ming Fang He é uma mulher do continente chinës que viveu a revolução cultural em sua juventude, passou algum tempo em uma fazenda agrícola, obteve seu bacharelado na Chinae seus títulos de mestre em inglês e em linguística em duas universidades no Canadá. Ela to obteve o vispermanente para o Canadá e, quando iniciou seu trabalho de tese, era cidad de dois países. Ela e suas com amigas experiências similares eram profundamente afetadas e confusas sobre quem eram. Quando sua posta de tese foi definida, essa confusão foi expressa com o fato de se prorimentar uma variedade de choques culturais. Ela sentiu as redes de expeda comunidade e da apoio universidade inadequadas em auxiliá-la a sentido mais forte de si atingir um mesma. Ela sua complementava renda ensinando ingls como segunda língua a imigrantes, muitos dos quais eram Ela descobriu muito chineses. pouco para elucidar seu sentimento de deslocamento nessas experiências de ensino e na literatura para ra é embasá-la. Tal literatuessencialmente baseada na noção de adaptação cultural pela aquisi ção de linguagem. Sua com as culturas experiência e os chinesa e canadense, movimentos de idas e vindas entre elas, levou-a a mais do que a que muito linguagem e a adaptação cultural estavampensar em Foi
as
jogo. aglomerado de experiências e sua considerações que proposta de tese, que desse
ticulou
ela
conceituou finalmente no resumo ar pleto de sua tese como "um comestudo de formação de identidade e transformação cultural de três professoras chinesas ao irem e virem entre as culturas chinesa e canadense" (He, A 1998). tese é um estudo intensivo das vidas de três chinesas: Shiao, Wei e Ming Fang, do final dos
na
China,
rastreando 1950 por uma série de transtornos políticos mudança para o Canadá, e
anos
sua
suas
e
vidas
culturais
perienciaram ao viverem no Canadá e no posteriores transtornos que ex estudo da Canadá. Devido em parte às continuas e delicadas Educação superior no China, e, em parte, às na limitações de biografias e situações politicas um método autobiografias, ela criou que nomeou autobiografia ou composta múltipla para narrar a formação da identidade e a
transformação cultural de
cada mulher. passo que Michael lia e relia as histórias de Ming Fang, Shiao e Wei sobre crescer na China, ele veio a compreender algo sobre como o tempo e o lugar moldaram suas vidas e as histórias si. Quanto mais que contavam sobre Ming Fang Ao
suas
memórias
de vida
trabalhava para
e as
paisagens em
88D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
compreender relação entre
que
a
as
vidas das três chinesas
se desenvolveram, mais Michael percebia o quão limitado era o seu co
nhecimento sobre Long Him, e que o pouco que sabia era oprimido pelas qualidades culturais peculiares da paisagem de sua infância. Em sua tese, Ming Fang viajou ao passado para um ugar onde suas histórias tiveram início. Embora Michael também tenha feito essa viagem de volta ao lu-
gar onde as histórias tiveram início, ele percebeu que não havia lugares chineses em sua história sobre Long Him. Long Him era, na história de
Michael, quase que completamente construído a partir da experiência de Michael sobre ele quando de sua chegada na paisagem canadense rural
de Michael. Michael tinha uma visão, de observador distante e estereoti-
pado, da China,
na
qual
suas
histórias de infáncia
com
Long
Him estavam
relacionadas. Michael se lembra de duas coisas a esse respeito. A primeira era a advertência de sua mäe de que deveriam limpar seus pratos porque como ela dizia, "Pensem nas crianças famintas na China", como se sua ali-
mentação estivesse de algum modo ligada à fome dos chineses. A segunda coisa que ele se lembra é o pensamento fascinante de que, se ele pudesse cavar um buraco bem fundo, ele sairia na China. Ele não tem lembranças associadas a como essas histórias estavam relacionadas em sua mente às
experiências de Long Him de crescer na China. A investigação narrativa de Ming Fang leva Michael ao lugar de suas
experiências.
Ele é
-
por meio da
tese de
Ming Fang
-
um
'viajante do
mun-
do' no sentido atribuído por Lugones (1987). Foi necessária praticamente uma vida para que ele ao menos questionasse o fato de se tornar um viado mundo ao universo de Long Him. As histórias da China distante e do Canadá atual de Ming Fang auxiliam-nos, como Blaise (1993) sugere
jante
"viver em seus países, falar sua lingua, negociar nas ruas em seus ônibus e
virar as chaves em seus cadeados" (p. 201).
O espaço tridimensional da Pesquisa Narrativa Criamos anteriormente a metáfora de um espaço tridimensional,
em que os pesquisadores narrativos encontrar-se-iam, usando um conjunto de termos que os indicava retrospectiva e prospectivamente, introspectiva e extrospectivamente, e os localizavam no lugar. Víamos essas dimensoes como direções ou avenidas a serem trilhadas enm uma pesquisa narrativa. Ao vislunmbrarmos as pesquisas de Ming Fang e de Michael, po-
Pesquisanarrativa 89
demos pensar nesses termos de várias maneiras diferentes.
Em termos de uma narrativa dominante, podemos imaginar os ter er mos como um arcabouço analítico para reduzir as histórias a um conjunto
de compreensões. Por exemplo, olhar em retrospecto seria ilustrado pe. las histórias de Ming Fang da revolução cultural, e o olhar introspectivo seria representado por seus sentimentos de choque cultural quando ela entrou no Canadá e começou seus estudos de mestrado. Se persistísse.
mos em desenvolver os termos como um arcabouço analitico, poderíamos encaminhar para afirmar descobertas desenvolvidas para cada conjunto. Por exemplo, na intersecção de lugar e tempo, poderíamos alegar que a China do início da vida de Ming Fangé uma construção que agora só existe
nas lembranças de suas histórias. Na intersecção do olhar introspectivo e do lugar, poderíamos alegar que Ming Fang experienciou choque cultural quando se mudou de um lugar, China, para outro, Canadá. Na intersecção do olhar extrospectivo e do lugar, poderíamos afirmar que foi a diferença entre os dois lugares que causouo choque cultural. Para converter o uso dos termos mais em direção às suas origens
experienciais, poderíamos pensar neles não tanto como geradores de uma lista de compreensões obtidas pela análise das histórias, mas sim como
indicadores de questionamentos, enigmas, trabalho de campo e textos de campo de diferentes tipos adequados a diferentes aspectos da pesquisa. Dessa forma, poderíamos ver Ming Fang coletando registros de memórias da
revolução cultural por
meio de
conversas e
entrevistas
com suas
parti-
cipantes ou, talvez, revendo pôsteres, slogans e registros de notícias dessa época. Ao focar no pessoal, veríamos como, talvez por meio de cartas com seus pais, ela reconstruiria o sentido de como ela se sentia em relação a si
mesma e à sua família durante a revolução cultural. Esse uso dos termos é como
desenvolvemos
o
O que não está de
afirmação
com as
restante deste
dito,
um
histórias
capítulo.
terceiro
uso
dos termos
apresentadas até agora),
é
(e não passível a
ambiguidade,
complexidade, dificuldades e incertezas associadas com o fazer de pesquisa. Esses fazeres, a "coisa" da pesquisa narrativa somente pode ser sentida e compreendida a partir da leitura da pesquisa completa. Apesar de não
explorarmos esta complexidade aqui, voltaremos a ela nessas e em outras histórias. Para retornarmos, então,
segundo uso, a saber, o uso dos termos para mostrar como uma pesquisa é estruturada pelo pesquisador - isto e, ao
para ver o que os pesquisadores narrativos fazem - abordamos a dimen-
90.D.Jean Clandinin |E. Michael Connely
são
temporal. Ming Fang inicia, em seu tempo presente, com um sentimenchoque cultural. Ela descreveu esses sentimentos como pess0ais, situados no e
to
de
presente, localizados
tempo
retrospectivamente
em seu
lugar canadense. Ela observou
o
sobre
seus sentimentos na China. Lembranças infäncia calma, intelectualizada, interrompida pelo redemoinho da revolução cultural. Ao se envolver nesse processo, ela se lembrou não apenas do pessoal, mas também da intersecção do com o social.
de
uma
pessoal
Seu texto de
pesquisa, sucintamente descrito acima, constitui-se de uma dupla narração pessoal e social. Permeando sua pesquisa narrativa, ela permanece em seu local canadense enquanto viaja retrospectivamente no
tempo e no espaço, na memória, para a China que não existe mais. O espaço tridimensional em que sua pesquisa está situada cria o sentido contí nuo em
de
deslocamento, enquanto ela se move de um passado rememorado um lugar para o momento presente em outro, todos construindo ima-
ginativamente uma identidade para o futuro. ele
se
Para retornarmos ààs histórias rememoradas da infância de dá conta de que os termos também estruturam sua
Michael,
(inesperada)
pesquisa narrativa. Ele começa no tempo presente com seu trabalho com Ming Fang. Ao contar as histórias de Ming Fang a Jean, ele se deslocou da
lembrança
de memórias de
infância, para memórias do primeiro sino-canadense, Long Him, que ele já havia encontrado. Ao fazer isso, ele sua
moveu-se retrospectivamente no tempo e lugar, compondo novas histórias para seu tempo e lugar presentes. Assim, Michael compôs histórias
ainda não contadas de visitas o armazém de Long Him. Mas ele também
relembrou histórias que sua me havia lhe contado. Ambos os tipos de histórias foram vividas em seu lugar e tempo da infância. Ambas foram contadas a partir de seu lugar e tempo da fase adulta e, ao serem levadas
adiante, ambas foram colocadas ao longo de sua história presente de Ming Fang e suas histórias antigas. Ao compor suas histórias de outro lugar e de outro tempo, foi ne-
cessário que Michael levasse em conta como se sentia. Aqui, ele começou um processo imaginativo baseado nas memórias tênues de um meio am-
biente um armazém escuro, um cachimbo d'água, uma esposa chinesa vista de relance. Mas, ao posicionar-se no espaço de investigação tridimensional, enquanto escrevíamos nosso texto de pesquisa, Michael começou a despertar para o fato de como Long Him tinha sido um "viajante do mundo" para o lugar e para o fato de que ele, Michael, no
tinha sido
um "viajante do mundo" para o lugar chinës e para as condições internas
Pesquisa narrativa
. 91
de Long Him. Michael compôs sua relação com Long Him de seu lugar na paisagem no oeste rural, de sua época de infåncia, com seus sentimentos infantis, tudo criado e moldado pela paisagem da infäncia. Ao compor esse texto de pesquisa, Michael vë novas possibilidades, pois recompõe o que sabe sobre Long Him, sobre Ming Fang e sobre si mesmo. Estar nesse es. paço é complexo para o pesquisador narrativo, uma vez que todos esses
aspectos estão sob consideração o tempo todo.
Nessa história, atuamos no espaço tridimensional da pesquisa nar rativa. 0 lugar muda da China antiga de Ming Fang para a Toronto atual, do
lugar antigo do oeste canadense de Michael, dividido com Long Him, para Toronto. 0 tempo muda das infäncias no oeste canadense e na China para o tempo presente em Toronto. Condições internas e existenciais são re-
contadas para Michael ainda criança, para Ming Fang ainda criança, e para ambos como adultos. Long Him permanece como memória parcial, como construção parcial imaginativa, uma figura na recomposição de Michael sobre quem Ming Fang e ele são neste caldo do mundo moderno de culturas e ideias. Ele interroga-se sobre o que Ming Fang escreveu sobre viver
entre-lugares, e mesmo pertencer a lugar nenhum ou pertencer a todos os lugares, poderia significar do ponto de vista interno. Ele pondera sobre o
que Long Him fez de
sua
vida
na
cidadezinha rural
com
dois armazéns,
e ele pondera sobre o que seus pais pensariam ao ouvir seu filho, uma
geração depois, questionar a sensibilidade de sua comunidade em relação a
povos de outras culturas. Ao
lembrar deles, ele só consegue imaginar que ficariam chocados e ofendidos, pois eram muito conscientes sobre as questöes de igualdade. Na
se
próxima história, brincamos mais uma vez no espaço tridimen-
sional de pesquisa narrativa, mas dessa vez posicionamos o lugar em es-
colas, ao nos movimentarmos retrospectiva e prospectivamente no tempo. Trabalhamos novamente com textos de campo sobre de rias
e
textos de campo de
relações
transcrições de pesquisa.
mem
Uma história de trabalho em um espaço tridimensional de Pesquisa Narrativa com Karen
Whelan
Há cinco pessoas reunidas ao redor da mesa em um dia de inverno frio, claro, cheio de raios de sol. E sábado e a luz passa pela janela. O ceu de um azul inacreditável, mas eles nem percebem. Este é um de seus sa
92 D .
Jean Clandinin | E Michael Connely
bados de pesquisa. Chuck e Annie dirigiram de Calgary para encontrar-se com Janice, Karen e Jean para discutirem e partilharem suas pesquisas. 0 toca-fitas roda tranquilamente no meio da mesa. Estão envolvidos em sua conversa, mesmo estando sentados há várias horas. Eles sao
parte de um grupo de pesquisa em andamento
-
professo
res, diretores e formadores de professores - que estão tentando entender
seus lugares em sua paisagem do conhecimento profissional sobre o qual vivem. Ao que segue, Jean partilha o fragmento de uma transcrição feita de
uma conversa (coletada pelo toca-fitas), na qual Karen Whelan fala: Acho que, às vezes, quando você tem um sentimento forte sobre as coisas,
então isso marginaliza você. Eu me lembro do primeiro ano com aquele diretor. Eu nme irritei discutindo com ele por causa desses relatórios porque ele queria que toda criança fosse avaliada da mesma maneira. Como a gente vai dizer, entende, que uma criança em sua classe está operando no nível um, e uma criança está operando no nível trs
numa classe de nível três.
A gente vai avaliá-las no mesmo, a gente vai, a gente sempre vai registrar
insupara a criança operando no nível um como insuficiente, insuficiente, ficiente porque eles não estão trabalhando no nível da nota, então eles es tão sempre por baixo, e eu quero dizer com isso que me lembro, eu estava histérica porque ele pensava desse jeito. Como se pode sempre classificar uma criança como repetente? E quando eu me aborrecia com essas coisas, minha tendência era ficar muito envolvida com isso. Nessas horas meus
olhos se enchem de lágrimas e eu quase não acredito, como isso pode estar acontecendo? [conversa do grup0, 18 de janeiro de 1997]
A conversa continua, ao intercalarem suas memórias de infância, suas
histórias de alunos sobre
lembranças
de salas de aula,
salas de aula, de professores sobre lembranças de
Crições
dos
outra de
um
projetos
deles, de
ca-fitas continua
a
pesquisa em andamento, a dos dados que seus passados,
de
gravar
suas conver'sas,
algumas de partilhar documentos da direção da escola relaçoes
e
o
suas
partilhar
história de
histórias
das trans-
chama
um
haviam coletado. O to-
algumas das memórias de
textos de campo de
pesquisa, tais
suas
como
transcrições de grupos de pesquisa. são feitas e, alguns meses depois, Jean as O dia acaba, transcrições
está estudando. Ela
as
estuda
e
em sua mesa
de trabalho, lendo-as
e
relen
ela recorda do que se lembrava pendo-as, parando nesta passagem, pois mas não há registro a transcTiçao para isso, Sando naquele dia. Ela procura
Pesquis.a uanativa
93
de que ela havia dito tais
ler
palavras. Ela pára de
e
começa
a
escrever.
Eis
o que esCreveu:
No meio de uma reunião de projeto, discutindo transcrições de conversas com os participantese notas de campo de reuniões da escola, uma história minha muito antiga vem à minha mente. Recordo-me de uma sala de aula de
minha infäncia: do cheiro de cera do chão, do fluido Gestetner, das luvas de là molhadas e dos cachecóis. Recordo-me do som das carteiras se arrastando no chão duro de madeira e da voz dela, enquanto soletrava palavras em voz alta. 0 nó de ansiedade aperta meu estômago, um sentimento trazido pelas discussões das experiências das crianças de receberem notas de forma padronizada em seus boletins. Os cheiros, os sons, as visôes, os sentimentos criam uma fotografia e uma história vem rapidamente à minha mente.
Jean é uma criança na sala de aula, uma classe do início dos anos 1950 numa velha escola de tijolos situada na pequena cidade para a qual ela era levada de ônibus todo dia. Donnie e Daryl, dois rapazes, íam no mesmo onibus que ela. Eles mandavam no ônibus da escola e sempre sentavam no fundo. Mas quando entravam na escola, vinham para a sala de aula de Jean, quarto ano. E é de dentro dessa sala que ela relembra o dia
daquela prova de soletrar. Sentada à sua mesa na universidade, lendo a transcrição, Jean recorda de si
como
criança naquela escola,
uma
criança fazendo
uma
prova.
Ela se lembra de uma professora alta parada no centro da sala, movendo-se entre as filas de carteiras. Ela está marchando? Seus saltos altos fazem
barulho quando tocam o chão? Ela para na carteira de Jean para observála escrevendo uma palavra? Ela para na carteira de Daryl? 0 Daryl é mesrapaz malvado? 0 Donnie faz
mo um e
têm
Daryl
quarto
ano,
quinze
anos e
a
prova? Jean
só estão matando
esperando completarem dezesseis para poderem legalmente
desistir da escola? Essas memórias vêm à bre as lembranças desse dia. Mais
o
lembra que Donnie tempo naquela classe de se
mente
de Jean
e
ela
escreve
so
tarde, ao
escrevermos este texto de pesquisa, pensamos sobre de espaço pesquisa. Naquele dia de janeiro quando conversavam, Karen levou os outros do grupo de pesquisa de volta no contava
o
sua
história. Karen descreveu, de
Gestetner feita
94
ao
é
o nome
próprio
cheiro do fluido usado
D.
Jean Clandinin | F.
de
sua
tempo enquanto perspectiva de narradora, a conversSa
fabricante de máquinas. Aqui, a referència e máquinas com estencil, do tipo mimeógrato.
um
nas
Michael
Connely
diretor. Ela descreveu a si própria rica. Ela se sentiu envolvida no encontro,
com seu
conversa
com o
vermelho, histelenmbrou-se. Ela descreveu suaa diretor, que queria todos os alunos com notas em rela rosto
com o
ção ao sistema de avaliação. Ela levouo grupo de volta àquele momento e os
lançou
ao
futuro
ao
fazer
conexäo entre momento e como ela agora vê a si mesma como marginalizada na paisagem onde o sistema de notas
aquele
a
avaliação padronizada é agora uma história aceita na escola. Ela os
e
situou
em um
lugar
-
a
escola
em um
sobre notas vieram de cima para
do diretor para Karen, como
centro urbano
-
onde
novas
políticas
baixo, retransmitidas da política de notas
professora.
Jean era, a princípio, uma ouvinte, mas a história de Karen a fez evocar vras
leu
memórias. Ela sabe que não falou,
seriam
as
mas,
se o
capturadas pela conversa transcrita.
transcrições que
lembrou que
tivesse
feito,
Foi somente
suas
pala-
quando
ela
história de Karen havia feito com que evocasse uma memória, que ela havia então anotado. Jean recordou se
a
os velhos tempos trazidos de volta, primeiro como resposta ao que Karen contava e,
subsequentemente, como leitura da transcrição.
Jean fez um percurso retrospectivo à sua sala de aula do passado e prospectivo à sua pesquisa atual e às questões do que significa ser um
pesquisador narrativo na paisagem do conhecimento profissional. Tudo isso ocorre em um lugar - seu lugar atual numa universidade, onde ela faz
pesquisa e escreve sobre seu trabalho com professores, e seu lugar antigo, onde ela
era uma
menina do campo educada
em uma
escola de
uma
pe-
quena cidade. Estes são fragmentos de histórias costurados na memória de Jean.
Quando criança, naquela sala de aula antiga, Jean não era uma pesquisadora narrativa. Não havia intenção de registrar notas daquelas experiências. Ela agora recria a narrativa por meio de relações de memória. Dada a distância temporal, espacial e corporal, ela conta a história a partir do agora: puxando o fio da história de uma professora, dois garotos, uma garotinha, uma sala de aula. Não há textos de campo, anotações detalhadas, fotografias ou conversas transcritas dos eventos naquela sala de aula. Nosso propósito ao dar esse exemplo é mostrar o uso dos termos que estruturam nosso espaço tridimensional de investigação narrativa. Iniciamos no presente, com um segmento de transcrição de uma reunião do grupo de investigação, em que Karen descreve um encontro de um ano antes com seu diretor. As palavras de Karen levam Jean de volta ao longo
da dimensão temporal de sua própria infäncia. Mas, ao deslizarmos re-
Pesquisa narrativa .95
trospectiva fixos
e
em um
praticado
aquelas
fica claro que nos mantemos S prospectivamente no tempo, onde um sistema de notas é lugar chamado escola, um lugar
e as
experiências das crianças são
distribuidas de
meio dos notas. Vamos introspectivamente, por
acordo
com
sentimentos in-
tensos de Karen, e extrospectivamente, em sua Conversa com o diretor
boletins obrigatórios e o sistema de notas. Jean que está descrevendo os também vai introspectivamente, para velhos sentimentos de ansiedade
gerados pela prova de soletrar e pelas histórias de colegas de classe, provas concretas, aos seus olhos de criança, do que acontece quando somos reprovados nos testes. O que parece se tornar aparente, a0 trabalharmos em noss0 espaço tridimensional, é que, como pesquisadores narrativos, não estamos sozinhos nesse espaço. Esse espaço envolve à nós e àqueles
com quem trabalhamos. A pesquisa narrativa é uma pesquisa relacional quando trabalhamos no campo, movendo-nos do campo para o texto do
campo, e do texto do campo para o texto da pesquisa.
Uma nota reflexiva Ao trabalharmos em nossos espaços tridimensionais como pesquisadores narrativos, o que se tornou claro para nós foi que, como pesquisa
dores, confrontamo-nos no passado, no presente e no futuro. 0 que queremos dizer com isso é que contamos histórias lembradas de nós mesmos, sobre épo cas antigas, assim como histórias atuais. Todas essas histórias fornecem roteiros possíveis para nossos futuros. Contar nossas próprias histórias no passado nos leva à possibili dade de recontagens. Vimos isso na história de Michael em suas relações com Ming Fang e Long Him. Vimos isso novamente na história de Jean com Karen e a turma de quarto ano de Jean. Não são apenas as histórias dos
participantes que säão recontadas por um pesquisador narrativo. Em nosso caso, são também as histórias dos pesquisadores (Michael e Jean) que são abertas para o pesquisar e o recontar. Como pesquisadores narrativos, partilhamos nossas escritas com
características de um trabalho em construção com comunidades respon sivas. Por comunidades responsivas, dizer queremos que pedimos aos ou tros que leiam nosso trabalhoe que respondam de maneira a auxiliar-nos outros sentidos que poderiam levar a outras lhamos este e recebemos, entre as a ver
capítulo
96
D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
recontagens.
respostas, algumas
Nós
part
surpreen
dentes para nós,
especial1mente
às histórias de Michael, Ming Fang e Long Him. Entre as respostas, havia uma que sugeria que Michael
era
racista
em seu
retrato de
com
Long
relação
Him. A resposta
parecia sugerir que
racismo estava aparente na linguagem estereotipada, como em cachimbo d'água, noiva por reembolso postal e exótico. Nessa resposta, noSsa linguagem foi tomada como representativa do ponto de vista dos contadores no presente. Nós retrabalhamos o texto para reforçar os liames narrativos entre
o
antes Essa
e o
agora.
resposta
fez parar
esco
que tínhamos Ihido intencionalmente a linguagem para representar, como ocorreriam nos
e
questionar, já
à nossa memória, as atitudes funcionando na paisagem da infância de Michael. Como contadores da história, nós deliberadamente encaixamos o que pensávamos que eram estereótipos culturais a atitudes insensíveis
disponíveis em sua paisagem de infância. Temos, agora, mais clareza em nosso pensamento para levarmos a resposta a sério. Por que retratamos
a infância de Michael da forma que o fizemos? Em parte, usamos a lin guagem que usamos para deixar claro que essas são nossas histórias. Nós realmente vivemos o que chamamos agora de estereótipos culturais. O contar sobre nós mesmos, o encontro de nós mesmos no passado por meio da pesquisa deixa claro que, como pesquisadores, nós, também, somos parte da atividade. Nós colaboramos para construir o mundo em que nos encontramos. Não somos meros pesquisadores objetivos, pesso as na estrada principal que estudam um mundo reduzido em qualidade do que nosso temperamento moral o conceberia, pessoas que estudam
um mundo que nós no
ajudamos a criar. Pelo contrário, somos cúmpli
ces do mundo que estudamos. Para estar nesse mundo, precisamos nos refazer, assim como oferecer à pesquisa compreensões que podem levar a um mundo melhor.
Poderíamos ter deixado a história de Michael de fora ou olhar superficialmente o que parecia menos que adequado para nossa atual visão
de mundo. Poderíamos ter criado um roteiro que sugerisse que o primeiro encontro de Michael com os sino-canadenses fosse com ing Fang, um roteiro que o retrataria como um sábio pesquisador do presente sem uma humilde narrativa passada. Seu lugar nesse roteiro não narrado é a Toronto dos dias de hoje, uma cidade que as Nações Unidas chamam de a cidade mais multicultural, um lugar do qual Michael poderia prontamente clamar insights sem comparações sobre assuntoss culturais. Mas esse roteiro tiraria Michael do mundo, como se ele nào fosse também parte do
Pesquisa narrativa 9 7
fenômeno, como se ele não fosse uma pessoa com viseiras de narrativa como qualquer outra. O que essa resposta elucidou para nós
que, como pesquisadores
narrativos, trabalhamos no espaço não só com nossos participantes, mas
também conosco mesmos. Trabalhar nesse espaço significa que nos tornamos visíveis com nossas próprias histórias vividas e contadas. As vezes, isso significa que nossas histórias sem nome e talvez secretas, vêm à luz assim como aquelas de nossos participantes. Esse confrontar de nós proprios em nosso passado narrativo torna-nos vulneráveis como pesqui-
sadores, pois transforma histórias secretas em histórias püblicas. Na pes uisa narrativa, é impossível (se não impossível, então obrigatoriamente decepcionante) como pesquisador ficar silencioso ou apresentar um self
perfeito, idealizado, investigativo, moralizante.
98 D.
Jean Clandinin | E. Michael Connely
CAPÍTULO 5
0 pesquisador entrando
campo de pesquisa caminhando por entre as histórias no
Enquanto trabalhamos no espaço tridimensional da pesquisa narrativa, aprendemos a olhar para nós mesmos como sempre no entremeio -
localizado
em
algum lugar ao longo das dimensões do tempo, do espaço
do pessoal e do social. Mas nos encontramos no entremeio também em outro sentido, isto é, encontramo-nos no meio de um conjunto de histórias as nossas e as de outras pessoas.
Introdução Neste capítulo, abordamos várias experiências de pesquisadores no entremeio. Examinamos as complexidades com as quais eles devem
negociar. Especificamente, exploramos aspectos-chave que pesquisadores devem aprender a fim de que possam trabalhar no seu campo de pesquisa - negociando relacionamentos, propósitos, transições e modos de ser útil.
Começando
no meio
do caminho
Como pesquisadores, vamos para cada novo campo de pesquisa vivendo nossas histórias. Nossos participantes também entram no campo
da pesquisa no meio do vivenciar das suas histórias. Suas vidas não começam
no
dia
que chegamos,
em
inem terminam
quando partimos. Suas
Silva (PPGEL, ILEEL - UFU), Dilma Maria de Mello Viviane Cabral Bengezen (ll.EEL - UFU)
Traduzido por: Clarissa Costa e LEEL, NEC
UFU)
e
Pesquisa narrativa
. 99
vidas continuam. Além disso, os espaços nos quais eles vivem e trabalham
am,
suas salas de aula, escolas e comunidades, também estão no meio de uma
porção de histórias quando nÓs, pesquisadores, chegamos. Suas institui. çoes e comunidades, suas paisagens no sentido mais amplo, também estão envolvidas no meio das histórias.
Geertz (1995) se sentiu assim em relação ao seu trabalho antropológico em Sefrou. Ele escreveu: "Uma entrada desta natureza no meio de
um intervalo de histórias, em que todas as coisas realmente importantes pareciam ter acontecido ontem e outras estavam prestes a acontecer, induz a uma sensação desconfortável de ter vindo tarde demais e chegado cedo demais, uma sensação que, no meu caso, nunca me deixou depois de tudo..sempre parecia não ser o momento certo, mas uma pausa entre
momentos certos" (p.4).
Kerby (1991), embora tenha outras questões em mente, acredita que, ao entrarmos no campo de pesquisa, carregamos conosco e encontramos
pré-narrativas vidas
com o
em
movimento, estruturadas narrativamente,
recontar ainda por vir durante a As histórias que trazemos como
cadas
pesquisa.
pesquisadores também estão mar-
pelas instituições onde trabalhamos, pelas narrativas construídas no contexto social do qual fazemos parte e pela paisagem na qual vivemos.
Começando no meio das histórias na
escola da Rua Baía
No
capítulo um, escrevemos sobre o trabalho que desenvolvemos com dois professores, Stephanie e Aileen. Nosso trabalho com eles foi parte de duas décadas de estudo sobre o conhecimento do professor. Trabalhamos em uma escola, a Escola da Rua Baía, por grande parte desse período. Aqui esta um exemplo de como a história da Escola da Rua Baía teve início para nós: Uma escola
conhecida
alunos
eram
frequentes,
motivo
era
nas no
redondezas por problemas raciais. Brigas
pátio,
de cunho racial. Havia parques. Era uma escola difícil. Uma escola
com
há
alguns
anos.
Todos
histórias de brigas
padrões inferiores. Ouvimos
nos
ae
pensavam que o corredores e nos
isso de
algumas pessoas a comunidade. Era o que nos diziam os funcionários de uma escola próxim segundo os quais, os pais preferiam colocar seus filhos
100 D. Jean Clandinin E. | Michael
Connely
em sua
escola po
esta oferecer um padrão de qualidade melhor. Por tudo isso, a Escola da Rua Baia foi nomeada uma escola projeto, por apresentar resultados tao
ruins. Muitos professores de lá queriam transferência para outras escolas. Uma escola para
se
enviar
cias de outras escolas.
crianças
Ouvimos
que não conseguem atender
que é
um
as
exigen
lugar para se enviar crianças que
tumultuam demais, que não obtêm êxitos ou que causam problemas demais para ficarem em outras escolas.
ESsas foram as histórias que vieram à nossa mente, como flashes,
quando chegamos pela primeira vez ao prédio do século dezenove, no centro de 1oronto, naquele primeiro dia em que fomos nos encontrar com
o diretor e alguns professores. Ao nos dirigirmos à sala de reuniões, pu
demos perceber a decadência do prédio e como os anos de negligência esses problemas pairavam no ar. Os sofás eram velhos, os corredores es curos e havia pouco sinal de trabalhos de alunos. Ainda assim, sentimos das pessoas com as quais conversávamos possibilidades e sentimentos de
esperança pela transformação daquela realidade. Era depois do horário de aula quando chegamos e pensamos que a escola estava senm crianças.
Contudo, depois do nosso encontro, fomos para o andar de cima para tomar um chá com um dos professores de Educação Especial e lá encontramos alguns alunos. Esses alunos, conforme anotamos em nossos textos de campo, estavam sendo cuidados pelo seu professor. Deixamos a escola naquele dia, cheios de esperança e acreditando sermos capazes de trabalhar com a escola no projeto de pesquisa, mas também com sentimentos de apreens o.
De que tipo de escola estávamos
nos tornando parte? Seríamos capazes de trabalhar naquela escola com a intensidade que a nossa pesquisa demandava? 0 que nós, duas pessoas da área rural de Alberta, estávamos fazendo ao tentar aprender sobre os problemas das crianças e dos professores da cidade? Apesar de nossas dúvidas, mesmo quando nos indagávamos sobre essas questões, sentimos viva a imaginação e a esperança do diretor e dos professores, que viram possibilidades das coisas serem diferentes. Havia dois sentidos de estarmos no entremeio
no entremeio de
um espaço de pesquisa narrativa tridimensional e no entremeio de um
fuído temporal, historiado. Esses dois sentidos se cruzavam e ajudavam a criar sentimentos mistos de apreensão e possibilidade de esperançca. Enquanto nos preparávamos para trabalhar na Escola da Rua Baía, naquela primeira reunião com o diretor e com os professores, não temíanmos tanto
Pesquisa narrativa
101
estar
lugar certo
no
no
momento errado,
mas era uma
questão de sermos apropriados para o lugar. Percebemos como as vidas das crianças daquela escola deveriam
diferentes da que tivemos em nossa infância, ao crescermos em vastas paisagens rurais com baixa população. Poderíamos nós. com toda nossa história acadmica em Chicago e Toronto, trabalharmos em sintonia junto aos estudantes, e com os quais professores pais iríamos lidar caso nosso projeto lá fosse desenvolvido? ser
Neste momento,
enquanto
escrevemos este
que fazemos dessas diferentes
mos: o
livro,
nos
questiona-
trajetórias narrativas? Precisamos
"deles" para realizar a pesquisa? Conseguiremos atravessar fronteiras do espaço narrativo para trabalhar com
ser um
as
significativamente
os
participantes? O que nós, pesquisadores narrativos, fazemos com as nossas
mais variadas
sas
questöes
dido
com as
Mas
Michael
e
experiências?
depois
da
nossa
reunião
na
escola,
es-
tivessem sido feitas a nós, provavelmente teríamos respondúvidas que apareceram em nossas anotações sobre a visita.
com0 nossas
histórias do
Long Him mostram,
biográficas
Se
capítulo quatro com Ming Fang He, ultrapassar as fronteiras de histórias auto-
é
possível e talvez até necessário, para a criação da compreensão narrativa. Segundo Bateson (1994), em oposição aos interesses de um pesquisador, os participantes às vezes delineiam seus próprios interesses e
às
mantêm distantes. E desta maneira que pode ocorrer ao explorarmos esta questão de diferentes histórias narrativas no campo de pesquisa. Podem aparecer, nas narrativas, observações sutis e também vezes os
pontos em comum. Ao longo dos anos, temos vivido a experiência desses
dois
tipos de narrativas, em momentos diferentes, com
na Escola da Rua Baía.
Curiosamente, talvez sintamos
pessoas diferentes
tipo de intimidade com o prédio compõem sua narrativa institucional. As lá pessoas entrarame saíram, como pudemos observar, e desse movimento surgiram essas narrativas. Mas o prédio da escola permanece e também a sua vizinhança, embora ambos continueme tenham suas próprias histórias. Na história em quadrinhos "For Better 0r For da escola
por
e com as
um
histórias que
mal), uma avóaparece, às vezes, tendo visões da
cido rondando-a e seu neto perguntando: "Por que sozinha, vovó?" Comparamos essa cena da
a
Worse"
figura
de
(Por um
bem
ou
avô fale-
senhora está falando
história à intimidade da qual ao prédio e à comunidade da escola. Parece-n0s impossível falarmos sobre a Escola da Rua Baía sem que nos venha à mente uma porção de memórias das pessoas e dos
falávamos que sentimos com relação
acontecimen
102
D.
Jean Clandinin |
E
Michael
Connely
tos. Essa talvez
seja, também, uma das coisas que os pesquisadores narra tivos fazem, pelo menos aqueles que estão nesse caminho há mais tempo. Seus canmpos de pesquisa - em nosso caso, a Escola da Rua Baía, as salas
de aula, a entrada, os pisos e toda a comunidade escolar - se transformam
em registros que guardamos na memória nos quais as pessoas e os eventos de hoje são recontados e escritos nos textos de pesquisa de amanha. Uma vez realizado esse processo, o espaço da pesquisa narrativa se abre em um
movimento flexível através do tempo, considerando
aspectos subjetivos quanto sociais. A escola e a comunidade, as pessoas que entram tanto
e saem, se relacionam de forma dinâmica, interativa. A comunidade faz parte da escola e a escola faz parte da comunidade. As histórias também
têm esse sentido. O dia de sua abertura, registrado com orgulho na torre da escola, não deve servir meramente para ser fotografado, mas assim como na cena em
que
deve servir
algo
como
o
avô aparece flutuando na história em quadrinhos, que fala para a escola e de suas condições naquele
momento. A escola e a comunidade, a paisagem em seu sentido mais am-
plo, ensinaram-nos que também nesses espaços há histórias narrativas. Entramos na escola no meio de uma série de pesquisas sobre conhecimento do professor e, ao desenvolvê-las, encontramos histórias narrati vas individuais. Entretanto, o apoio financeiro que nos trouxera à escola era uma bolsa do Instituto de Educação Nacional dos Estados Unidos (US.
National Institute of Education, NIE), para a reforma da escola. Nosso tópico era institucional, e nosso foco eram as pessoas. Nossa atenção com a questão institucional era secundária e por vezes se fazia presente quando
nos detínhamos sobre a história da escola e da comunidade. Apesar disso, a história da Escola da Rua Baía, naquele momento, estava sempre em nossas mentes. Ouvíamos histórias daquele lugar como sendo uma escola com "problemas raciais", com "baixos índices de qualidade", um lugar "para o envio de crianças que apresentavam muitos problemas. Contaram-nos histórias sobre o novo diretor da escola, as quais indicavam que o mesmo
era inovador e se importava com a comunidade. A escola, com seu novo diretor, conforme nos foi apresentado, era um local apropriado para o de senvolvimento da pesquisa que nos fora concedida. Através das histórias, especialmente das iniciais, pudem0s compreender tal fato. Mais tarde, en-
contramos conexões para as histórias da escola no século passado, perto do período da Confederação Canadense. Desde sua abertura, em 1877, histórias acerca da Escola da Rua Baía revelavam a presença de diversas
Pesquisa narrativa
103
populações imigrantes naquela instituição. Ao entrarmos no escritório do diretor para começarmos
nosso trabalho de
campo, sabiamos da presen-
histórias que contavam sobre aquela instituição, mas somente mais tarde foi que sentimos fortemente a continuidade e a interferência
ça de
dessas
histórias. Talvez
sejam necessários alguns esclarecimentos sobre
como
chegamos compreensão. Caso não estivéssemos "dentro" e "fora" do campo de pesquisa, mas apenas realizando o que Ray Rist (1980) chamou (no título de seu livro) de "etnografia as histórias essa
a
riam
representado
pesquisa.
Estar
no
relâmpago",
nunca te
mais do que um mero material para de campo pesquisa, dia após dia, ano
enfeitar textos de
após ano, trouxe
necessidade mister de se considerar a amplitude de narrativas na ação paisagem. Isso também é uma das coisas que os
tona
narrativos fazem no campo: eles lado dos participantes e chegam a visto
contado feitas, que moldam
ser
à
a
e
diretamente, a
suas conversas.
Estar
no
em
pesquisadores
estabelecem,
se
vivem
experimentar não
e
trabalham
somente
o
pode
que
também as coisas não ditas estrutura da narrativa das suas observações mas
ao
e
não
e
das
meio do caminho é
diferente para cada um Vinte
manifestou
anos acerca
depois, JoAnn Philion, citada da Escola da Rua
Balía,
torado naquele contexto: Nesta
primeira visita, eu
me
sinto
um
ao
capítulo três, assim se iniciar sua pesquisa de douno
tanto
apreensiva com relação à esco participante. Recordo-me que um assistente social me advertiu acerca do perigo na região Alexandra Park. Ao sairmos do metrô, Mick e eu caminhamos em uma rua cheia de papéis espalhados e outros escombros. As lojas daquela de parte Chinatown ainda não estavam As la
e ao meu
soas
dormiam sobre
abertas.
uma
grade
pes
pilhas de roupas, com montanhas de sacos plásticos ao lado delas. No frio do fim de novembro, muitas pessoas tossiam e ofegavam, levantavam suas mãos pedindo esmolas. Enquanto caem
minhávamos, de frutas
costas,
e
vimos pessoas varrendo as ruas, bitucas de cigarro para o meio fio.
segurando
104 D. Jean
a
mào de suas måes,
Clandinin | E. Michael Connely
empurrando papéis, cascas
Crianças com mochilas nas iam em direção à escola. Passamos
pela creche. Uma criança pequena de origem africana segurava uma criança de origem asiática enquanto brincavam juntas. A Escola da
as
mäos
de
Rua Baía está
localizada em uma das vizinhanças mais multiculturais que eu já conheci. Caminhamos por uma das principais ruas perto da escola. Os dois lados têm um número de lojas e pontos grande ciais, galerias de arte e comer lojas de raridades., refletindo a complexidade e a di versidade de Toronto. Há sinais em vietnamita, chinés, coreano, portugues, ingls e outros idiomas. Há propagandas de restaurantes das mais
culturas, viva
e
variadas
algumas que até mesmo desconhecia. Sente-se uma atmosfera excitante naquele lugar.
Tudo isso
eu
me
preservada,
faz muito
em
nostálgica pela cultura dos anos 60 que parece ser pequena parte, nessa vizinhança. Que lembrança da cul-
hippie eu cultivo neste dia? Eu me considero uma pessoa aberta, que aceita as diferenças, está que pronta para escutar a todos e a todas as pers-
tura
pectivas. Entendo
que isso
me
auxiliará
num
bom sentido
ao me
nesta pesquisa.
Mick está ele
e
se
recordando
Jean desenvolviam
acerca uma
de
como
pesquisa
estava
a
escola
engajar
nos anos em
lá. Ele nmenciona que
a
ampla
que cal-
çada por onde passávamos havia tomado o lugar de um estacionamento que lá existia. Ele aponta para o centro comunitário em que os estudantes
faziam aulas de natação. Percebo a existência de um sentido histórico e contínuo naquele lugar: Esta é a Escola da Rua Baía, uma escola na qual Mick e Jean passaram anos de suas vidas e desenvolveram grande parte de suas produções. Tenho um sentimento de pertencer a algo que é mais do que simplesmente meu projeto. Estou nervosa e apreensiva por estar em uma escola que significa tanto para Micke Jean. Talvez eu devesse ter escolhido um lugar que nào tivesse
ligação com eles. [1999, p. 55] O relato de JoAnn, acerca dos momentos que antecederam sua entrada no campo de pesquisa mostram, novamente, o quanto o pesquisa-
dor já está no entremeio de histórias quando chega no campo. Ela sente a força (ou talvez o peso, seria um termo melhor para caracterizar a passagem aqui apresentada) do longo percurso de pesquisa que está prestes
a iniciar. Para nós, a história da Escola da Rua Bala se revelava lentamente, imperceptivelmente ao longo do tempo, segundo nossas percepções.
JoAnn nao pôde se dar ao luxo de observá-la à distância, talvez nem mes mo perceberia as ininterruptas narrativas surgindo a cada momento. Com
Pesquisanarrativa .105
um de nós andando ao seu lado, comentando sobre como os estaciona mentos, as pessoas e os lugares tinham mudado, uma versão da história
narrativa daquele lugar precedeu sua reunião com o diretor:. Além disso JoAnn tinha lido nosso trabalho sobre a Escola da Rua Bala e conversado
conosco sobre ele bem antes da manhä de sua visita. Ela também estava apreensiva, mas seu sentimento não era igual ao de Geertz e nem ao nosso.
Sem dúvida alguma, de uma maneira particular, ela se questionava se seria capaz de manter-se no campo de pesquisa e escrever seus textos, que pos-
teriormente poderiam contribuir para as histórias da Escola da Rua Baía. Um forte senso de história narrativa traz consigo apreensões sobre esta, impulsionadas pela necessidade de marcar um lugar em uma narrativa no
futuro. Mas a narrativa pessoal de JoAnn não era igual à de Jean nem à de
Michael. Ela nasceu em uma área urbana, escolheu certas formas alternativas de vida, lecionou no exterior e interessou-se por multiculturalismo.
Sua vida pessoal e acadêmica se sustenta sob um paradigma de justiça e
igualdade. Suas observações acerca da vizinhança, enquanto caminhava pelas ruas, são observações ligadas à sua própria narrativa. Todas essas
questões podiam ser fortemente percebidas por ela naquela manh
em
que se encontraria com o diretor da escola, mais por uma motivação ad-
vinda de
sua
própria trajetória narrativa do que pela narrativa da Escola maneiras, em quaisquer contextos escolares, sua
da Rua Baía. De muitas
proposta funcionaria. Suas apreensões, até certo ponto, se relacionavam questão de reconhecer que sua história narrativa poderia, de um jeito ou de outro, interferir em seu interesse principal. Ao mesmo tempo, ha tensão porque ela sente que ser parte de um contexto e contribuir para a pesquisa, poderia fortalecer suas investigações. A e o à
texto uma
profundidade
possibilitados pela
narrativa da Escola da Rua Baía dimensão que exigiria de JoAnn toda uma vida para
con-
adicionariam
alcançar por ou
tros caminhos.
Nossas reflexões sobre a narrativa de JoAnn ressaltam cia de se reconhecer a
centralidade da experiência do
importänpesquisador do via
-
contar, recontar e reviver dessas experiências. Um dos pontos de par tida na pesquisa narrativa é a própria narrativa de ver,
sador, sua autobiografia. Esta tarefa
de
de
experiências do pesquicompor nossas próprias narrativas
experiências é central para pesquisa narrativa. A partir dela, dizemos que é a
possível compormos narrativas
dor começa
seu
106 D. Jean
trabalho.
introdutórias confornme
Clandinin | E. Michael Conmely
o
pesqulsa
Por exemplo, na introdução deste livro, cada um de nós apresen-
1 as narrativas introdutórias quue fundamentaram nosso trabalho em torno da temática do conhecimento do professor. Ao compormos nossas narrativas, nos movemos no espaço tridimensional, relembramos histó-
rias passadas que influenciam nossas perspectivas presentes através de um movimento flexível, que considera o subjetivo e o social e que os situ am em um dado contexto. Vemos um reflexo de narrativas desse tipo nos textos de campo da JoAnn, enquanto ela tentava obter experiència da sua experiência, construindo uma narrativa daquela experincia.
As narrati-
vas introdutórias, advindas do viver, contar, recontar e reviver de nossas experiencias pessoais nos ajudam a nos reconhecer no camp0 e nos aju
dam a compreender textos de pesquisa que escrevemos acerca de nossa
experiência num dado contexto. Com relação à pergunta apresentada no capítulo quatro: 0 que fazem os pesquisadores narrativos? - respondemos que eles tentam se fa-
miliarizar ao máximo com as tantas e multifacetadas narrativas presentes no campo de pesquisa. Eles delineiam possiveis encontros e ligações entre elas. É um processo complexo que nos deixa apreensivos, como mostrou o
trabalho de Geertz em Sefrou, o nosso e, mais tarde, o de JoAnn na Escola da Rua Baía. Apesar de tudo, também há esperança e expectativa em rela-
ção à pesquisa narrativa que se desenvolverá. Qualquer que seja o trajeto no sentido de
estar no
lugar
certo na
de histórias não contadas, de
estar
em u m a
-
hora errada, de
estar no meio
pré-narrativa - o pesquisador tem a percepção inevitável de ser incapaz
de lidar a
de
e também fluxo contínuo de histórias, que lhe circundam No momento e m que s e participantes no campo de pesquisa.
com o
seus
ilustra n o s s a chegada e mais tarde pesquisa, c o m o bem há o sentimento de expectativa de a de JoAnn n a Escola da Rua Baía, não a história que lá já m a s também por toda somente pelo que está por vir, do passado e surgem n u m espaço tridiexiste. As narrativas se deslocam chamamos campo de pesquisa. mensional específico, que
chega
ao campo
Vivendo, contando,
recontando e
revivendo histórias
já havíamos dito que (Connelly; Clandinin, 1990) uma nova histósignificava o começo de projeto de pesquisa
Anteriormente niciar
um
Pesquis.a narrativa
107
ria. Pensar tuar
experiência
a
como
pesquisa
em uma
Dewey,
de
em
pesquisa
termos narrativos
historiada
como
em
nos
permite concei
vårios
níveis. Assim
interesse principal nas experiëncias é o crescimento e a na transformação história de vida que nós, pesquisadores, e participantes enredamos. Por isso, tão difícil quanto pode ser contarnossos uma história, mais difícil ainda é a tarefa igualmente importante, de nosso
recontar
histórias que permitem desenvolvimento e mudança. Desse modo, podemos pensar que, na
experiências vividas, ver e
recontar de
mente como
há
-
processo reflexivo entre o viver, contar, revihistória de vida. Assim como enfatizamos
uma
nossas
anterior
na
Escola da Rua Baía, nós
no
viver
próprias, de nossos participantes e
pesquisa que compartilhamos com todos. Quando iniciamos o trabalho junto aos
Rua
Baía, começamos ento a contare viver campo de pesquisa, vivemos sas
experièncias
ticipantes
de
recontaram
e
histórias,
e as
de narrativas de
um
quando falávamos de nosso trabalho pesquisadores já estávamos engajados
histórias de
construção
as
modificamos
pesquisa
na
reviveram
ao
contar de nossas das nossas questões e
participantes
na
Escola da
histórias. Inseridos no contamos histórias advindas desnovas
recontá-las e ao revivê-las. Os partambém viveram, contaram,
Escola da Rua Baía
suas
histórias.
0 que fazemos agora que estamos no campo de pesquisa
Quando os pesquisadores entram no
campo de pesquisa, eles rimentam mudanças e expe transformações, constantemente valiando e mantendo negociando, rea flexibilidade e abertura para
sempre em transformação.
uma
paisagem que esta
Negociando relacionamentos Logo após mos a
frequentar
trabalhava com
com
Stephanie,
nossa a
reunião com o diretor Escola da Rua Baía três
Susan, uma
uma
e
os
vezes
professora-bibliotecária, da
professora
professores, pas el Michae
por semana. na
biblioteca e jea
primeira série, em sua Instalam0-nos para a "longa jornada", trabalhando junto aos 108
D.
Jean Clandinin |
E.
Michael Connely
sala de
nossos
au P:
cipantes, tentand0 ajudar da maneira que podíamos e tentando manter o foco
no
que
No
iníci0,
ções frágeis. quisado dias
se
nos unia os
naquele momento.
princípios
As vezes, tal
de
colaboração
situação perdura
ao
são incertos
longo
da
e as
combina-
pesquisa
e o
pes
pode se sentir como um invasor. Em nosso caso, os primeiros desenrolaram mais
um carro numa manh
ou menos como se
tivéssemos tentando ligar
fria e houvesse apenas força suficiente para ligar o
motor. Talvez ele pudesse pegar ou no. Houve ocasiões
distância entre as narrativas de um pes quisadore de seu participante parecia intransponível. Em sua dissertação, Siaka Kroma (Kroma, 1983) fez um relato acerca de sua relação com um em
que
a
participante no início de uma pesquisa narrativa. Eles não entravam em
acordo. Assim como a metáfora do carro que usamos, o motor não pegou e o participante e Siaka decidiram por não trabalharem juntos. Com relação ao nosso trabalho na Escola da Rua Baía, o motor pegou. Ao longo do mesmo, em nossa experiência no campo de pesquisa,
entendemos que a relação pesquisador-participante é frágil, que está sempre sujeita a ser negociada. Após três meses do início do trabalho de Jean na sala de aula de Stephanie, o período escolar terminou em junho. Jean e Stephanie entraram de férias e concordaram que Jean voltaria no fim de agosto para ajudá-la na organização da sala para a volta às aulas.
Assim que Jean chegou, Stephanie contou, de forma hesitante, que esteve prestes a ligar para que ela não retornasse mais. Segundo ela, seria dificil ter Jean em sala no início de setembro. Após horas de conversa, Jean e Stephanie renegociaram suas relações de trabalho e a ideia de prosseguirem juntas prevaleceu. Apesar de nem todas as relações de negociação serem tão dramáticas como a que experimentaram Jean e Stephanie, o processo de negociação na relação de pesquisa estâ sempre acontecendo
ao longo da mesma.
Além disso, apesar de o pesquisador desenvolver uma relação ínti ma com as pessoas e lugares na paisagem em que se insere, há sempre a
percepção de
que
a
inter-relação
de diferentes narrativas será
uma cons-
tante nesta paisagem: trabalhamos en diferentes lugares, temos objetivos diferentes e formas diferentes de nos concebermos pesquisadores e par-
ticipantes.
consigo um sentimento do tempo de dumelancólico, saudoso, advindo da constante lembrança sentimento quando se mudou para o açao desta. Jean experimentou este Bons
relacionamentos de
pesquisa
trazem
Pesquisa narrativa 109
oeste canadense e Michael alguns anos atrás, quando a concessão de sua
pesquisa acabou. JoAnn sente tal tristeza agora ao escrever sua disserta ção, sem saber ao certo onde estará daqui a um ano, se talvez estará em uma outra cidade ou em outro país, longe da Escola da Rua Baía.
Negociando propósitos Como sugerimos acima, uma das coisas que os pesquisadores nar-
rativos fazem é negociar continuamente seus relacionamentos. Um procedimento de pesquisa racional afirmaria que a negociação é um passo que se inicia na entrada e termina uma vez que o pesquisador se insere no campo de pesquisa. Não é assim para os pesquisadores narrativos, como o exemplo com Jean e Stephanie torna claro. Como comumente dizemos, os
relacionamentos precisam ser trabalhados. Parte da negociação é que nos expliquemos. Continuamente nos
pegávamos explicando
que estávamos tentando fazer. Isso
o
era
especial-
mente verdade para Michael, já que Susan perguntava continuamente se ele estava conseguindo o ele que queria e se "estava OK". Uma pessoa logo descobre (se prestar muita atenção a essas explicações) que nunca é bem claro naquilo que pretende fazer Uma das lições importantes a serem res
narrativos é que eles
no
campo de
pesquisa,
precisam
para
aprendidas pelos pesquisadolugares, não apenas
encontrar muitos
explicarem
aos
outros
o
que eles estão fa-
zendo. Nós os encorajamos a estabelecerem comunidades receber retornos do que vem
prestar contas do seu tempo. A medida que esse procedimento
delineados serão
seus
Um dos sos
que possam
fazendo, lugares contínuos em que eles pos trabalho em desenvolvimento com o passar do
sam
bem
em
de
serem
explicativo ocorre, mais claros e
propósitos.
princípios metodolóógicos que nos fora ensinado em curanálise quantitativa se relacionava à especificação de hipóteses a testadas na pesquisa. Isto não funciona assim na pesquisa narra-
tiva. Os
propósitos e aquilo que uma pessoa está enigmático mudam no desenrolar da pesquisa. Issoexplorando e considera
acontece dia após dia, longo de todo o trajeto em que as narrativas sao construídas, os questionamentos são substituídose os mudam. Nossa permissão (NIE), que nos levou à Escolapropósitos da Rua Baía, foi estruturada com o objetivo de que semana
após semana e
ao
implementássemos politicas concer
110
D.
Jean Clandinin |
E.
Michael
Connely
nentes ao relacionamento racial. Contudo, enquanto trabalhávamos na Escola da Rua Baia, nosso puzzle se alterou assim que nos interessamoos
pela intersecção que havia entre o quadro da política de relações raciais da Educação e as políticas interioranas e da linguagem. Nosso interesse em retornar à Escola da Rua Baía com um novo projeto, diferente de nos-
sa primeira produção, guiado por novas concepções de reforma escolar e de interpretação das diferentes construções narrativas, é um exemplo das mudanças que ocorrem ao longo de todo o processo de pesquisa. Uma questão que surge das experiências discutidas acima se relaciona ao fato de que não somente nossas explicações acerca do que que-
remos desenvolver, mas tambémo trabalho junto aos participantes pode contribuir para a construção de caminhos interessantes e possíveis de serem
percorridos ao longo do
campo de pesquisa. Jean começou seu trabalho com Stephanie pensando em termos de
imagens como uma expressão do conhecimento prático pessoal do profes sor. Ela não antecipou, no início, que sentiria os ritmos e ciclos do trabalho na vida e na prática da Stephanie e que isso seria importante para pensar
através das dimensões do conhecimento prático pessoal. À medida que Jean e Stephanie trabalhavam juntas na sala de aula, Jean percebia os ritmos de vida que ali todos vivenciavam. Essa percepção, bem como a disposição para o diálogo aberto com Stephanie, no qual ambas podiam se expressar mutuamente, foram aspectos que fizeram o diferencial nesta relação. Durante o curso da pesquisa, Stephanie desenvolveu uma nova concepção de si própria; ela recontou sua história. Em parte, isto tinha a ver com a história da escola que estava sendo recontada a partir do trabalho do novo diretor, Phill, que se empenhava nesse sentido, e também em par-
tes à história docente de Stephanie, que estava sendo delineada nas nar rativas de Jean, narrativas essas compartilhadas com Stephanie para que a mesma pudesse lê-las e comentá-las.
Negociando transições Talvez as transições mais dramáticas sejam os inícios e os términos das pesquisas narrativas. Acima, descrevemos acerca de negociações iniciais. Entretanto, ao nos movermos do cannpo de pesquisa para os tex tos de campo e posteriormente para os textos de pesquisa, precisamos
hegociar muitas transições
em nosso
percurso. JoAnn, atualmente
no seu
Pesquisa narrativa
111
trabalho
Escola da Rua Baía, está tendo que negociar com seus particj. o de número dias em ela irá à uma vez pantes escola, que que ela tem que fazer as transições de seus textos de campo para textos de pesquisa. Embora altamente variável de pessoa para pessoa e de lugar para lugar, pesquisas narrativas terminam, pelo menos formalmente. Relatórios são escritos, dissertações escritas, as pessoas se mudam, o para
na
pesquisa
a
financiamento
acaba.
Negociar
esta
transição
final é também parte do
pesquisador narrativo faz no relacionamento no campo de pesquisa. E de suma importância para a validade e a integridade do trabalh0 que os pesquisadores não se retirem do campo de pesquisa simplesmente quando "seu tempo chegar". Evidentemente, quando a intimidade tiver sido estabelecida, esse tipo de ruptura é difícil de imaginar; na verdade, o que
um
pesquisador vai embora de forma relutante.
Não são somente os participantes do campo de pesquisa que cor rem o risco de se sentirem abandonados. Durante o último ano de Phil na Escola da Rua Baía, Michael trabalhou com ele e demais funcionários da escola na preparação de um relatório sobre o Centro de Aprendizagem da Integrada escola e na produção de três folhetos que seriam entregues para os funcionários, informando-lhes sobre a filosofia e o uso de compu
tadores da escola.
Os materiais foram outono. Michael
esboçados durante o verão e enviados à escola no quase perdeu o contato com a escola naquele outono, mas sabe que os folhetos receberam pouca atenção.
Isto causou
Michael certo história da escola já estava sendo truída com a vinda de um cons novo diretor. Não havia relacionamento de trabalho algum entre Michael e o novo diretor e, portanto, nenhuma razão para pensar que os folhetos seriam usados. Além disso, eles não já tinham mais conhecimento das novas narrativas se que cruzavam naquele momento.
desconforto. Entretanto,
a
uma nova
Negociando um modo de ser útil Durante
o
período
inicial de
pesquisa, quando o motor ainda decontexto de Pode ser que no início pesquisa é importante. pareça que não pertençamos àquele lugar. Uma das maiores questões levantadas por críticos da pesquisa narrativa frequen temente se relaciona ao mora
a
pegar, encontrar
participantes utilizam.
112 D. Jean Clandinin
um
lugar
poder
no
co-participativo de voz que pesquisador e
| E. Michael Connely
Eles questionam que a voz do participante é ouvida, roubada e publicada como sendo do pesquisador ou que a voz do pesquisador se sobreponha à dos participantes, de forma que quando estes últimos parecem estar talando
algo,
na
verdade é
a voz
nesse discurso. Estas são, senm dúvida, quisadores narrativos devem se ater.
Mas zer com
do
pesquisador que predomina
questões importantes as quais pes-
experiência de estar no campo de pesquisa pode às vezes fa que o pesquisador também enfrente problemas. Pode ocorrer que a
- quando o foco da pesquisa está mais relacionado à observação do que à
inter-relação das narrativas ou co-participação - o pesquisador narrativo se sinta silenciado e sem voz frente aos assuntos concernentes aos seus interesses de pesquisa.
Alguns ano0s atrás, Hedy Bach, uma estudante de mestrado, e Jean estavam engajadas em uma série de discussões mensais com garotas de onze a doze anos. Jean se encontrava com cada uma das garotas separadamente para uma conversa de quarenta e cinco a sessenta minutos, todo mes. Frequentemente, uma das garotas contava uma história de casa ou da escola que se assemelhava a algumas de Jean. Apesar de Jean também querer expor suas próprias histórias como professora, como me,
como
garota, ela se continha. Ela sentia que seu trabalho era gravar fielmente o
que suas participantes diziam. Apesar de perceber em seus textos de pes quisa que sua voz poderia também estar presente, ao se inserir no campo de pesquisa, Jean se sentiu silenciada, sem voz. Há variações sobre o tema de pesquisadores narrativos se sentirem silenciados. Karen Whelan e Janice Huber são duas professoras-pesquisadoras engajadas em uma pesquisa narrativa com um grupo de administradores. Elas frequentemente comentavam que num primeiro momento elas ficaram em silêncio, sentindo que elas poderiam não se engajar completamente nas conversas porque entendiam muito pouco das narrativas de experiência dos administradores. Agora, ao escreverem seus textos de pesquisa, elas veem a mistura gradual de vozes, delas e dos participantes, como uma espécie de fronteira que foi ultrapassada, e que há uma interli-
gação de narrativas de experiência. Vicki Fenton se juntou à Escola da Rua Baía no outono de 1997
para sua dissertação. As notas de campo iniciais de Vicki parecem revelar seu sentimento de que há muito que aprender sobre a paisagem da
escola, da comunidade e da sala de aula. Em uma de suas notas, ela escreVe, "A escola ainda parece como um labirinto para mim e minha mente
Pesquisa narrativa
113
está sobrecarregada de informação" (notas de camp0, 18 de setembro
de 1997). Para ela, parece que tudo precisa ser descoberto. E quem é ela neste labirinto?
Após ser apresentada a outro professor por um de seus participantes, Vicki escreveu na margem de suas notas de campo, "Estou com um desconfortável sentimento de ser parte das histórias das pessoas, mas não escrevendo realmente, eu mesma, nenhuma delas (notas de campo,
23 de setembro de 1997). Mais tarde, em uma reunião de projeto, Vicki relatou para o grupo que ela havia se sentido bem em uma de suas visitas à escola
na semana
anterior porque
sua
participante havia pedido para
que ela trabalhasse com um grupo de crianças. Vicki disse que estava se
sentindo desconfortável
inútil, sentada em uma cadeira enquanto sua participante dava as aulas. Michael lembra que sua experiência com Susan
foi de de
e
alguma forma semelhante à de Vicki.
alguma forma,
A
um mero
Ele também sempre
se
sentiu,
visitante.
construção da intimidade entre
pesquisador e participante O
sentimento
de não
mentou, está relacionado às que ela tinha. Numa
pertencer ao novo contexto, suas
dúvidas
e aos
perspectiva de pesquisa
que Vicki experiexcessos de informações
em
que temos os extremnos hipóteses-testes, pesquisadores planejam estratégias experimentais, criam seus próprios campos de pesquisa com variáveis de acordo hipóteses pensadas. 0 pesquisadormanipulam é tipo de pesquisa. responsável por tudo, neste e
as
Diferentes graus tipos pesquisa, das de
rativa, ses
o
que
de
responsabilidades estão envolvidos
quantitativas às qualitativas. Mas na
pesquisador tende a
podem ser testadas ou
escapar
ao
papel
de
nos
vários
pesquisa nar
controlador de
hipóte provadas. o Aqui, de participa uma vida pesquisador entra na pal os em profissional andamento. Uma coisa que pesquisadores narrativos fazem é eles estiverem familiarizados com a aprender rapidamente que mesmo se paisagem talvez até os membros da paisagem, como os professores uma grande quantidade de desenvolvendo uma tese podem estar ha aspectos que surgem em nos relacionamentos e acontecimentos diferentes momentos nesta tomados por certos. sagem
e
-
-
paisagem que não devem ser
114 D. Jean
Clandinin | E. Michael Connely
Imagine, por um momento, que alguém não esteja familiarizado com a rotina de escolas. Como devem parecer estranhos os sinais, a alga
zarra na hora do recreio, os grupos de estudantes indo para a biblioteca ou Dara a ginástica, a espera em volta do escritório do diretor, e os avisos quue interrompem e que todos param para ouvir. Mas para alguém que conhe-
ce a vida característica daquela escola, nada disso é surpreendente. Esses acontecimentos são construídos dentro da vida escolar diária. A pessoa que vem de fora está sempre perguntando, O que é aquilo?
em referência a um nome que pode ser um centro comunitário, um profes sor ou uma politica da escola, pois é tudo que um pesquisador conhece,e Quem é aquele? quando um riso contido é obtido enquanto um professor conversa com outro e menciona um acontecimento de um ano atrás.
Realmente há o sentimento, como apontou Geertz, de que chegamos tarde demais, uma vez que tudo que ouvimos as pessoas notarem
ou comentarem já aconteceu, e que isso faz parte de suas histórias e con versas. Nas notas de campo de 18 de setembro, Vicki escreveu: "Estou mne sentindo completamente perdida, me esqueço dos nomes das ruas. Terei que perguntar-lhe mais tarde. Minha mente está cheia de informações. Há tanto para se ver e ouvir e lembrar". A fim de fazer parte das histórias construídas ao longo da pesquisa, de se tornar parte de uma paisagem, o pesquisador precisa se inserir nesta por um bom tempo, prestar atenção e questionar as situaçóes para
compreender os eventos e histórias, as muitas narrativas que se inter-re lacionam a cada instante e que apontam, frente a seu olhar ainda inexpe-
riente, caminhos na compreensão de mistérios. A intimidade, semelhante à que sentimos com relação à Escola da
Rua Baía, é parcialmente explicada por termos conseguido alguma cone xão do "tomar por certo" na vida diária. Pode ser que digam que a intimidade de um pesquisador narrativo é ser capaz de entrar em consenso com seus participantes.
Vivendo a vida na paisagem A perspectiva narrativa se tornou tão identificada com histórias, em um senso único e particular sobre elas
frequentemente tratadas
como passíveis de serem escolhidas, ouvidas, contadas, e geralmente rola-
das a volta - no mesmo movimento como se pode rolar bolinhas de gude-
Pesquisa narrativa 115
que a pesquisa narrativa tem, na visão de alguns críticos, ficado associada à gravação e ao ato de contar histórias. Uma das críticas à narrativa vai ainda mais longe e, a0 assegurar que as histórias são as unidades de aná lise desta, argumentam que a pesquisa narrativa é essencialmente uma forma linguística de pesquisa. Pesquisadores narrativos, de acordo com esta crítica, gravam histórias. Se eu sou um pesquisador narrativo interes-
sado na área de enfermagem, então eu devo ouvir as histórias de vida dos estagiários na enfermaria. Portanto, os gravadores são importantes neste momento, porque as histórias são o alvo; precisamos obtê-las bem; e se
análises linguísticas podem nos dizer sobre a construção de histórias, en tão registrá-las integralmente, usando o gravador, é de suma importância. Mas, as histórias de pesquisadores narrativos, já contadas, mostram que a pesquisa narrativa é muito mais do que "procurar e ouvir histórias" A pesquisa narrativa vivida no campo de pesquisa é uma forma de viver, é um modo de vida. Porém, certamente, há pesquisas narrativas bem reconhecidas e publicadas em que o pesquisador optou por fazer uso do método de gravação das entrevistas realizadas. Isso pode ser apropriado para os propósitos deles, mas não podemos associar tal procedimento de pesquisa com toda a abordagem da pesquisa narrativa. Mais importante, seria um erro pensar que esses pesquisadores fazem o mesmo que os pesquisadores narrativos fazem quanto estão inseridos no campo de pese
quisa, e ainda enquanto trabalham na negociação de suas relações com seus participantes de pesquisa. A pesquisa narrativa, desse ponto de vista,
é uma tentativa de fazer sentido da vida como vivida. Para começar, ela
tenta descobrir aquilo que é tomado por certo. E quando esses aspectos também começam a ser tomados por certos pelo pesquisador, então o pes quisador pode começar a participar e ver as coisas que funcionaram, por exemplo, na enfermaria do hospital, na sala de aula, na organização. Alguém pode observar um professor na sala de aula e registrar o
número de participações dos alunos, bem como do professor, ou até mes-
mo algum outro tipo sofisticado de participação, o qual Ihe pareçainteres sante. Mas o pesquisador narrativo dificilmente sabe o que fazer com tais
registros sem conhecer as narrativas que se inter-relacionam no campo
de pesquisa. Essas teias narrativas são complexas e difíceis de serem de-
sembaraçadas. Consideramos novamente os ritmos e ciclos no trabalho da Jean com Stephanie. Sem uma compreensão do modo como Stephanie traba Ihou todoo ano, considerando as estaçõese osferiados, se poderia cons
116
D.Jean Clandinin | E Michael Connely
truir um sentido muito pequeno diante dos eventos diários que ocorre ram. Claro que, estudos realizados num dado momento e acerca de uma dada questão são produzidos e publicados: como, por exemplo, um estudo
do uso de termos cientificos da Biologia feito por Stephanie em setembro e outubro, uma linguagem religiosa-simbólica usada em dezembro e no mêés
precedente à påscoa, e assim por diante. Mas é o ritmo do ano inteiro que ajudou o trabalho de Jean com Stephanie a fazer sentido e permitiu que Jean escrevesse sobre as imagens do lar e do currículo como um veículo
para celebrar a diferença cultural entre as crianças. Pesquisadores narra tivos também sabem que o óbvio nunca é esgotado e que mistérios estäão sempre ligados também ao que nos parece óbvio. Stephanie é parcialmen te quem ela é como professora, pela posição que está em sua carreira, em sua vida religiosa e em sua vida particular. Essas e outras teias narrativas importantes para construir sentido estão sempre um passo atrás quando se está no agora informadamente trabalhando.
O que isso representa para o pesquisador narrativo é que histórias, pelo menos as histórias específicas às quais eles podem ter acesso por meio das negociações, embora não menos importantes, podem desempenhar um papel relativamente menor quando o pesquisador narrativo escreve suas
notas de campo sobre a vida em senso amplo numa dada paisagem. 0 pes quisador narrativo pode notar histórias, mas mais frequentemente registra ações e fazeres, além de acontecimentos, tudo aquilo que constitui expressões narrativas. Isso é o objeto da pesquisa narrativa para o pesquisador preocupado com o distanciamento e a intimidade na pesquisa.
Pesquisanarrativa
117
CAPÍTULO 6
Do camp0 para os textos de campo
estando no lugar das histórias
frase vivenciando a experiênciaé um lembrete de que para nós a pesquisa narrativa destina-se ao entendimento e à composição de sentidos da experiência. Esta é a linha base do "por que" para a pesquisa em ciências sociais. Por que usar a pesquisa narrativa? Porque a pesquisa narrativa é um caminho, acreditamos que o melhor, para pensar sobre a
experiência.
Introdução Este capítulo apresenta alguns desafios que os pesquisadores narrativos costumam encontrar no campo. Como lidar com o distanciamento
ea proximidade, por exemplo? Para nós, a composição cuidadosa dos textos de campo ajudaa conhecer muitos desses desafios. Os textos de campo retrospectiva e prospectivamente em um completo envolvimento com os participantes e também distanciamen-
duxiliam
o
pesquisador
a
mover-se
to deles. Investigamos como os textos de campo ajudam a memória a su-
prir as falhas,
as nuances e as
complexidades
da
paisagenme das histórias
UFU), Dilma Maria de Angela Márcia da Silva (PPGEL/1LEEL Kunh "Teixeira (PPGEL/ILEEL (ILEEL, NEC UFU) e Lara Brenda Campos -
Traduzido
Mello UFU)
por:
-
-
Pesquisa narrativa 1 1 9
vividas. Discutimos o lugar dos textos de campo no tratamento como re. re-
lativismo bem como no auxílio ao pesquisador para que ele olhe tanto o pessoal quanto o social. Final1mente, o capítulo discute a complexidade (e
a profundidade) trazida pela composição dos textos de campo no espaço
tridimensional de pesquisa. Quando pesquisadores narrativos estão em campo, eles nunca estão ali como mentes (sem corpo) registradoras da experiência de
alguém. Eles também estão vivenciando uma experiência, qual seja: a experiência da pesquisa que envolve a experiência que eles desejam
investigar. Se o pesquisador está investigando sobre a vida numa ala de hospital, ele torna-se parte da vida desse lugar, e, consequentemente, da experiência que está sendo estudada.
A experiência da narrativa
do pesquisador é sempre dual, é sempre o pesquisador vivenciando a
experiência e também sendo parte da própria experiência. No capítulo quatro, ilustramos algo nesse sentido com a história de Michael com Ming Fang e Long Him. Ao se engajar em sua pesquisa com Ming Fang,
Michael foi levado de volta ao seu tempo de infânciae reconheceu
algo
de sua própria história experiencial. O estudo da formação de identidade
na
vida de
Ming Fang foi vivenciado por Michael
como parte de sua própria vida. Como notamos anteriormente, fazemos parte do desfile
que presumimos estudar.
Apaixonando-se, escorregando para observação fria Existem tensões e dilemas ao estudar o desfile do qual parte. Existe a preocupação de que se os pesquisadores não volvem completamente com a
somos se en-
experiência
estudada jamais poderão vidas em exploração. Mas, também
compreender, verdadeiramente, as
acredita-se que esse envolvimento completo pode gerar objetividade. Tornar-se completamente envolvido
quisador pressuponha as mentose tenha
poderia sugerir
mesmas
as mesmas
que
o
coisas, adote
120.
D.
perda
da
implica
que
mesmos
posiciona
o
pes-
intenções práticas que os participantes. Isto
pesquisador
irá
narrativos trabalhados uma agenda servadora, dizem os críticos. Estas tensões de
os
a
como
simplesmente
de
vivenciar
Jean Clandinin | F. Michael Connely
a
insistir
em
pesquisa conformista
experiência
em uma
e
fios
col
pesquisa
soluções são oferecidas, por exemplo, a Edel ([1959] 1984, p.29), que escreve que um biógrafo nunca de-
narrativa são de Leon
recorrentes. Várias
veria se apaixonar por seu objeto de estudo. Ele faz esta prescrição a favor do distanciamento, no sentido de manter a objetividade. Inevitavelmente, pesquisadores narrativos experimentam esta ten-
são, poisa pesquisa narrativa é relacional. Eles devem tornar-se completamente envolvidos, devem "apaixonar-se" por seus participantes, e devem
também dar um passo para trás e olhar suas próprias histórias na pesquisa, as
histórias dos
participantes,
assim
como a
mais
ampla paisagem
a
qual todos eles vivenciam. Esta tensão de mover-se retrospectiva e prospectivamente entre o
completo envolvimentoe o distanciamento é, como em nossas relações do cotidiano, a responsabilidade de não estar sozinho como pesquisador e nem como participante. Qualquer que seja a distância, que
pessoais
acontece no trabalho em qualquer ponto no tempo, ela é co-construída
pelo pesquisador
pelos participantes.
e
Essas distâncias são às
vezes
elás-
ticas, ás vezes próximas e outras vezes mais distantes. A história de Jean sobre como Stephanie hesitou em permitir que ela entrasse em sua sala de aula em setembro, após ter concordado com isto em junho, dá um senso
de como os relacionamentos pulsam a todo o tempo, de como a negocia-
ção da relação
entre os
participantes
são de fato
e
de
como a
distância é
mutuamente construída. Essas tensões que permeiam a distância entre as relações estão narrativa. Mas, a forma c o m o lidamos com sempre presentes na pesquisa as tensões é mais importante que meramente identificá-las e nomeá-las.
Um exemplo dessas tensões é o temor em perder a objetividade. Mas, passar por uma relação de intimidade com os participantes é um trabalho necessário na pesquisa narrativa. xonar" dade
pela qual acreditamos que essa intimidenominada certeza de uma possível perda de objetividade (como
pelos participantes? A
e a
Então, qual o motivo para não se "apai-
razão
de tudo há a presença dos por alguns autores) não é tão séria é que apesar textos de campo eo que envolve a atenção dada a eles. Se um pesquisador narrativo para seus
de
e s c r e v e r seus
participantes
levado a esquecer
campo, pode ser iso o levará a se sentir
pelo
apaixona
por
de
um
de
escrever
de
construção de campo e sido desviante, suspeita ou infiel tipos de textos de campo tenha
seus textos todos os
ou
textos de campo, e se
c o m o se a
narrativo possa ser visto então talvez esse pesquisador Como aquele que passou dos limites, se envolveu demais e se apaixonou
aos
participantes,
Pesquisa narrativa
121
demais. Sob essas circunstâncias as precauções de Edel podem ser consi deradas sensatas. Mas, assinm que
os
pesquisadores estão atenciosamente
dia-a-dia, construindo textos de campo, são capazes de"escorregar para dentro
para fora" da
e
experiência que está sendo estudada,
e
de escorre-
gar para dentro e para fora da relação de intimidade com os participantes, Estar no campo permite intimidade. A composiçã0 e a leitura dos
textos
de campo possibilitam o escorregar para fora da intimidade, por Este momento. movimento de ir e vir, entre o apaixonar-se e a
fria é
algum
observação
possível através dos textos de campo.
Aqueles que escrevem sobre a importância prática do exercício reflexivo, como Donald Schön (1983), escrevem sobre o modo como alguém vive a vida e reflete sobre ela, combina vivncia
desenvolvimento. E assim
com a
com autocríticas e
experiência de estar no campo, na com-
posição dos textos de campo e então na reflexão sobre esses textos de 0
campo. em uma
pesquisador escreve em seu notebook,
tela
enxurrada de
uma
usa um
gravador, digita
observações descritivamente orientadas participante e
para o campo. Estas são unma mistura de "você e eu'", do do pesquisador são notas sobre o que você fez, sobre o _
que
eu
fiz
com
voce, sobre o que estava ao nosso redor, sobre o lugar onde estávamos, sobre os sentimentos, sobre eventos correntes e sobre de
lembranças
fatos passados. Esses
registros descritivamente feitos
para gravar eventos, acontesentimentos congelam momentos específicos no e s narrativa. Um, ou três, ou dez anos mais
cimentos, atitudes paço da
pesquisa
lembrar dos fatos mo com nossos
po para
e
com um
tarde, podemos toque nostálgico como, por exemplo, o coleguis-
participantes, professor e alunos, em uma viagem de cam-
plantar árvores em um parque. Esses sentimentos sobre a
viagem
campo podem nascer fora da reconstrução da narrativa, impulsionados por termos nos apaixonado pelo campo de pesquisa. Nossos textos de do dia da campo viagem, inalterados com o passar dos anos, não influen ciados por memórias e experièncias interventoras, pode mostrar uma imagem mais complexa, talvez até mesmo diferente dos acontecimentos daquele dia. Os textos podem revelar ao
-se
mal, que alguém estava ferido
As notas de campo, as fotografias, as notas de planejamento dos
que
e
algumas crianças comportaram
levou
os
os
supervisores
ao
pânico,
etc.
trabalhos escritos pelos estudantes,
professores são todos textos de campo que observação fria dos eventos que sao relembrados de forma apaixonada. nos
ajudam
122
D.
a
adentrarmos
em uma
Jean Clandinin | FE. Michael
Connely
Relembrando um esboço, deslizando em detalhes Memórias
de Ane Dillard (1988) tendem a suavizar os de talhes, deixando um suave esboço esquemático da paisagem. Os textos de como as
campo ajudam a completar a riqueza, a nuance, e a complexidade da paisagem, retornando ao pesquisador reflexivo a uma paisagem mais rica, mais
complexa e
mais
problematizante do que a
memória
pode costruir.
provavelmente
Um episódio da série de ficção científica Star Trek: Voyager aborda dramaticamente este ponto sobre a questão do lugar dos textos de campo na pesquisa narrativa. O episódio inicia-se em um museu de espécies alie-
nígenas, setecentos anos desde que a nave espacial Voyager passou pelo sistema estelar, e setecentos anos no futuro, na perspectiva do telespectador. Uma lição de história ministrada por um cientista alienígena está em curso, nela o papel de dominado da espécie dele é explicado para uma outra pessoa a partir da intervenção do Voyager setecentos anos antes.
A tripulaçäo do Voyager é descrita como um time de guerreiros brutais do
à raça dominante que havia dado ao Voyager as coordenadas de uma passagem (um buraco negro) que possibilitaria o
espaço, que
em retorno
retorno deles para a Terra, comete genocídio sobre aquela raça, dominada na atualidade, um descendente deles conduz a lição da história. Todos os fatos da história são familiares ao telespectador. As aparências fisicas são perfeitas
a nave, a sua disposição interna, sua tripulação,
Sua aparência e sua tecnologia. A topografia da paisagem é perfeita. Mas, tudo está errado. Ninguém age em seu personagem: o capitão, conhecido
pelos telespectadores como um líder zeloso, é retratado como um líder brutal e autoritário; os membros da tripulação,
conhecidos como atenciosos e
cooperativos, são descritos como viciados e competitivos; as civilizações
alienígenas, protegidas por um código de não interferéncia, são cruelmente manipuladas para os fins do Voyager; e ainda, o doutor holográfico da nave, restritamente governado pelo Juramento de Hipocrates, é diabólico e faz ex
perimentos com bactérias para criação de armas biológicas Um artefato é encontrado no planeta alienígena, e acaba por ser, em
parte,
uma
cópia do programa para o
doutor
holográfico do Voyager
Quando o programa, (um holograma) é ativado, o doutor fica espantado com a parte da história liderada pelo cientista alienigena. Embora setecentos anos de experiência tenham influenciado o cientista e sua cultura
defeituosa, o doutor, por meio de um texto de campo, mantém-se inalte
Pesquisa narrativa
123
rado
e seu programa
como os
que é os
desativado
telespectadores,
ao mesmo
possuem
Ao recontar eventos de
certa uma
diferente dos
pois
passados,
setecentos anos e os
eventos,
que conduziram
o
a
doutor,
nem o
nem
experiência.
na
incluindo
alguns per-
doutor descreve
produzindo
como personagens
eventos
reconstrução da história
"memória" de intervir
ambientes físicos sonagens, alguns
pulação do Voyager
uma
tão errada,
e
é, assim
setecentos anos. O doutor
confundido por
tempo tão
telespectadores
por
a
tri
interpretação
uma
atual divisão social racista do
mundo alienígena. o artefato continha dados Em adição ao programa do holograma, eventos de setecentos anos atrás - que, específicos texto de campo dos e à sua audiência, a satisfação quando decodificado demonstrou ao doutor, O incrédulo cientista aliení sua tradução aqueles eventos. de precisão ea gena,
aos
eventos sua
poucos, começa
interpretado por
dominada
cente,
mas
uma
ideologia racial, crucial
espécie, conduziu sua interpretação
que ocasionou
uma
para
a
identidade
extremamente
convin-
visão errônea da história.
A história The Star Trek:
portância de
conjunto de
determinado a entender como um
Voyager
permite refletir sobre a impara preencher grandes con
nos
utilizarmos textos de campo
ainda, um sentitornos históricos construídos através da memória. Há, verdade que não existe uma única nessa história, isto
é,
do importante ou uma
versão correta dos fatos. Na
campo são sempre e num
interpretativos,
pesquisa narrativa,
nossos textos
sempre compostos por
determinado momento. Como
um
de
individuo,
pesquisadores, podemos, por
plo, tirar uma fotografia de um determinado momento no tempo,
exem-
mas essa
fotografia é apenas um contar, um lance, uma imagem. Percebemos isso agora enquanto lemos e relemos os textos de cam-
Baía, há quinze anos. Michael fez notas de campo sobre os eventos da escola. Jean participou dos mes
po da pesquisa realizada
na
Escola da Rua
mos eventos e também fez suas anotações. Mantivemos ambas, reconhecendo que essas notas de campo não eram idênticas. Detalhes diferentes foram notados, palavras diferentes foram destacadas. Quem éramos como
pesquisadores, qual relação tínhamos
com os
participantes
e como
vive-
mos no espaço tridimensional fizeram a diferença naquelas notas de cam-
po que nós compusemos. mais Agora, ao lermos estas mesmas notas de campo, lembramos uma vez que não existe uma versão verdadeira dos acontecimentos que
ocorreram há quinze anos, ao contrário da implicação na história The Star
124
D.Jean Clandinin | F. Michael Connely
Trek: Voyager. Contamos outras histórias dos eventos passados e então "deslizamos" de volta para as notas de campos para completar (preencher) os detalhes. Em nosso atual projeto de pesquisa, estamos relendo essas notas de campo, compostas há quinze anos, não em busca da verdade ou de uma versao correta dos fatos, ou mesmo para corrigir a história
do outro sobre o que aconteceue como chegamos onde estamosagora, mas sim para entender a história da escola dentro de uma nova agenda de um
pesquisa em que construímos uma compreensão narrativa ou uma teoria de mudança e desenvolvimento da escola. Muitas vezes, de forma imperceptível, todos nós, pesquisadores ou não somos como as espécies alienígenas da história The Star Trek: Voyager. Recontamos nossas histórias refazendo o passado sob nossa perspectiva.
Isto é inevitável. Além disso, é algo bom. É algo essencial para o cresci mento pessoal e social e, para Dewey, é um modo de julgar o valor da ex periência. A reconstrução da experiência de Dewey (para nós, o recontar e o reviver das histórias) é boa na medida em que define o crescimento pessoal e social. Reforçar esse crescimento é um dos propósitos da pesquisa narrativa. No entanto, há sempre o perigo de ao recontarmos nossas histórias, construirmos, como fizeram as espécies alienígenas, uma história inadequada e insalubre e encontrarmo-nos no que Dewey chamou de experiência educativa equivocada. Honrar nossos textos de campo pode nos ajudar a escapar dessas situações.
Verdade narrativa e relativismo narrativo A tensão dos pesquisadores narrativos ao adotarem uma postura
devalor éo relativismo implicado, a noção de que todos têm sua própria interpretação dos eventos e cada uma é igualmente válida. Levada para este ponto, a pesquisa narrativa perde sua qualidade narrativa, pois a ten-
Sao entre a experiência e o significado que lhe damos é perdida. Um sentido desconectado de significado é posto no lugar de um significado narrativo construído. De um ponto de vista da pesquisa narrativa (assinm como no episódio do Star Trek: Voyager), existem, com base nas evidências, os textos de campo, interpretações melhores e piores da história.
O episódio The Star Trek: Voyager dramatizou a questão do relati VISmo. O doutor pretendia se desativar quando soube que a consciência publica de sua versão da história estava criando violetas rupturas so-
Pesquisa
narrativa
.
125
ciais. Ele pensava que as espécies alienígenas estavam sendo melho
ores
servidas por sua própria versão da história, mesmo assim ele "sabia".
que
aquela versão era errada. Sua intenção de desativar-se implicava uma ver.
são relativa da verdade. Num final digno de Hollywood, para a décad
da
dos anos 50, o cientista alienígena, firmemente comprometido com a ver são da história do doutor, convence-o a permanecer em curso. Ambas as espécies repensanm sobre a origem da relação desigual entre elas. Assim
a harmonia racial é estabelecida, a sociedade encontra um novo sentido para seus propósitos e o doutor decide seguir para casa com o Voyager Apesar de pesquisadores narrativos, que estão acostunmados a lidar com sutilezas de
significado, explicações de narrativas duvidosase finalizações
ambiguas, pode ser que nos sintamos ofendidos com a qualidade desse script hollywoodiano, mas sua mensagem moral para a pesquisa narrativa
adequadae clara. O mero relativismo näo funciona. Os textos de campo devem ser mantidos e constantemente referenciados pelos pesquisadores narrativos.
Virando para
dentro, olhando para fora
Outra tensão que
vivenciamos, à medida que
nos movemos
do
cam-
po para os textos de campo, está ligada à tarefa de composição dos textos
de campo que são registros de do mundo existencial, e mesmo
interpretações
do que experimentamos textos de campo falamos
compornmos experiências, sentimentos, dúvidas, incertezas, reações, histórias relembradas e assim por diante. No capítulo quatro temos uma ilustração disso, quando Jean conta sua experiência com a quarta série como uma história lembrada em resposta à história de Karen, registrada sobre
na
ao
nossas
transcrição de uma reunião do grupo de pesquisa. No exemplo abaixo, os textos de campo duais (notas de campo que
registram registram
os
eventos
suas
existenciais, eventos externos, diários e notas que respostas internas) de Vick Fenton (de 18 de setembro de
1997) são ilustrados.
126
D.
Jean Clandinin | E. Michael Connely
Minha mente está
uma
sobrecarga
tanta coisa para
de
ao
com
lembrar. Imagino
| tas empresas de pequeno porte | lado oposto da rua com
informação. Há ouvir e tentar|
ver e
Continuamos para oeste longo Smith Street. Existenm mui-
em
várias
no
cartazes
línguas. As empresas dão
que isso é assim a | este porque tipo de comunidade é lugar casas, algumas com jardins, características interesdiferente da minha. Tenho a sen-|outras com e sação de esta comunidade ser bas- santes únicas. Há um mural de | personagens de desenhos tante densa e há muitas coisas para | no muro e um modelo de 3-4pintado assimilar pés da Torre Nacional Canadense em cima de uma varanda ou terraço. As casas do lado norte da rua, então, dão
lugar ao Hospital Toronto.
após Baía,
Esses textos de campo, de 18 de setembro de 1997, foram feitos uma caminhada pelas mediações da vizinhança da Escola da Rua uma
caminhada conduzida por
As notas de campo de Fenton são
um
membro da comunidade escolar
descrições do lugar, mas sua coluna à esquerda registro em diário no qual ela faz observações sobre as suas experiências interiores ou introspectivas. Seu diário descreve como ela está vivenciando a experiência direta como uma "sobrecarga de informação" e dá uma ideia preliminar do porque isso está acontecendo e como ela contrasta os lugares ao redor Escola da Rua Baía com os lugares é uma espécie de
que ela melhor cohece. Esse estilo de diário reflexivo, sobre a experiência da experiência, ajuda a manter a sensação de movimento introspectivo e extrospectivo em relação à experiência. Como notamos anteriormente,
profissionais em qualquer campo preservam um sentido educativo de crí tica e crescimento sobre sua experiência por refletir sobre ela. E isso que
Fenton está fazendo nesses textos de campo duais suas notas de campo viram-se para o externo e seus diários reflexivos para o interno. -
Ambos os textos de campo, de Jean e Vick Fenton, mostram como os textos movimentam-se retrospectiva e prospectivamente entre os registros da experiência em estudo e os registros de si mesmo, no momento em gue o pesquisador vivencia a experiência. Pretendemos nos aprofundar em um ponto adicional que ocorre quando nos tornamos mais intimamente envolvidos com a experiência estudada, como, por exemplo, no trabalho
de Jean com Stephanie e no de JoAnn Phillion com Pam. O ponto que queremos abordar é uma versão do que alguns, de um ponto de vista diferente
Pesquisa narrativa
127
da pesquisa narrativa, tèm chamado de "problema da influéncia do obser. vador sobre o observado". Após ter trabalhado com um participante ou em sala de aula por um longo tempo, talvez seja possivel ver mais claramente que estamos moldando o desfile dos eventos enquanto os estudamos, Como pesquisadores, observamos a nós mesmos dando lorma aos eventos estudados, aos eventos da sala de aula, à relação com as crianças e assim
por diante. As notas de campo de Annie Davies de 17 de outubro de 1994, registradas no capítulo sete deste livro, são ilustrativas. Em suas notas de campo, Davies descreve um cenário de sala de aula com dois professores Tom e Liz. Em uma parte das notas Davies descreve seu envolvimento com as crianças em sala de aula e suas respostas com as instruções de Liz.
Como pesquisadora, Davies está estudando não somente Liz e as crianças,
mas a si mesma enquanto trabalha em sala de aula com elas. Em resumo, o que queremos enfatizar é que, no texto de campo dual que criamos as notas de campo das condições existenciais e os gistros nos diários das condições internas há também a possibilidade
re
-
de outro dualismo. As notas de campo de uma situação existencial, são escritas, podemos dizer, em situações de intimidade, como no estudo de Davies, encontramo-nos como parte dessa situação. Pesquisadores narrativos que têm estabelecido um relacionamento íntimo em situações de estudo de longo prazo e ficam face-a-face com eles mesmos. Temos enfatizado a qualidade dual das anotações do pesquisador sobre si mesmo - suas notas como parte da experiência de campo que está
sendo estudada e suas notas sobre ele mesmo vivendo uma experiência,
isto é, refletindo sobre ela. Ë o caso do pesquisador também precisar estar atento para
a
dualidade dos
participantes. Assim que um pesquisador nar
rativo se insere em uma experiência de campo, também os participantes
de campo se inserem na pesquisa. Compor textos de campo significa estar alerta para as coisas que os participantes fazem e dizem como parte de sua experiência em curso e isso significa manter registros sobre como eles vivenciam a experiência de estar na pesquisa. Os participantes também têm sentimentos Isso é
e
pensamentos sobre a pesquisa.
perceptível
na
pesquisa
de Davies
com um
grupo de
profes
sores. Davies faz textos sobre os sentimentos e pensamentos dos profes sores participantes e sobre o que eles estão começando a compreender de sua participação na pesquisa. Em um ponto de uma conversa com Davies, Tom, um membro da equipe de professores, diz: "Eu acho que o que estou descobrindo com esta pesquisa é que existem muitas histórias. A escola
128 D . Jean Clandinin | FE. Michael Connely
está cheia de histórias e o que você está capturando é somente parte delas. Elas farão parte do que Liz, Carol, Jane e eu fizemos juntos este ano.
Elas serão reduzidas para 250 folhas de papel e um pouco de tinta e ainda não será toda a história" (conversa com Annie Davies, 7 de julho de 1995) (Davies, 1996, p.246). Carol, outra professora participante, também em uma conversa Davies, diz: "Falar
você realmente me ajuda a crescer, porque quando falo em voz alta, na verdade estou dando espaço para pensar so0 com
bre este tema. Eu posso
com
ver
onde
eu
gostaria de
me mover
mais
colabora
tivamente...e o que eu posso melhorar" (conversa com Annie Davies, 12 de
junho de 1995) (Davies, 1996, p.248.). Estes dois
exemplos deixam claro que os participantes da pesquisa
narrativa são influenciados por sua participação na pesquisa e pela experiência de vivenciar a pesquisa. Essas reflexões essa experiência da experiência pelos participan
tes transformam-se em textos de pesquisa, assim como ocorre com as experiências dos pesquisadores. Ilustramos isto no capítulo nove deste livro, no qual tratamos dos textos de pesquisa e no qual mostramos que os participantes assim como os pesquisadores chegam a um novo entendimento de si e do mundo, como parte do que acontece em uma pesquisa narrativa.
A ambiguidade do trabalho no espaço tridimensional da pesquisa No capítulo quatro introduzimos a ideia do espaço tridimensional da pesquisa narrativa. Mesmo introduzindo esta ideia, percebemos que a noção de tal espaço pode colocar limites artificiais e restritivos sobre a pesquisa. Para nós, fazer pesquisa narrativa é uma forma de viver. Viver em
Seu sentido mais geral e ilimitado. As estruturas visiíveis e invisíveis, que imitam realmente nossas vidas, quando notadas, podem sempre ser ima-
ginadas de outra forma, podem ser mais abertas, podem ter possibilitar alternativas. Essa noção é incorporada à ideia de recontar histórias e reviver experiências de vida. Nossa intenção com a pesquisa narrativa é capturar, ao
maximo possivel, essa possibilidade de abertura da experiencia. Mas há um paradoxo em potencial se o espaço de pesquisa for vi Sualizado como uma caixa fechada em vez de um espaço infinitamente
Pesquisa narrativa 129
historlas e o que você está capturando é somente parte deestá cheia de ano. farão parte do que Liz, Carol, Jane e eu fizemos juntos este las. Elas reduzidas para 250 folhas de papel e um pouco de tinta e ainda Elas serão (conversa com Annie Davies, 7 de julho de 1995) toda a
não
será
história"
(Davies, 1996, p.246). Carol, outra professora participante, também em uma conversa
com Davies, diz: "alar com vocé realmente me ajuda a crescer, porque
quando falo
em voz
alta,
bre este tema. Eu posso
na
ver
verdade estou dando espaço para pensar soonde eu gostaria de me mover mais colabora-
12 de tivamente... e o que eu posso melhorar." (conversa com Annie Davies, junho de 1995) (Davies, 1996, p.248.). Estes dois exemplos deixam claro que os participantes da pesquisa narrativa são influenciados por sua participação na pesquisa e pela experiência de vivenciar a pesquisa.
Essas reflexões essa experiência da experiência pelos participan tes transformam-se em textos de
pesquisa,
experiências dos pesquisadores. Ilustramos
assim isto
no
como ocorre com as
capítulo
nove
deste
livro, no qual tratamos dos textos de pesquisa e no qual mostramos que os participantes assim como os pesquisadores chegam a um novo enten-
dimento de si e do mundo, como parte do que acontece em uma pesquisa narrativa.
A ambiguidade do trabalho no
espaço tridimensional da pesquisa No capítulo quatro introduzimos a ideia do espaço tridimensional da pesquisa narrativa. Mesmo introduzindo esta ideia, percebemos que a noção de tal espaço pode colocar limites artificiais e restritivos sobre a pesquisa. Para nós, fazer pesquisa narrativa é uma forma de viver. Viver em
Seu sentido mais geral e ilimitado. As estruturas visíveis e invisíveis, que imitam realmente nossas vidas, quando notadas, podem sempre ser imaginadas de outra forma, podem ser mais abertas, podem ter possibilitar al-
ternativas Essa noção é ncorporada àideia de recontar histórias
e
reviver
experiencias de vida. Nossa intenção com a pesquisa narrativa é capturar, ao aximo possível, essa possibilidade de abertura da experiência. Mas há um paradoxo em potencial se o espaço de pesquisa for vi-
Sualizado como uma caixa fechada em vez de um espaço infinitamente
Pesquisanarrativa
129
aberto,
como
noções de
Nossa esperança é atuais sugerem. espaço mais tridimensional abra
possibilidades
da ideia de espaço que o equilíbrio possibilidades que não poderiamser pesquisadores, os imaginativas para
noção. ambiguidade nos faz pensar O espaço da pesquisa e sua implícita conscientes do lugar onde nós e nossos sobre a inmportância de estarmos facilmente notadas
na
ausência dessa
o momento participantes somos colocados, a todo e ralmente, espacialmente e em termos de pessoal
em
particular _tempo-
social. Nossa consciên-
cia transporta para nossos textos de canpo, onde um texto é sempre datado, posto e situado em um continuo pessoal-social. Por exemplo, a nota de Fenton, citada anteriormente, é basicamente sobre o lugar no momento
aqui e agora em que ela o vê. Suas anotações no diário sobre a experiência
de sua experiência é uma mistura entre o pessoal e o social. Ela registra algo muito pessoal e, na sequência, reflete sobre isso a partir de um ponto diferente do continuum pessoal-social. Ela pensa sobre o estado de sua mente enquanto ligada ao contraste entre o meio que observa e o meio
que conhece. Viver no ambíguo espaço tridimensional da pesquisa torna-se mais
complexo quando nele inserimos o elemento tempo. Uma experiência torna-se tingida com o tempo, tornando-se por vezes difícil saber exata mente
que
época ela está localizada. A história da Escola da Rua Baía, vagarosamente entra em nossa consciência de commo em
que
pesquisadores,
descrevemos anteriormente, levou-nos vos
escolares que
tas,
diários, revistas,
se
viagem
a uma
à bordo dos
encontravam bem recortes de
arqui
conservados. Lá encontramos carjornais uma história em processo da -
-
Escola da Rua Baía
Quando das datas
lugar
e
dos
nunca
rem em uma
sente
temporal fluir, a história e o sentido dos nomes, acontecimentos, a forma como alguém se adentra a um
se
o
será idêntica
àquela
de outra pessoa. Dois amigos nasceu e foi criado nesta casa
casa juntos, um trou lá pela primeira vez, ambos experimentarão
eventos: andarão pela escada, abrirão a porta farão de maneira totalmente diferente. Suas não serão as mesmas.
eo
exatamente
irão até
e
a
ao
entra-
outro
os
en-
mesmos
cozinha,
mas
o
experiências da experincia
não é
A Escola da Rua Baía não é
a
mesma
experienciada da mesma forma,
para todos
uma vez
os
pesquisadores,
influencia a pesquisa. Phillion que seu fluxo temporal Escola da Rua Baía, entrou certamente, devido a nossa história com a em
130
D.
contato
Jean Clandinin | F. Michael
Connely
com
o
fluxo
temporal
da
escola,
comparativamente, no inicio de sua pesquisa. Aqui está um trecho que ela
escreveu quando começou a elaborar sua dissertação. Ela leu o diário do primeiro diretor da Escola da Rua Baía, nomeado em 1877. Depois de ler o diário ela cuidadosamente juntou os períodos de tempo, movendo-se de 1877 com um diretor que se prepara para abrir a escola para 1997, quando ela era uma pesquisadora na escola. Ela descreve: A Escola da Rua Baía era moderna em todos os sentidos. Ela tinha sistema de aquecimento, água corrente, banheiros no porão, vestiários, quadros e mesas individuais. Devido à ideia do sistema de aquecimento, a previsão do diretor para a abertura da escola foi adiada devido à entrega dos cinquenta
e seis cabos de madeira. O sistema de aquecimento era o melhor disponível, então o diretor ficou perplexo ao perceber que ao longo dos dias a escola tinha ficado tão fria. Depois de todo empenho, eles ainda teriam que usar pequenos aquecedores de madeira para manter as salas de aula aquecidas. Os alunos seriam enviados de volta para casa, caso a temperatura das salas fossem inferiores a 40 ou 45 graus. O diretor não queria que isso aconte-
cesse, principalmente no primeiro dia de aula. Mais do que isso, ele estava
preocupado com língua afiada da chefe do departamento feminino, alojada no segundo andar. Ela certamente se queixaria se seu quarto estivesse muito frio. Mal sabia ele que muitas vezes teria que enfrentar a ira dela. Mais
de
centoe vintes anos depois,
no
inverno,
os
aquecedores,
agora atomiza-
dos, anunciam através de um som indicativo que o aquecimento chegará em
breve. Eu
passado,
o
despesa.
O
meu
e
sistema de
problemas
se o
se
aquele
som.
substituído causando
uma reunião com a
feminina da equipe
Gostaria de saber
adorávamos ouvir
aquecimento foi
diretor, em
sistema eliminaria uma voz
participante
uma
anunciou que
equipe,
o
novo
temperaturas frias. Imediatamente manifestou falando sobre o calor do verão.
primeiro diretor da se os
escola daria risadas sobre banheiros
eram os mesmos
passado! Eles parecem ser antigos 1877. (Phillion, pp.81-82)
o suficiente
as meninas usavam no
de
grande
com
colocação. Eu também queria saber serem artefatos
No ano
essa
que para
enraizada em u m lugar No comentário acima, Phillion permanece na Escola da Rua Baía, mas ao mesmo tempo salta retrospectiva e pros pectivamente
numa
extensão
gistros do arquivo da escola, d
e m experimentado n o
temporal de
sem
aqui
e
dúvida,
120
anos.
Quando
ela lê
os re-
como tem a escola em sua mente
agora. Ao assistir
a
uma
reunião atual de
Pesquisa narrativa
131
funcionários da escola e ouvir as mudanças sobre o novo sistema de aquecimento, mencionadas por eles, contrasta as intormaçoes com oS registros
do primeiro diretor arquivados em sua mente em forma de diários. Textos de campo são assim. Pesquisadores narrativos precisam ser sensíveis a todos os tipos de mudanças temporais que ocorrem em qualquer ponto do tempo. Phillion diz que em uma conversa com sua par
ticipante, uma professora caribenha, frequentemente mudará de lugar e tempo em questão de segundos - é a discussão de uma criança em sala de
aula, uma referência a origem de um imigrante, uma interpretação ofere cida a partir de uma perspectiva educacional caribenha, uma referência para o ensino de alguns anos atrás em outra escola do centro da cidade.
Tentar manter tudo isso em mente pode parecer uma tarefa proibi da para um pesquisador narrativo. Os pesquisadores precisam estar atentos para os detalhes do lugar, para as nuances modificadas com o tempo, para as mudanças complexas entre as observações pessoais e sociais e para suas relações. E precisam fazer isso por eles, e por seus participantes, e devem estar conscientes da interação mútua. Podemos aqui utilizar um ditado conhecido: é mais fäcil fazer que falar. Um pesquisador sensivel, es-
pontaneamente, quase sem premeditações, vive essas mudanças no lugar e no
tempo unido
aos
aspectos pessoal
e
social. Conversas animadas, por
exemplo, simplesmente acontecem. Mas, captar as nuances dessa vivencia, nos textos de campo, é algo complexo e cheio de ambiguidades. Para pesquisadores narrativos, manter o espaço tridimensional em mente éalgo útil. Por exemplo, caso se esqueçam de anotar detalhes de
lugar (o que é comum acontecer), pensar na pesquisa como um espaço tridimensional ajudao pesquisador a reconhecer o "onde" da pesquisa. A um
complexidade provocada pela composição dos textos de campo nesse es-
paço tridimensional da pesquisa é ilustrada no capitulo sete, através dos textos de campo de Davies.
132.D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
CAPITULO 7
Compondo textos de campo
N
os capítulos cinco e seis, abordamos o momento de estar
no campo. Estávamos preocupados com nossas experiências de entrar no
campo no capítulo cinco e com nossa experiência de estar no campo no ca-
pitulo seis. No capítulo sete, nosso propósito é descrever os tipos de registros, normalmente chamados de dados, pensado por nós como textos de campo. Assim os denominamos porque são Criados, no
são encontrados
e nem descobertos, pelos participantese pesquisadores, com o objetivo de
representar aspectos da experiência de campo.
Introdução Nesse capítulo, exploramos as maneiras nas quais nossa relação de pesquisador com as histórias dos participantes
as histórias sendo vivi-
das e contadas - dão forma a natureza dos textos de campo, assim como Os tipos de textos de campo que podem ser compostos. Quando fazemos
isso, nós estamos cientes de estar trabalhando no espaço tridimensional da Pesquisa Narrativa.
aduzido por: Judith Mara de Souza Almeida (PPGEL/ILLEL - UFU), Thays Mello (lLEEL, NEC Onalves Arantes (PPGEL/ILEEL UFU) e Dilnma Maria de -
-
UFU)
Pesquisa narrativa
133
Para ilustrar
variados tipos de textos de campo que a Pesquica Narrativa pode usar, observaremos uma variedade de textos de os
empregados e entrelaçados pelo pesquisador. Exploramos o uso tórias de professores, escrita autobiográfica, escrita de diários, campo, cartas, conversas, entrevistas de pesquisas, histórias de documentos, fotografias, caixas de memórias, e outros artefatos
camno
de his. notas de
familia
pessoais. -sóciais-familiares e as experiências de vida todos instrumentos que podem resultar em valiosos textos de campo. Concluímos o -
capítulo com discussão sobre a importância do posicionamento cuidadoso dos textos de campo para a integridade final de um trabalho acadmico nos moldes da pesquisa narrativa. uma
Compor textos de campo é um processo interpretativo bre
o
Considerando que os textos de campo são que é considerado como dados na
ta que os
dados tendem
pesquisa
a
carregar
uma
forma de falar sonarrativa e tendo em visnossa
ideia de
experiência de pesquisa, é importante notarrepresentação objetiva de quão imbuídos de inter pretação são os textos de campo. uma
de campo,
tórias sobre
ação
Quando passamos
já estamos contando para nós as
razões de
nossa
é
pesquisa.
para nossa pesquisa mesmos e para os outros as hisNosso interesse especial na situ-
repetidamente e continuamente estabelecido e negociado participantes (como mostramos nas seções sobre
cinco). Portanto, a
forma
negociação
no
com os
capítulo
adentramos ao campo de cia o que pretendemos. Deliberadamente selecionamospesquisa influenalguns aspectos que aparecem nos textos de campo. Outros aspectos, menos e conscientes deliberadamente selecionados, tambéém nos aparecem textos de
Para entender o que os os textos de campo é ocorre,
mas
que
a
como
pesquisadores
narrativos fazem
importante estar ciente que não valorização de um ou outro aspecto
só
ao a
campo. escreverem
seletividade
pode tornar outros visíveis ou até invisíveis. Os textos de campo, de forma bem relevante, tanmbém dizem muito sobre o que não é dito e nem notado. Esse fato talvez seja melhor percebido nas exemplo, quando um pesquisador narrativo anotações de camp0. Por movimenta-se em unma aspectos
menos
tada sala de aula na coisa acontecendo.
escola,
no
hospital ou
em
outra
Aspectos diversos sobre lugares, instituição,
ag
há muita
pessoas, coisas, even
134
D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
tas e histórias, sejam eles menores ou maiores, ficam em evidência. Um
nesquisador é, mesimo coim a melhor das intençöes de conseguir anotar tudo que acontece a sua volta, incapaz de fazê-lo. Algo semelhante também ocorre quando alguem se engaja na coleta de documento e seletivamente escolhe quais vai coletar: Algumas vezes, por exemplo, optamos
apenas pelos documentos politicos da escola ao invés de selecionarmos o documentos educacionais.
Apesar de nós algumas vezes fazermos essa opção de forma consciente, em outros momentos a fazemos sem perceber que estamos fazen-
do escolhas. Na Escola da Rua Baía, pedimos para as secretárias da escola que criassem uma caixa de correio para nós, pesquisadores, e que todo o
material que fosse encaminhado para a equipe da escola, fosse também colocado naquela caixa. Fizemos essa escolha conscientemente. Mais tarde, porém, percebemos que alguns documentos estavam circulando por
outros meios e não colocados nas caixas de correio. Depois desse fato aprendemos que nosso processo de coleta de documentos era um processo seletivo. Esse ponto geral se aplica a toda a extensão de textos de campo que possam ser criados. Consideremos uma entrevista estruturada, talvez a forma menos comum de entrevista utilizada na Pesquisa Narrativa por causa de sua qualidade não relacional. Como pesquisadores, decidimos o momento de ligar o gravador, decidimos as questões que serão perguntadas e assim por diante. Mas o mais importante é pensar que todos os textos de campo são inevitavelmente textos interpretados, pois nós podemos interferir em certas respostas de alguns participantes pela forma como reagimos - por exemplo, sorrindo, fazendo outra pergunta relacionada ao
momento ou pedindo esclarecimentos. Devido à resposta de nosso corpo, O participante pode responder com mais ou menos detalhes ou pode até mesmo alterar sua resposta. Igualmente, quando iniciamos uma entre-
Vista, já a iniciamos com um período de tempo previamente estipulado cISso pode também fazer com que o participante tenha um procedimen-
tO diferente do que teria se iniciássemos essa entrevista de outra forma. Evitavelmente, quando um pesquisador encoraja respostas e discussoes
Dre um determinado item, alguns outros serão deixados de lado ou sea0 menos desenvolvidos. Os textos de campo såo modelados pelos inteS e s ou desinteresses do pesquisador ou do participante (ou de ambos).
ue pode
parecer
uma
gravação objetiva de
uma
entrevista estruturada
Já é um texto interpretado e contextualizado: ele é interpretado porque e
Pesquisanarrativa
135
pelo relação,
modelado
processo
de
e
sua
origens
e
é
do participante e interpretativo do pesquisador, circunstâncias particulares das
contextualizado
do cenário da
pelas
entrevista.
Escrever textos de campo que expressam
a
relaçãão
entre pesquisador e participante O que é central para
a
criação de
textos de campo é
a
relação entre
anteriormente participante. Apesar de termos são reconstruções seletivas da experiência que todos os textos de campo de campo e desse modo incluem um processo interpretativo, queremos
pesquisador
ressaltado
e
adicionar a isso a importância da relação entre participante e pesquisador. A relação do pesquisador com a história em andamento do participante configura a natureza dos textos de campo e estabelece seu status episte-
mológico. Assumimos que um relacionamento embute sentidos nos textos de campo e impõe a forma com que o texto final de pesquisa sera desen-
volvido. 0 que foi dito, assim como seu sentido, é moldado pelo relaciona mento. Os textos de campo criados podem ser construídos de forma mais ou menos colaborativa; podem ser mais ou menos interpretados e podem ser mais ou menos influenciados pelo pesquisador. Tudo depende da re-
lação vivida. Os pesquisadores precisam estar atentos a isso e precisam escrever diários com notas que revelem as circunstâncias das relações da-
quelas situações representadas nos textos de campo.
Textos de campo
em um
espaço de
pesquisa tridimensional Antes de iniciarmos
apresentação detalhada de textos de campo estudo, queremos lembrar os leitores sobre a complexidade da ta sobre os tipos de coisas para as quais precisam atentar a
em um
refa
e
enquanto vivenciam a experiência e compõem seus textos de campo. No capítulo seis, escrevemos sobre a necessidade dos textos de campo como meio de
possibilitar a mobilidade dos pesquisadores entre a intimidade com os participantes de campo e uma instância reflexiva: textos de campo precisam ser rotineiramente e rigorosamente feitos. Também escrevemos so bre a necessidade dos textos de campo para preencher os espaços criados
136D.Jean Clandinin | E. Michael Connely
memória
sobre
eventos, p0is eles precisam ser ricos em detalhes. Encaminhamos, aiinda, a questão do relativismo da narrativa, ilustrando a
1nela
instância
de valor
os
dos textos de
campo
no
recontar de
histórias
e
a
pos
sibilidade que a ação de recontar possa levar a mudanças: os textos de
permitem
campo
ideias
e
crescimento
e
mudança ao
fatos. Outro ponto que ressaltamos é
invés de fixar a
relações
necessidade de
dor estar atento para compor textos de campo
em
o
entre
pesquisa-
condições existenciais,
assim como nas respostas internas do indivíduo: anotações e outros textos de
campo precisam ser complementados por outros textos de campo, tais como diários sobre as respostas de pesquisa. Encaminhamos, também, a questão da ambiguidade de trabalharmos em um espaço tridimen
sional de pesquisa aberto e sem fronteiras: ao compor textos de campo, os
pesquisadores precisam atentar para o lugar em que ele e os participantes encontram, para
se
cialmente -
qualquer momento particular temporalmente, espa -
e para os termos pessoais e sociais.
Assim que iniciamos a apresentação dos textos de campo, nos conscientizamos de que apresentar uma lista de seus tipos cria a impressão de
que são isolados, que são gravações claramente definíveis construídas ao longo de uma pesquisa. No intuito de apresentar os textos de campo de uma maneira mais consistente, considerando o que os pesquisadores nar
rativos fazem, damos um sentido do alcance e da inter-relação dos textos de campo a partir da análise de um estudo completo. A tese de doutorado de Annie Davies, "Team Teaching Relationships" - 0
Relacionamento de
Professores que Trabalham em Equipe (1996), é o estudo aqui utilizado ara a nossa abordagem sobre os textos de campo.
Textos de campo entrelaçados Começanmos POls, passamos po
por
com um sua
que ela compôs.
de Davies e, debreve panorama do trabalho de camdando exemplos de vários textos
pesquisa,
À medida que
vamos
fazendo isso, mostramos
como
eles se entrelaçam uns aos outros. Davies é
uma
Dasica do oeste do Czes Es u
trabalhando trabalhando a Sua
de experiente professora
Canadá, sozinha em
uma
Educação anos, algumas
escola de
ministrado aulas por que tem em uma sala de aula
com as
equipe
crianças
com u m ou
doutorado, tinha pesquisa de
mais
e outras
parceiros. Quando
o questionamento,
ela
sobre
Pesquisa narrativa
co-
como
137
os
professores negociavanm
os
relacionamentos
nas
equipes docentes
que a fascinava. Davies ficava intrigada sobre a forma como a paisagem de conhecimento profissional historiada se interligava com as narrativas individuais de experiência dos professores. A autora ressalta que aqueles professores traballhavam em equipe por causa de uma ordem do Conselho de Educação. Como eles compartilhavam o espaço que havia sido, até o
mandato, segundo a pesquisa acerca da paisagem de conhecimento profissional observada, um espaço seguro para vivenciar histórias ensinar? 0 que acontecia quando sala de aula tornavam-se públicas Davies
começou
secretas de
as
histórias secretas de ensino de
na
paisagem de
pesquisa
sua
uma
fora da sala de aula? narrativa com um estudo de orien-
tação autobiográfica sobre suas próprias experiências de aprendizagem na Gr-Bretanha e seguiu com suas primeiras experiências didáticas no Canadá, onde ela inicialmente ensinou Educação Física. Alguns anos mais tarde, ela começou a trabalhar em situações de ensino em equipe também. Nessa primeira fase do seu estudo, Davies realizou uma pesquisa narrativa sobre
suas
Ela ra
próprias narrativas de experiências.
ligou
o
estudo de
sua
narrativa inicial
ao seu
relato da
experiência de professores trabalhando em equipe. Quando
primei-
completou
relato, percebeu que queria ouvir as histórias de sua equipe ocorridas cerca de doze anos antes. Como eles contavam suas histórias de experiência de docência em grupos? Isso deu início à
seu
segunda fase de sua pesquisa. procurar antigos parceiros docentes e a cada um deles pedia, por meio de relatos de memória, que contassem suas histórias daquele tempo em que trabalharam juntos. Enquanto Davies entrelaçava esses múltiplos relatos em um relato Passou
a
texturizado de narrativas contadas através da memo-
ria dos um
relacionamentos passados, ela percebeu que queria se engajar com grup0 de professores que se encontravam trabalhando em equipe. Davies sentiu que a paisagem de conhecimento profissional esta-
mudando e ela queria muito estudar esse cenário de aquela equipe de professores estava trabalhando, assimmudança
va
como
qual também no
queria se filiar a um grupo de professores como uma outra fase de sua pesquisa narrativa. Ela queria, nesta terceira fase, engajar-se nas relações continuas de um grupo de quatro professores e estudar suas práticas de sala de aula. Além disso,
queria se envolver com cada professor, construir relatórios narrativos que ligassem suas histórias do com suas
práticas
porém, essas
atuais
e suas
fases não säo
138D. Jean Clandinin | E.
um
a
fim de
passado
possíveis práticas futuras. Obviamente,
mapa
a ser
Michael Conmely
seguido
por outros
pesquisa
dares.
Cada estudo
tem o seu ritno
e
sua
sequëncia
e
cada
1arrativo tem que criar o ritmo próprio de sua pesquisa.
Davies trabalhou
no
pesquisador
espaço tridimensional da pesquisa narrativa.
E existem camadas de complexidade em cada uma dessas dimensões. Temporalmente, ela inicia com seu passado, suas experiências de infância de crescer
na
Grä-Bretanha. Depois, passa às
suas
primeiras experiências
de ensino em equipe no Canada e, em seguida, apresenta um estudo sobre
a observação de uma equipe de professores da atualidade. Há um fluxo temporal na estrutura geral das três fases desse estudo - infância, primeiras experièncias docentes em equipe, e uma pesquisa
de observação dos atuais participantes. Além disso, dentro de cada fase, a autora faz os movimentos retrospectivo e prospectivo, no tempo, para cada participante, quando aquele indivíduo olha para suas experiências da infância e se move para as experiências da atualidade. Na primeira fase, sua autobiografia tem um fluxo temporal. Na segunda fase, sua pesquisa com os participantes, da primeira equipe de docentes, é um estudo das relações de memórias ao longo do tempo. Na terceira fase, sua observação dos participantes é realizada ao longo de um período de trés anos e, além
disso, envolve os participantes em discussões reflexivas e autobiográficas, individualmente, ao longo do tempo. Davies fica atenta ao espaço. Ela se desloca de um país para o outro e para diferentes escolas de um Conselho Regional de Educação. Ao mesmo
atenção
também
presta Tempo em que ela atenta para o tempo e o lugar, ela a dimensão pessoal-social. Ela estuda as narrativas de experièncias indivi duais dos
professores
profissional Erentes
em
e
situa
o
transformação
tipos de
pessoal em uma paisagem de na
textos de campo
Educação. -
conhecimento
seguida, apresentamos dide professores, escrita auto-
Em
histórias
notas
histórias da família, DIOgrafica, diários de pesquisa, histórias orais, os participantes, as dnpo, conversas, as cartas do pesquisador para
de
cartas
Esses são os textos famílias e documentos. das relatos participantes, diferenabordá-los apresetaremos Davies. Após utilizados por Camp0 os
es
Tipos de
textos de campo
advindos de
Histórias de professor u a n d o - s e no
,em
Edmonton.
tempo
e
outros estudos.
c o m o texto
no espaço,
no
de campo
primeiro
rapidamente Davies viaja
no
doutomés do seu
tempo para
recordar a s
Pesquisa narrativa
139
histórias de sua criação na Gr -Bretanha.
Escrever essas histórias serviu , em parte, para situá-la no meio das histórias que ela está vivendo e con-
tando desde quando começou sua pesquisa. Davies escreveu várias histó rias de si mesma em forma de textos de campo sobre suas experiências
quando criança. Sua primeira história foi intitulada Uma Nova Escola em casa vindo do trabalho.. de costas para lareira meu pai fica de pé sério
Não
me
pede para recitar uma rima infantil
hoje, ele parece não me notar minha mãe traz o chá eles conversam a
colher dele mexendo
"o
o
açúcar
filho do Bill sabe ler
ele tem apenas seis anos ele sabe fazer coisas que Robert tem quase sete -
o
Robert não sabe
ele está bem atrás temos de encontrar
uma
escola melhor"
pai já sabe de uma escola Ouço novas palavras meu
-
honorários, freiras . O que é isso? e uma
viagem de trem
para nós dois
"Que bom,"
eu
Eu amo trens
penso comigo mesmo
tenho minha última volta No cavalo de balanço da
Eu
Não
140
vou
sentir falta dele
escolinha-
D. Jean Clandinin | E. Michael
Connely
(1996, p. 1-3):
sua
cauda
já se foi pela metade
Digo adeus...
Conversando sobre compras para
o meu
uniforme
embora eu não soubesse o que poderia ser um uniforme de blazers cinza com azul royal na gola Robert e eu estávamos orgulhosos -
mam e
entrega nossos sapatos
um último brilho com um espanador ela ajusta a fita no meu cabelo confere
os
rostos limpos...
meu pai diz,
"Tome conta de sua irm" Robert concorda atravessamos a ponte do canal
para chegar à estação .. e embora eu tivesse cinco anos Robert segura minha mão
dando um pequeno puxão quando eu desacelero Não estarei a ver navios nos dias de escola..
mamãe lhe dá um sorriso de aprovação nos dois sorrimos de volta amandoa nossa aventura
na estação compramos os bilhetes
de Liverpool para Blundellsands ida o coletor de bilhetes perfura-oS... -
e
volta
na plataforma vemos garotas grandes com os mesmos blazers mamae conversa com elas
Vejo-as concordando
elas vão cuidar de nós
Pesquisa narrativa
141
no trem de volta para casa então, mame
nos encontrará
nosso trem para em muitas estações mame
diz os seus nomes
e repetimos quando as meninas grandes se levantamn
sabemos que é a "Isto não vai e
nossa
parada
dificil", diz mame as meninas grandes dizem,
"Não
se
ser
preocupe, cuidaremos deles"
mais caminhada vemos uma placa
mamäe lê em voz alta
"Convento Escola Ursuline" parece o castelo
do meu livro de contos de fadas especial e ainda misterioso Eu sei que
gostarei da minha escola
Escrito
forma poética, esta história é início de sua pesquisa.
em
uma
das três
compostas Quando tenta encontrar seu lugar no espaço da pesquisa, ela se coloca dentro de suas primeiras experincias escolares. Começando como uma estudante, novamente em seu trabalho de por
Davies, no
doutorado, volta à sua infância e às experiências de aprendizagens em outro lugar, quando ela começa a luta de elaborar sua pesquisa. Uma das primeiras coisas que os pesquisadores narrativos fazeme o que vemos Davies
fazendo, isto é, ela própria se
meio". Escrever histórias da isso.
Quando
começo
em
escreve esse
outra escola,
posicionando "no entre
própria experiência é uma maneira de fazer primeiro poema historiado, ela lembra de seu
e sua
segunda história é sobre o
início no esino tempo integral. A relevância dessas histórias de começos é relatar o interesse de Davies pelas
em
experiências de trabalho em
equipe dos profes fundamental para a maneira como ela ue pesquisa. Para a pesquisadora, a relação do enquadra seu problema
sores
e
é
primeiro trabalho de ensin após anos afastada pad*
tempo integral, após retornar à sala de aula,
142
D.
Jean Clandinin | E Michael Connely
maternidade e para o trabalho de meio período, era a situação de docên cia em equipe. A maior parte de seus textos de campo subsequentes esta,
então, no interior e em torno dela própriae nas experiências de outros
professores que trrabalhavam em equipe. Evidentemente, as histórias não são necessariamente apresentadas em forma poética. Na verdade, elas são mais suscetíveis a aparecer em
formato de prosa. Conforme leremos
àfrente,
muitas histórias são incorporadas, quer de histórias completas. No trabalho de
forma de esquema ou em forma Davies, elas aparecem numa escrita
em
outros textos de campo,
em
autobiográfica, em entrevistas sobre história oral, em anotação de campo do dia a dia baseadas na participação em sala de aula e em conversas.
Escrita
autobiográfica como texto de campo
Estes relatos são, por vezes, autobiográficos, como o poema his-
toriado de Davies. Ele é simultaneamente um exemplo de uma história de campo e de escrita autobiográfica como texto de campo. Para Davies, o escrito autobiográfico sob a forma de poema leva-a para o
como texto
entremeio da experiência. A escrita autobiográfica é uma maneira de escrever sobre todo o contexto de uma vida. No poema historiado de Davies, ela faz uma escrita autobiográfica relatando o início da sua vida e define o contexto para contar sua vida escolar posterior. Essa história é sobre um breve instante de um evento muito particular, uma viagem matinal para a escola. Mas é mais do que uma anotação isolada e descontextualizada do que poderia ser um relato de pesquisa. A partir do poema, aprendemos sobre a sua vida familiar, algo sobre sua vida religiosa, sobre as atitudes dos pais sobre Educação, algo da comunidade em que vivia a familia, coisas sobre o
sistema da época, das classes sociais na Gr -Bretanha,
e assim por diante.
0 poema é cheio de detalhes autobiográficos que mostranmo contexto de sua vida. Molloy (1991) observa que a autobiografia é sempre uma "re-
apresentação, ou seja, um recontar, porque a vida a qual esse recontar supostamente se refere já é um tipo de construto narrativo. A vida ésempre, necessariamente, um conto" (p.5). Como pesquisadores narrativos,
reconhecemos que qualquer fragmento de escrita autobiográfica é "uma reconstrução particular da narrativa de um determinado indivíduo, e po-
Pesquisa narrativa
143
deria haver outras
reconstruções" (Connelly; Clandinin, 1988, p.
39). Sempre pode haver uma rica variedade de possíveis textos de cam.
quando escrevemos textos autobiograficos. Ao olharmos para esse conjunto de possibilidades vemos que muitos deles tëm uma qualidade autobiográfica. po
Existe como
uma
linha muito sutil entre
textos de campo
e a
a
escrita
autobiográfica utilizada
escrita
autobiográfica utilizada como textos de autobiografia e memorial são reconhecidas
pesquisa.
Cabe ressaltar que formas de textos de pesquisa, sobre os textos de pesquisa, o
mas
voltaremos
a
elas
em nosso
capítulo
capítulo nove. No entanto, queremos apenas assinalar que a escrita autobiográfica pode ser usada de diferentes formas. Pesquisadores precisam estar cientes das suas utilizações no âmbito das suas pesquisas. Neste capítulo, discutimos os textos de campo autobiográficos de Davies, que foram usados para escrever um texto de pesquisa que não era primariamente autobiográfico. A dissertação de Davies- seu texto de
pesquisa
não é
autobiografia. Mas, os mesmos textos de campo autobiográficos poderiam, certamente, terem sido utilizados por Davies para escrever
uma
um texto
de
pesquisa autobiográfico.
Escrita de diários Muitas
vezes, o
escrito
como
textos de campo
autobiográfico, do tipo
que Davies usou, está
estreitamente relacionado com a escrita de diários. Davies, por exemplo, escreveu diários durante muitos anos, frequentemente relacionados com o seu trabalho como professora pesquisadora. Ela escrevia regularmente um diário que documentava sua aula prática. Por um certo tempo, ela era parte de um de grupo pesquisa docente no qual os membros do grupo compartilhavam seus diários, sabendo que comentariam uns sobre os diários dos outros. No0 caso da Davies, imaginamos que seus diários, como uma reflexão sobre sua prática, não foram concebidos como um texto de campo de pesquisa. No entanto, achamos que deve ter havido uma mudança em seu pensamento sobre o seu diário como uma espécie de texto de campo, quando ela aderiu ao grupo de pesquisa de professores. Imaginamos que esses diários poderiam ter tido um tom diferente e, talvez, ela tivesse registrado coisas diferentes de formas
diferentes, se tivesse pensado em seu uso previamente. Isso
nos
lembra que
textos de campo são sempre e esse aspecto também levanta a quest o da audiência para os textos de
144
os
D. Jean Clandinin | F. Michael Connely
interpretados,
campo. Mallon (1984) faz um excelente comentário em que ele reflete
sobre a influència reflexiva e pessoal sobre os tipos de diários mantidos, quando alega que um diário pessoal tem sempre um senso de audiência. Segundo esse autor, "Eu posso recordar algumas vezes durante o dia, que eu decidi não fazer algo (geralmente, uma coisa mesquinha e má), porque percebi que se eu fizesse isso eu teria de me referir a elas no diário daquele dia. Isso pode ser o resultado de uma Educação católica, durante a qual a confissäo era um elemento de perdão para o pecado, e não apenas um antidoto, ou pode ser apenas uma desculpa que ocasionalmente me dou
para permitir-me ser melhor do que sou" (p. xiv). Contrariamente ao sentido de que os dados de pesquisa são livres, numa pesquisa narrativa, o público alvo é sempre uma presença e inter
pretativamente molda os textos de campo construídos. Diários são um meio poderoso para que as pessoas possam dar relatos de suas experiências. Como May Sarton (1982) observa, "Diários são uma maneira de descobrir onde eu realmente estou... Eles têm a ver com encontros com pessoas que vêm aqui, que conversam comigo, ou com amigos que vejo ou com o jardim. Eles me fazem sentir que a trama de
minha vida tem um significado "(p. 25). Diários são um método de criação de textos de campo. Porque, para Davies, eles eram a parte da sua vida de professora-pesquisadora, ela virou-se para eles como uma forma de criar textos de campo em sua pesquisa. Em seu diário, Davies escreve sobre o seu primeiro dia no local de sua pesquisa, na terceira fase do seu trabalho: . minha necessidade de um cenário onde me sinta confortável, a minha necessidade de estar me relacionando com os professores no meu estudo e de estar com os professores que acreditam na equipe docente. Eu disse que queria estar na Escola Riverview porque eu sabia que Tom e Liz estavam trabalhando juntos. Gostaria de saber se eles estariam interessados
em participar da pesquisa. Visitei a escola na segunda-feira, 3 de outubro. Eu tinha ido lá no recesso de um estudo para uma das nmipara pedir aos funcionários para participar nhas aulas da universidade. Fui bem recebida e fiquei satisfeita. Tom estava ansioso para saber como as coisas estavam indo para mim e eu pensei em
casualmente a possibilidade de trabalhar com ele e com apenas explorar Liz. Ele estava muito animado com a perspectiva, e de imediato, insistiu em que
eu
fosse para
a
sala de aula às 10:45,
0 momento em
que ele iria come-
Pesquisanarrativa
145
çaro seu seu
ensino
Uma em
to
dia
vez
com
Liz. Ele disse-me
como
ele estava
entusiasmado
e com a experiència de trabalhar em equipe.
dentro da sala de aula.. Senti de imediato
casa.. Tom
de ensinar
e
me
Liz
uma
sensação de estar
pareciam realmente satisfeitos de me ter lá
lembrou
uma
conversa entre
com
*
. .
Seu jei
amigos. sorriam tanto enquanto interagiam entre si e com as crianças. Eles estavam se divertin do em um ambiente descontraído de aprendizagem. [diário, out 16, 19941 [1996, pp. 58-60] Os
diários de pesquisa de Davies são
de notas de campo
Eles
combinação interessante sua visita à escola entrelaçadas com se sentia sobre a experiència. Ela relata as uma
detalhadas sobre
reflexões sobre a forma como condições existenciais do que ela está fazendo, situando-as em um lugar, em um determinado de período tempo, com detalhes dos eventos ficos
observados. Ela então sentimentos, de estar feliz, diário de
especí-
vira para dentro de si para dar conta de seus e metaforicamente de "estar em casa". Nesse
pesquisa, vemos seu entrelaçar semelhante ao que fez Vicki Fenton, capítulo seis, um texto de campo dual, com anotações de campo que registraram eventos externos e observações de diário no
que
suas respostas internas.
registraram
Os
diários talvez, e muitas vezes, assumem nadora intimamente reflexiva, talvez menos
uma
qualidade questio
experiência, como observado por Sarton, e mais como forma de relato de uma forma de problematizar a experiência. JoAnn Phillion, uma escritora inveterada de como uma
ários
em suas
pesquisas de campo, refere-se a
de luta." Davies
seus
também escreveu muitos diários problematização. Mas, em seu caso, esses diários
diários
di como "espaços
com essa
qualidade
de
não eram,
na sua maior textos de pesquisa. Eles eram muito mais re cursos inmportantes de textos de campo para sua pesquisa em desenvolvimento e para a construção de seus próprios textos de pesquisa. O pesquisador narrativo principiante achar pode fazer um diário é um desperdício de tempo e ficar com a sensação de que que a escrita deles nao acrescenta muito. Ouçamos a crítica de Emily Carr, ela seus diários pareciam ser "feitos de restos de nada" quando escreve que (1966, p. v). Ela na seus diários de docinhos de festa, que são "tão pequenos que não vale a pena comé-los em
parte, trabalhados
em seus
denom
pequenas porções" (p. v). No entanto, ela escreve: "Foram pequenos aspectos que, juntos, me ensinaram a viver. Demasiado im significante para ser considerado individualmente, mas como os docinhos esses
146 D. Jean Clandinin E. | Michael
Connely
de festa dão água na boca e aos poucos ficamos satisfeitos e saciados"(p. v).
Pesquisadores, tais como Davies, encontraram esses padrões emergentes quando eles escreveram seus textos de pesquisa. O que pode ter parecido
ser insignificante ou nada no momento em que foram compostos, como texto de campo pode assumir um padräo quando entrelaçado com outros textos de campo
no
momento da
construção de
textos de
pesquisa.
Notas de campo como textos de campo Na maioria dos nossos trabalhos de Pesquisa Narrativa, as anota-
çoes de campo são as formas mais importantes que temos de registrar os pedacinhos de nada que preenchem nossos dias. Essas anotações diárias, cheias de detalhes e momentos de nossas vidas de pesquisa, são o texto sem o
qual não podemos contar histórias de
nossas
histórias de
experièn
cias. No capítulo seis, escrevemos sobre anotações de campo como um dos mais importantes tipos de textos de campo que permite tanto nos apaixonarmos pela nossa área quanto fazer uma observação objetiva, bem como
fornecer detalhes que completam a nossa memória esboçada. As notas de campo, combinadas com os diários escritos sobre nossas experiências de campo, permitem um equilíbrio reflexivo. Na ilustração seguinte, de uma nota como texto de campo, temos um excerto de Davies, sobre quando ela trabalhou numa aula do primeiro ano de Tom e Liz, dois participantes da equipe docente: Tom revé o que eles tém feito até agora usando um caderno de uma criança. Com o livro de Jessica, Tom mostra as crianças que ela está passando página
por página "sempre na próxima página", As falas de Liz e Tom resultam numa conversa fácil quando o conceito de ciência é explicado. Tom escreve um título na lousa, "Primavera Muda para Inverno" Ele relaciona isso com a neve pesada que havia caido no final de
semana. Liz retoma. Ela cria uma lista de vocabulário quea turma lê: geada, neve, lama, água, o ar éfrio, as árvores não tém folhas. Enquanto Liz trabalha o vocabulário, Tom vai conversar com Cameron. O trabalho que ele faz
com Cameron não perturba a aula. Cameron está sendo ajudado no sentido de ter um comportamento mais adequado.
Voltando à frente da sala, Tom explica como registrar as observações pesso ais
numa
página dupla do caderno
de ciéncia.
Pesquisa narrativa.147
Eu
caminho n a sala a
fim
início dos exercícios
o
uma
e
a
de
conver'sar
tentar
mostra árvore. Ele tannbém
desenha
a
partir do seu
a
com a s os
aprender
Crianças, ajudando-as nomes.
água subterránea
conhecimento
|sic),
como
Erik está
a fazer
desenhando
indo às s u a s raízes. Erik
sugere Liz.
Danny m e disse,
fora ele a c r e s c e n t a "estou indo Em "Isso éo que elasfazem para crescer o comentáimpressionado que ele captou minha árvore, Estou copiar para livro e lápis, Danny camiobservam" Pegando seu rio de Liz que "cientistas 100-101] 17 de outubro de 1994] [1996, pp. nha para ajanela. [nota campo,
lá
péé,
pesquisadores de campo possam ser escritas por Davies, como pesquisadora. participantes, essas foram feitas por das crianças com quemn atividades de ambos, Tom e Liz e
Embora ou
pelos
Ela anotou
as notas
as
mesma e sobre as crianças eles interagiram, além de tomar notas sobre si s e r escritas com com quem ela havia interagido. As notas de campo podem mais ou menos detalhes e com mais ou menos conteúdos interpretativos.
Nessas
anotações de
campo, Davies está tentando
registrar
o
máximo de
detalhes possíveis, até mesmo quando ela participa na sala de aula. Os pesquisadores precisam estar conscientes sobre os tipos de notas de campo criadas, particularmente sobre as relações que têm com os
participantes. No capítulo seis, enfatizamos o papel das notas de campo em influenciar o tipo de relação estabelecida entre pesquisador e participante, mas é também o caso de que a relação estabelecida influencia os tipos de notas de campo feitas. Como destacado anteriormente, isso faz uma grande diferença se nos distanciamos dos acontecimentos a fim de registrar as anotações ou se participamos ativamente de eventos como um parceiro. Do mesmo modo, faz diferença quando criamos notas de campo se nos vemos apenas como registradores externos (outsider) dos eventos ou se nos vemos como
ramente
se
vê
personagens desse evento. Nesse
participando
dos eventos
como uma
caso,
parceira
Davies cla-
e como uma
personagem. Nossa opinião é que os pesquisadores são frequentemente mais relutantes do que o necessário para usar as notas de campo. A preocupação é de que as anotações de campo sejam insuficientes para capturar a experiencia de campo adequadamente. Quando isto acontece, gravadores de fitas e de vídeos tendem a ser usados em excesso, com posteriores sessões de transcrição severas, já que as anotações são feitas com base nas transEm crições. qualquer evento, o receio é de que algunma seja perdida e isso leva os pesquisadores a tentar gravar tudo.experiència O que falhamos
148
D. Jean Clandinin
|
E
Michael
Connely
em recohecer claramente é que todos os textos de campo são representaçoes construídas da experiência. Fotografias tiradas pelos participantes ou pesquisadores são, em nossa perspectiva, uma espécie de nota de campo. Na pesquisa narrativa, os pesquisadores fazem uso de fotografias. Por exemplo, em um estudo
com jovens garotas, Jean deu câmeras para elas e pediu-lhes para gravar, com fotografias, os aspectos de suas experiências dentro e fora da escola. Essas fotografias foram reveladas e tornaram-se o tema de conversas nas quais as jovens falaram sobre o que estavam tentando capturar naquelas fotografias. DeCarion (1998) e Bach (1997) fizeram uso intensivo de fotografias, tiradas por elas mesmas e tiradas por seus participantes, como
uma espécie de nota de campo.
Cartas como textos de campo Cartas são escritas para alguém com a expectativa de uma resposta. Em cartas, tentamos fazer um relato de nós mesmos, fazendo sentido das nossas experiências, e tentando estabelecer e manter relacionamentos entre nós mesmos, as nossas experiências, e as experiências dos outros. Na
Pesquisa Narrativa, as cartas como textos de campo podem ser utilizadas entre os participantes, entre os colaboradores da pesquisa, ou entre os pesquisadores e participantes. Em cada caso, um dos méritos das cartas é a relação de igualdade estabelecida, o ir e vir da conversa. No trecho a
seguir temos uma carta como texto de campo. Davies (carta, 12 de novembro de 1994) (1996, p. 112) escrevia uma por semana para Tom e Liz, seus
dois professores participantes: Queridos Tom e Liz, Como eu observei Aaron, queria que sua mâe pudesse ver o comportamento do filho em relação aos seus colegas. Escola é uma experiência tão diferente para uma criança. Pensei, também, sobre muitas conversas que tivemos com os professores sobre o "comportamento no limite" -
a
forma
como os jovens se posicionam em um grupo. Notei que Jenny fica sempre
tão próxima, nunca passa dos limites. Por que algumas crianças escrevem absurdo para eles mesmos? Aaron nào teve um parceiro para a atividade de artes. Isso não foi uma surpresa. Quando frustrado fazia coisas tolas, como ficar procurando a tesoura. Quando bem sucedido, com apoio, ele
Pesquisainarrativa 149
era capaz de realizar um trabalho perfeito. Com um adulto exclusivo Dara
ajudá-lo
ele
era
ótimo. Com
um
de 23
ou
48 ele sente dificuldades
essa parte não deva ser levada para sua m e.
e
talve
Com sua mae ao seu lado na
mesa da cozinha, o trabalho de Aaron seria ótimo. Eu vou observá-lo me. Ihor agora. Por falar nisso Liz, eu achei que sua anotação de casa para a mäe
dele.. deu-lhe propriedade para a conver'sa que ele precisa ter... Você criou um espaço, uma conversa...que não
a mae e nem o professor resolvendo
o problema do Aaron.
Até a próxima semana, Annie
A qualidade mais notável da carta é o seu tom pessoal e conversacio nal. Isso foi dramaticamente diferente das anotações de campo de Davies, ilustradas anteriormente. Havia pouco sentido de audiência e nenhuma
expectativa evidente de resposta. Suas anotações tinham uma espécie de "agora isso, em seguida aquilo, e depois" sentido. Na carta, Davies tenta olhar através do "nada" do cotidiano, quando ela procura por padrões, que nessa fase de sua pesquisa, são os padrões de questionamentos, são as coisas sobre as quais ela pensa. Vemos isso observando como ela tenta descobrir como duas crianças, Aaron e Jenny, fazem sentido do que elas são na sala de aula. Ela observa a diferença que faz o trabalho diário junto com Aaron comparado ao trabalho feito como membro de uma vasta equipe de docentes. Ela dá a Liz um feedback sobre o que ela vê que a carta, de Liz diz para måe de Aaron, em termos do trabalho em Cartas como textos de campo também podem ser criados pelos par-
desenvolvimento.
ticipantes. Na próxima carta como texto de campo, Liz, como participante, escreve para Davies (carta, 5 de novembro, 1994) (1996, p. 174), a fim de dar
significados
as
reuniões de
Esse texto, de autoria de
dora,
torna-se
um
outro
uma
planejamento das equipes de trabalhos participante e endereçado a uma pesquisa
tipo de
texto de
campo.
Cara Annie,
Considero essas reuniões muito frustrantes, estou muito grato por Tom estar
aqui para amenizar
isso. Tenho
aprendido ao longo dos anos que e importante que se diga o que você acredita e ouvir as filosofias dos outros. Eu tento arduamente ouvir
outrose
eu vou
e ser
solidário
com as
estratégias de ensino dos
continuar a trabalhar nesse sentido. Essa é uma das minhas ano. Carol tem seu próprio jeito que é mellhor para ela
metas para este
150 D. Jean Clandinin
| F. Michael Connely
mas, porque meu jeito é diferente, pretendo defender o que eu acredito. Com carinho,
Liz Nessa carta, Liz tenta compor sentido de sua experiência por escri-
to. Há, novamente, a expectativa de resposta e conversa. Davies (1996, p. 176), comentando a utilização de cartas como tex tos de campo, escreve:
A coisa positiva acerca das cartas é o fato de que você pode ficar em contato com seus próprios pensamentos e sentimentos, em seu próprio tempo e
espaço. Permite, creio eu, um nível mais profundo de reflexão por parte dos escritores (nesse caso, Liz). Liz sentiu-se obrigada a escrever em resposta à minha carta para ela. A escrita de uma carta oferece privacidade de pensamento e de clareza. Pensando nisso, eu percebi o quanto eu sei
sobre a escrita de carta a partir de minha experi ncia
de escrever para os
meus pais a cada semana, e de ler sobre outros escritores de cartas como Virginia Woolf e o Grupo Bloomsbury. A escrita de carta para mim não é a escolha de uma metodologia, como foi, a partir de uma lista de possibilidades, mas é uma resposta mais complexa ao contexto particular que é a forma como tenho sido moldada e o meu desejo de estar me relacionando com meus participantes. Para mim, a escrita da carta tem que encaixar... fazer sentido. Existe uma autenticidade para ela. A escrita de carta honra
o tempo eo espaço do outro. O tempo para Liz era um prêmio.A escrita de carta poderia se encaixar em sua vida e do seu jeito. Ela sentiu que a carta nos conectava.
Conversa como texto de campo Como já referido acima, as cartas como texto de campo, ilustrado pela carta de Davies para Liz e a carta de Liz para Davies, assumem a qualidade de uma conversa por escrito. No entanto, uma conversa é mais frequentemente uma maneira de compor um texto de campo em encotros
face a face entre pares ou entre grupos de indivíduos. No excerto a seguir, de seu texto de pesquisa, vemos Davies (conversa, novembro 9, 1994) (1996, pp. 110-111), como pesquisadora, suscitando uma questão e Liz e Tom se envolvendo na conversa sobre a jpråtica de suas aulas:
P'esquisa narrativa
151
Eu
ouvi falarem de Aaron,
primeiro
do grupo da Liz, Tom um
e eu
para
na
Quando
um
gravada
Liz finalmente juntou-se
fazer sobre
LIZ: Eu
falar
com
a
sob
responsabilidade
a
estava atrasada em na
a
juntar-se
com
sala de aula. Ela havia recebido filho não gostou da
nós, perguntei
o
que ela estava
situação:
descobrir por Aaron esta tarde, pessoalmente, para odiando a escola. Ele não quer voltar.
descontente que ele está tão
TOM: Talvez
Liz
criança
seu pai chateado, explicando que
planejando vou
almoço.
a nossa conversa
telefonema de
escola.
hora de
uma
e
caminho de casa, que nós não alguma coisa aconteceu hoje no
sabemos? LIZ: Lembre-se, ontem, no refeitório, o supervisor levou a sacola grande dele... Tenho a sensação de que era seu brinquedo para compartilhar. Ele o tem isso desde os dois anos de idade.
TOM: Ele estava batendo nas pessoas com isso. Será que sua me
sabe so-
bre o seu comportamento?
LIZ: Eu disse a ela, ela sabe. TOM: Isso contribui para uma criança não gostar da escola.
LIZ: Nós vamos resolver isso. Ele é um menino muito inteligente.
Conforme esclarece Davies, essa foi uma conversa gravada no almoço, a qual foi posteriormente transcrita. Conversas e entrevistas säão claramente duas das interações em que um pesquisador pode querer usar
o gravador E possível, claro, imaginar uma reconstrução de anotações de campo ou uma reconstrução de eventos diários. Mas seria difícil captar a
dinâmica de
troca
interpessoal. Além disso, o gravador libera o pesquisa
dor para participar da conversa.
Como é evidente, no segmento acima as conversas são marcadas
pela igualdade entre os participantes e pela flexibilidade para perminr que estabeleçam formas e temas adequados a sua pesquisa de grupo0. lemos isso
quando
Liz
e
Tom
exploram questões
acerca
do
comporta
mento daquela criança. Conversas implicam o ouvir. A resposta do ouvinte pode constituir uma sondagem da experiencia que tem a representação da
152 D . Jean Clandinin | E Michael
Connely
experiência muito além do que é possível em uma entrevista. Na verdade,
há uma sondagem em uma conversa, uma sondagem profunda, mas é feita em uma situação de confiança mútua, de escuta, e de solidariedade com a
experiência descrita pelo outro.
Entrevista de pesquisa Um método
amplamente
como
texto de
utilizado de
campo
de textos de campo é a entrevista (Mishler, 1986), que pode ser transformadas em textos de
criação
campo escritos através de várias formas. Todas as fitas podem ser trans-
critas; anotações de campo podem ser feitas como uma escuta e re-escuta das
gravações,
ou
transcrições parciais de segmentos da entrevista
grava-
da, dependendo do interesse do pesquisador. A forma como um entrevistador age, questionae responde em uma entrevista formula uma relação e por isso os participantes respondem e
dão relatos de suas experiências. O mesmo ocorre considerando as condições em que a entrevista acontece e também a forma, por exemplo, o local, a hora do dia, e o grau de formalidade estabelecida. Imagine, por exemplo, as diferenças que possam desenvolver entre uma entrevista de um admi-
nistrador sênior conduzida na sede central da empresa em comparação com a mesma pessoa entrevistada em sua casa.
A questão sobre a forma como um entrevis
or age, pergunta e
responde é graficamente ilustrada pelo comentário de Anderson e Jack (1991) acerca de um estudo sobre uma entrevista em que eles escreve "Os entrevistadores ignoram as dimensões mais subjetivas da vida das mulheres ou aceitam comentários de valor pessoal, quando uma pausa, uma palavra, ou uma expressão pode ter convidado o narrador a continu-
ar" (p. 12). Entrevistas de pesquisa têm normalmente uma desigualdade acerca delas. A direção da entrevista, juntamente com suas questões específi cas, é regida pelo entrevistador. No entanto, pesquisadores que estabele cem relacionamentos participativos com os participantes acham dificil, se não impossível, conduzir tais entrevistas. Mesmo quando eles começam
com a intenção de realizar uma entrevista, essa, muitas vezes, se transfor ma em uma forma de conversa.
Existe também a possibilidade de as entrevistas de pesquisas se rem controladas pelos participantes. Eles podem pedir para serem entre
Pesouisa harrativa 153
vistados sobre um assunto um
particular, assim tëm uma oportunidade de dar
relato de si
próprios em torno desse tema. No entanto, se escolhido pelos participantes ou pelo pesquisador, os tipos de
o
tema é
perguntas e formas que são estruturadas fornecem as ideias principais com as os quais participantes moldam os relatos de suas experiências. Minister afirma que "a seleção de um (1991
as
determinado tópico pelas questões do entrepessoa falando em algum momento, o narrador "roubando a cena" com uma linguagem referencial que mantém dentro dos limites de temas selecionados" (p. 35) fazem grande diferença no conteúdo dos textos de vistador,
uma
campo criados.
Entrevistas entrevista em
de
histórias orais são
das formas mais comuns de pesquisa narrativa. Existem várias estratégias para a obhistória oral, que varia em utilizar um conjunto uma
uma
tenção de uma a estruturado, partir de perguntas em que as dos pesquisadores são mais intenções dentes (Thompson, 1978), ao pedir aos participantes que contem suas evi próprias histórias, a sua própria maneira e (Anderson 1991), caso em que as intenções dos participantes são mais evidentes.Jack, Ao comentar sobre seu próprio trabalho, Anderson e Jack (1991) escrevem que a mudança de foco "a partir da coleta das informações quando o foco é as questões essenciais à interação ou quando o foco é o processo (p. 23)", e ilustram o
potencial dinamico dos textos de campo sobre as histórias orais construídos colaborativamente. Nesse último caso, os
poderíamos imaginar como o participantes se engajam em uma conversa, sobre ou comopesquisador e
durante a qual cada um traz o seu material de história oral. Davies realizou entrevistas de histórias orais
história oral,
um dos seus participantes ao longo de seu estudo. O seguinte trechocada é uma com
ção feita a partir da entrevista de história oral com Tom. Essas
transcri
entrevistas um conjunto
conduzidas por Davies tendiam a ser mais estruturado de perguntas as quais solicitampróximas de usar que os participantes contem suas próprias histórias, a sua própria maneira. TOM: Eu
era o
velha vivendo eu
ainda
quarto filho em casa,
estava
na
de cinco. Eu mal
porque ela
escola
e
foi para
minha outra irm
me o
lembro
curso de
da minha
irm mais magistério quando
foi para o curso de formação pré-escola quando eu era muito jovem, tivemos... viagens de acampamento em família e Natal com a casa cheia de gente. Nós vivíamos numa pequena casa no noroeste de Calgary. ANNIE: Então você nasceu em para
a
também. Então,
Calgary?
TOM: Sim,
em
1952.. minha måe sempre dizia que
a nossa casa era
peque-
na demais, e ela a odiava porque ela era uma mulher do lar.. Meu irmão. era
de
très
anos
mais velho.
. .
Ele, sendo
o
primeiro menino, tinha
a
espécie
responsabilidade de meus pais acerca das coisas de menino.
Ele sempre quis facilitar as coisas para mim, e eu sempre quis facilitar as coisas para o meu irmão mais novo. Ainda sou bastante próximo da minha segunda irma. Nos falamos muitas vezes ao telefone... mas eu realmente não sou tão
próximo da minha irm mais velha e eu acho que é simplesmente porque ela nunca viveu em casa... que me lembro. Lembro-me de nossas viagens
de acampamento, quando tínhamos toda a familia reunida, mas às vezes voce não sabe se você se lembra ou apenas tem essa lembrança a partir de
fotografias. [1996, pp. 68-69] Entrevistas de histórias orais são autobiográicas e contém fatos, como
claramente visto
nesse
fragmento.
Frequentemente, envolvemos os participantes na criação do que cha mamos de anais e crônicas, como uma forma de criar a estrutura principal a partir da qual constroenm suas histórias orais. Através do processo de compor anais e crônicas, os participantes começam a recordar suas experiências e a criar os pontos primordiais de uma narrativa pessoal. Anais e crônicas podem ser pensados como a elaboração rudimentar do narrar histórias pessoais e sociais. Usamos essas duas noções como instruções formais para alunos envolvidos na construção de histórias narrativas pessoais. Pensamos em anais como uma lista de datas, memórias, eventos, notícias, e coisas do gênero. Os alunos ou participantes constroem linhas do tempo desde o início, por exemplo, o nascimento, algum período distante, ou data importante na história das pessoas da família, ou alguma data mais recente como uma espécie de ponto referencial inicial. Pensamos em crônicas como a sequência de eventos
dentro e em torno de um tema específico ou uma discussão narrativa de
interesses, por exemplo, a adolescência ou os anos de viagem. Ás vezes, os anais e crônicas construídos em tormo da linha do tempo são especialmente úteis na construç o
de histórias orais e escritos narrativos. Mas, em outras
Ocasiðes ou para outras pessoas podem ser menos significativas. Esse sentido, que determinados tipos de textos de campo podem
ser mais ou menos importantes para pessoas diferentes em momentos diferentes, tende a ser aplicável a todos os textos de campo descritos neste capítulo. Às vezes, as fotografias são vistas como extremamente importantes, às vezes as notas de campo, por vezes anais, e assim por
Pesquisa narrativa
.
155
diante. Em última análise, é o entrelaçamento de textos de campo e a arte de textos de pesquisa significativos que são os árbitros finais de um sentido relativo junto a qualquer tipo particular de texto de campo Essas questões são discutidas com mais detalhes no capítulo nove.
Histórias de família e histórias das familias como textos de campo Histórias familiares são essas histórias proferidas de geração em geração sobre os familiares e eventos familiares. Muitas vezes, as contamos quando estamos tentando dar um relato de nós mesmos e quando as pessoas, muitas vezes os pais, estäo estabelecendo valores. Percebemos
algo semelhante quando o professor de música estabeleceu um legado ao qual Tom deveria fazer jus: Fui transferido para um programa de uma escola regular e levei a Música 10
que foi ensinada pelo diretor musical da minha igreja. Ele era amigo íntimo dos meus pais. Ele tinha minhas irms
no grupo de música também, então no
primeiro dia de aula, quando ele estava fazendo a chamada, quando chegou no meu nome ele olhou para cima e disse: "Vocé não?" E eu disse: "Sim, eu sim"
"Bem, esse
eu
tenho certeza que você será
legado que eu
Essa é
uma
tinha de viver. Ele
um
dos melhores cantores aqui.." Havia
conheciaa
história familiar que molda
a
minha família. [1996, p.
71).
identidade de Tom.
Outro exemplo de história de família é visto no transcrito da entrevista de história oral em que Tom conta sua me é relatada como do lar e que viviam em uma casa que era muito pequena. A experiência de histórias familiares tem condições existenciais e internas, como Stone (1988) observa: "A si
primeira preocupação da família é por segundo aspecto de preocupação é a sua relação com o mun-
só, do. Histórias familiares acerca do mundo são geralmente histórias de ensino, dizendo ao familiares os caminhos do mundo de acordo com mas o seu
as
que
seus
antecessores tiveram... Histórias familiares
portância,
mesmo
quando
as
parecem
experincas
persistir na im
pessoas pensam em si mesmas, individualmen te, sem dar conta da relevância do papel familiar. A principal cadeia humana de que fazemos parte é o centro da nossa identidade individual"
(p. 7).
56
D.
Jean Clandinin | E. Michael
Conely
Documentos Há
uma
como
textos de campo
série de
documentos em qualquer pesquisa de caimppo. Como pesquisadores, temos de decidir qual desses documentos são relevantes para uma pesquisa narrativa. Conforme observado anteriormente neste capítulo, seletivamente decidimos escolher documentos
sobre a política escolar e não documentos sobre ensino, como aque les relevantes para nossa pesquisa na Escola da Rua Baía. Com aquela ideia em mente, também revisamos e coletamos materiais de arquivo nas áreas do Conselho de Educação e outros
departamentos.
Davies recolheu documentos de estrutura escolar relacionados
às equipes docentes, os documentos recentes e arquivados do Conselho de Educação relacionados à equipe docente, além de documentos contextuais relacionados a um grupo particular de professores com quem ela trabalhou. Alguns dos documentos recollhidos e analisados por Davies foram relatórios dos pais ao Conselho da escola, históricos de
média, relatórios do histórico da avaliação educacional, administração escolar e dos documentos da política educacional da escola, memorandos e outras comunicações oficiais. Já relatamos que, em nosso trabalho anterior na Escola da Rua Baía, decidimos selecionar todos os
documentos que os professores recebiam através das caixas de corres pondências criadas pelas secretárias para nós, mas tivemos o conheci mento, após o fato, de que os professores também recebiam materiais de outras maneiras. Talvez um dos pontos mais importantes, para nós, é constatar quão facilmente, em nossa experiêencia, esquecemos ou ignoramos a existência e a importância dos documentos.0 pesquisador, que estabelece relações com os participantes, pode tornar-se tão centrado na relação que o fluxo de documentos, que pode ajudar a contextualizar o
trabalho, passa despercebido.
Fotografias, caixa de memória e outros artefatos pessoal-familiar-social como texto de campo Muitos de nós coletamos uma variedade de materiais quando compomos nossas vidas. Fazenos isso como pesquisadores e nossos partici-
pantes também fazem. Podemos selecionar e guardar fotografias de pes-
Pesquisanarrativa 157
soas
notáveis
vidas de
alguma forma, de eventos especiais e de lugares. Cada fotografia representa um momento especial em nossa memória, uma memória que nos cerca e das quais construimos histórias. As em nossas
coisas, que se encontram no meio de outras, chamamos de caixas de memórias. São coleções de itens que acionam memórias de momentos
outras
im-
portantes, pessoas e eventos. Todos esses itens podem ser desencadeados na nossa memória, para recolher os "pequenos fragmentos que não têm começo nem fim" (O'Brien, 1991, p. 39) e em torno dos quais contamos e recontamos histórias. São esses artefatos, coletados em nossas vidas, que fornecem uma fonte rica de memórias. Observar esses documentos em um contexto de
pesquisa narrativa constitui algo que
arqueologia
da memória
e
do
se
pode chamar de
uma
significado.
têm um papel semelhante a Arquivos desempenhar em pesquisa narrativa relacionado ao explorar de narrativas sociais. Por exemplo, durante o centenário do Canadá, no ano de 1967, as comunidades em todo o país estabeleceram pequenos museus, onde vários artefatos e museus
uma
dos membros das comunidades foram recolhidos. Esses pequenos museus tornaram-se uma espécie de caixa de memória, uma coleção que expressava a narrativa social de cada comunidade. Ao mesmo tempo em que esses museus foram criados, muitas comunidades locais formaram comitês de escrita devotados a recolher histórias
família
de
Esses livros a
e
histórias familiares
que posteriormente compiladas em livros posteriormente distribuídos.
foram
também
se
tornaram
uma
construção de narrativas sociais.
fonte rica de textos de campo para
Experiência de vida como fonte de
textos de campo A
te, por
Pesquisa Narrativa tem uma qualidade
vezes
extremamente interessanconfusa, de concentração global de experiências de vida com
experiência específica de pesquisa,
vezes
pensamentos de experiências, muitas pesquisa. E quase uma pesquisa, limitar os fenômenos e manter máxima, em muitas distância deles. Uma
desmembrados em
uma
formas de pesquisa narrativa tem sempre objetivos, embora possam mudar, e sempre tem foco, embora esse também ficar possa obscuro e mudar. Os limites de uma pesquisa narrativa se expandeme se contraem, e onde quer que se encontrem e em qualquer momento sâo
158
D.
Jean Clandinin |
F.
Michael
permeáveis, mas não permeáveis
Connely
osmoticamente com as coisas tendendo a mover de uma maneira só, mas permeáveis interativamente. As vidas - pessoais, privadas e profissionais
dos
pesqui
pesquisadores têm fluxos através dos
limites de um local de sa; de igual modo, embora muitas vezes não com a mesma intensidade, as
-
vidas dos participantes fMuem em outra direção. A consequência dessa fluidez para criar textos de campo é que há
uma quase interminável lista de experiências de vida que poderiam ser, e frequentemente são, transformadas em textos de campo valiosos para uma pesquisa. Mesmo falar em categorias é produzir uma lista muito longa, por exemplo, dança, teatro, música, cinema, arte e literatura. Os estudantes que vêm para a pesquisa narrativa muitas vezes relatam maraviIhados as histórias que eles vêem em toda parte e que se conectam às suas narrativas - andar de metró, ouvir rádio, ver televisão, um bate-bola em
equipe. Nossos cursos de teoria de pesquisa narrativa exigem dos alunos a escrita de relatórios de leitura acerca do curso e sobre outras leituras.
Um elemento desse relatório é relacionar a leitura feita ao desenvolvimen to da pesquisa de cada aluno. Phillion diz que ela escreve nota de campo
acerca de um filme, uma forma de arte que pode tornar-se um dos interes ses de sua vida. Talvez seja importante observar que, tal como acontece com os relatórios de leituras acima referidos, os textos de campo sobre experiências de vida que n o
estão diretamente relacionados à pesquisa de campo
e às suas necessidades precisam estar conectados à pesquisa. E preciso
questionar
porque
se sente a necessidade
de criar
um
determinado
texto
de campo (uma anotação de campo, uma foto, um poema, uma história, e assim por diante). Ao fazer um texto de campo após ver um filme, por
exemplo, o pesquisador precisa explorar possiveis significados da experiència para os aspectos de seu estudo, tais como, significados para si pró-
prio
como
pesquisador,
campo de pesquisa
O que é
para
como um
os
participantes,
para
seus
alunos
ou
para
o
todo.
importante que
os
pesquisadores saibam
sobre os textos de campo? trabalharmos nosso caminho pelos diferenO que se torna claro, ao tes tipos de textos de campo utilizados por Davies, em seu estudo, é que
eles não são claramente diferenciados
uns
dos
outros.
As histórias pas-
Pesquisa narrativa.159
sam a escritas autobiográficas, escritas autobiográficas passam a diários e assim por diante. Além disso, ao estudarmos cada seção do trabalho de
Davies, queríamos deixar claro que as possibilidades, para outros tipos de textos de campo e para diferentes nuances da história, do diário e das notas de campo, eram praticamente infinitas. Ao problematizarmos esse estado de desordem, sentimos que os nossos planos iniciais para este capítulo continuaram perdidos.
Começamos por pensar que seria importante fornecer uma lista dos tipos de textos de campo juntamente com exemplos do que se pretendia diá -
um exemplo; metáfora, um exemplo, história familiar, um exemplo, e assim por diante. Mas, percebemos as limitações deste estudo por ser tão complexo e porque os textos de campo utilizados em qualquer investiga-
ção específica são entrelaçados ao longo de todo o estudo. Pensávamos que apresentando um único e complexo estudo como o de Davies daríamos outros
desse
entrelaçamento de textos de campo, e que acrescentando exemplos mais tarde estaríamos aprofundando a tipologia de tex
um senso
tos de campo com as
quais pensamos começar.
No
entanto, ao trabalharmos esse plano, percebemos que o mes mo não iria revelar as coisas mais que julgávamos importante para nosso ensinamento de formação de um pesquisador narrativo, para orientaço de muitos estudantes de mestrado e doutorado que escrevem pesquisas narrativas, e para nosso próprio trabalho em curso há muitos anos. Nós não
aconselhamos
uma
lista
tipos de textos de campo nas mãos, se faça uma pesquisa com uma determinada node ção quais tipos de textos de campo serão importantes. Pelo contrário, encorajamos outros pesquisadores narrativos, e nós próprios, a estarem nem
com os
estabelecemos que
abertos para as possibilidades E verdade que em nosso
imaginativas para compor textos de campo0. próprio trabalho, quase sempre pedimos para
se escrevam notas
que mos
de campo. Mas também gravamos conversas e cria muitos outros tipos de textos de campo. Além os
disso, quando nos trabalho e perguntam: " bom manter registroS como anotações de campo?" dizemos "Isso vai ser bom, mas você também terá que encontrar uma forma de manter um sos
alunos vêm
como seu
registro de suas respostas 1lalunos perguntam se eles precisam fazer um mapa da de sala aula onde estão trabalhando, falamos com eles sobre um leque de possibilidades imaginativas para descrever lugares, como tirar fotogratias ou utilizar as descrições dos alunos. Quando um aluno pergunta se una ternas" Quando
nota de
160
os
campo pode
ser
escrita
como m a
D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
história
e
não sob
a
forma que
nós, Michael e Jean, utilizamos em nossos trabalho, dizemos, "Tudo bem, desde que o detalhe experiencial seja capturado," Quando um aluno diz que um personagenm em um teatro lembra dilemas enfrentados por seus
participantes, dizenmos, "Escreva sobre isso" Quando pensamos acerca do que é mais importante para os pesquisadores saberem sobre os textos de campo, voltamos para o nosso conceito de trabalho tridimensional no espaço interior da Pesquisa Narrativa. Nos capítulos anteriores, discutimos o que fazer acerca do seu poSicio
namento em relação aos pesquisadores narrativos dentro desse espaçco. Agora, quando pensamos sobre os textos de campo que criamos como
pesquisadores, é igualmente importante posicionar os textos de campo
nesse espaço. Suas situações não são idênticas as nossas. Para exemplificar, tomemos o lendário poema de Davies, Uma Nova Escola. Ao posicionarmos o poema ao longo da dimens o
temporal vimos que, para começar,
o poema refere-se a um tempo em sua infäncia. Mas, quando o poema foi escrito? Foi algo escrito por Davies quando criança? Foi algo escrito no
momento em que ela iniciou sua dissertação? Ou foi algo escrito por ela
algum
em
tra pessoa, como a m e
época
ou
do processo de pesquisa, de Davies? Se sim, a sua me
outro momento
depois?
espaço leva-nos
a
foi escrito por o u o escreveu naquela
ou
do posicionamento do poema ao longo da dimensão ou fazer perguntas, tais como: Foi escrito na Inglaterra
O
no Canadá? Há níveis de complexidade no texto de campo, o poema, por
foi
0
um
poema posicionado ao longo da dimensão pessoal-social? concebido para transmitir u m a sensação o u tipo de construção ficcional familiares? O poema foi baseado sentimento após visualizar fotografias daquela imagem? Davies construiu isso em uma memória, u m a lembrança Foi uma costrução ficcional, sozinha? Ou foi escrito com outra pessoa? social do momento da a Davies pudesse transmitir situação
ser
de modo que
sua infância? Foi escrito na na Grã-Bretanha?
de
diferença
Bretanha?
época que tomou
de modo Ou foi construído
sócio-cultural entre suas
Essas
questões deixam
claro
como o
tridimensional
questöes sobre
seus
no
uma
Canadá
e
espécie na
Grã-
posicionamento dos textos
é complexo
para
localizar
os
n a r r a t i v o s encaminhem essas
estão posicionados, porque textos de campo dos textos o status epistemológico
para
posições tém consequéncias que derivam finamente, o s textos de pesquisa
Suas e,
como
representar
a
experiências
de campo dentro do espaço dimensões. nesmos ao longo das três pesquisadores E importante que os
classes
ciencia do sistema de
deles. Por
exemplo,
Pesquisa narrativa
quan-
161
do os pesquisadores narrativos criam relatos de suas infäncias, muitas vezes dão-lhes o status de um fato objetivo. No entanto, é preciso atentar para a complexidade gerada pelo pensamento deles em termos das três
dimensoes espaciais, tornando claro que a extensão dos textos consiste em reconstruções contextuais dos eventos. Sem esse posicionamentocui
dadoso dos nossos textos de campo, e o nosso reconhecimento explícito da forma como eles são posicionados os textos de pesquisa, construídos a partir dos textos de campo, são infinitamente abertos para questões ir. respondíveis e para as críticas sobre o conhecimento em construção além dos significados gerados.
162.D.Jean Clandinin | E Michael Connely
CAPITULO 8
Dos textos de campo0 aos textos de pesquisa:
compondoo sentido da experiência
movimento de transição para transformar textos de cam po em textos de pesquisa é uma tarefa dificil e complexa. Iniciantes na pesquisa narrativa nos contam que essa é uma das mais difíceis transições
por eles realizadas. Em nossas próprias investigações, também sabem0s das dificuldades quando trabalhamos através de vários aspectos e dimen-
soes ao fazer essa transição.
Introdução Quando os pesquisadores chegam a essa transição complexa (a
transição no entremeio de suas investigações), questöes que foram pensadas no início da pesquisa, mas que talvez tenham sido deixadas adormecidas pelos pesquisadores enquanto trabalhavam no camp0 e compondo textos de campo, emergem novamente. Os topicos de justificativa, fenome-
Traduzido por: Alice Lima da Silva(l.etras/1l.EEL
(ILEEL, NEC
UFU), Dilma Maria de Mello
UFU) e Marina Alves de Brito (letras/11.EEL - UFU)
Pesquisa narrativa. 163
no, método,
namento, eo a
base da
tipo de
pesquisa,
desejado
texto
e
A fim de abordar retomados neste capitulo. serão todos com quem trabalhamos, auxiliar e ajudar aqueles
questões para nos precisam ser t r a z e m o s e s s e s tópicos que de pesquisa. desenvolvimento dos textos
consideradose
na
espaço
tos
de pesquisa
de lado durante imaginamos
com o
medida
seu
e
em
cada
que
no
ta, O que
de
nossas
pesquisas. Cada
de campo, voltam à
de pesquisa tomando
textos
no
entram e saem
aspectos
talvez desses textos, embora
um
o trabalho
nossos
Esses
mencionados
tópico tem os tex mudamos dos textos de campo para
andamento
tona o seu
sejam deixados
fortemente quando
lugar no
mundo.
tópicos anteriormente neste livro, trouxemos pela primeira vez a perguncapítulo quatro, quando
Poderíamos ter discutido talvez
novamente para an
nasCidos
composto
essas
de foco de acordo
teórica, posicin io
literatura o espaço da
interpretação-análise,
os
pesquisadores
esses
narrativos fazem? No
entanto, escolhemos este
aqui, porque estávamos preocupacomo uma série de questões ou dos que o leitor não visse esses tópicos trabalhados e respondidos de uma só vez problemas a serem levantados, momento, para situar
nossa
discuss o
e pronto. Queríamos levar o leitor por algumas de nossas pesquisas para
dar o sentido de que a Pesquisa Narrativa é um processo de aprendizagem para
se
atentassem para pensar narrativamente; para que
para posicionarem em um espaço tridimensional metafórico.
enquanto vividas narrativamente,
e
as
as
vidas
investigações
Essas inquietações são algumas dentre aquelas que guiam nossas nosso que vão além do como apresentamos trabalho em forma de textos de pesquisa públicos. Neste capítulo, traba
pesquisas, do início
ao
fim,
e
Iharemos esses tópicos ao considerarmos a maneira como eles são vividos na transição dos textos de campo para textos de pesquisa. Mas, os leitores
vão querer se imaginar endereçando esses tópicos como se estivessem elaborando suas propostas de pesquisa, negociando seus trabalhos de
campo, compondo múltiplos textos de campo e preparando textos de pesquisa públicos, seja em forma de palestras, artigos, livros ou dissertaçoes.
O que fazem os pesquisadores narrativos? A primeira vez que abordamos essa pergunta foi no capítulo qua
tro. Neste capítulo, nosso foco é a pergunta a ser feita, Oquefazemos como pesquisadores narrativos quando vivenciamos a transição dos textos de
164
D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
campo para textos de pesquisa? O que fazemos quando começamos a pensar
sobre a
escrita de nosso
trabalho, quando fazemos apresentações
em
confe
rências, escrevemos nossos artigos e livros? Ao fazermos esta transição, nos perguntamos sobre significado, relevância social e propósito.
Inquietações dessa natureza são importantes quando a pesquisa co
meça, por exemplo, quando as propostas são desenvolvidas, a entrada n0 campo é negociada, e o traballho de relacionamento com os participantes é
desenvolvido. Assim que
trabalho vai progredindo e nos apaixo namos pelos participantes, pelo campo e pelos textos de campo, podemos nosso
tender a perder o foco em relação a releváncia, significadoe propósito. No entanto, na medida em que vivemos a transição dos textos de campo para textos de pesquisa, questões (do tipo "Mas quem liga pra isso?" e "Mas e
dal?) re-emergem. Como podemos saber se nosso interesse pela pesqui sa é algo além do pessoal ou algo mais que trivial? Como podemos saber se alguém estará interessado? Será que nossa pesquisa faz diferença? Em sentido mais geral, as questões de significado, relevância, e pro pósito so
questões sobre quem, por que, o que, como, contexto, e forma.
Para quem iremos escrever? Quem são os personagens estudados? Por que estamos escrevendo? 0 que estamos tentando cobrir? Quais contextos pessoais, práticos, e teóricos dão significado para a pesquisa e para seus resultados? Quais formas nosso texto final de pesquisa terá? O lugar para começarmos nossa discussão é o tópico da justificativa, um tópico sempre latente, mesmo durante o trabalho de campo, quando se é frequentemente cobrado a justificar sua pesquisa.
Justificativa (por qu)? Pesquisadores narrativos são sempre fortemente autobiográficos.
Nossos interesses de pesquisa prov m
de nossas próprias histórias e dão
forma ao nosso enredo de investigação narrativa. Para ós, foi a nossa experiência de ensino e nosso forte interesse pela narrativa de outros professores e alunos que nos levou a estudar o conhecimento do professor e eventualmente nossa estrutura sobre os estudos relacionados ao conhecimento do professor em termos de conhecimento narrativo. Ao começarmos essa linha de trabalho ha alguns anos, nós mergu-
lhamos no que Schwab (1960) chamou de pesquisa fluida, uma forma de pensar na qual a pesquisa não é claramente governada pelas teorias, tá-
Pesquisa narrativa 165
ticas
Existem falsos começos e finais mortos. No mtuito de justificar nosso próprio trabalho, nos mantivemos buscando e
estratégias metodológicas.
encontrar pontos de contatos com outros. Tínhamos um arquivo cheio de pareceres negativos de periódicos que ocorreram, em parte, porque ceristas e editores não viam a relevância social do trabalho submetido e
pare
tendiam a ver sonmente o aspecto pessoal. Eles sempre etiquetavam nossos
trabalhos como indiosincráticos e narcisistas. Um de nossos projetos da época nos permitiu patrocinar um se-
minário realizado durante dois anos, que culminou em um simpósio de
conhecimento pessoal durante vários dias. Mark Johnson, cujo lugar em nosso pensamento pode ser notado no capítulo um, esteve presente nesse
seminário. Embora
naquela época, no tivéssemos a clareza que
temos ao apresentar o que expomos neste livro, estávamos tentando encontrar uma
maneira de
contato entre mos
tentando sobressaltar
senso
de
comunicarmos com as pessoas para encontrar pontos de nossos interesses e os dessas pessoas. Em resumo, estáva-
nos
social
pessoal de justificativa com um Nossos próprios interesses e formas
nosso senso
público de relevância. pensamento não foram o bastante. Precisávamos e
ter
trabalho mais
o
amplamente conectado a questöes de relevância social. Durante anos, aprendemos a manter os tópicos de social a parte de nós. E mesmo ao escrever isso
justificativa pes percebemos que não podemos, em nenhuma dada pesquisa, pensar sobre essas questões (pes soal e social) para a satisfação de outrem, mas temos clareza da importànsoal
e
cia delas
tentamos
e
continuamente encaminhar ambos os aspectos. Para os pesquisadores narrativos, é crucial saber articular essa relação entre o interesse pessoal e o senso de relevância e amplas sociais,
no
trabalho
e na
vida das
preocupações
pessoas.
Enquanto escrevíamos este capítulo, descobrimos
cil assim
estabelecer
um senso
pode-se
pessoal
de
justificativa.
que não étão fåAo ler a literatura,
pensar que expressar interesses pessoais é uma tarefa simples como se descrever o óbvio. Por outro lado, muitos de nós somos assombrosamente complexos para falar sobre quais são os interesses de nos sa pesquisa narrativa e como a em tentamos
responder porqu o
justificamos
de estarmos
termos
pessoais. Quando interessados em um tema e o
porqué de escolhermos organizar nossa pesquisa do jeito que fizemos, so mos incapazes de responder a essas questões com muita
a
essa noSsa
em nossas
dificuldade
aulas
166 D. Jean
e
(frequentemente
em nossos
trabalhos
clareza. Devido
no
com
Clandinin | E. Michael Connely
reconhecida
e
escondida),
pesquisadores narrativos m
ciantes pedimos que escrevam uma série de histórias sobre fenômenos de seus interesses. Jean encorajou Hedy Bach (1997) a escrever histórias
sobre experiências de sua própria juventude quando ela iniciou sua narTativa com meninas jovens. Na medida em que Bach escrevia suas histórias e recebiafeedback de outras pessoas, começou a narrar e acenar com um
senso pessoal de justificativa sobre sua própria experiência em relação evadidos do currículo daquelas jovens. Embora encorajemos a justificativa do interesse de pesquisa, em
aos temas
termos pessoais, as normas científicas de pesquisa pressupõem que as pessoas só devem justificar seus estudos através de fatores sociais. Há uma tendência de que os textos de pesquisa devem ser escritos em sua maioria como se não houvesse um pesquisador, uma pessoa, um "Eu' no
processo. Introduzir esse "Eu" realmente não é uma tarefa fácil. A primeira vista, em nossas pesquisas narrativas sobre experièn cias de professores na escola, era comum deixarmos os "Eus" fora dos nossos textos escritos. Inicialmente, achávamos mais fácil escrever em terceira pessoa, semelhante ao que os outros professores também faziam, assim como foi com o caso de Stephanie, porque os pareceristas, os editores e as agências financiadoras achavam que nosso "Eu" pessoal era algo problemático. O ato de escrever partindo de um "Eu' deu abertura para que fossemos chamados de narcizísticos, mesmo assim sentimos que finalmente triunfávamos e desenvolvíamos um senso de escrita do porquê algo podia
ter relevância pessoal. Precisamos estar preparados para escrever "Eu" na medida em
que passamos pela transição de textos de campo para textos de pesquisa. Conforme escrevemos "Eu'", precisamos transmitir sentido de relevância social. Devemos estar seguros da relação de que quando dizemos "Eu", entendemos que o "Eu" está diretamente conectado com "Eles". Falaremos mais sobre isso no capítulo nove, onde lidamos com questões de voz, assi-
natura e audiência. Outro ponto sobre justificativa que reemerge na medida enm que fazemos a transição dos textos de campo para textos de pesquisa relaciona-se com a razão pela qual optamos por tazer pesquisa narrativa em
nossas pesquisas. Por que não escolher a etnografia? Quem sabe um estudo teórico? Por oque escollher justamente a pesquisa narrativa? O que nos faz pensar que podemos aprender sobre o lenomeno, nos engajando
a
pesquisa narrativa, que sera especial ou sngular? Como a pesquisa
arrativa se encaixa perfeitamente, amplia ou muda as coversas sociais
Pesquisa narrativa
.
167
e
teóricas sobre
um
fenômeno
contar o que
parados para especial, algo
que não
de
Precisamos nosso interesse?
podemos
cial
como
do de
enfrentamos essa narrativos. Por
pesquisadores
Jean,
um
Clandinin ter
professor da
se
engajado
Stephanie
Por que Jean não tinha apenas usado
é
ou
questão em nosso trabalho ini exemplo, na defesa de doutora-
banca examinadora
com
fenõmeno que
estudar por meio de outras teorias
métodos.
Frequentemente
nosso
sobre o
aprendemos
estar pre-
na
um
questionou
vivência de
sua
porque de sala de aula. o
questionário para
compreen-
der suas imagens? 0 que Jean aprendeu convivendo com Stephanie que não aprenderia a partir de um estudo com repostas a um questionário0? Embora nos perguntem cada vez menos agora, achamos importante pensar sobre essas questões em nossas pesquisas. O que a pesquisa narrativa consegue
nos
ajuda
a
aprender
outros métodos e teorias no
sobre
o
fenômeno que estudamos que
os
conseguem?
Joy Ruth Mickelson (1995) implementou uma pesquisa narrati-
va sobre as experiências de quatro maes que tinham filhos diagnosticados como crianças com desvio de comportamento. Mickelson trabalhou por muitos anos como psicopedagoga e assistente social em unma escola. Durante seu trabalho, ela foi requisitada para assessorar os alunos dessa escola, utilizando de medidas psicológicas e sociológicas variadas para arranjar um lugar adequado para esses alunos. O discurso social na área era o de assistir as crianças para determinar déficits e subsequentemente determinar locais educacionais apropriados para medicação e tratamento. 0 discurso teórico, na maior parte, constituído pela psicologia e Educação, era
baseado
no
aprendizado e
no
desenvolvimento de teorias. Há um gran-
de número de pesquisas na área de diagnóstico, avaliação e tratamento de jovens considerados como tendo comportamento problemático. No entanto, as experiências das mães são muito silenciadas e foi nesse silêncio que Mickelson situou sua pesquisa narrativa. A intenção de sua pesquisa seria ouvir as histórias sobre as experiências dessas måes. Na medida em ouvia Mickelson que essas histórias, ela era de
relativas
capaz
levantar
questões
modelo de déficit que moldava as respostas de professores, administradores, pais e psicólogos que trabalhavam com aqueles jovens.
A
ao
pesquisa
narrativa proporcionou a ela criar um texto de pesquisa que iluminaria não só as experiências daquelas/para aquelas mães como também as experièncias de como o discurso de contextos sociais e teóricos moldavam as relações daquelas mäes com seus filhos.
168
D. Jean
Clandinin |
F
Michael
Connely
O que Mickelson
aprendeu
ao
engajar-se
na
pesquisa
narrativa,
com as maes, que não poderia ser aprendido de outras formas? Esta con-
sideração
importante não só quando se começa a delimitar uma pro-
posta de pesquisa, mas também na medida em que se faz a transição dos
textos de campo para
os
textos de
pesquisa.
Precisamos fazer
indagaçóes
continuamente sobre a forma que a pesquisa narrativa ilumina contextos sociais
e
teóricos
nos
quais posicionamos nossas investigações.
Para retornarmos
jando-se
ao
ponto da defesa de doutorado de Jean, enga-
pesquisa narrativa com Stephanie, percebemos que esse en volvimento permitiu a Jean entender como o conhecimento de professor na
é composto narrativamente, incorporado em uma pessoa e expressado na
prática. Se Jean tivesse se engajado num estudo realizado por meio de entre-
vista,
essa
conceituação de conhecimento do professor não seria possível
Fenômeno (o quê)? Pesquisadores narrativos são sempre constituídos em torno de uma curiosidade particular, o puzzle de sua pesquisa. Este é normalmente denominado problema de pesquisa ou questão de pesquisa. Entretanto, essa denominação de puzzle tende a representar equivocadamente o que acreditamos que seja o trabalho dos pesquisadores narrativos. Questöes e problemas de pesquisa carregam consigo as qualidades da clara habilidade de definir e a expectativa das soluções, mas a pesquisa narrativa carrega muito mais um senso de busca, de um "re-buscar" ou um buscar novamente. A pesquisa narrativa relaciona-se mais com o senso de refor mulação contínua em nossa investigação e isso está muito além de tentar apenas definir um problema e uma solução. Na medida em que refletimos sobre os fenômenos em uma pesquisa narrativa, pensamos em responder as questoes tais como: Sobre o que é a sua pesquisa narrativa? Qual é a
experiência de seu interesse enquanto pesquisador narrativo? Em nossos próprios estudos sobre a escola da Rua Baía, nosso tra-
balho, a princípio, tinha seu foco na tentativa de entender como o conhecimento de um professor era construído quando ele vivenciava a implementação de políticas e de novas diretrizes em sua escola. Essa implementação resumia mais ou menos nossa proposta do projeto de 1980 para o NIE,
Por um lado, em cada novo projeto, há uma afirmação da proposta pública que a agéncia está financiando. Mas, nossa experiência de estar em campo
Pesquisa narrativa 169
levou
caleidoscópio
de
a um
puzzles
de
pesquisa, cada uma com uma tomada diferente sobre o fenômeno: como a organização do tempo nas escolas influenciava o conhecimento experiencial dos professores? Como o contexto politico de mudanças constituía a experiência do professor? Como o posicionamento dos professores em suas paisagens educacionais nos
configurava suas experiências de quem eles eram e formava suas identidades, e assim por diante. Por um lado, poderia parecer que identificar um fenömeno de interesse é
algo claro
e
direto. De fato,
quando
pós-graduandos trilham
os
caminhos de curso em curso, em seus programas de doutorado, eles até acham graça quando vivem situações nas quais evitam sobre
seus
questöes
nomeação
de
problemas de pesquisa. Jean se recorda das tentativas de se encolher nos cantos dos elevadores quando qualquer professor bem intencionado perguntava sobre o tema de sua pesquisa, imaginando
a
que fosse
seus
possível
que ela pudesse definir o fenômeno de sua pesquisa enquanto o elevador movia-se do pavimento térreo até o décimo andar.
Como isso não seria
possível, Jean
apenas se encolhia e aguardava pela chegada pavimento para então escapar. Pensando sobre aquela ex periencia, Jean dá-se conta agora, na medida em que ela se engaja na pesquisa narrativa, que ser capaz de dizer sobre qual fenômeno a pesquisa narrativa trata não é uma questão fácil de ser respondida. No é uma ao seu
gunta que é respondida de pronto
per
no
começo da
investigação
ou
mesmo
projeto de pesquisa. Na medida em que o pesquisador lêe relé seus textos de campo de maneira a compor seus textos de pesquisa, o fenômeno, o "o que" da pesquisa, está entre os pontos que se põe ao pesquisador. Esse no
explorar
sobre
lembra-se de
experiências
nomeação
do
fenômeno de pesquisa é necessário. Jean ter tentado nomear seu fenômeno com foco tanto nas suas quanto em seu conhecimento e ter recebido a
respostas que indicavam que ela deveria estudar os construtos pessoais dos professores, o processo de implementação, ou fazer de uma sala
etnografia
lembra-se de ter ficado confusa e incerta, mas sitava encaminhar o tema sobre o qual sua que ela
de aula. Ela que ainda assim ela neces
pesquisa tratava, na medida em
compunha seus textos de pesquisa.
Um
exemplo
seguiu apresentava
mais recente ocorreu
tornar seu fenömeno seu
projeto
de
com
JoAnn Phillion, que co
razoavelmente claro
no
momento
em
que
pesquisa. brincadeira, ela se au todenominou de Sra. Multicultural, após aquilo que inicialmente denom nava como seu fenmeno de pesquisa. Foi no decorrer de seu trabalho de Em tom de
170D.Jean Clandinin | E. Michael Connely
campo, em uma sala agitada de uma escola cheia, que ela näo teve comno fugir ao fenómeno que a ela se apresentava. A complexidade da experiência de campo a assoberbou, definindo minuciosamenteo fenômeno de sua pesquisa. Como pesquisadores, tendemos a definir nosso fenômeno como
se a vida parasse e não estivesse em nosso caminho. Mas a vida não para, ela está sempre em movimento (seguindo seu caminho), sempre transformando o que pode parecer estático e não mutável em uma complexidade
movente e interativa. Na medida em que Phillion escreve seu texto de pes quisa, ela precisa mais uma vez descobrir sobre o que ela está estudando.
Após ter mergulhado na complexidade do campo, ela agora percebe que seu fenómeno não será aquele que ela imaginara anteriormente, de forma
tão clara,
em seu
projeto de pesquisa.
Reconhecendo que os fenômenos na pesquisa narrativa são um tipo de base movente, criamos espaços para que os pesquisadores narrativos iniciantes definissem seus fenômenos de pesquisa em vários momentos de suas jornadas narrativas. Eles dizem o que eles estão estudando nos cursos que os levaram a apresentação de seus projetos de pesquisa, nos seminários de trabalhos em desenvolvimento, quando eles compõem textos de pesquisa provisórios, nas várias reiterações de suas teses e dissertações e em seminários públicos que levam a defesa final de seus trabalhos. Em entido, essas situações forçam os pesquisadores a dizer algo que eles não estão totalmente prontos para dizer. Vemos essas situações como um platô incerto na definição do fenômeno a ser estudado. Na medida em que ouvíamos Ming Fang He e Annie Davies, durante vários anos enquanto elas trabalhavam com suas pesquisas, percebemos seus esforços para conquistar primeiro um e depois outro platô. Todavia, Davies estabeleceu seu fenômeno como sendo as experiências de ensino em time/equipe como expressão do conhecimento dos professores, e He estabeleceu o seu como sendo a experi ncia
de professoras mulheres mo-
vendo-se entre a China e o Canadá, apenas na versão final de seus textos
de pesquisa. Essas definições de seus fenômenos não foram possíveis antes que suas pesquisas estivessem finalizadas.
Queremos enfatizar que a mudança profunda no fenômeno da pes quisa narrativa, assim como està ilustrado nos trabalhos de He e Davies,
nao é uma questão de inexperiência das autoras. Nós também vivemos os mesmos movimentos incertos de plató a platô para tentarmos definir nosso próprio fenómeno. Os fenónenos também mudam dependendo de como estrutura-
Pesquisa narrativa 171
mos seus
contextos
posições enquanto pesquisadores dentro desses contextos. Por exemplo, quando posicionamos o fenômeno do conhecimento do professor dentro da prática da sala de aula, algumas e
nossa
caracteristicas foram realçadas. Quando reposicionamos o fenómeno do conhecimento do das
práticas
professor
dentro da sala de aula quanto fora de sala, outras características foram para primeiro plano, tanto
enquanto outras ainda passaram a segundo plano. Quando nos posicio-
pesquisadores no espaço fora da sala de aula, entendemos conhecimento do professor como algo que é express0 na prática em diferentes maneiras, diferentemente de quando nós nos posicionamos namos como
o
dentro do espaço de sala de aula. Nosso fenômeno na Escola da Rua Baía também mudou ao longo da dimensão social-pessoal. Nossa primeira inquietação focalizava a de
construção
dos na
conhecimento pessoal
professores, sendo que nossas pesquisas recentes já têm seu foco paisagem educacional onde os professores trabalham. Com a efeito,
complexidade do espaço tridimensional da pesquisa narrativa é a base para o princípio da mudança.
Quando pesquisadores narrativos iniciantes tentam definir seus fenomenos, eles algumas vezes confundem aspectos do fenômenos com
aspectos do método. Em nosso trabalho na Escola da Rua Baía, teria sido possível para nós definirmos o nosso fenômeno como Stephanie e Phil,
dois
participantes, ou talvez como a política de relações e a política de linguagem, dois corpos centrais das políticas de Educação em funcionamento
naquela escola. Davies poderia ter confundido seus professores -participantes com a experiència de ensinar a partir de uma equipe de professores, e He poderia ter confundido sua experiência de mudar de
identidades com suas trés
professoras-participantes.
Método (como?) Existem trés conjuntos a serem considerados dentro dos aspectos relacionados ao método na pesquisa narrativa -
considerações pråticas e çoes
orientadas para
analítico-interpretativas, na medida
textos de
considerações
texto de campo; em que fazemos a o
e
teóricas, considera-
transição
de
campo para textos de pesquisa. Nesta seção, tentarenmos com partilhar nossas reflexöes sobre estas considerações com um foco particu lar na transição de textos de campo para textos de
pesquisa.
172
D.
Jean Clandinin | E. Michael Connely
Considerações teóricas Como tentamos esclarecer durante todo livro, teoricamente, a
principal questäo para os pesquisadores é optar por uma visão narrativa da
experiência.
Esta questão aparece logo quando novos pesqul sadores em narrativa, inexperientes provenientes do estudo de outras formas de pesquisa qualitativa, querem encontrar um espaço entre OS
demais métodos para a pesquisa narrativa. Conhecemos um pouco desse desejo de ordenar e classificar métodos porque antes começamos a pensar sobre a nossa pesquisa como pesquisa narrativa, nós buscávamos outros
métodos
possibilidades
para o estudo da experiência. Havia um número variado do que pareciam ser abordagens teóricas secomo
melhantes, por exemplo: Fenomenologia, Etnografia, Etnometodologia e pesquisa teórica.
Quando começamos nosso estudo sobre a experiência do professor nós começamos olhando por meio dos vários métodos qualitativos que estavam ganhando algum crédito em nosso campus no final dos anos 70 e começo dos 80. Por exemplo, exploramos os métodos de pesquisa teórica, tais como aquelas escritas por Glaser e Strauss. Ficamos fascinados com suas ideias de anotações, temas e categorias como um meio para ler transcrições de entrevistas. Também passamos certo tempo estudando, por várias comunidades, fenomenologia, etnografia e outros métodos. Tentamos trabalhar com a ideia de imaginar eventos usando métodos que se tornaram popular por meio dos fenomenólogos; e tentamos a ideia de mapas escolares como uma maneira de entender contextos e ideias usadas por etnógrafos. A medida que fizemos isso, fomos obrigados a lutar contra o impulso de nos perder nas maravillhas e complexidades desses vários métodos. Havia um tipo de sedução aos métodos que achávanmos apaixonante, uma sedução que ameaçava nos envolver em ideias e conceitos que guiavam o método. Era dificil manter nosso puzzle de pesquisa sobre a experiência quando os métodos pareciam täo interessantes mesmos.
Nossa própria jornada por meio das variadas possibilidades me-
todológicas nos dá um senso de que, ainda que possam ser interessantes, não é muito útil começar uma pesquisa na qual classificamos e colocamos métodos teóricos lado a lado. Pesquisadores iniciantes de narrativa Irequentemente se preocupam com Seu caminho por meio das definiçðes
e procedimentos de diferentes teorias metodológicas, tentando definir a
Pesquisa narrativa 173
pesquisa
narrativa
e
distingui-la de cada
uma
das outras, tentando encon.
em meio a ordem das molduras trar um nicho para a pesquisa narrativa das metodologias qualitativas teóricas apresentadas a eles, mas nós não
encorajamos essa abordagem. Embora possa valer a pena para um entendimento da ampla gama de metodologias, não é de grande importäncia para a pesquisa narrativa porque, como discutido no capitulo trés, 0 papel da teoria na pesquisa nar-
rativa se difere do papel da teoria na pesquisa formalista. No capítulo trés assinalamos que os formalistas começam a pesquisa na teoria, enquanto
que pesquisadores narrativos tendem a começar com a experiência vivi-
da e contada por meio de histórias. Aqui, desejamos assinalar que para a esquisa narrativa é mais produtivo começar com explorações do feno
meno da experiência em vez da análise comparativa da vários arcabouços
órico-metodológicos. No decorrer do trabalho, os pesquisadores narrativos vo
des-
cobrir que aspectos do seu estudo têm características denominadas
etnográficas e outras caracterizadas como fenomenológicas, como apontado por alguns autores. Quando se faz a transição dos textos de campo para os textos de pesquisa, essas considerações teóricas vêm à tona novamente, na medida em que os pesquisadores posicionam seus textos de
pesquisa teoricamente. Em
nosso
trabalho mantemos
em
pri
meiro plano a nossa visão de escrita narrativa da experiência com as
narrativas de experiência dos participantes e pesquisadores, situadas vividas
paisagens historiadas, metodológico.
e
nas
Ao fazermos
a
quisa, tentamos ligar éncia
em
estudo
tentar
teóricode pes-
experiència de pesquisadores sobre a exper formas narrativas de pesquisa daquele fenômeno.
nossa
com
entender
arcabouço
transição dos textos de campo para os textos
Quando prosseguimos era
como nosso
nosso
trabalho
na
Escola da Rua Baía,
nosso foco
experiencias dos professores narrativamente, o que significava pensar sobre as experiências deles nos termos do espaço tridimensional de pesquisa, ou seja, pensar sobre as dimensões
rais, dimensöes
as
sociais-pessoais e
em um
lugar.
tempo
Em nosso livro
"Shaping Professional ldentity: Stories of Educational Practice (Connelly and Calndinin, 1999), baseado numa série de estudos, oferecemos um senso de a
compreensão das experiéncias dos professores chamamos de histórias a serem
174 D. Jean Clandinin |
F.
enfrentadas.
Michael
Connely
por meio
daquilo
que
Texto de campo
prático considerações orientadas -
As
estratégias práticas para a criação de textos de campo é um topico do capítulo sete. Considerando que discutimos as questões de composição de textos de campo em detalhes no capítulo sete, aqui abordamos
questões que vëm à tona, de modo particular, à medida que fazemos a
transição
dos textos de campo para os textos de No capítulo cinco discutimos
pesquisa. negociações nas quais pesquisadores
narrativos engajam os participantes no campo negociando relações, propósitos, modos de ser útil e transições. Ao começarmos a fazer o movi-
mento dos textos de campo para os textos de pesquisa, essas negociaçoes reaparecem. A transição dos textos de campo para os textos de pesquisa
pode ser dificil, mas é importante. Como pesquisadores precisamos nos distanciar do contato próximo, das conversas diárias, dos encontros frequentes e do trabalho lado a lado para fazer a leitura e a releitura dos textos de campo e em seguida escrever os textos de pesquisa. Isso näo
implica que a relação próxima com os participantes esteja encerrada, mas, ao contrário, os relacionamentos mudam de intensidade daquele viver de
histórias com os participantes para o recontar de histórias por meio texto de pesquisa. Jean lembra como foi difícil deixar seus três dias por semana com Stephanie, em sua sala de aula, assim que começou a escrever seus textos de pesquisa. Para facilitar esta transição a principio ela tentou diminuir a frequência dos encontros, passando de tr s
para um dia por semana.
Porém, apesar dessa decisão fazer sentido para Jean, como pesquisadora, acabou interferindo com o andamento da sala de aula, pois as crianças
perguntavam por ela naqueles dias nos quais estavam acostumados a vê-la e questionavam, também, o porquë da visita apenas uma vez por sema-
na. Essa experiência a ajudou a ver que era necessário negociar cuidado samente sua saída do campo da mesma forma que foi preciso negociar sua entrada anteriormente. Ela precisava encontrar uma forma de saída do campo que coubesse na vida diária da escola. Ela tinha que negociar, ainda, uma nova maneira de se relacionar com Os participantes, que pudesse
permiti-la cumprir seus propósitos de compor seu texto de pesquisa, de sustentar as relações e, além disso, de continuar a ser útil no canmpo.
Observamos o mesmo acontecer, durante nossos encontros do grupo de pesquisa narrativa, a partir dos relatos de Janice Huber (1999) e Karen Whelan (1999). Em suas pesquisas, elas conheceram um grupo de
Pesquisa narativa 175
professores e anos.
administradores durante um período de dois
Porém, assinm que começaram a compor seus textos de pesquisa seus
encontros suas
outro grupo de
com esse
grupo
se
dificuldades era negociar
tornaram bem menos uma
frequentes.
Uma de
saída de campo que
ajudasse a manter participantes, para que pudessem negociar seus
relações com seus textos de pesquisa com eles
Suas
e
que
permitisse, também, que
elas
tivessem
tempo para se concentrar na escrita de seus textos de pesquisa. Estas são
questões que precisam ser consideradas à medida que passamos de textos de campo para textos de pesquisa. Isso tudo fica mais Xonamos não
complexo quando nós percebemos que nos apai-
apenas por nossos participantes, mas também por nossos textos de campo. Algumas vezes nossos textos de campo são tão apaixo nantes que nós queremos parar e deixá-los falar por si mesmos. Tentamos deixar claro, por meio da do como
apresentação
trabalhamos
os
textos de
campo de Davies, que textos de campo consistem em cartas, conversas, poemas historiados cativantes e convidativos, além de outros materiais
apaixonantes. Porém, porque
nossa
como
pesquisadores,
não
tarefa de
textos. Textos de tos de pesquisa.
podemos
parar por aií,
pesquisa é descobrir e construir sentidos destes campo precisam ser reconstruídos para se tornarem tex
Considerações analítico-interpretativas Isso
trás para o terceiro sobre a análise e a
nos
considerações
conjunto
de
considerações,
ou
seja,
interpretação. A medida que passamos
dos textos de campo para os textos de são textos sobre os quais nos cia social.
Quais
pesquisa, nossos textos de campo perguntamos sobre seu sentido e significân-
sentidos dos poemas historiados de Davies, da transcrição oral da história de Tom e das notas de campo diárias? Por que faz diferença descobrir seus possíveis sentidos? Estas são os
perguntas gerais encaminham a transição dos textos de campo para os textos de pesquisa, quando os momentos de análise e interpretação vêm à tona. Essas as
que
questöes se tornam mais complexas ao nos questionamos sobre elas, en quanto tentamos negociar
cipantes,
e
uma nova
forma de
à medida que lutamos contra
de campo falar por si.
Para
uma
nosso
relação com nossos parti desejo de deixar os textos
pesquisa narrativa de escopo razoável, os textos de
176 D. Jean Clandinin
| F. Michael Connely
cam-
po construidos podem parecer opressivos. Há arquivos de computador,
fichários, pastas, coleções de fotos, e outras ferranmentas para a organização. Quando a quantidade de arquivos de texto de campo se torna quase não gerenciàvel, usamos, ocasionalmente, programas de computador. Em nosso trabalho conmeçamos a usar o "NUDIST". Porém, esse não é um programa que funcione sem adaptação, pois foi elaborado para estudos menores, com um número limitado de transcrições de entrevistas, trans-
Crições de encontros de grupos focais e similares. Nós não consideramos esses programas computadorizados particularmente úteis para pesquisas
com imenso número de textos de campo, de diferentes tipos, compostos ao longo de vários anos de estudo. Antes de abordar a questão do que fazer com todos os textos de campo, precisamos saber o que temos. De certa forma, essa é uma tareta de arquivar. Precisamos nos certificar que lemos e relemos todos os textos de campoe de algum modo os ordenamos de forma que saibamos o que temos. Isso envolve uma sinalização cuidadosa dos diários, documentos e o restante, com a anotação de datas, contextos de composiço
dos tex-
tos de camnpo, personagens envolvidos, talvez tópicos tratados e assim por diante. Para nós essas considerações sobre o que há - ou seja, considera-
ções sobre o arquivo
nos remetem à questão do posicionamento dos
nossos textos de campo dentro do espaço tridimensional da pesquisa narrativa, como citado no capítulo seis. Quando consideramos perguntas de posicionamento dos textos de campo, dentro do espaço da pesquisa, abrimos questões para análise. Mas essa vai muito além da dificil tarefa de posicionamento. Apesar de a pesquisa narrativa ser, para algumas pessoas, somente um processo de contar e escrever uma história com talvez algum complemento reflexivo pelos pesquisadores e participantes, o processo de mover-se dos textos de campo para os de pesquisa é muito mais complexo.
0 pesquisador narrativo passa várias horas lendo e relendo os textos de campo para construir um relato sintético ou resumido do que está contido nos conjuntos de textos de campo. Apesar de a análise inicial lidar com assuntos como caracteristicas, lugar, cenário, enredo, tensão, finali zação, narrador, contexto e tom, estas questões se tornam cada vez mais complexas à medida que o pesquisador busca esta releitura sem fim. Com os termos analíticos da narrativa em mente, pesquisadores narrativos co meçam a tematizar narrativamente seus textos de campo. Por exemplo,
nomes dos personagens que aparecem nos textos de campo, lugares onde
Pesquisa narrativa 177
açoes e eventos ocorreram, histórias que se entrelaçam e se interconec
tam, lacunas ou silêncios que se tornam aparentes, tensões que emergem e
continuidades
e
descontinuidades que aparecem são todos temas pos-
siveis. A medida que pesquisadores narrativos entram neste trabalho eles começam a considerar diferentes textos de campo em relação a outros
textos de campo. Porém, são repostas as perguntas de sentido e significância soCial que por sua vez modelam textos de campo em textos de pesquisa. Estas säo as questões que formam a análise e interpretação do trabalho. Em geral, os textos de campo não são construídos com intuito reflexivo. Preferencialmente, eles são próximos à experiência, tendem a ser descri-
tivos e são formados por eventos particulares. Textos de campo têm uma qualidade de registro, seja auditivo ou visual. Textos de pesquisa estão a uma distäncia dos textos de campo e vêm do questionamento repetitivo
de perguntas a respeito do sentido e relevância. Como o exemplo de Carr (1969), de centenas e milhares, um pesquisador, compondo um texto de pesquisa, procura por padröes, linhas narrativas, tensões, e temas, tanto dentro conmo através de uma experiência individual em cenário social. Por exemplo, no texto de pesquisa que Davies compôs afinal, ela procurouma neiras de dar importância para cada história individual daquele ano de ensino em equipe, incluindo um relato de sua própria história. Esses foram relatos de experiência ricamente detalhados que trouxeram os textos
de campo para recontar as histórias individuais. Mas ela também compôs um texto de pesquisa que ilustrou como a narrativa social de profissionalismo deu forma à paisagem do conhecimento profissional e deu forma
histórias de fachada dos professores. Em seu texto de pesquisa ela foi capaz de
escrever
histórias de fachadae penetrar nelas devido
aos
relacio-
namentos e espaços, que havia criado, nos quais os professores contaram e viveram suas histórias.
Seria tentador ver este processo global de análise e interpretação, no
movimento dos textos de campo para
os textos
de
pesquisa, como
uma
série de passos. Porém, isso não é como as narrativas são vividas. A nego-
ciação
ocorre
medida que
do começo
as conversas
fim. Enredos são continuamente revisadas à acontecem sobre os materiais escritos e à mediao
desenvolver pontos de da que textos de campo são compostos para táncia
ve
na
história revisada.
O movimento dos textos de campo para os textos de pesquisa envol fácil e ninguém formas de complexidade. Não há transição
ainda outras
178
impor-
D.Jean Clandinin | F
Michael
Connely
compilando, classificando e analisando. Textos de campo têm um vasto e rico potencial de pesquisa. Retornamos a eles muitas e muitas vezes trazendo nossas próprias vidas recontadas como pesquisadores, trazendo novos questionamentos de pesquisa e (re)pesquisando os textos. Por
exemplo, inicialmente, nossas primeiras intenções, como pesquisadores, com os textos de campo compostos pela Escola da Rua Baía eram entender como o conhecimento do professor era capturado em forma de imagens. Retornamo0s aos textos de campo alguns anos depois ao tentarmos entender a formação do conhecimento do professor expressa na prática como a
intersecção do ciclo temporal da escola e os ritmos incorporados da prática dos professores. Estamos atualmente engajados em reler os textos de campo arquivados da Escola da Rua Baía, agora com uma intençao inv
tigativa de entender a mudança na escola ao longo do tempo. Agora nós
não estamos sozinhos nas releituras desses textos de campo. Outros pesquisadores trabalham conosco, lendo e relendo os textos de campo, textos
que parecem ter vida própria. Esses novos pesquisadores, não familiarizados com os temas, tempos e personagens retratados nos textos de campo, trazendo suas próprias vidas e suas próprias histórias, para os textos de campo. Quer leiamos os textos de campo sozinhos ou com novos leitores, a busca por padrões de linhas narrativas, tensões, e temas, que dão forma
aos textos de pesquisa, é criada pelos escritores das experincias
quuando
eles lêem erelêem os textos de campo e os colocam lado a lado, de diferen tes maneiras; quando trazem as histórias de suas experiências passadas e as colocam ao lado dos textos de campo; e também quando léem os textos de campo considerando o contexto de outra pesquisa e outros trabalhos
teóricos. Quando aprendemos a ser pesquisadores narrativos, percebemos que não existe uma única forma de transformar os textos de campo em textos de pesquisa. Frequentemente, nos engajamos em escrever uma
variedade de diferentes tipos de textos provisórios, textos situados nos espaços entre textos de campo e a versão final dos textos de pesquisa publicados. Em nosso trabalho, experimentamos vårios meios de escrever textos provisórios, em sua maioria, feitos para serem compartilhados e
negociados com nossos participantes.
Esses textos provisórios tomam formas diferentes e variam de acordo com as circunstâncias em torno da vida da pesquisa e particularmente a pesquisa e vida escolar do pesquisador. Algunmas vezes esses textos provisórios são construídos no processo de pesquisa - ou seja,
Pesquisanarrativa 179
eles são construídos
negociações
que trazem pesquisador para o campo. Por exemplo, nos estudos da dissertação de Jean, ela deliberadamente construiu
nas
uma
série de relatos que
ela chamou de:
"relatos interpretativos", narrativas feitas para negociar interpretações prelimina-
Stephanie.
res com
Davies construiu
tenha sido escrito,
em
fizessem parte do
texto
mais
processo similar embora o dela de colaboração, em forma de cartas. um
relação Diferentemente, por outro lado, enquanto Jean queria que suas narrativas final de
pesquisa, Davies não tinha essa intenção. pretendiam facilitar a conversa em andamen-
Os textos
provisórios dela os participantes à medida
to com
Um modo de olhar
esses
Davies
os
Ocorre
frequentemente
que ela escrevia suas notas de campo. dois textos provisórios é de que no trabalho de
textos tendiam
próximos aos de campo; no trabalho de Jean os textos eram mais próximos aos textos de pesquisa. Os textos provisórios de Jean e Davies, como descrito acima, são e da parte parcela pesquisa em andamento definida pela investigação. ser
a
vida acadêmica do pesquisador, fora despesquisa particular, também pode favorecer a escrita desses tex tos provisórios. Essas iniciativas podem vir de fontes teóricas e práticas. O primeiro conjunto de textos provisórios de Phillion a de
sa
que
a
em
surgiu partir palestra acadêmica que ela iria ministrar. Os materiais apareceram forma de uma comunicação negociada previamente com sua partici-
uma em
pante. O momento da palestra ocorreu quando Phillion ainda estava no
campo. Embora ela tivesse ela
pretendia
textos
ficar
provisórios
composto
no
coletado
alguns textos de campo, tempo mais longo. Para ela aqueles e
campo por um vieram somente dos
primeiros textos de campo. Porém,
aprendemos que a escrita de textos de pesquisa provisórios ocorre fre-
quentemente à medida que textos de campo começam a ser compostos. Textos de campo provisórios são escritos em tempos diferentes n0 processo de pesquisa e para diferentes objetivos, e ainda de formas dife
rentes. Além de cartas, narrativas
balhos,
experimentamos a
interpretativas e apresentações de tra*
escrita de relatos
historiados de eventos espe desenvolveram em torno de uma ideia ou uma inquietaçao. Trés instáncias de relatos historiados do nosso próprio trabalho são o qu chamamos de o banco de histórias da disciplina, usado num capítulo ae livro; a história sobre filosofia pessoal do diretor da Escola da Rua Bala, cíficos que
se
que apareceu enm um artigo, além da narrativa "historiada" do centro e
para o curriculo da escola, (que nunca foi publicada. Usamos o gundo relato para problematizar a relação entre teoria e prática vivida Se no recursos
180
D.
Jean Clandinin | F. Michael Connely
programa de desenvolvimento de recursos da escola. Estávamos particu-
larmente
nervosos
por
trazer esta narrativa
para
os
dois
professores-al
xiliares de recursos. Porém, quando negociamos as narrativas com, eles
concordaram com a maneira como os retratamos nestes relatos; ea partir da reflexão sobre a nossa própria ansiedade e inquietação, aprendemos mais sobre o processo de transformação dos textos de campo em textos de pesquisa. Neste caso, porém, o documento não foi usado de nenhuma
outra forma para a criação dos textos de pesquisa. Algumas vezes, talvez muitas vezes, os textos provisórios apresentam sua função na transição dos textos de campo para os textos de pesquisa sem nunca aparecerem nos textos de pesquisa. Nossa própria inquietação e preocupação sobre partilhar os textos provisórios com os dois professores-auxiliares de recursos, uma das nossas primeiras experièncias com isso, nos ensinou muito sobre a transição dos textos de campo para os de pesquisa. Quando se começa o trabalho de análise e interpretação, essa transição é cheia de incerteza. Não há um caminho claro para seguir que funcione em cada pesquisa. As circunstâncias em torno de cada pesquisa, as relações estabelecidas, a vida investigativa do pesquisador, e a adequação de diferentes tipos de textos provisórios e a versão final dos textos de pesquisa significam que a pesquisa é frequentemente cheia de incertezas. A dúvida e incerteza são vividas em interminá veis falsos começos. Quando começamos a escrever os textos provisórios
e a versão final, podemos experimentar um tipo de texto de pesquisa e descobrir que ele não captura os sentidos que nós temos em mente, que não têm vida e falta o sentido que gostaríamos de retratar, que os parti cipantes da pesquisa não achanm que o texto captura sua experiência, ou acham que o texto de pesquisa não é apropriado para o público pretendido. Experimentamos outros tipos e continuamos compondo textos até que
encontramos alguns que sirvam para nós e para nossos objetivos. Essa inevitável experimentação com a forma narrativa é discutida com maiores detalhes no capítulo nove. Além da dúvida, existe o pânico, ou na menor das hipóteses um considerável nervosisno. Nós dois lembramos da ansiedade que sentimos quando íamos para a Escola da Rua Baia para compartilhar aquele prinero texto provisório con os dois prolessores-auxiliares de recursos. Um dos nomentos mais diliceis na pescquisa narrativa é sempre o momento no qual 0s textos de pesquisa sao compartilhados com os par'ticipantes.
A preocupação é que o texto de pesquisa escrito possa alterar a relaçào
Pesquisa narrativa 181
de traballho entre o pesquisador e o participante. O medo por trás dessa
inquietação se classifica pelo medo de perder um local de pesquisa até o medo de que a amizade entre o pesquisador e os participantes seja perdida. Um
pesquisador
relação intima
participante
não quer que o documento de pesquisa seja prejudicial ao participante. Mesmo que numa
com um
com muitos anos de experiência como pesquisadores narrativos, essas
preocupações surgem novamente a cada vez que partilhamos textos de pesquisa com participantes. Este conjunto de considerações nos remete, como pesquisadores
narrativos, para negociação de relações com os participantes. Esse senso contínuo ir e vir entreo campo, os textos de campo e os textos de pesquisa estão sempre presentes à medida que negociamos a pesquisa.
um
Teoria e Literatura Acima, escrevemos brevemente sobre posicionar os textos de campo entre o espaço tridimensional de pesquisa à medida que nos movemos
dos textos de campo para
os
de
pesquisa.
Esse é
um
tipo de po-
sicionamento que consideramos. Um outro tipo de posicionamento que vem à tona, quando fazemos o movimento dos textos de campo para os de pesquisa, é a contextualização do estudo tanto socialmente quanto teoricamente. Quando pensamos sobre nosso próprio trabalho, consideramos esse
diferentes
posicionamento cuidadosamente, pois compreendemos que comunidades acadêmicas, frequentemente, lêem um padräo
específico de discursos. Por exemplo, algumas vezes as comunidades acadêmicas de Educação são separadas por áreas de tais
há
como
Ensino de
Línguas
conhecimento,
e
Ciências, por exemplo. Algumas
vezes
organização por áreas departamentais, como Administração Educacional e Psicologia Educacional. Outras vezes os limites fronteiuma
riços estão relacionados
a
temas
Educação inclusiva. Qualquer como
pesquisadores
como
posicionamos
nosso
de
que narrativos, devemos
ser
trabalho. Considerando a metáfora da conversa, trabalho socialmente e teoricamente,
qual
reforma escolar e de nosso discurso,
cuidadosos
com a
forma
nosso
conversa
pesquisas 182
específicos, como seja a delimitação
ao
pensar
posicionar
no
perguntanmos
a
de
nós mesmos
queremos participar. Por exemplo, em nossas primeiras narrativas posici0namos o trabalho da Escola da Rua Baía inse-
D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
rido na ampla questão sobre como teoria e prática estão relacionadas, na prática escolar de uma perspectiva do conhecimento em uso. Escrevemos textos de pesquisa com a intenção de nos engajarmos na conversa sobre
questöes epistemologicas e ontológicas do conhecimento do professor
Depois posicionamos nossa pesquisa com a intenção de entrar na conversa sobre reforma escolar.
Outra consideração que se torna particularmente relevante, a me dida que é feita a transição de textos de campo para os de pesquisa, é também de posicionamento, ou seja, posicionar o trabalho em relação a outras correntes de pensamento, programas de pesquisa e ideologias. Ao passo que esta consideração é importante quando nós delimitamos propostas
de pesquisa, vai para o segundo plano à medida que começamos a trabalhar no campo e a medida que compomos textos de campo. Reemerge quando fazemos a transição dos textos de campo para os textos de pesquisa. Observamos acima que as questões de importância social ressurgem ao começarmos a compor os textos de pesquisa. Fazemos perguntas
sobre com quais conversas acadêrmicas queremos nos engajar. Isto, por necessidade, nos exige um posicionamento das nossas pesquisas ao lado de outras pesquisas. Por exemplo, no início do nosso trabalho na Escola da Rua Baía, fica-
mos fascinados com as nossas pesquisas, tentando entender o conhecimen to pessoal. Encontramos uma rica literatura filosófica sobre conhecimento pessoal nos trabalhos de Polanyi (1958), Johnson (1987) e Code (1991).
Depois de ler a literatura filosófica, nos voltamos para a recente li teratura sobre pesquisa educacional, que usava o pessoal para definir o conhecimento do professor. Revisamos a literatura para entender "o que é pessoal nos estudos sobre o pessoal" e usamos isso como um caminho
para posicionar nosso próprio entendimento do conhecimento do profes sor como conhecimento prático pessoal, entre outros pensamentos de outras correntes de pensamento. Este posicionamento das nossas pesquisas é necessário se as pesquisas narrativas såo para contribuir para questões
de relevância social.
Tipo de texto pretendido Uma última consideração a qual prestamos atenção à medida que Tazemos a transição dos textos de campo para os de pesquisa é a conside-
Pesuisanarrativa 183
ração do tijpo de texto de pesquisa que pretendemos escrever. Apesar de dedicar o capítulo nove às discussões sobre os textos de pesquisa, gostaríamos de destacar alguns aspectos que emergem. Assim como dissemos anteriormente neste capítulo, podemos escrever uma variedade de textos provisórios no processo de composição dos textos de pesquisa públicos. Observamos que podem existir inúmeros falsos começos ao experimentarmos diferentes formas. No capítulo nove, lidaremos com as condições
internas de voz e assinatura e as condições existenciais dos objetivos de pesquisas, formas narrativas e audiência. Porém, à medida que fazemos a transição dos textos de campo para os de pesquisa, começamos a entender que existe uma extensão de pos
síveis formas de representar nossos textos de pesquisa. Frequentemente, começamos com um tipo de pesquisa dentro das nossas preferências pessoais. Sugerimos que você faça algo similar. Por exemplo, vocè gosta de ler memórias? Discussões? Coleções de fotografia? Poesia? Relatórios? Dramas? Fazer estas perguntas a si mesmo, olhar para a estante de livros, estudar a
seu
formular
padrão de empréstimo na biblioteca são formas a
resposta para perguntas sobre
o
tipo
para começar de texto de pesquisa
pretendido. Assim a pesquisa abre uma série de possibilidades e frequentemente sugere formas inovadoras e sedutoras que de outra forma riam não ser consideradas.
pode-
Ao nos
sa
prepararmos para começar a compor os textos de pesqui frequentemente lemos outros pesquisadores e escritores que achamos
particularmente interessantes. Lemos livros sobre escrita, como Natalie Goldberg's Writing Down the Bones (1986), e Wild Mind (1990), e Annie Dillard's Writing Life (1987). Esses livros abrem as nossas mentes para
possibilidades e ajudam-nos a atentar para maravilhas como ficcionalização, representação de vozes múltiplas e entrelaçamento de vários novas
gêneros, como citações em diários, conversas transcritas e fotos. Nós nos dirigimos a estas e outras considerações sobre textos de pesquisa no ca pítulo nove.
184D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
CAPITULO 9
Compondo textos de pesquisa
qui
processo o qual chamamos de "ir e vir" da escrita de textos de pesquisa para o pesquisador narrativo. nós caminhamos
pelo
Introdução Neste capítulo discutimos como o inicio do processo de escrita traz o pesquisador de volta para as fronteiras formalista e reducionista. fronteiras que
precisam ser negociadas enquanto compomos textos de pesquisa. Exploramos o lugar
Observamos as
tensões criadas
pelo viver nas
da memória na composição dos textos de pesquisa e a tarefa de lidar com a incerteza. Na maioria das instäncias, as finalidades da pesquisa que es-
campo, têm sido deslocadas e mudadas, levando o escritor a um sentimento de dúvida a respeito
tavam claras inicialmente, antes de
entrarmos no
precisam ser das finalidades do texto de pesquisa. Algumas questões que meio a estas incertezas são as questões cuidadosamente consideradas em audiència. Dedicamos a última parte do de voz, autoria, forma narrativa, e das complexidades que envolvem a escolha capitulo para uma exploração um texto de pesquisa; neste ponto, relata da melhor forma narrativa para Traduzido
por:
do Amaral Dias (PPGEL/ILEEL (PPGEL/1LEEL UFU)
Naildir Alves
-
UFU)
e
Cássia
-
egina
Migliorança
Pesquisa narrativa 185
mos a jornada de dois pesquisadores narrativos e como eles trabalharam
através dessas escolhas.
Experimentando as tensões no começo da escrita O momento de começar a escrever um texto de pesquisa é um momento cheio de tensåo. Há, de um lado, uma tensão associada com o deixar O campo e imaginar o que fazer com o conjunto de textos de campo. Há
ainda, por outro lado, tensões como consideramos ou não o nossa audi encia ou, de que forma nossos textos podem falar aos nossos leitores.Há
também, unma tensão quando olhamos introspectivamente a respeito de questões de voz e se seremos capazes de capturar e representar as histórias compartilhadas por nós mesmos e por nossos participantes. Há uma
tensão, ainda, quando nos voltamo extrospectivamente, para pensar a respeito de questões de audiência e de forma. E há, também, uma tensão
quando consideramos em como representar a situacionalidade da pesquisa dentro de um lugar. Sabemos que não podemos ignorar as tensões que cercama pesqui-
narrativa escolhendo o foco de uma ou outra destas dimensões. Não podemos focar profundamente no passado, isto é, sobre o campo e sobre os sa
textos de campo, sem
social sem
e
ou
seja, a audiência e
pessoal do nosso trabalho. Se compusermos um texto
atenção suficiente ao campo
de escrever um
considerar o futuro,
um
texto
texto que serve de
conexões claras
desconectado
a
de
impacto
pesquisa
textos de camp0, corremos partir da experiência da
o
risco
pesquisa, motivação para o pesquisador, mas sem experièncias dos participantes. Não podemos fo-
interesse
com as
tão
e aos
o
e
pesadamente sobre questões de voz, tentando somente capturar nossas experiêencias com os participantes sem considerar por que estamos escrevendo e qual é o sentido ou o significado que a pesquisa pode ter para eles. Essas tensões, parao pesquisador narrativo compor um texto de car
pesquisa,
são tensões que
experienciamos quando tentamos posicionar espaço tridimensional da pesquisa narrativa. Ao iniciarmos este capítulo, vamos parar e olhar de volta o que ja até escrevemos aqui. O que o escritor de um texto de pesquisa narrativa temé uma nosso
to
trabalho
no
diversificada coleçåo de textos de campo historiados. Cacda tex de campo é, em certo grau, um texto individual e isolado com suas pro-
prias qualidades narrativas. Alguns mais historiados do que outros. Em
186
D.
Jean Clandinin
| E. Michael Connely
alguns textos de campo, a qualidade da história é mais implícita do que
explicita.
Uma
vez
que esses textos de campo foram coletados e posicio nados dentro do espaço tridimensional da o pesquisa narrativa, conjunto como um todo tem o potencial de representar um sentido mais completo do campo de pesquisa narrativa. A tarefa agora, face ao pesquisador nar rativo, é encontrar um modo de selecionar e colocar juntos estes textos de
campo dentro de um texto narrativo global e único. Seguindo a noção de espaço tridimensional da pesquisa narrativa, o escritor tenta compor um texto olhando
retrospectiva
e
prospectivamente, introspectiva
e
pectivamente, situando a experiência dentro de um lugar.
extros
Escrevendo textos de pesquisa nas fronteiras Antes de proceder à discussão sobre as tensões produzidas ao escrever um texto de pesquisa no espaço tridimensional, retornaremos às tensões de viver a vida nas fronteiras que foram introduzidas nos capítulos dois e três. As tensões produzidas ao pensar narrativamente nas fronteiras dos pensamentos reducionista e formalista - importante e observa vel nos estágios iniciais de uma pesquisa -
são, na maior parte, perdidas
de vista quando se está no campo. Lá, a pesquisa avança sobre os seus pró-
prios termos.
na construção dos textos de pesquisa, nos diálogos relacio
nados, imaginados e desejados com uma audiência, que alguns termos da narrativa esbarram-se contra os termos reducionistas e formalistas, dis-
cutidos nos capítulos dois e três. Nós assinalamos, naqueles capítulos, que estes conjuntos de termos são parte do mundo intelectual de todos nós. Não são, portanto, unicamente termos de alguém disputando nas fronteiras.
São
termos
de todos nós. que fazem parte
Escrevendo texto
de pesquisa
na
fronteira formalista
Mary Shuster, trabalho 8rantes,
com
uma
escrevendo
segunda geraço
tese baseada em
suas
participantes.
altamente em c u r s o estivesse
dois
anos
de
de professoras hondurenhas imi-
(do s e u estudo, encontrou-se, no inicio
tus social e econômico de
campo
uma
preocupada
com o
sta-
Embora seu trabalho de
personalizado
com sonmente
Pesquisa narrativa
trêès
187
participantes, ela se viu lutando para selecionar os textos de campo que formulassem uma hipótese para atitudes sociais racistas e sexistas en-
demicas para a sociedade dos participantes. O desejo de Shuster, nesse caso, era escrever um relato que revelasse a hostilidade e a hegemonia
das estruturas sociais. Nas discussões de teses sobre esta possível ordem de escrita parece que, em geral, para escrever o texto formalista sobre estruturas sociais
um diferente tipo de estudo seria mais indicado. Além disso, na medida que Shuster busca este tipo de texto, ela percebe que seus participantes, os quais ela deseja homenagear no texto de pesquisa, se tornariam
em
figuras secundárias em um papel demonstrativo da desigualdade social. Shuster reconhece que seus textos de campo mostram que as nuances na vida de cada pessoa, fragmentam as categorias de raça e gènero. Raça e
genero,
geral, funcionam,
não especificamente para os seus par ticipantes. Um participante, por exemplo, descreve sua família como uma em
mas
em que crianças são valorizadas igualmente. No entanto, a categoria de
gènero implica que, em uma família de imigrantes católicos hondurenhos, as garotas são oprimidas. Quando os participantes são conhecidos mamente
inti
pessoas, não são meramente representantes categóricos ou fragmentos de categorias. Mas Shuster tem um problema porque ela deseja um mundo melhor para a sua participante e pensa que mostrando como a
como
sociedade perpetua atitudes racistas
e
sexistas fará
algum
bem
para o qual ela percebe sua participante em um estado um pouco infeliz,
necessidade de escrever sobre sua participante e colocá-la como representação em um texto de pesquisa formalista. Há, certamente, uma grande tensão porque Shuster deseja ambos, homenageá-la e criticar a estrutura social através do conhecimento das daí
a
experiências
de
sua
participante
por vé-las somente
de
como
exemplares
categorias formalistas. Ela precisa, portanto, encontrar uma forma de representar suas vidas historiadas em forma de história, não para representar vidas historiadas como exemplares de categorias formais.
Escrevendo texto
de
pesquisa na
fronteira reducionista
Para outros, muitos talvez, a interação entre narrativa e termos criam reducionistas tensões em duas e possivelmente mais formas à me-
188
D. Jean Clandinin | E.
Michael
Connely
dida que compoem textos de pesquisa. A primeira forma evolve a memória e o seu lugar na pesquisa narrativa. Por exemplo, algumas vezes os textos de pesquisa superam a capacidade do pesquisador em lidar razo-
avelmente bem
com
eles
organizadas
o
- pode haver muitas suficiente
-
notas,
uma vez que
talvez elas não estejam na escrita o pesquisador e
recorre à memória da experiência de campo e compõe, sem referencia aos textos de
campo,
uma
declaração
de eventos lembrados
em
ap010
a um ponto ou outro do texto de pesquisa. Pode ser também, como e
frequentemente o caso, que o pesquisador esteja usando registros da memória; por exemplo, entrevistas com os participantes nas quais os
participantes estejam recoletando suas narrativas de histórias. Outro exemplo é a escrita de texto de pesquisa autobiográica fora da memória sem o apoio de textos de campo. Nestes três casos, a memória tende a
assumir uma qualidade factual e sem nuances. Um participante pode ter
dito, por exemplo, que se lembra da infäncia de certo modo, mas que ele também sabe que a partir de discussões com irmãos, ou outras pessoas, por exemplo, certos eventos da infância pareciam ser entendidos e lembrados de diferentes formas por diferentes membros da familia. Sem
re
tornar aos textos de campo, o pesquisador pode se render sem nuances da infância desse participante. 0 que era uma rendição interpretativa com nuances da experiência de campo torna-se um fato afirmado, uma
coisa, no texto de pesquisa. Portanto, o que era uma narrativa de texto de campo torna-se reduzid0 a um fato positivo no texto de pesquisa. Esta forma de reducionismo é comum em textos autobiográficos, em que os escritores podem descrever um evento anterior ou um sentimento comno
se ele fosse exatamente como tal. Mas a memória é seletiva, moldada,e recontada na continuidade de uma experincia. A história de Ivan Schmidt ilustra a segunda forma em que há
uma tensão na fronteira reducionista quando alguém compõe um tex to de pesquisa. Schmidt, escrevendo uma tese sobre experièncias de
pessoas em tornarem-se trabalhadores sociais, encontra-se, no final de vários meses de conversações com cinco trabalhadores sociais, preo-
Cupado em como escrever seu texto de pesquisa. O curso de seu tra balho de campo com os trabalhadores sociais era altamente personalizado. Ele falava conm eles, ouvia suas histórias de crescer com as suas familias, dos anos passados na escola, dos trabalhos intormais com as lamilias em diversos lugares, da mudança de carreira, uma vez que, sentindo-se insatisfeitos mudavam para outra. Juntos, eles contavam
Pesquisa narrativa 189
histórias, olhavanm álbuns de fotografias dos participantes que compar-
tilhavam velhas cartase jornais. Na medida em que Schmidt começou a pesquisa,
ele
queria, por unm lado,
criar
um
pensar em seu texto de
texto de
pesquisa ricamente
texturizado que representasse a complexa narrativa de experiencias condizente com os assistentes sociais, com as histórias a serem enfrentadas como assistentes sociais. Mas, sentindo a tensao em dizer algu ma coisa generalizável, ele queria, por outro lado, escrever um texto
de pesquisa que criasse temas que permeassem as cinco narrativas de escrever temas experièncias. No entanto, reconhece que se ele quiser Se generalizados, outro tipo de estudo deveria ser mais apropriado.
ele entra nesta tensão posteriormente e escreve temas destinados a serem generalizáveis, ele poderá perder a riqueza das narrativas da
experiência,
sem
adquirir
a
desejada generabilidade
uma vez
que ele
tem somente cinco participantes. Se ele cede à tensão de escrever uma
única narrativa que homenageia a experiência dos seus participantes, ele teme que sua pesquisa não seja julgada boa o suficiente para encontrar o crit rio
de pesquisa estabelecido por aqueles que trabalham
em uma forma mais reducionista. Há, certamente, tensões aqui porque ele deseja ambos, homenagear as experiências de seus participantes e criar teorias generalizáveis a respeito das decisões dos assistentes sociais em tornarem-se assistentes sociais. A tensão vivenciada por Schimidt representa uma invasão comum de termos reducionistas na escrita do texto de pesquisa, na pes-
quisa narrativa, uma invasão que se torna aparente quando o escritor imagina-se escrevendo o texto de pesquisa com capítulos individuais, dedicados à minibiografias dos participantes ou a olhar os traços e ele mentos comuns atrav s
dos participantes. Não é surpresa encontrar
estudantes de doutorado que estão trabalhando com três participantes e que imaginam que, por adotar um cenário comum de termos analíticos, eles podem ser capazes de criar temas para cruzar a análise dos participantes. Os escritores imaginam a si mesmos escrevendo um
documento generalizável, em que o traço constitui generalizações e os participantes desvanecem em papéis secundários, mais do que eles fa zem em nosso exemplo com Schimidt. Esse tipo de redução, uma redução descendente dos temas, (mais do que ascendentes para categorias
globais como no formalismo), conduz a um diferente tipo de texto com um diferente papel para os participantes.
190
D.Jean Clandinin | E. Michael Connely
Escrita, memória e
textos de
pesquisa
Até aqui fizemos uma alusão às conexões entre memória, textos de campo, e textos de pesquisa. Uma forma de pensar os textos de campo é
ve-los
como
sinalizadores da memória. Ler
um
texto de campo
permite
-nos tocar em uma base de memórias das experiências de campo. Por um lado isto é verdade. Mas, textos de campo são mais transformadores d0
que sinalizadores de memória. Para começar, a escrita dos textos de campo molda a experiência. Além do mais, assim como alguém lê e os relê ao longo do tempo eles se tornam menos uma sinalização das experiências de campo tornando-se tudo o que é deixado dele. Os textos de camp0, e na-
turalmente, qualquer intervenção no texto de pesquisa que alguém pode ter escrito, são, na sua maioria, o que resta da experiência de campo. Agora por exemplo, quando nós retornamos aos nossos textos de campo de vinte anos atrás, tentamos lembrar e contar histórias uns a0s outros sobre as experiências de campo na Escola da Rua Baía. Algumas vezes fomos bem sucedidos neste trabalho de memória. Encontramo-nos decorando os textos de campo os quais pensávamos que eram memórias recoletadas, desencadeadas pelos textos de campo. Na maioria das vezes,
os próprios eventos, provavelmente não seriam antecipados, muito menos lembrados, com algum rico sentido experiencial, sem a gravação dos textos de campo. Com mais frequência do que deveriam, os textos de campo são tudo o que permanece de situações e eventos especificos. Dillard disse: "se você prima por suas memórias... não escreva uma memória
0 ato
de escrever sobre uma experiência leva muito mais tempo e é muito mais intenso do que a própria experiência que você deixou somente com o que você escreveu, assim como os sinalizadores de suas férias tornam-se mais reais do que suas próprias férias. Vocè canalizou suas verdades lembradas
e substituiu-as por uma nova." (Zinsser, 1987, p. 27). Quando há um grande volume de textos de campo, o que não é incomum na pesquisa narrativa, considerações sobre a forma de empregar textos de campo é importante. Algumas vezes, arquivos de computador e sistemas de códigos são usados. A memória desempenha um papel indi-
ferente (ou negligente) se os computadores são utilizados no processo ou não. Quando o volume total de textos de campo fornecido não é esmagadoramente grande, é possível que o papel da memória, tanto para aqueles que codificam usando computadores como para aqueles que codificam sem computador, pode ser similar na construça0 e na escrita de seus tex-
Pescqulsa narrativa 191
tos de pesquisa. No entanto, se os textos de campo forem utilizados para estudos posteriores, como em nosso retorno aos textos de campo da Rua Baía, as questões são dramaticamente diferentes, principalmente por cau-
sa do papel da memória. Textos de campo não arquivados, digitalizadas e categorizados em computador, como as notas de lápis desbotam, nesse caso, notas contextualizadas e relevantes são perdidas e conexões entre
códigos passam despercebidas. No entanto, as gravações digitalizados permanecem. Sem arquivos digitalizadas, os textos de pesquisa podem ser tudo ou praticamente tudo o que é deixado da memória. Sem arquivos
digitalizados será difícil imaginar a construção de um texto de pesquisa alternativo no futuro. Já com gravações digitalizados, a memória é apresentada não somente no texto de pesquisa construído, mas também em textos de campo digitalizados. Em
nossa
visão, não há nada de errado
com a
abordagem não digita-
lizadas para a forma de organizar textos de campo que se apresentam tão
longo e
forte
bastante para ligar experiência de campo a textos de campo com um único e principal texto de pesquisa. No entanto, nós orientamos àqueles com um olho no futuro, enraizado firmemente no passado, a usar a melhor tecnologia à disposição deles para gravare organizar seus textos de campo. Embora somente recentemente começamos a usar o NUDIST, nós temos usado, desde o início, o processador de texto eletrônico como o software com programas de processadores de texto como Microsoft Word. o
Escrevendo textos de pesquisa em meio às incertezas No
capítulo cinco e
quisadores da
narrativos
pesquisa narrativa,
dimensöes
de
abertura deste capítulo, descrevemos
na
estando
como
no
sempre localizados
tempo, lugar,
os
pes-
meio do espaço em
tridimensional algum lugar ao longo das
pessoal e o social. Além do mais, imagina mos nós mesmos aninhados em um conjunto de histórias nossas e deles. Nós e nossos participantes estamos juntos, no meio. Este mesmo sentido o
-
de estar
no
meio caracteriza
o
que
pesquisadores da narrativa fazem quando eles escrevem seus textos de pesquisa. No entanto, estar no meio quando alguém escreve um texto de pesquisa pode, e os
quase sempre acondiferente de estar no meio do campo. Inevitavelmente talvez, os escritores são menos confiantes do que estão fazendo e do que querem dizer, do que eram quando eles entraram no tece,
ser
campo,
192.D. Jean Clandinin | Michael F.
Connely
e
mais
seguramente,
eles são menos seguros e à vontade com eles mesmos do que eram durante a
experiëncia de campo, se forem bem sucedidos, desvelados. Nos capítulos trêse oito, nós discutimos o lugar da teoria
pesquisa narrativa. Declaramos que teoria desempenha um papel ambiguo e confuso no lugar da prática, o cenário da pesquisa. Coisas que eram na
vistas claramente à distância e antes do trabalho de campo como com-
preensivel, pesquisável ou interpretável em termos teóricos, perdem sua precisão quando o cotidiano da experiência de campo é encontrado.
Shuster,
no
estudo observado anteriormente, näo somente queria
interpretar suas participantes em termos de raça e gênero, mas tambem iniciou sua pesquisa pensando naqueles termos. Parecia muito claro para ela -
dada as
d i n â m i c a s de
gênero,
como
ela
os c o m p r e e n d i a
emn
Honduras e no Canadá, e dadas as atitudes culturais no Canadá - que suas
participantes representariam categorias teóricas.
Mas a experiència de campo destruiu aquela fácil compreensão inicial. Há uma ironia nisso para os pesquisadores narrativos porque eles tendem a ser menos seguros deles mesmos, menos claros do que eles têm a dizer depois de investirem eles mesmos, intensamente ao longo do tempo em suas pesquisas, do que eles eram antes de fazer a pesquisa. Se experiência de pesquisa supõe produzir clareza, a maioria não sente isso quando começa a escrever textos de pesquisa. Parte das incertezas dos escritores vem pelo conhecer, e pelo se importar em relação a participantes específicos. Categorias teóricas abstratas podem ser mais relevantes antes da pesquisa, mas os participantes, e o relacionamento de alguém com eles, são a chave quando o texto de pesquisa vai ser escrito. Os pesquisadores aprendem que pessoas nunca são somente, (nem mesmo se aproximam) em algum cenário particular de termos, categorias ou noções teóricas isoladas. Eles são pessoas com todas as suas complexidades. São pessoas vivendo vidas historiadas em
paisagens historiadas. Parte das dúvidas do pesquisador narrativo venm da compreensão de que eles precisam escrever sobre pessoas, lugares e coisas "em trans formação" mais do que "estáticos". A tarefa deles não é tanto dizer que
pessoas, lugares e coisas são desta ou daquela maneira, mas que elas tê uma história narrativa e que estäão avançancdo. O texto de pesquisa narrativo é fundamentalmente um texto temporal -a respeito do que tem sido o que é agora, e o que está se tornando. O escritor precisa encontrar formas de escrever um texto que está "em um lugar", não abstrato, mas situado.
Pesquisa narrativa
193
E o lugar também precisa ser visto como em transformação. Como loAn Phillion escreve acerca de sua vida com Pam na Escola da Rua Baía, ela pc
Creve a respeito da escola como um lugar com uma história, um lugar au
que
está situado e um lugar que está direcionado para o futuro. Pam, no lugar está em uma transição temporal -
um complexo evento que está deter
minado pelo passado e está determinando, de uma forma extremamente
incerta, o futuro. Ainda outra quest o
confusa que conduz à incerteza do escritor
é a relação de pessoa e lugar para contextualizar o agora, em relação ao
passado e ao futuro. Não é suficiente escrever sobre a Escola da Rua Baia em um lugar temporalmente. Phillion precisa situar a escola em seu contexto, com o qual também tem uma história narrativa - a comunidade e como ela é desenvolvida, com o Canadá e suas histórias e políticas de
imigração e proteção de refugiados. Ambos, Pam e Phillion estão em um
relacionamento colaborativo e estão no contexto uma da outra. Além do mais, cada uma delas está em seu próprio contexto. Todas essas intersecções de contextos fazem diferença para compreender o trabalho. Por
exemplo, parte do contexto de Pam (como o de Phillion) é o contexto da Escola da Rua Baía. Pam também tem uma vida independente do contex to dessa escola, uma vida com uma história relevante para sua prática
docente. Phillion, outro contexto
pesquisadora em desenvolvimento, também tem sua própria história e futuro. Como pesquisadores
uma
com
narrativos, tais como Phillion, trabalhando no meio da composiçao de um
texto de
cadas entre
pesquisa, criam um cenário que emerge das tensões provo0 pessoas, lugares, e coisas em relação, em um contexto e el
transformação? Não
confusa.
se
admira, então, que
Os escritores
escrita do texto de pesquisa seja tao el manter em mente e colocar no pape
a
precisam questões tão discrepantes, mas intimamente conectadas no espaço dimensional da pesquisa narrativa. Os escritores-autores sabem y não é suficiente nomear as várias partes. Títulos não constroem co nhecimento. Todas essas partes precisam ser lembradas enquanto oS escritores Jutam com questões de significado e relevância. Tudo is> se torna
mais complexo na medida
ma
para transmitir
Questoes
tais
a
em
história vivida
como voz,
assinatura,
que eles
buscam por
uma
contada com os participu tes. forma narrativa, e especia e n t e e
audiéncia precisam ser discutidas. Passarenos, então, para u tratamento destas questöes.
194
D.
Jean Clandinin |
E.
for-
Michael Connely
breve
Voz Em sentido mais amplo, a voz pode ser considerada como pertencente
aos participantes, ao pesquisador, e a outros participantes e outros pesquisadores para quem um texto fala. Há uma grande literatura desenvolvida sobre a voz.
Na pesquisa narrativa há umarelação entre pesquisadores e
participan
tes, e as questões de voz surgem para ambos. Um dos dilemas dos pesquisadores, ao compor textos de pesquisa, é apreendido pela analogia de viver na fronteira, tentando manter um equilíbrio entre a luta para expressar a própria voz, no meio de uma pesquisa desenhada para contar as experiências historiadas pelos participantes e representar suas vozes, e ao mesmo tempo tentar criar um texto de pesquisa que falará e refletirá as vozes do público. Voze dilemas, criados tendo considerado o que foi dito anteriormente, são sempre ordenadas por exercício de julgamento. O pesquisador está sempre falando parcialmente desprovido e está genuinamente aberto para legitimar a crítica
dos participantes e da audiência. Alguns pesquisadores säo silenciados pelo convite à crítica contida na expressão da voz. Há outras considerações a respeito de voz. Uma questão fundamental é a multiplicidade de vozes, ambos para participantes e pesquisadores. Não é necessário ver nossos participantes como unívocos, não vinculados a uma estrutura teórica ou modo de comportamento que os deixariam com a aparência de seres unidimensionais. Nós, e nossos participantes, vivemose contamos muitas histórias. Nós todos somos personagens com
múltiplos papéis
que falamos de dentro de
múltiplos
enredos. Como ten-
tamos capturar esta multiplicidade, precisamos considerar as vozes ou-
vidas e as vozes não ouvidas. Ou, para olhar a voz de outra forma, podemos incluir a voz do participante de tal forma que o contexto do texto de pesquisa obscureça ou silencie importantes partes da voz do participante. Como pesquisadores, lutamos para falar nosso texto de pesquisa com nos-
sas múltiplas vozes. Nossos silêncios, ambos, aqueles que nós escolhemos e aqueles dos quais não temos consciència, são também considerações de VOz em nosso texto de pesquisa.
Assinatura Voz e assinatura estão intimamente relacionadas à escrita que transforma textos de campo em textos de pesquisa. Quando um véu de
Pesquisa narrativa
195
é
silêncio
ele ou escritor sabe que levantado e o ele precisa
encontrar uma
aloum
alguma coisa a
forma
do
le dizer o
poder da voz, dihcil para o escritor claseis diz Geertz (1988), E, falar. deseja " L o l o c a r - s e em seus textos fo..
o dizer e sente
que
ela tem
como
forma
ssificar
deve
se
colocar
representacionalmente
no texto.
colocarem-se dentro
Para
imaginativamente,
há multiplas
(pg, 17). Para Geertz, formas de estar no como há múltiplas
dificil"
especial, natura
de
deveria
marca
que
cada unm de nós
pesquisa. A questão é
ser:
formaS de estar no
texto. Estar no campo
como
quao vivida
de
nossa
o risco uma assinatura correria
muito vívida
campo.
escritores, constitui
o dilema de
de
uma
de vista do
ais im
ascim
fo rma
nossa
ssi-
assinatura
obscurecer
uma assinatura corre-se o
e seus
eja,
alguns, pode ainda ser
participantes; muito sutil fale do ponto decepção que o texto de pesquisa campo
seja,
"pode s e r + ida cultura (ou D
ele diz dentro dos textos deles),
etnógirafos quanto dentro da cultura).
os
ficil para
a
o
risco da
participante. Os
autoria excessivamente vívida são bem conhecidos na literatura e são intituladas de abuso da subjetividade. Os riscos de uma autoriscos de
uma
ria muito frágil não são imagináveis, e é aqui que o pesquisador narrativo
precisa prestar porque outros
muita
atenção
textos e outras
aos seus
teorias,
escritos. A autoria
ao invés
pode
frágil
ser
do escritor, assinam
o
tra
balho. Igualmente, a autoria pode ser muito frágil porque o pesquisador
imagina que
os
participantes
e seus
textos de campo também são autores
do trabalho. Ambas as formas de fragilização precisam ser combatidas. Ao obter uma voz, e uma assinatura, os pesquisadores precisam colocar
sua própria marca no trabalho. O texto que tem uma assinatura tem rit mo, cadência, e expressão, e faz o trabalho facilmente identificável com00
trabalho de certo autor ou de um conjunto de colaboradores. O expressar assinatura é chamada por Geertz de discurso. A assinatura e sua expressao no discurso cria a identidade do autor.
A assinatura é comumente considerada como parte do pesquisador,
mas pode, também, ser pensada para se referir aos participantes. Quando os pesquisadores narrativos retornam para os participantes com o tex
sua pergunta não é: se "eu tenho o direito?" "É isso que você disse: isto que você faz?" Ao contrário, sua pergunta é
muito mais global e nar
vê aqui? É este o personagem que voce q lade ser quando for lido pelos outros? Estas são questöes mais ae d mana:
do
Este é vocé? Você
que questões de
ticipante
se
se ou
não
alguém relatou corretamente o q
disse ou fez. Pam, por exemplo, aparece como uma peo escritos de Phillion? Nós, ou ela mesma, reconhecemos sua foe
196
D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
par a
nos
d e :ser
numa sala de aula multicultural? Isso dá o tom e senso do modo como ela
conhece o mundo de diversidade no ensino e na aprendizagem? Por ora, usamos o termo assinatura do participante para capturar o que temos em
mente, mas um termo diferente e mais enriquecido deve ser mais apro priado para a nosa compreensão. Mas, imaginamos um outro termo que reconheça a influência do participante sobre a assinatura que possa ser
negociada entre pesquisadores e participantes. (as seções sobre voze as sinatura são adaptadas de Clandinin e Connelly, 1994). Audiencia A audiência existe na imaginação do pesquisador desde o início da pesquisa, na maior parte das vezes esquecida durante o trabalho de campo, agora se agiganta. E a condição necessária que deve ser cumprida
pelo texto de pesquisa narrativa. O prazer de um bom relacionamento com um senso de significado e de relevância compartilhado entre pesquisador e participante é importante, mas insuficiente para a escrita de textos da pesquisa narrativa. Um senso de uma audiência, espreitando sobre os
ombros do escritor precisa impregnar a escrita e o texto escrito. E desculpável julgar equivocadamente uma audiência e escrever um texto que não seja significativo para os outros. Mas é imperdoável não ter um senso de audiência e do que um texto de pesquisa pode ter de útil para o leitor. Admitir a audiência, no entanto, cria ainda outra tensão e outra ação de equilíbrio à medida em que os escritores constroem seus textos de pes-
quisa. Escritores podem sentir-se ligeiramente infiéis aos seus participantes quando eles escrevem a respeito de seus trabalhos de campo para uma
determinada audiência. Dificeis questões surgem durante os momentos compartilhados, intimidades, segredos, e o desejo de encontrar um lugar para esses momentos no texto de pesquisa. A luta do escritor para respeitar
as relações de trabalho eproporcionar um lugar para a voz e a assinatura do participante tende a estar em tensä0 com a noção de audiência.
Tensões entre voz, assinatura e público Estabelecer a voz e a assinatura move-nos para dentro da pesquisa, para o campo e seus participanteS. (Como mencionado no capítulo oito,
Pesquisa narrativa 197
10ssa primeira audiència é quase sempre nossos participantes. Afinal, a audiencia está quase sempre na imaginação e fora da pesquisa. Como se dá com todas as outras tensões da escrita de textos de pesquisa, na pesqui-
sa narrativa, a adoção de valores extremos produz um texto de pesquisa
inadequado.
Um documento
frio, despersonalizado,
sem
assinatura
e sem
V0z, endereçado na íntegra para uma audiência, tem por vezes, na pesqui-
Sa nas ciências sociais, até o momento, considerado como bom ou ideal. A construção de tais textos de pesquisa toma uma forma em que o pesqui-
sador é "o pesquisador" e náão o "Eu'", os participantes são "os sujeitos" e não "Pam". Mas, o outro ext1remo é igualmente inapropriado para o texto
da pesquisa narrativa. Um texto em que "Eu" e "Nós" e "Pam" e outros são escritos de tal forma a estabelecer uma convivência fraterna, provocando o leitor a sentir-se ligeiramente envergonhado da invasäo, não constitui um bom texto de pesquisa narrativa. Infelizmente, esta caricatura de tex tos de pesquisa na pesquisa narrativa, tendeu a ser popularizada pelos críticos. As acusações de solipsísmo são comumente atribuídas ao trabalho narrativo. Algumas vezes, sentimentos de empatia subjugam a escrita e a
acusação é justa. O escritor do texto de pesquisa continuamente equilibra a assinatura e a voz com a audiência. Algumas vezes, talvez em algumas passagens, capítulos, ou mesmo textos inteiros, a audiência pode se agigantar. Em
outros, assinatura e voz e a construção de textos íntimos podem parecer maiores. Sempre, ambos os lados, desta tensão do escritor, precisam ser
abordados conscientemente e por escrito dentro do texto de pesquisa. Outra tensão que entra em jogo quando alguém começa a escrever um texto de pesquisa é uma tensão associada com a escolha da fornma
narrativa. No capítulo oito, nós sugerimos que pesquisadores narrativos
deveriam considerar uma gama de possibilidades do que eles gostam em um texto de pesquisa. A questão para os escritores é: o que você gosta de ler? Esta é
uma
questão
quando
que
frequentemente perguntamos a
nós
mesmos
começamos compor nosso texto de pesquisa. Quase sempre, pedimos aos estudantes de mestrado e doutorado para explorarem esta questão. No entanto, isto faz parecer como se alguém fizesse a escolha a
com
base
tre
pessoal
puramente no gosto pessoal. Este não é o caso. Há sempre umna tensão entre voz, assinatura, e audiència. Além do mais, há uma tensão eno
quisador com a
198
-
que
e dos
conversa
D.
é
o
que parece
participantes em curso
e o
adaptar-se com as experiências do pessocial
que envolve
as
-
que é
o
questes abordadas
Jean Clandinin | E. Michael Connely
adaptar-Se na pesquisa.
que parece
No trabalho empreendido por Janice Huber, Karen Whelan, and Wendy Sweetland (em andamento), vemos um exemplo de como elas negociaram as complexas tensões presentes n0 ato de compor um texto
de pesquisa. Huber and Whelan são alunas do doutorado desenvolvendo uma pesquisa narrativa com um grupo de professores participantes. Elas selecionaram o formato de artigo para a tese delas, um formato que permite cada uma delas escrever cinco artigos, baseados em seus campos de
estudos, para publicação. Sweetland é
das professoras participantes. Ao incluí-la como participante e como coautora, iniciou-se uma tensao ao uma
abordar questões complexas de voz e assinatura. A voz de Sweetland será parte do texto de pesquisa e Huber e Whelan näo falarão por ela. 0 texto terá uma co-autoria. Elas concordaram em escrever sessões individuais, responder as questöes uma das outras e incluir algumas destas respos tas. Cada uma delas escreve sua própria história, a partir de suas proprias
experiencias autobiográficas; os textos de campo fazem parte do trabalho de campo; assim como as respostas de uma para outra. A complexidade ao negociar um texto co-autorado, que se baseia nos textos de campo co-
muns, ilustra algumas das tensões em torno da voz. Mas esta é apenas parte da tensão. Cada uma das sessões que elas assinam (são autoras) tem sido impressas com a própria assinatura delas. Cada parte ostenta o único carimbo do autor que o escreveu. Como elas tecem essas partes únicas
dentro de um texto que tem um conjunto de assinaturas, uma assinatura que adequadamente fala pelo coletivo de autores? Novamente, esta é apenas uma parte da tensão. Elas precisam ainda considerar questões de audiência. Para que revista vão escrever? O que é aceitável no discurso acadêmico daquela revista? Daquela comunidade
acadêmica? É no meio das negociações dessas tensões que questões de forma narrativa emergem.
Forma narrativa "Eu quero começar a minha tese escrevendo", disse Bev Brewer enquanto abria um encontro de discussão de teses. "Eu penso que escrevi alguma coisa que é um estilo de dissertação. Estou imaginando se estou
no caminho certo. Podemos discutir isso a partir daquele ponto de vis ta?" Bev está no meio do desenvolvimento de uma tese sobre Educação de adultos em faculdades comunitárias. 0 texto que ela trouxe para o en-
Pesquisa narrativa 199
uma série de encontros a descrição de contro, quinze páginas ou mais, era disse ela, "Uma introdução do parcom um participante de pesquisa. "Era'", usar a descriçäo para três ticipante dela" Ela também disse que esperava e uma seçäo da tese. propósitos: uma conferência, um artigo para publicar ele e Bev, se encontravamn Michael leu o texto. Subsequentemente, narrativa. A discussão deles se esem meio a uma c o n v e r s a sobre forma ver o texto Como um material tendeu por uma sessão de orientação. Ao potencial para a conferência, eles falaram sobre a distribuição do tempo
de fala de Bev,
se
ela queria
ou
não
cópias do artigo
público, se o artigo deveria ser um texto para ler ou
para distribuir entre o se ela esperava que ele
seria um grande documento a ser publicado em um periódico, em que me
dida o artigo e a comunicação oral seriam textos diferentes. Eles falaram acerca de como periódicos específicos tendem a ter um formato particular e quão útil seria ter uma outra revista acadêmica em mente enquanto sua
comunicação era preparada. Eles falaram a respeito de que modo e quantas ideias e pontos e teses poderiam ser suficientemente endereçadas em uma fala de dez minutos ou em um artigo de vinte páginas. Eles tentaram imaginar as diferenças entre um texto para uma comunicação oral e um
texto para um periódico. Eles também falaram a respeito da escrita destes textos provisórios, como possibilidades de serem encaixados na versão final do texto de pesquisa, a tese. Deveriam ser colocados no começo, em algum lugar no meio, ou mesmo no final? Poderiam imaginar como o artigo da conferéncia, um texto provisório, poderia ser ao mesmo tempo, um segmento (parte) da tese? O que seria necessário ser feito, mais tarde, para remodelar um texto provisório para a versão final do texto de pesquisa, uma tese? 0 que seria necessário conter em um artigo para conferência que um segmento final de tese não deveria?
Ambos estavam, realmente, em meio a tensões de conmposição de um texto de pesquisa. Sem uma ideia firme do propósito imediato e do
público-alvo
comunicação, comunicação como base para escrita de ar-
tigo, tese, comunicação e artigo tornando-se parte da tese eles tinham pouca ideia por onde começar. Michael e Bev precisavam traballhar em meio àquelas tensões.
dificuldades deles ficaram maiores. Imagine se decidissem os textos em questäo primeiramente para a tese? Onde deveria ser As
do? Dada à natureza da discussão contida no texto, usar o texto para introduzir a tese o - seu puzzle
usar
encaixa
poderia ter sido possivel central, a qualidade do seu
200D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
fenomeno e o tipo da pesquisa a ser desenvolvida. Ele poderia, por exemplo,
ser colocado em algum lugar na seção de metodologia, onde o material pudesse ser usado para introduzir os participantes e apresentar alguma coisa
da metodologia conversacional, usada no campo de trabalho. Poderia ter sido, também, usado como história chave dentro da tese, como crítica à literatura de Educação de adultos e práticas que estavam sendo questionadas. Por outro lado, se eles imaginassem o texto para ser usado como base para os possiveis textos provisórios de Bev, para conferência ou para a publica ção de um artigo, eles teriam que saber alguma coisa mais sobre o que Bev
queria dizer tanto na conferência como no artigo. Como os escritos poderiam ser colocados em alguma parte da tese, dependendo de como ela imaginava, o texto poderia ter sido formatado para se tornar a base para a sua próxima apresentação em conferencia ou para um possível artigo. Como deveriam pensar a respeito disso? Como deveriam proceder? Enfim, eles tinham que olhar adiante e imaginar o fim do percurso antes mesmo de chegarem lá. Bev e Michael discutiram Aristóteles, e ela deixou o encontro pensando em questöes de forma, de como, de fins e meios. Aristóteles diz que as causas materiais e formais, combinadas com causas eficientes conduzem a causas finais: um plano arquitetônico, combinado por um arquiteto e construtores, com materiais de construção levam a uma construção; uma ideia de uma pintura combinada com um pintor, utilizando materiais de arte, produz uma pintura; e uma ideia de uma tese combinada com um pesquisador, com textos de campo produz um texto de tese. Isto é, claro, uma visão simplificada do que está em jogo. Bev e Michael também falaram a respeito da noção de finalidade, de Dewey, durante o desenvolvimento de um trabalho prático, a ideia de que ninguém trabalha às cegas, ao contrário, a finalidade ajuda a moldar o fazer e a prática, que em contrapartida moldam a finalidade. A forma narrativa é algo como a causa formal de Aristóteles ou a finalidade de Dewey. Os escritores da pesquisa narrativa, sem especificar e sem se limitar, precisam imaginar uma forma para o texto final da tese. Algumas vezes, pode ser possível imaginar alguma coisa específica tal como um documento que tem a marca de um bom texto de literatura de ficção, com personagens bem desenvolvidos, trama, e cena. Outras vezes. é possível considerar um ou outro tipo de texto. E também possível planejar capítulos em potencial, ou suas partes. Bev leu, para uma revisão de
diário reflexivo, dois livros sobre Educação de adultos que ela considerou
Pesquisa narrativa 201
pertinente para criar
qual
tivesse
relação
uma nova
com sua
a
respeito
de Educação de
noção
seções da quais ela poderia imaginar possiveis
tese e
mesmo dos capítulos. Estas
considerações estão
elas se tornam mais refinadas
do
nosso
o texto
texto de
final
pesquisa.
adultos, a
achou que poderia ser linha de trabalho. Ela preliminar de forma narrativa,
cono uma
capaz de desenvolv -las com as
visão
no c e r n e
da forma
à medida que
Elas
nunca
esteja completo. Enquanto
narrativa.
avançamos na
talvez, até E claro que
composição
ficarão totalmente claras até que a a escrita do texto avança,
forma
de forma
tipo noção orgânica no trabalho, escrita faz diferença para a forma genética desenvolvimental. A própria ou de desenvolvimento de atual do texto final. Há um tipo de crescimento Bev e Michael estavam consnoções rudimentares de forma, do tipo que a forma que é truindo em seus encontros de orientação, até se alcançar muda
e se
amplia. Há
um
uma
finalmente aplicada no texto escrito.
Porque suas sessões de orientação eram frequentemente repletas de momentos de pausa, suas discussões eram discursivamente fragmentadas. A busca pela forma faz parte do que os pesquisadores narrativos
fazem, ainda que sintam uma confusão inicial ou que não percebam que estão alcançando a forma pretendida.
No capítulo um, escrevemos que estamos em meio a um turbilhão de possibilidades para construirmos textos de pesquisa, os quais são, nas
palavras de Geertz, "insatisfatórios, estáticos, frágeis e mal formados: um grande improviso" (1995, p.20). Marcus e Fischer (1986) chamam esse
momento (em seu título) de um 'momento experimental". Há uma dispo sição para o experimento com a forma narrativa, literária (Bakhtin, 1981).
visual (Chatmam, 1990), poética (Rose, 1990), dramática (Turner, 1980), e outros modos de expressão são evidentes. Estas e outras formas têm sido recentemente colocadas por Eisner (1991) e são discutidos por Denzin e
Lincoln (1994). Denzin e Lincoln descrevem este nosso momento da pes-
quisa narrativa comoo "quinto momento" (p.11) na pesquisa qualitativa e preveem um sexto momento. O entusiasmo dessa fluidez pode levar o leitor a pensar que vale tudo e de certa forma isso é verdade desde que funcione e seja convincen-
Eisner
(1997), refletindo sobre as experiências com forma, di zem, "as implicações de explorar e utilizar novas formas de representaçäo, para a condução e apresentações da pesquisa educacional, são profundas te.
Barone
e
(p. 92). Em progranas de pós-graduação e em conferências acadèemicas,
202D. Jean Clandinin |
E.
Michael Connely
experimentos com uma gama de possibilidades as quais freqen temente chamamos de pesquisa com base em artes, como dispositivos
vemos
para estruturar textos de pesquisa. Um painel de mensagens em uma de
instituições
anuncia "uma série de colagens explorando pesquisa em arte". No entanto, a noção de Edel, de que cada sujeito biográfico tem nossas
sua própria forma, sugere que não é qualquer forma que vai se adequar a
qualquer pesquisa. Ao escrever textos de pesquisa narrativa, precisamos atentar para o
equilíbrio de tensões da escrita, dentro do espaço tridimensional da pesquisa narrativa, de uma forma que narrativamente capture o campo das experièncias, e no equilíbrio destas com a audiência. Embora haja pos-
sibilidades imaginativas na construção de formas de textos de pesquisa, escritores enfrentam algumas dificuldades devido às particularidades do espaço tridimensional da pesquisa narrativa. Antes de voltarmos mais diretamente para as questões de forma, para os textos de pesquisa narrativa, queremos lembrar aos leitores que textos de pesquisa narrativa são, de fato, um grande improviso construído sobre múltiplas e fluidas fundações constituídas de formas ambíguas que podem soar mais ou menos claras em um ponto ou em outro.
Escritores e leitores de textos de pesquisa narrativa precisam ter certa tolerância para o desconforto que pode acompanhar a ambiguidade e o abandono que Dewey chamou de a busca de certezas (1929). Temos lutado com o como podemos transmitir as complexidades inerentes às considerações de forma, como as entendemos. Porém, encontramos muitas estruturas na literatura -
por exemplo, Bruner (1990) conhecimento
paradigmático e narrativo; Chatman (1990) três tipos de textos (narrati vo. descritivo e argumentativo); e Wolcott (1994) modos de transformar dados qualitativos (descrição, análise, e interpretação) - nenhum refletiu
nossa experiência que está envolvida em moldar textos de pesquisa narrativa. Temos buscado uma metáfora para ajudar o entendinmento de nossa concepção. Foi então que pensamos na metáfora da sopa. Esta metáfora é bastante significativa para iniciarmos nossas explorações da forma narrativa. Imagine por um momento uma fumegan-
te panela de sopa cheia de vários pedaços e partes de verduras, arroz,
e
macarrão, temperada com ervas, sal e pimenta. Imagine outra sopa com poucos ingredientes, diferentes porçoes, pedaços dierentes e temperada
de outra forma. Quando começamos a brincar com a metáfora da sopa, percebemos que como as sopas, poderiam haver diferentes ingredientes
Pesquisa narrativa
203
em nossa caçarola narrativa. Partes do nosso texto de pesquisa podem Ser compostas de ricas descrições de pessoas, lugares e coisas; outras partes podem ser compostas de argumentos cuidadosamente construídos que advogam por certa compreensão das relaçoes entre pessoas, lugares, e coisas; e ainda, outras podem ser narrativas valiosas sobre pessoas situ-
adas em lugares, tempo, cena e enredo. Para nós, tudo isso pode ser tex-
to narrativo. Trabalhando com os três tipos de textos de Chatman, todos os tipos - argumentativos descritivos e narrativos - estão presentes. No
entanto, dependendo da experiência de campo sendo representada e de-
pendendo do pesquisador, elas estão presentes em diferentes proporções. Não podemos, por exemplo, chamar um texto de pesquisa narrativa, se ele deixar de fora a descrição e a narrativa e usar somente argumentos. Nem
podemos chamar um texto de pesquisa narrativa se ele é uma narrativa pura sem descrição e argumento. A metáfora da sopa oferece outra característica complexa sobre os textos narrativos. Algumas vezes o recipiente em que a sopa é colocada é claramente definido. Por exemplo, a forma do recipiente pode parecer óbvia. Talvez estejamos escrevendo uma tese em um departamento da universidade onde a forma é especificada. Ou talvez estejamos escrevendo um texto narrativo para um periódico, que exige que o texto tenha vinte e cinco
páginas ou menos. O recipiente estabelece a forma, e nós trabalhamos dentro daquela forma para escrever nosso texto de pesquisa narrativa. Parte da
história de abertura desta seção, sobre a discussão de Bev e Michael, tratava das incertezas e da importância de identificar o recipiente. Outra maneira de refletir a respeito do recipiente é pensar na expe riência de campo e de como esta experiência molda a forma. No trabalho de Carol Dietrich, "Narrativas de uma professora-enfermeira: o início de uma familia interligada, uma filha, uma professora e uma amiga - uma
fonte pessoal de conhecimento prático" (1992), está claro que ela esta
va trabalhando em memorial. Há certas formas literárias que formam ou moldam a escrita de memoriais de alguma maneira. Em outros casos, tais
como aquele de Joy Ruth Mickelson, "nossos filhos são rotulados de comportamento desordenado: aqui estão nossas histórias" (1995), o tipo de recipiente é menos claro. Em seu estudo com mäes de garotos rotulados como "crianças com dificuldade de comportamento," seu trabalho com mães
exigiu
um
formato
representacional interativo
e
responsivo
e,
con
siderando os requisitos do seu trabalho, ela usou cartas enviadas para as måes como seu formato de texto narrativo.
204
D.
Jean Clandinin |F. Michael Connely
Nossa sopa metatórica tornou-se um modo de pensarmos sobre a
complexidade da forma nos textos de pesquisa narrativa. Embora tenha mos começado com as ideias categóricas de Chatman (1990) de tipos de textos a serviço de outro, imaginamos que o sistema de categorias, tais
como os de Chatman não funcionam bem coma composição de textos de pesquisa narrativa. Porque estamos certos em pensar que as tensões associadas à composiç o
de textos, na fronteira da pesquisa narrativa, estão
em cada um de nós, é que imaginamos que não há algo como um texto
puro, que seja inexoravelmentee exclusivamente narrativo do começo até o fim. Todos os escritores, a cada vez que escrevem, trabalham, em meio a tensões, e compõem um texto que sempre pode ser de outra forma, sem-
pre pode ser melhorado. Um texto que é inevitavelmente um passo, um texto provisório, dos quais outras questões, ainda com outros textos de campo podem ser imaginadas e buscadas. Nos conscientizamos disso à medida que trabalhamos duas teses à nossa maneira, ambas com textos de pesquisa bem dentro da perspectiva da pesquisa narrativa. Lidamos coma tese "Paisagens do Conhecimento Professional: três chinesas em processo de formaçãoe aculturação na China e Canadd" de Ming Fang He e, em seguida, a segunda tese "Histórias de Prática de Professor: Explorando Paisagens do Conhecimento Prático Professional", de Chuck Rose.
Forma narrativa na tese de Ming Fang He He escreveu uma tese narrativa desenhando sobre um campo de
trabalho com três participantes, Shiao, We e Ming He. Seus textos de cam po consistiam, primariamente, de histórias e relatos de vida na Chinae no Canadá, apresentados através de conversas gravadas entre as três mu Iheres. A tese começa com um Prólogo, no qual ela inicia com uma história situada no espaço tridimensional da pesquisa narrativa. Esta história
volta ao seu passado e de suas duas participantes e apontam parao questionamento sobre quem elas sãoe sobre quem elas estäão se tornando, em
sua nova terra. A pesquisadora olha introspectivamente para suas razöes pessoais que a levaram a este estudo e extrospectivamente para o significado social do seu trabalho. Ela pinta paisagens da China e do Canadá e
desse entremeio onde imagina morar. Nas suas cinco páginas do prólogo, ela escreveo que Welty (1979) pode chamar de "blocos de tempo" e "blocos de enredo" (p. 164). Estes blocos são ambos, recipientes e transporta-
Pesquisa narrativa
205
vida dores de histórias, expressões que "falam da O prólogo dá ao p. 164) com um início e um fim.
em movimento"
capítulo
um, "a
( Welty, história
de como iniciamos nossa busca por nossa paisagem. Ainda no título, o dentro do texto pelos releitor pode ver c o m o a estrutura foi introduzida feridos blocos. Entendemos que as participantes estão na transição, que há uma busca, que está colocada na forma de uma história e que estamos
colocados em um lugar próximo ao que ela nomeou, para o propósito da
narrativa, de início. Este capítulo inicia com a história de um jantar festivo e lembranças da vida na China emergem na forma de uma conversa entre
as três participantes. Esta tese está divida em capítulos que narram a vida dessas três
mulheres. Um capítulo inicial narra a infância delas antes da revolução cultural, outro relata suas vidas como imigrantes canadenses e outro, a
vida académica durante os estudos de pós-graduação. A tese está escrita em uma linguagem metafórica e possui pausas e lacunas que fazemo histórico das três experiências e que leva o leitor a imaginar como esse relato será finalizado. As três mulheres são retratadas como vivendo no meio
do caminho das paisagens culturais; suas vidas preenchidas por tensões e novos questionamentos sobre suas identidades, ao longo da conclusão
de suas histórias, no desenvolvimento e conclusão da dissertação. A tese
é concluída com um capítulo mais convencional sobre a "aprendizagem resultante do estudo realizado." No capítulo um Ming He usa histórias contadas através de conversas para começar a preencher os elementos de ligação do enredo que ela
introduziu
no
balho está
posicionado
prólogo.
Ela também inclui na
descrição sobre como seu tra literatura sobre aculturação e culturação. Ela a
sinteticamente esboça o argumento para a tese quando escreve, "este estudo proporcionará uma oportunidade para obter maiores esclarecimentos sobre a exploração da inferface entre diferentes culturas e grupos étnicos"
(p. 20-21). No
capítulo dois, "Procurando um Caminho para Narrativizar Paisagem: Metodologia e Fundamentação 1Teórica", ela apresenta uma
da pessoal, contada em ordem cronológica, sobre e dar sentido à literatura relacionada à
pesquisa e
a
jorna
sua
tentativa de localizar
entendia essas leiintroduz os leitores na história de seu encontro com suas participantes e leva-nos para seu canmpo de colaborativa. pesquisa Aqui, também, ela começa a narrar questões éticas nas envolvidas histórias compartilhadas ela e turas
realizadas.
Ao
longo
do
capitulo, Ming
por
206D. Jean Clandinin | F. Michael Connely
como
He
por
suas
participantes.
O
capitulo très, "Narrativizando a paisagem,
na
qual fonmos trazitO
ao mundo: Os cointos de Ming, Shiao e Wei", conta as histórias da escola chinesa de cada
uma
das três
participantes.
Estas narrativas
biográficas es
tão repletas de descrições detalhadas da vida social e da escola da China. Muitos dos detalhes são apresentados em forma de histórias especificas
em um ponto particular no tempo. Em um breve parágrafo no final do capítulo très, ela nos apresenta qual parte de seus argumentos é explorada e revelada por meio dessas narrativas. Ela concui que seu pressuposto - de que as trës mulheres tinham uma primeira cultura Chinesa - é posto em questão. O capitulo quatro, "Contrapondo histórias de Ensinar n0 entremeio de duas Paisagens Culturais", segue o mesmo formato do capítulo três; isto é, as narrativas biográficas individuais com ricos detalhes descritivose
histórias especificas transmitem grande parte dos detalhes. Este capítulo contém uma introdução que realça o contexto cultural no qual as histó-
rias ocorrem. O contexto está implícito no decorrer de todo o texto, mas
ocasionalmente, como nessa introdução, o mesmo é mais explicitamente relatado. No interlúdio que conclui o 'capítulo quatro, Ming He retorna à explicação de como as histórias se conectam com a sua discussão em desenvolvimento sobre a questão da identidade. No capítulo cinco, "Histórias de Forasteiros' em uma Paisagem de Exílio', as vidas dos participantes no Canadá são descritas, mas, neste momento, o formato da tese muda. A autora volta ao formato conversacional, aproximando-se dos textos de campo. Ming He vê as histórias e as relaciona com suas interpretações. Mais do que nos capítulos anteriores, Ming He está construindo um argumento - equilibrando as passagens interpretati-
vas e argumentativas com as narrativas.
No capítulo seis, "Histórias de aprender a fazer pesquisa educacional em Paisagens Estrangeiras", Ming He liga a ideia de aprender a fazer pesquisa com as histórias do início de suas transformações na infância. Há uma continuidade narrativa estabelecida entre o capítulo seis e os capítulos anteriores. Novamente, isso é construído principalmente como uma jornada baseada nas histórias que conectam fragmentos de conversas. Em alguns
lugares,
usando
unm
formato de texto-dividido, ela continua
a
construir
sua
discussão geral paralelamente às histórias e fragmentos de conversas. No capítulo sete, "Histórias de Aprender a Ser um Fluido Estudante
e Pesquisador Narrativo emn uma Paisagem Estrangeira", Ming He continua a jornada iniciada nos capituloS anteriores. Mais uma vez, ela usa
Pesquisa narrativa
207
fragmentos de conversas interconectados com seções de discussäo, reaçoes pessoais e paginas de textos divididas em colunas. Ela finaliza este
capítulo usando uma metáfora da viagem para ligar as histórias das tres
mulheres, conforme foram contadas nos diversos capítulos ao longo da dissertação. A autora adota a concepção de fronteiras para relatar as di-
ferentes partes da viagem marcadas em cada capítulo. Esta parte final resume sua discussão sobre formação identitária considerando o vivenciar de
novas
paisagens.
Em seu último capítulo, "Identidades Construfdas Por meio das
Mudanças Culturais, Educacionais e Linguísticas: Identidades na Parada'" ela faz algo um tanto diferente do que fez em todo o restante da tese. Conforme
ela resume o que chama de resultados da tese, é quase como se a forma
recipiente de sua tese tivesse assumido o controle e atribuísse forma ao que a autora
coloca
sopa metafórica. A tensão entre as duas formas aparece na linguagem, em que ela usa a noção de parada para sustentar a ideia
de
uma
em sua
jornada, mas apresenta a maior parte da escrita em termos de gene-
ralizações e insights, as quais ela denomina "resultados". Nas primeiras páginas do Epílogo, "Uma Pesquisa para Toda a Vida
fluindo para Sempre Entre a China e o Canadá, Ming He retorna a um formato mais narrativo e historiado. Ela, então, descreve como as histórias
das três mulheres apontam para o futuro, e descreve as paisagens em
transformação no Canadá e na China.
Formas narrativas Rose escreveu
dissertação de Rose
na
dissertação em pesquisa narrativa valendo-se dos textos de campo com três participantes, Sara, Clark e ele mesmo. Seus de textos campo consistiram de notas de campo da escola e da participação na sala de aula, apontamentos em diários dos participantes, conversas e
uma
histórias pessoais contadas de
memória.
O capítulo um, "Introdução", é autobiográfico e introduz o seu questionamento de pesquisa e os termos principais de seu trabalho. Ele situa
cuidadosamente o estudo no espaço tridimensional voltando
da
pesquisa narrativa,
tempo olhando para a sua infância em escolas situadas bem próximas de onde viveu suas histórias de ensino e de direção escolar. O no
e
autor começa com uma história do a uma
208
escola
D.
como
diretor,
Jean Clandinin
depois
passado
recente
quando
de sair de
licença
enm seu ano
| E. Michael Connely
ele retornou
sabático;
então, ele volta ainda mais ser Criança na escola, de ser
no
tenmpo,
professor na escola e
direção da escola. Ele move-se adiante usando a história de abertura, que tratava
na
histórias
para no
de
autobiográficas
do início de
tempo
e
sua
termina
de
atuação
capítulo
o
como os
professores responderam de modo diferentes a um aluno que usava boné na sua escola mais recente, como uma metafora para caracterizar o campo como ele o vë e para construir sua discussão. Ele desenha um contraste nítido entre os professores que eram tolerantes com os alunos que escolhiam usar bonés e aqueles que nä0 0 eram, e o dilema que ele, como diretor, sentiu a respeito do que fazer com o garoto que usava boné. As histórias conflitantes em torno deste incidente particular retornam mais uma vez e
outras
vezes conforme ele tenta compreender a paisagem onde trabalhou como diretor. Ele volta à história do boné ao longo da Ele
dissertação.
vamente, para as suas reações pessoais para fazer mente para a relevância social do seu trabalho. A
dissertação
recem com o
que estamos
"Introdução", los
quatro,
contam
as
está dividida
e
seis
histórias das
nos
capítulos
acostumados
"Revisão Teórica"
cinco
em
e
a ver
este
experièncias
em
meio
de Rose
introspecti
trabalho,
e
externa-
que, à primeira vista, paem trabalhos acadmicos
"Metodologia'".
colocam
olha
Entretanto,
a uma com
série de
Clark
e
os
capítu-
cartas que
Sara,
seus
dois
participantes. Todos os três são retratados como moldados e moldando as paisagens de conhecimento profissional. A dissertação é concluida com Rose recontando suas próprias histórias de vida como diretor. No capítulo dois, "Revisão da Literatura" Rose escreve uma análise
descritiva das áreas de conhecimento do professor e formação de professores. Ele finaliza o capítulo ligando a revisão da literatura à história do boné e ao seu campo de pesquisa, apresentando um dos seus participantes, Clark. Rose nos conta que a literatura lhe ofereceu uma conceituação "que parece servir a uma linguagem da prática que é relevante" (1990, p. 49). Conforme escreve o capítulo, Rose posiciona seu estudo na conversa acadêmica sobre formação de professores, uma conversa estruturada pelas considerações sobre o conhecimento do professor No capítulo três, "Metodologia, ele estrutura cuidadosamente uma discussão para dar suporte à sua escolha pela pesquisa narrativa como seu método. Embora o capítulo siga, prioritariamente, o formato da revisão da literatura (ou seja, descrevendo e construindo uma argumentaçao), há duas seções narrativas em que Rose apresenta seus participantes
edescreve
a sua
negociação de
entrada no campo.
Pesquisanarrativa 209
No capítulo quatro, "Narrativa l', Rose apresenta uma narrativa das
experiências passadas da infância inicial, as experiências escolares e as experiências de ensino de Clark. Esta narrativa tende a ser apresentada cronologicamente. Entretanto, a cronologia é dividida em seções marcadas com titulos que se referem a interpretações teóricas conectadas à sua discussão. Por exemplo, uma seção, que narra a primeira experiência de ensino de Clark, é intitulada "Começando a ensinar: mais um contexto de
conhecimento profissional". Todo o capítulo é apresentado na forma de Essa carta é composta de histórias, mentos de conversas e notas de campo, todos entremeados por comenuma carta
frag
endereçada a Clark.
tários interpretativos. As cartas não são, exatamente, o que normalmente concebemos como cartas. Rose se refere a elas como "construções mútuas" (p. 208), indicando que as narrativas são relatos construídos colabora-
tivamente O usando ta
entre ele
o mesmo no seu
interpretação a
dois
participantes.
capítulo cinco, "Narrativa l"
indica,
ele vê
e seus
da
como uma
responder.
formato
textos de
e
parágrafo
de
uma
segunda
carta para
Clark,
campo similares. Esta
fechamento,
prática de Clark. série de
é
Rose
que
a
segunda carpretende ser uma
carta
seção final sobre o que "problemas e dilemas" (p. 140) e convida Clark
Neste momento,
escreve a
percebemos o
sentido de
mento entre Rose e Clark.
relação
em
anda-
No
capítulo seis, "Narrativa IIr, Rose escreve uma carta à sua segunda participante, Sara. Os capítulos quatro, cinco e seis começam com uma saudação, por exemplo, "Querida Sara". Rose começa a carta com um relato
de
cronológico do seu trabalho em conjunto e, então, esboça uma série entrelaçamentos, tais como "Comunidade como Família: Boas-vindas,
Aceitação, Cuidado" (p. 150). Cada fio narrativo é desenvolvido usando tanto narrativas quanto descrições para ilustrá-lo. Rose combina termos como paisagem de conhecimento profissional, lugar
gar
fora-de-sala-de-aula. Ele conclui a
carta
e o
a responder.
em-sala-de-aula, e lucapítulo convidando Sara
capítulo sete, "Dando forma aos Contextos de Ensino", senvolve um dos componentes principais de sua discussão, de No
texto
molda
o
conhecimento
do
professor.
Rose de-
con capítulo traz histórias dos que
Este
o
capítulos quatro, cinco e seis como exemplos de vários
pontose sub-dis cussões que deseja fazer. O capitulo é de referências e lembretes repleto de histórias tão vividamente presentes nas riores. Suas
210
D.
påginas
sao
repletas
cartas dos três
de
pessoas, eventos
Jean Clandinin | F. Michael Connely
e
capítulos ante-
resumos de suas
histórias, e
não
que Rose está
sensação nos
com
fundamentação teórica. Essa é,ainda, uma discussão
querendo.
de que Clark
O
leitor de
sua
Sara
dissertação
fica
com uma
forte
foram, realmente, moldados pelos contextos iniciaram sua quais docência. No capitulo oito, "Possibilidade Assustadora", Rose, em certo sentie
do, faz de tudo. 0 capítulo é uma mistura cuidadosa que nos leva de volta aos questionamentos e dilemas de Rose como diretor. Ele reflete sobre seu trabalho com Clark e Sara e como deveria ser, no futuro, como um
diretor. Ele faz isso sem referências à literatura, mas com referências a
categorias narrativas abstratas, como histórias de fachada e paisagens, que ele usa para ajudar a imaginar as vidas recobradas nos capítulos
prévios. Porque Rose narra uma discussão geral sobre conhecimento de professor entrelaçada a termos teóricose ligada a personagens e eventos da tese, este capítulo tem um tom reflexivo. Ele termina o capítulo retornando tanto a relevåncia pessoal quanto a social de seu trabalho,
lembrando a nós, como leitores, que as pesquisas narrativas precisam atender esses dois aspectos.
Procurando a forma narrativa A história da conversa sobre a forma narrativa com a qual começamos esta seção tem dentro de si o coração do que fazemos e do que pedimos que façam aqueles com quem trabalhamos, como pesquisadores
narrativos, no caminho da composiçao dos textos de pesquisa. Na próxima
seção, esboçamos modos de trabalhar que consideramos úteis na comp0 sição dos textos de pesquisa.
Lendo outras teses
Quer leiamos as
e
livros narrativos
teses de He
(1998)
ou
de Rose
(1997), ou os tex
tos de pesquisa narrativos de Vivian Paley (1989, 1990), como lemos, encorajamos, ainda tros trabalhos.
imaginar os
os
pesquisadores
Encorajamos
nossos textos
narrativos
iniciantes
a
lerem
ou-
isto por duas razões. Uma delas é tentar
de campo
e nossos
questionamentos
e
encai-
Criou. Este processo imaginativo forma que outro pesquisador narrativa, como um passo inicial de leitura do texto de outra pesquisa
xá-los
na
Pesquisanarrativa 211
para conpormos a
possibilidade,
los
próprio texto,
inosso
é
um
modo de rompermos
um
enredos das pesquisas formalista
modo de
nos
abrirmos
para
espaço limitado criado pereducionista no meio das quais
e
o
aprendemos a viver. Conforme lemos textos de pesquisa de mos as possibilidades de romper as fronteiras entre estes outros, veos modos paradigmas e narrativos de Outra,
tivamente para
o
pensar. talvez mais importante, razão é reconstruir de processo pesquisa de outro autor como e
trabalharmos
um
imaginaprelúdio
próprio processo de pesquisa. Lendo e reconstruindo, imaginativamente, a experiência de pesquisa do outro nos permite ver possibilidades. Em nosso próprio trabalho com pesquisadores narrativos iniciantes, normalmente, pedimos a eles que imaginem uma tese completa como um nosso
insider, como se esta fosse sua própria pesquisa. Pedimos que se coloquem na situação de pesquisa do escritor da tese e tentem imaginar o processo, os dilemas, as as escolhas fronteiras, relacionadas aos textos de e assim Nos cursos que das tarefas mais
ministramos
campo,
por
diante.
em nossas
respectivas importantes é que os alunos escolham instituições, uma dissertação do seu interesse e a apresentem dissertação em aula. Pedimos eles não se que preocupem tanto em apresentar o e as problema mas sim, em descobertas, reconstruir o processo de da construção pesquisa utilizado pelo autor. Pedimos que leianm o projeto de pesquisa e que estabeleçam ligações entre este e a tese completa. Pedimos, sempre que possível, conversarem com o autor da tese e para uma
pedirem pessoa que faça um relato experiência de seu ponto de vista e que conversem sobre sua vida acadêmica do início à conclusão da tese. Deste modo, tentamos tanto recons truir a experiência de pesquisa colocando-os no contexto da vida académica do jornada de Nosso objetivo à
da
pesquisador-autor.
tarefa não é conhecer as velmente úteis, possam tes
a se
estratégias,
embora aspectos emergir, mas sim, ajudar os
principal
com essa
específicos, possipesquisadores inician-
imaginarem vivenciando uma pesquisa narrativa.
Procurando uma metáfora Ao
longo dos
servamos que
as
anos
trabalhando
pessoas
com
frequentemente
pesquisadores narrativos, obusam uma
metáfora, ou várias metáforas, para ajudá-las pensarem sobre seu trabalho. Muitos textos de sido a
pesquisa tém 212
escritos usando metáforas
D. Jean Clandinin
| E Michael
Conely
por
exemplo,
retrato
nar-
rativo (Bowers, 1993), narrativa visual (Bach, 1997),
delta
(Hedges, 1994), jornada (He, 1998), além de outros, que têm usado metáforas como colagem, tela, manta, peregrinação, e crônica. Edel ([1959] 1984) escreve em forma de crônicas, retratos e romances como de formas texto. Mallon (1984) escreve sobre dores, apologistas, confessorese
o
rio
possíveis
cronistas, peregrinos, viajantes,
cria-
prisioneiros. Estes autores, entre outros, sugerem metaforas possíveis que podem ser úteis para o autor de textos de pesquisa narrativa. Os escritores
zê-lo
com um
devem
ao usar uma
metáfora precisam deliberadamente fapouco de cuidado. Estamos convencidos de que metáforas
proporcionar um tipo de efeito libertador para o escritor que busca uma forma, mas também há riscos. Lakoff e Johnson (1980) apontam que as metáforas deixam de funcionar em algum ponto em sua aplicação. As
vezes,
um
pesquisador narrativo pode selecionar uma metáfora e agarrar-
-se muito firmemente a ela, a fim de que o texto de pesquisa desenvolva um
sentido,
como se os textos
de campo estivessem sendo
pressionados
para dentro de uma forma artificial. Quando isto acontece, o resultado é que há menos, ao invés de mais sentido. Todavia, desde que se esteja consciente dos perigos possíveis, as metáforas podem ser úteis na criação da
forma narrativa.
Percebendo as preferências de leitura Prestar bastante atenção aos tipos de texto que lemos é também parte do processo de criação de uma forma narrativa que se encaixe às nossas pesquisas narrativas particulares. Tanto Michael quanto Jean lem
extensi-
vamente. Jean recorda todos os momentos quando, olhando a sua estante de livros, ela disse, "Eu sei que tenho o livro. Terminei de lé-lo há pouco tempo". Foi refletindo em momentos como estes que ela percebeu que muitos destes livros "perdidos" estavam nas suas estantes de casa. Ao perceber isto, ela compreendeu que não poderia, por muito tempo, separar seus materiais de leitura pessoais e profissionais. Quando alguém se engaja em uma pesquisa narrativa, ficções, como a do livro Caia de Joelhos de Ann Marie MacDouald (1996), que experimenta diferetes generos literarios como apontamentos de diários, diálogo e cartas, se tornam tanto leituras quanto materiais ura. zerosos que informam questões sobre a forma narrativa. Jean, quando lë os diários de May Sarton, não sabe mais se e por razoes pessoais ou profissio-
Pesquisa narrativa 213
nais. 0 Apelo às Histórias (1989) de Robert Cole, é uma leitura importante para
pesquisa narrativa ou para insights pessoais A confusäão de Jean em relação ao lugar onde guarda seus livros é
o sinal exterior de quão confuso é para ela, e para outros pesquisadores
narrativos, a distinção entre o pessoal e o profissional. A confusão entre
pessoal e profissional se torna ainda mais dificil quando compomos listas de leitura para alguns e sugerimos leituras possiveis para outros. Estar
alerta para todas as nossas preferências de leitura é algo que encorajamos que façam os pesquisadores narrativos à medida que se engajam no processo de composição dos textos de pesquisa, na pesquisa narrativa. Nós os encorajamos a observarem o que uma vez foi uma distinção sólida entre o pessoal e o profissional, entre fato e ficção, e assim por diante. Não somente a leitura extensiva de muitos diferentes tipos de texto, mas também a percepção dessa diferença podem nos ajudar, como pesquisadores narrativos, a experimentar novas formas narrativas possíveis. Alvarez
fala da importância de ler a cada manh, como parte de seu ritmo de escrita: Considero esse tempo de leitura matinal uma combinação de tempo de leitura por prazer, quando leio os traballhos e autores de que mais gosto0, e tempo de leitura "com os dedos", quando sintonizo minha própria voz à
musicalidade da língua inglesa como é tocada pelos melhores escritores. E por isso que evito gastar meu tempo de leitura matinal em revistas e livros de leitura rápida, manuais e jornais, dos quais eu gosto, mas todos eles usam a língua para transmitir informação, passatempo, autoajuda, fofoca, e em muitos casos, em nossa cultura consumista, para vender alguma coisa. Não é esteo refrão que quero ouvir. (Alvarez, 1998, p. 286).
Nós ecoamos o sentido de Alvarez da possibilidade do lugar da leitura de outros tipos de textos e da observação dos tipos de textos que lemos, como um prenúncio, e um acompanhamento para a composição do nosso próprio texto.
Experimentando a forma Ocasionalmente, estudantes que vem para a pesquisa narrativa
aparecem na porta de Jean, na metade de seus trabalhos de pesquisa Frequentemente, outro pesquisador, aluno, ou mesmo uma instituiço,
214
D.Jean Clandinin | E. Michael Connely
envia um aluno COm um pedido para que Jean o ajude a escrever sua pes-
quisa na forma narrativa. Isto se torna um desafio por diversas questoes, mas, para o nosso propósito aqui, a razão central é que, pesquisa narrativa, para nós, não é um algo a mais. Nós não começamos uma pesquisa narrativa nos estágios finais de uma pesquisa como se pudéssemos converter algum tipo de estudo em pesquisa narrativa. Isto não quer dizer que histórias não possam ser compostas de textos de campo não narrativos, mas para nós, tal texto de pesquisa, composto depois do fato da pesquisa, não são textos de pesquisa narrativa. Questöes de forma, para o pesquisador narrativo, estão presentes
desde o início da pesquisa. Mesmo enquanto nós contamos nossa própria história de pesquisadores antes de entrar no campo de histórias, há um senso de tentativa de enredo. Na medida em que nos engajamos com os participantes. vivemos e contamos histórias com eles, os cenários, em composição, são re-historiados, isto é, são revividos e recontados. Todos estes 'contar' e viver' prefiguram a forma narrativa do nosso texto
de pesquisa. Como pesquisadores, começamos a nos afastar do trabalho de campo intensivo com os participantes e começamos a ler, reler, e codificar nossos textos de campo, e à medida que continuamos a ler os textos de outros pesquisadores narrativos, podemos perceber novas possibili-
dades para o nosso recontar. Estas novas possibilidades fornecem ainda, novas maneiras de imaginar a forma narrativa. Encorajamos os pesquisadores narrativos iniciantes a verem eles mesmos como engajados em um
contínuo processo de pesquisa sobre a forma narrativa. Huber, Whelan, e Sweetland, cujos trabalhos foram abordados anteriormente neste capítulo, engajaram-se com o compor de muitas versões de textos narrativos antes mesmo de selecionar aquele que eles eventualmente criaram. Eles
iriam começar a compor parte de um texto, experimentá-lo com eles mesmos e com outros pesquisadores. E mesmo cheio de questionamentos, sobre se estavam funcionando para seus propósitos, para seus textos de campo e para eles mesmos, tentariam alguma coisa mais. Questões de audiencia, voz, e assinatura foram postas juntamente com questões de forma
enquanto eles se engajavanm na busca pela forma que fosse mais adequada. Quando vieram conversar com Jean a respeito dos textos que encontraram
ela mesma respondeu não tanto co
os comentarios sobre formas aceitas
e pré-estabelecida, mas com questoes situadas no espaço tridimensional
da pesquisa narrativa.
Pesquisa narrativa 215
Os feedbacks desempenham um papel central no processo de expe
rimentaçao com a forma. Encorajamos pescquisadores narrativos iniciantes a formarem grupos de estudo, nos quais o trabalho continuo é compartilhado e diversos feedbacks são oferecidos. Falanmos a respeito desses
grupos de apoio nos quais os pesquisadores narrativos têm a oportuni-
ade de compartilhar seus textos de pesquisa por diversas semanas ou
meses, durante o processo de composição de sentidos. Embora Alvarez não fale da importância de uma comunidade sustentada de colaboradores, também engajados no processo de escrita, ela ressalta que temos aprendi
do muito ao ler nosso trabalho em voz alta. "Na verdade, concluímos que, mesmo que um leitor-colaborador não nos ofereça feedbacks negativos, o processo de ter meu trabalho lido por alguém mais, acaba com a camada de 'amor que nos cega' na qual nosso trabalho esta envolvido. Comecei a ouvir o que escrevi pensando em como esse trabalho soaria para os ou tros. Esta tarefa nåo pode ser considerada ruim se de fato queremos nos tornar escritores que
escrevem
não apenas para nós
mesmos e
para
al
guns amigos tolerantes." (Alvarez, 1998, p. 289). Em nossa experiência, temos nosso material lido, as sugestões
dadas, as revisões realizadas, e então os textos são compartilhados novamente. Esse trabalho contínuo, sustentado pelas sugestões e opiniões
dos
leitores, membros do grupo de estudo, é mais efetivo quando todos es
tão engajados nessa tarefa de pesquisa. Como cada pesquisador luta com
questöes de composição de textos de pesquisa, eles compreendem, às ve zes de forma complexa, as dificuldades de compor esses textos. Esses grupos de apoio auxiliam o processo de experimentação contínua da forma.
exemplo,
das características mais difíceis da pesquisa narrativa, a ser representada nos textos de pesquisa, é a qualidade de Por
uma
(re) historiação da narrativa. Um documento escrito parece ficar parado; a narrativa parece acabada. Ela foi escrita, a vida dos personagens
construída, histórias sociais gravadas, e significados expressados para todos verem. Mesmo aqueles engajados na pesquisa narrativa sabem que o documento escrito, o texto de pesquisa, assim como a vida, é um contínuo desvelar-se, no qual a viso
narrativa de hoje são os eventos
cronológicos do amanhä. Pesquisadores narrativos sabem de antemão
que a tarefa de transmitir a sensação de que a narrativa está inacabada, que as histórias serão ditas e as vidas revividas de uma nova forma e provavelmente serão completadas de uma forma não to satisfatória, é sempre uma questäo de experimentação com a forma narrativa. Mesmo
216
D. Jean Clandinin | F. Michael Connely
quando os pesquisadores ficam satisfeitos com o resultado, eles precisam senmpre lembrar que os leitores podem congelar a narrativa, resul
tando no prejuízo da qualidade da vida re-historiada e destinada pelo es Em critor, que pode tornar-se fixa como um retrato impresso pelo leitor. grupos de estudo, o feedback de outros participantes são importantes para ajudar a sustentar a experimentação com a forma, a possibilidade de tentar compor um texto melhor.
enquanto
temos
Mantendo a ideia de trabalho em curso Como pesquisadores narrativos, compondo nossos textos de pesfronteiras. encontramos, de uma forma ou outra vivendo nas Alunos que escrevem teses na pesquisa reducionista frequentemente
quisa,
nos
completam
suas teses
capítulo
por
capítulo. Eles
escrevem o
capitulo
in-
trodutório, o capítulo de revisão da literatura, o capítulo da metodologia
e assim por diante, movendo-se, no processo de escrita da tese, capítulo por
orientador. capítulo é aprovado e controlado pelo a tese requisitado de capítulos é escrito e aprovado
Cada
capítulo.
o número está pronta para a defesa final. Frequentemente, não é assim para os pes-
Quando
quisadores
narrativos
quando
confrontados com a escrita
de
seus textos
ao se trabalhar nas fronteiras. de pesquisa. Esta é outra tensão que surge narrativa esperam desenFrequentemente, alunos engajados à pesquisa u m processo similar. Escrever textos volver os seus escritos por meio de é um processo muito diferente. Em de pesquisa, na pesquisa narrativa, dizemos que há uma espécie de tentativa de descrever o processo, nossa
um capítulo, compartilhamos vir. Na pesquisa narrativa, compomos fazemos revisões, e trabalhamos com nosso grupo, recebemos sugestões,
ir
e
sentirmos que nos m o v e o s no texto tão proatravés desse processo até Depois, o deixamos de lado e iniciamos ou-
fundamente quanto pudemos. tro
capítulo. Seguimos
também. Depois, lemos
um os
o colocamos de lado processo similar at que dois, à procura de um sentido estético do con-
começamos a revisar ambos os capítujunto desses capítulos. Lendo-os ao outro, buscando um sentido que poderá los, explorando um em relaço narrativo, enfim, com um sentido de pletorná-lo parecido com um todo
nitude estética. Esse é mais o processo em que nos engajamos
um tipo
revisando, colocando de lado. vir, recebendo sugestoes, seguido um processo similar, conescrevendo outro capítulo ou seçao,
de escrita
e
ir
e
Pesquisa narativa 217
frontando todo,
um
capítulo com outro até que, finalmente, haja
completo,
como uma
peça, que possa
se
sustentar, pelo
momento, sozinha.
audiencia
A No cada
tes para
sentido do
menos nesse
composição de textos de pesquisa
capitulo
pesquisa
conversa,
e a
um
sua
oito escrevemos sobre a importäncia de posicionar narrativa dentro de um diálogo acadêmico contínuo. Esta
substância,
e suas
regras de
aceitabilidade são importan
forma. Nossa discussão sobre os limites das maneiras de pensar formalista e reducionista deixam claro que a forma de um texto de pesquisa é moldada pelas diferentes maneiras de pensar daqueles queo lêem. Frequentemente, as questöes de limites ou fronteiras, referem-seà consciência e aceitabilidade de outras formas de pesqisa dentro de um a
subcampo particular ou ainda, talvez, da universidade ou do lugar ao
qual
pertencemos. Assim como os escritores pensam em seu público com0 uma fonte de forma narrativa, eles também precisam pensar a respeito da forde
ma
seus
artigosa serem apresentados nas conferências das quais parti-
cipam, para um grupo ou para uma área em particular. Eles precisam estar conscientes de que alguns periódicos em particular, exigem uma forma de arranjo para publicação de artigos aceitos. Precisam, também, considerar os livros publicados na área e pesquisar as formas utilizadas nesses livros. Claro que não estamos na
construção
de
seus
sugerindo que as pessoas deixem de ser criativas próprios textos de pesquisa. Se quisermos que nos
trabalho seja aceito e tenha influência, precisamos moldar nossos tex tos de forma que eles tenham uma chance para romper as fronteiras, mas so
não
218
forçá-las
para além da crença de
D. Jean Clandinin | E.
Michael
nosso
Connely
público.
CAPITULO 10
Preocupações que persistem em relação à pesquisa narrativa
este capítulo, discutimos as preocupações que são en-
frentadas por pesquisadores quando se preparam para a entrada no campo de pesquisa. Suas preocupações se mantèm ao longo da composição e
compartilhamento dos textos de campo. Essas são preocupações que se ajustam ao longo do processo de pesquisa narrativa vivido e por isso as trouxemos para este capítulo com o objetivo de discuti-las em termos de todas as fases de uma investigação. Assim, damos aqui uma ideia de como essas preocupações são vivenciadas ao longo da pesquisa quando nos movermos do campo para os textos de campo e depois para o texto de pesquisa, acenando nosso percurso prospectivo e retrospectivo, introspectivo e
extrospectivo, sempre permanecendo situado em determinado contexto.
Introdução Nosso foco neste capítulo é levantar e discutir questöes. Mas, ne nhuma delas tem respostas definitivas. Nós levantamos as questões que são como preocupações com as quais os pesquisadores narrativoss preciTraduzido por: Dilma Maria de Mello (1LEEL, NEC
UFU)
Pesquisa narrativa 219
ao Sam estar atentos e refletirem
longo de
uma
pesquisa.
Essas preocupa-
provisoriamente resolvidas ocorre, são çoes, persistindo como em geral apropriadas para u m a determino interim de uma série de considerações no tempo. em determinados pontos nada
investigação
As preocupações discutidas toes
parágrafos seguintes são ques-
nos
de éticas, questões de manutenção
anonimato
(de participantes
autoria e responsabilidade pesquisadores), questões de des relacionais, questões de como somos historiados como pesquisa de
pesquisa
e
sobre e distinção entre fato e ficção, questões durante o processo investigativo. possíveis riscos, perigos e abusos
dores, questõðes sobre OS
Finalmente,
damos
a
uma
olhada
pesquisa dade (wakefulness). importância para
a
em um
narrativa
ponto que para nós é o de maior a manutenção da despertabili-
-
Ética Assuntos éticos precisam ser narrados ao longo de todo o processo de pesquisa narrativa. Não se pode lidar com eles de uma vez por todas, como pode parecer acontece, quando formulários de análises éticas são preenchidos e a aprovação do comitê de ética da universidade é dada para nossas pesquisas. Questões éticas mudam e mudam assim como mudamos ao desenvolver nossa pesquisa. Essas questöes nunca estão longe do ámago de nossas pesquisas, não importa em que momento estejamos no processo de investigação. Em algumas universidades, e certamente em outras, antes de começar a pesquisa precisamos obter aprovação do comitë de ética para nossa
pesquisa. De muitas formas, este processo de obtenção de aprovação ética para nosso projeto ocorre antes de iniciarmos a negociar nossa pesquisa e isso vai de encontro ao processo de negociação relacional que é parte
da pesquisa narrativa. No entanto, como um requisito institucional, a ob tenção dessa aprovação é necessária. Isso põe pesquisadores narrativos presos a um dilema. Eles não podem abordar seus participantes até que
aprovação do comité de ética seja garantida. Se eles abordam os parti cipantes primeiro, quebram regras institucionais. Se abordanm os particia
pantes já com a aprovação do comitê de Etica, então alguns aspectos da
pesquisa não são mais passiveis de serem negociados, como desejado no contexto de pesquisa narrativa. Além disso, iniciar as negociações com o
220D. Jean Clandinin | F. Michael Connely
112rticipante tendo um conjunto de formulários já aprovados e pedidos dle
asinaturas é um início proibido nesse tipo de pesquisa.
Schroeder e Webb (1997), dois doutorandos, escreveranm sobre asS
contradições de ter que delinear a pesquisa claranmente e em detalhes an-
tes de nenm mesimo estabelecer relações preliminares com os participan-
tes. Eles levantam vários pontos preocupantes sobre o processo mandatório de análise do comitè de ética. O mais relevante é a interpretaçao do
termo de consentimento. Os autores dizem: A expectativa da universidade é de que os participantes, que assina o con-
sentimento de pesquisa no início do estudo, sejam completamente infor mados sobre o que consentiram o que implica que o projeto de pesquisa
tenha sido minimamente explicado antes do início do estudo. A realidade da pesquisa colaborativa com participantes, no entanto, é que a mesma
tende a mudar ao longo de seu desenvolvimento. 0 papel dos participantes pode mudar durante o estudo e isso inclui tornar-se um pesquisador, um
interpretador e mesmo um co-autor do relatório final de pesquisa. Tais papéis podem não ter sido antecipados quando o pesquisador fez seu contato
inicial para solicitar sua participação no estudo. (p.239-240). Ao refletirmos sobre nosso próprio trabalho nas escolas, somos obtido o consentimento de todas as pessoas com quem entramos em contato. O que significa obter consen
questionados sobre
como
podemos
ter
timento livre e esclarecido em um cenário institucional? O que o consentimento livre e esclarecido significa nesses cenários? Quem tem a autoridade para oferecer esses consentimentos? E uma pessoa, como o diretor ouo
professor, autorizado a dar consentimento por outros? Nós pesquisadores
precisamos de
consentimento de todas as pessoas
com
quem entrarmos
em contato? Há, claro, o consentimento institucional, como é dado pelo
corpo diretor de uma escola e de um hospital, por exemplo. Mas, esse con sentimento não constitui uma resposta para as questöes postas.
Pensando sobre autorizações éticas, como visto no guia de ética universidades, venmos que esses guias, embora para seres humanos das técnicos, detalhados e legalistas, não nos permitem considerar questões
de relacionamento, as quais, na narrativa, so
o centro de todo esse pro-
cesso de pesquisa. Em algum outro momento, escrevemos que precisamos termos de assuntos relacionais: pensar sobre a ética em
"no dia
a
dia da
vida, a ideia de amizade inmplica um compartilhar, uma interpenetração
Pesquisa narrativa. 221
da esfera de experiéncias de duas ou mais pessoas. Um mero contato é coleguismo e não amizade. O mesmo pode ser dito para a pescquisa colaborativa, a qual requer um relacionamento próximo como Ocorre em umarelação de amizade. Relacionamentos são unidos, como diz Mclntyre, pelas
nidades narrativas de nossas vidas." (Clancdinin; Connelly, 1988, p.281). Compreender autorizações éticas para o termo de consentimento Ihvre e esclarecido, do ponto de vista relacional, nos da uma outra forma de
pensar sobre nossas questoes. Na perspectiva legalista, as questões sobre 0 TCLE sao insolúveis e provocaria, em um estudo de qualquer nível de
complexidade, uma paralisação. Já em uma perspectiva do relacionamento, os pesquisadores são levados aos seus próprios recursos éticos. Para que a pesquisa ocorra, os pesquisadores narrativos ficam inevitavelmente
encrencados em relação ao legalismo do processo de aprovação de seus termos de consentimento e de seus projetos. Mas, do ponto de vista das
relações, eles precisam considerar suas responsabilidades como pesquisadores e para com seus participantes. Da mesma forma que consultamos nossas consciências sobre as responsabilidades que temos em uma
relação de amizade, precisamos consultar nossa consciència sobre nossa
responsabilidade como pesquisadores narrativos em uma relação de participação no processo de pesquisa. Essas questões de relações éticas começaram a se tornar parte de
investigação
nossa
das histórias
a
narrativa assim que ouvimos e construímos sentido nós contadas, antes de nossa primeira reunião na Escola da
Rua Baía. Mas também começaram muito antes, como notanmos, quando no estávanmos já entremear de vivência de nossas histórias. Por exemplo,
observamos no capítulo cinco, já nos tinham relatado histórias sobre ambos, escola e seu diretor, Phil, antes mesmo de termos chegado a es cola. Essa rede de histórias nos levou a essa e a tambéém instituição como
lecer
um
contexto de
estabe
negociações sobre nossas relações.
escola com um tipo de contexto neutro e livre de valores Tínhamos uma agenda de pesquisa a qual achávamos
Não entramos ou
na
pré-conceitos.
poderia se encaixar
relatos que haviamos ouvido sobre aquela escola. A negociação de questões éticas também
com os
termos mesma,
começou muito antes de inserido na escola. Por exemplo, as histórias de Jean, sobre si falam de uma ética comunitária, nascida e
nos
desenvolvida
em uma
comunidade rural isolada nos anos que seguiram a segunda guerra dial, uma comunidade, onde vizinhos aprendiam a um dos de forma que
mun-
outro depender conseguissem sobreviver, na qual se tinha sempre um clima
222 D . Jean Clandinin | F. Michael
Connely
muito tenso.
Ao
narrarmos as estar alertas em
questöes éticas em uma pesquisa, entao, relação às questões que emergem de nossas de experiência como pesquisadores. Laie (1993) diz: nossa vida, os
Drecisamos Dróprias histórias "Os eventos
em
espaços
em
que
que conhecemoS continuam a fazer parte de Nossa vida é um longo romance e ao
as
percebemos que do
as
nunca
já estivemos
e
pessohistórias de vida. metade de nosso livro, as
nossas
chegarmos a
escaparemos de nossas primeiras páginas, quana vida, quando o mundo se torna um
luzes foram acessas para toda
espaço de intimidade e todos seus habitantes são conhecidos por seus nomes. Todos estão
na
dança
nhar. Todos podem retornar a
qualquer
e
têm
suas
mãos
estampadas
nesse
cami-
nossas vidas sem pedir licença, sem avisoe pretendido" (p.43). histórias de Michael, no capítulo quatro, sugerem, sua pria
momento
Como
as
meira infäncia inundou seu relacionamento com
Ming Fang He e
sua
pesqui
sa sobre mulheres chinesas em transição. Embora a história, como contada, não explore o impacto das "cruciais primeiras páginas" de Michael sobre
sua relação com Ming Fang e entre ela e suas participantes, imaginamoso como essas histórias propiciaram conversas, atitudese respostas diferentes em seu relacionamento e como isso pode ter afetado as questões éticas, nesse caso, em termos do relacionamento orientador-orientando. Mas, nossas narrativas institucionais também falam de ética, um
tipo de ética que nasceu do que chamamos, no prólogo, de narrativa do minante, na qual participantes são vistos como sujeitos necessitados de
proteção em um consentimento de pesquisa. A ética que emerge de nossa narrativa de experiências como pesquisadores e aquela que emerge da narrativa dominante via instituição estiveram sempre conosco desde que entramos no campo de pesquisa, na Escola a Rua Baía. Ao iniciarmos aquela primeira reunião na escola,
aquela primeira negociação pesquisa, logo Ciadas ser
nos
com nossos
pensadas
e
da sala de aula
sobre quem éramos
e o
que seríamos
naquela
serem negodemos conta das unidades narrativas a Questões sobre nosso papel precisavam
participantes.
ser posicionados no espaço conversadas. Estávamos para observadofora dela? Seríamos mais participantes que
ou
onde res? Se participantes fossemos,
e com
quem estaríanmos? Eramos nós
mulher, homem, amigos, estudantes universiprofessores, pesquisadores, diretor da escola? Quais dos ou amigos do tários, auxiliares do professor nós mesmos e começamos a imaginar para múltiplos possíveis cenários para falar aos n o s s o s participantes?
Pesquisa narrativa
223
Mais tarde, as preocupações éticas emergiram quando começamos o trabalho no campo e iniciamos nossa composição de textos de campo.
Sabíamos que nossa presença na escola tornaria dificil a negociação sobre confidencialidade e anonimato.Qual seria nossa resposta quando visitantes chegassem na escola, nos vissem, e perguntassem o que estávamos fazendo ali? Se nós, ou nossos participantes, dissessem que nós estávamos là como pesquisadores, o anonimato tornar-se-ia nebuloso. Se os partiCipantes de pesquisa permitissem que outras pessoas conhecessem nosso relacionamento de pesquisa, isso tornaria ainda mais problemática a
questão do anonimato. Eo que dizer de nossos textos de campo? Deveríamos usar pseudonimos ao escrevê-los? Ao conversarmos com nossos supervisores e outros membros do grupo deveríamos nos referir aos nossos participantes por seus pseudônimos? Quando nossos participantes pedissem para não registrarmos em nossos textos de campo certos eventos, con-
versas e documentos, nós, claro, não
o faríamos. Mas, esses eventos e
conversas nos influenciariam e poderiam nos levar a destacar ou atentar para outros eventos e diálogos futuros de forma mais profunda e de
diferentes maneiras. Mesmo quando respeitamos o pedido de nossos participantes, sabíamos que ao testemunhar um evento poderíamos ser influenciados. Havia outras
questões éticas
que começaram
a
emergir quando
escrevemos nossos textos de pesquisa. No capítulo oito, escrevemos so-
bre os sentimentos de dúvida e incerteza que tivemos quando demos os
textos de
pesquisa
para
a
leitura dos
participantes. Havia questões nisso, pois era nossa responsabilidade não feri-los. Ao compor nossos textos de campo, precisavamos ser cuidadosos em relação
cas mos
aos nossos
participantes de pesquisa, considerando
nosso
primeiro
en-
eles, certamente o encontro mais importante, no qual ficara estabelecido nosso comprometimento com o zelo ao compormos textos não causassem que rupturas nas histórias de vida que os sustentavam. contro
com
Mas, como pesquisadores, também precisávamos zelar pela nossa res-
ponsabilidade com um grupo maior de pessoas que seriam nossos futuros leitores, com nossos pares na academia e com o discurso acadêmico, além disso, nossos textos de pesquisa precisariam falar sobre o como havíamos vivido e contado nossas histórias naquuele campo particular de pesquisa.
224
D.
Jean Clandinin | E. Michael
Connely
Ética e anonimato Anonimato, uma das preocupações já levantada, é uma complexa e problemática questão ao longo de toda uma pesquisa. No entanto, como observamos, é o que devemos garantir, conforme o indicado no manual de
ética para seres humanos de nossas universidades. Em muitas pesquisas qualitativas intensas, e na pesquisa narrativa em particular, a questäo do anonimato surge e ressurge. Como dissemos, mesmo quando garantimos
anonimato, não parece de todo claro que ele é possível de alguma forma significativa. Quando estamos no campo, visitantes e demais pessoas sabem que estamos lácom interessesde longo prazo naquele espaço em par ticular. Mesmo quando tentamos disfarçar o que estamos fazendo, outras pessoas podem dizer que estamos lá como pesquisadores. Nossos partici-
pantes podem dizer quem somos e o que estamos fazendo. Por exemplo, quando trabalhamos na escola da Rua Baía, Phil, o diretor, anunciou com
muito orgulho que éramos pesquisadores residentes e que estava ansioso por dizer a todos os visitantes e outros que ele era participante em nossa
pesquisa. Stephanie, por outro lado, estava relutante de que os administradores e consultores de seu quadro de trabalho na Educação soubessem que ela era parte de nossa pesquisa. Ela foi muito cuidadosa ao se distan-
ciar do projeto para que os colegas de trabalho não soubessem que ela estava envolvida naquele estudo. Essas questões mudavam, de alguma forma, a medida que nos movíamos no e do campo e começávamos a compor nossos textos de pesquisa. Ambos, Plhil e Stephanie, continuaram a ter anonimato nos textos parcial e final de pesquisa que escrevemos. No entanto, na ocasião, Phil nos convidou para apresentar nosso artigo e falar de nossa pesquisa, participando de fórum aberto ao público. Nessas oportunidades, ele identificou-se por
seu nome real e disse que ela era o PHIL da pesquisa. Stephanie também mudava em sua perspectiva de anonimato quando estava em outra paisa gem e não mais em sua escola ou distrito. Na universidade, ela ficava feliz que as pessoas - alunos de pós-graduação e professores universitários soubessem que ela era a Stephanie da pesquisa, e ela anunciava seu nomne real para se apresentar nesses momentos. Preocupações sobre anonimato como parte da ética frequentemen-
te mudam de outras formas quando os participantes tomam seus papéis em outras partes do processo de pesquisa. Por exemplo, no estágio inicial de pesquisa, os participantes podenm concordar com o anonimato, mas a
Pesquisa narrativa
225
medida que o estudo vai ocorrendo e que vão tomando seus papéis, eles
decidem que querem ser reconhecidos pelo trabalho deles, porque vêem Se como co-autores. Wendy Sweetland, por exemplo, começou como uma participante no estudo de Janice Huber e Karen Whelan. Mas, no decorrer do estudo, ela cada vez mais se via como co-pesquisadora e co-autora
dos textos de pesquisa, eventualmente descartando a ideia de anonimato,
quando foi co-autora de um artigo com Huber e Whelan. Frequentemente, professores e demais profissionais pedem para serem chamados por seus nomes, como fez Pam e Phillion em suas pesquisas, como forma de validar Seu trabalho durante a pesquisae como forma de ter reconhecimento pelo
gue fizeram. Claro que esse procedimento é sempre problemático para pesquisadores e participantes porque pode haver riscos quando as pes sOas-
chegadas de suas instituições
verem seus nomes
-
de
um
modo que
não valorize ou honre a narrativa institucional. Por exemplo, as críticas
podem não ser bem recebidas; os participantes podem ser acusados de estarem passando as histórias da escola para todos; ou podem ser vistos
alguém pesquisa.
como
que
"quer aparecer"
ou
ter
beneficio
próprio
por conta da
Claro que há outras possibilidades de resultados nos quais as pes soas possam dizer, desde o início, que querem ser chamadas por seus próprios nomes e dizer bem claramente que escolheram não serem anôniSomente mais tarde, talvez progressão para o texto final de
mos.
podem exigir o
estar
vulneráveis
quando
o
pesquisa,
trabalho de campo estiver eles comecem a perceber
em
que
forem identificados. Então, podem passar a uso de pseudônimos e que métodos de ficcionalização sejam usados para prover segurança e anonimato a eles. se
Identificação de crianças é uma outra questão ética complexa a ser enfrentada em textos de pesquisa. Frequentemente, as crianças ou adolescentes que se engajam em rias validadas através da
uma
pesquisa narrativa querem
ter suas
divulgação de seus nomes reais no texto
quisa. Algumas vezes, seus pais concordam apareçam. Sempre, em todos esses casos de ter
a
relação
no
centro
daquilo
que
que
os nomes
histó-
de pesde seus filhos
anonimato, precisamos manestamos considerando. Precisamos
trabalhar com os participantes, da forma mais clara possível, os cenários futuros de nossas histórias que podem surgir dessa decisão envolvendo o anonimato. O que
estamos tentando deixar claro éque anonimato longo de toda a
ocupação
ao
226
Jean Clandinin | E. Michael Connely
D.
pesquisa.
Como
é
uma
pre-
pesquisadores, precisamos
estar atentos sobre
as
possibilidades
que
a
paisagem
e
as
com
pessoas engajados como participantes ser modificadase poden transformadas. O que parecia fixo e decidido em um determinado m mento pode tornar-se um chão de mutações e transformações possivels quem estamos
e inimagináveis.
Propriedade e responsabilidades da relação A maioria dos suas
pesquisadores
justificativas pessoais
frentam
o
como
problema de saber a
narrativos iniciantes, ao comporem parte de seus projetos de pesquisa,
en
quem
pertencem
as
histórias. Essa questão
éfrequentemente estruturada muito diretamente em termos de problematizar
se as
histórias contadas
pelos participantes pertencem
aos
participan-
tes ou ao pesquisador. Por exemplo, será que a escrita de alunos sobre suas
experièncias na escola precisam de aprovação de seus professores, alunos, irmãos ou outros mencionados na história contada. Essa história pertence a eles porque foram eles que contaram? E suficiente ter seus personagens anonimos? Tudo isso se torna mais complexo ainda quando o anonimato é impossível, como quando um aluno escreve sobre o pai ou um irmão ou
mesmo sobre um professor em particular de uma série específica. A questão da propriedade surge novamente durante a escrita dos textos de campo. Pesquisadores narrativos mantêm suas anotações refletindo se, por exemplo, todas as notas de canpo precisam ser compartilhadas com todos os participantes. Elas pertencem ao pesquisador, que as escreve, ou aos
a participantes? A possibilidade de compartilhar
posse das
histórias pode surgir dependendo do relacionamento entre pesquisadore e pesquisador, negociaparticipante. Mas, precisam ambos, participantes rem a escrita das notas de campo? sentimos quando escrevemos nossas Lembramos da incerteza que Rua Baía. 0 que faria Jean sobre certas históna Escola da
notas
de campo
ela? rias de Stephanie contadas por as notas
de capo
poderiam
ser
como as e outras
problemáticas.
pesquisador para separar
As
Se
algumas
de Phil
(o
outro
vezes, diarios
ser o material a
das histórias
fossem para
participante)
as
lesse,
pessoais são escritos pelo
compartilhado
com os
partici.
Isso sentimos que é inapropriado compartilhar. pantes do material que no estágio dos material mantido e m segredo, traz a questäo sobre s e o no texto final de pesquisa. t o r n a r - s e püblico tos de campo, pode ou deve
tex
Pesquisa narrativa
227
Questoes sobre propriedade tornam-se preocupações consideran do o relacionamento ético negociado no campo. Em termos diretos, os pesquisadores estão sempre atentos sobre a possibilidade desse relacionamento ter que ser finalizado e de terem de interromper o estudo e dei Nar o campo.
Essas questões sobre propriedade emergem, ainda, quando da composição dos textos de pesquisa. Mestrandos e doutorandos sentem 1SSo quando eles percebem que seus nomes irão para os textos de pesqui-
Sa, depois da dissertação ou da tese finalizada e a autoria/propriedade será claramente deles, e não de seus participantes. Essas preocupações se tornam mais complexas ainda considerando que provavelmente os alunos terão lido, nesse ponto de seus trabalhos, una literatura critica sobre o co-
optação de voz, que apresenta crítica aos pesquisadores por co-optarem e usarem as vozes de seus
participantes para fins de pesquisa. Durante a escrita dessa seçã0, percebemos que embora nossas preOcupações sejam sempre estruturadas em termos de propriedade, esse pode não ser o melhor encaminhamento para pensar a questão através dos vários dilemas e questionamentos que surgem. Imaginamos que se reestruturarmos as questões de propriedade na pesquisa narrativa em termos de esse
de
relação
de
responsabilidade
tema. Se retornarmos
projetos, achamos
refletirem não sobre suas
experiências
na
a
explorar
mais útil para
a
quem
talvez a
seja mais útil refletir sobre questão considerando a escrita
pesquisadores
pertencem
as
narrativos iniciantes histórias de sua infância e de
escola, mas, sim, refletir
em
termos da
relação
de
responsabilidade com o outro, tais como seus pais, seus irmãos e outros que não honrar a
podem
tornar-se
anonimos. Os alunos frequentemente desejam memória de pais ou respeitar seus valores. O senso de responsabilidade relacional éo melhor caminho para refletir ao invés de pensar sobre esse problema como uma questão de propriedade. Escritores podem decidir que possuem a memória e ainda concluir que não desejam contar uma determinada história com base no que ouviram porque sentem que as outras pessoas podem no desejar ter sua história contada ou porque seria doloroso fazer tal relato.
Semelhantemente, ao compormos nossos textos de campo, as ques toes sobre a propriedade não são tão inmportantes quanto são as
de a
responsabilidade
verdade
ca aos
228
se
a
aqueles com
estabelece,
os
quais
os
questoes
nos
relacionamos. Assim que
participantes frequentemente dão carta branpesquisadores para dizer o que desejarem. Ainda assim, os pesqul D.
Jean Clandinin |
F.
Michael Connely
sadores, a s vezes mais atentose conscientes de como os textos podem
ser lidos, podem ser mais cautelosos sobre o como os participantes são representados do que os próprios participantes.
Como somos historiados/narrados
como pesquisadores Logo que iniciamos nosso trabalho como pesquisadores narrativos, nosso foco eram as nossas energias em considerações sobre como nós his-
toriávamos os participantes em nossos estudos. Nós não imaginávamos este que poderia haver histórias sobre nós. Mesmo enquanto escrevíamos texto, percebemos que soava ingênuo. Era algo que poderíamos facilmen-
te ter imaginado, tivéssemos pensado sobre a pesquisa como relacional. Claro que as paisagens nas quais trabalhamos são historiadas. Claro que como pesquisadores naquelas paisagens seríamos parte das histórias contadas pelas pessoas com quem trabalhávamos. As histórias sobre nós estão conosco ao longo de nosso movimento entre os textos de campo eo
texto de pesquisa. da Rua Quando inicialmente negociamos nossa entrada na Escola Baía, como pesquisadores narrativos iniciantes, vagarosamente despertamos
para
as
histórias que
ponto, Stephanie em seu
comentou em
mestradoe
algum insight
eram
contadas sobre nós. Em
off que Jean
um
determinado
talvez estivesse trabalhando
Michael em seu doutorado. Esse comentário nos trouxe
sobre
c o m o um
sempre falava de nós
de
participantes nos percebia. pesquisadores residentes, pessoas
nossos
como seus
Phil que
estavam lá para ouvir suas histórias e para ajudá-lo a refletir sobre possí-
veis ações futuras. com quem trabalhávaNo entanto, não somente os participantes contavam histórias sobre nós. Em uma pes mos mais próximo nas escolas da segunda série de uma professora iniciante
quisa posterior com Marie, uma escola de Calgary, percebemos que tórias sobre nós. Um dos alunos, que
crianças também contavam hisgostava da presença de Jean na sala as
de aula, contou para ela, em um cochicho confidencial, que a professora da terceira série estava deixando a escola eque Jean poderia conseguir a vaga dela e, assim,
Jean poderia
ter sua
Esses relatos sobre quem
própria classe.
somos c o m o
pesquisadores também são
evidentes em nossos textos de campo, quando nos engajamos em entre
Pesquisa narrativa
229
participantes. As nos dizia algo sobre
VIstas e conversas com o s s o s
ticipantes falavam
conosco
m a n e i r a s COmo oS
como
par-
eles construíam
histórias sobre nós. Na Escola da Rua Baía, os participantes inicialmente talavam conosco de forma que percebíamos que eles noS Viam como ex perts que tinham
o
conhecimento
o
qual poderia
ser
transmitido
a
eles
atividades de desenvolvimento profissional. Gradualmente, ao passarem a confiar em nossa relação de trabalho, passa-
por meio de
workshops
e
mos a ser compreendido como amigos e colegas em quem podiam confiar. Em uma pesquisa narrativa com jovens meninas, realizada alguns anos depois, na cidade de Calgary, Jean aprendeu, ao ouvir a conversa entre as meninas, que elas contavam histórias de Jean como se ela fosse uma pro-
fessora visitante na escola, alguém que estava interessada em suas tarefas e em seu progresso escolar.
As histórias sobre quem somos enquanto pesquisadores também ficaram evidentes quando estávamos compondo nossos textos de pes-
quisa. Algumas vezes, como ocorreu em nosso trabalho de longa duração na Escola da Rua Baía, aprendemos sobre como éramos compreendidos quando uma de nossas participantes leu nosso trabalho e através de outros nos contou sua história sobre quem seríamos para ela. Os pesquisadores precisam ser sensiveis a essas histórias que os participantes contam sobre eles. Encontramo-nos nessa situação na Escola da Baía quando fomos formalmente solicitados a fazer um workshop para os professores no período na tarde. Pensamos que se fizéssemos aquilo, isso alteraria nossa relação na escola e institucionalizaria o pensamento de que eramos de fato oS experts. Pensamos que isso poderia minar
papel e a história que tínhamos contado sobre nós mesmos e isso poderia criar tensões. Em nosso caso, ao não fazermos os workshops, escapamos do risco de sermos tratados como meros usufruidores da escola, como aqueles que tiram sem dar nada em troca.
Fato e ficção
pesquisa narrativa, a distinção entre fato e ficção é unm terreno arenoso. Nos confrontamos nessa distinção como um questionamento em nossas frequente perguntas sobre os textos de pesquisa quando problematizamos, ou somos chamados para tal ação, a factualidade e a vera Na
cidade do que
230
D.
escrevemos. Mas
Jean Clandinin
quando problematizamos essas questões,
| F. Michael Connely
stamos aios gios aue
probleaizando
Sobre assuntos que
já são evidentes nos está iniciais de nOsso trabalho, assuntos que se intensificam na medida começamos a produzir nossos textos de pesquisa. Quando um pesquisador está no campo e uma história é contada
evento é narrado, podemos bem imaginar Esses eventos realmente ocorreram? Como
ou um
As
sabe?
respostas
variar dependendo
a essas
perguntas,
se
da
bases dessa história. podemos saber? 0 narrador são feitas de alguma forma, irao as
histÓria ou do evento. Podemos fazer tais perguntas novamente ao registra-las em nossos textos de pesquisa. Algumas vezes registramos nossas confabulações em diários pessoais associados com outros textos de campo. Escrever uma história ou registrar um evento em um texto de pesquisa é condicional. E condicional aos nossos interesses e
circunstâncias envolvidas. Ao pensarmos sobre essas questões, respostas claras e certas se tornam alusivas. Quando pressionamos, o que parecia ser um fato aparece cada vez mais como a reconstrução de nossa memória ou a de nossos par-
ticipantes. Essas reconstruções são melhor pensadas em termo de ficção? Escritores de memoriais e autobiógrafos, como Torgovnick e Blaise, oferecem um comentário sobre a insolubilidade de se distinguir fatos e ficção, que pode auxiliar. Ao final de seu memorial, Crossing Ocean Parkway (1996), Torgovnick pondera sobre uma pergunta na qual ela se questionou: O que sua m e
Em
meu
tendo
pensava? Como resposta a essa questão, ela escreve:
livro,
como
meus
pais e irmãosaparecem
representações
baseadas
em
como
o
personagens
fatos retratados
que
en-
memória.
pela
Como em todos os memoriais, eles... 1ão aparecem como são propriamente, romance mas como atores no m a r meus
estava ou
em
pais
em
meio
ao
de outra. Eu
secretária que
Ao
Sua
pais
minha vida. Será que tentei transfor-
a
Eu não tinha
processo de escrita,
eu estava
isso
mas eu
(quando)..
deixando
os mesmos
pensado
tinha feito isso de
seu
para pegar
meus
ensaio Bensonhurst?
forma, Torgovnick foi
questionada daquela Para ela, de fato e ficção.
uma
Eu casualmente mencionei
meu escritório
pais do
sobre isso até que
a
forma minha
pais. Ela
(p 175-176).
forçada
a pensar
ser
em termos Seus
personagens?
percebi
falou: Ah, eles são
que é
na
vida real
secretária,
história de
os
e seus
pais da
pais
história
relacionamento,
seus
pais
leitores,
como
tudo que se conhecia. Não
havia
n a história. eram
e r a n as m e s m a s pessoas,
de memória, para
Mas, para
os
substanciar as característi-
Pesquisa narrativa. 231
cas parentais no livro e tornar possível evitar a questão sobre fato e ficção, Para os leitores, os pais da história såo necessariamente personagens fic.
ticios. Para Torgovnick, eles eram personagens construídos fora da vida real. Eram eles fatos ou ficção para quem e em que dimensão?
A conversa entre Torgovnick e sua secretária compos a pergunta sobre fato e ficção porque quando lê um memorial, o leitor imagina eventos e personagens como sendo personagens e eventos da vida, relatos, fatos fora do como os fios narrativos e de interpretação na forma de memoriais são construídos. Mesmo assim, é possível que o leitor, a secretária no caso,
pergunte: São os mesmos pais? Para ela, os personagens factuais poderiam ter sido, ou provavelmente foram assumidos como sendo, ficcionalização de alguma forma. Entre outras coisas, essa história mostra como o relacionamento dos leitores para com o texto influencia as considerações sobre o que é fato e o que é ficção. No caso relatado, essa questão parece ter sido
considerada como fato, pelo autor. Os personagens são seus pais e, portanto, são factuais. A pergunta de sua secretária implica que os pais na história e os pais na vida real não são os mesmos. Para a secretária, uma leitora, há uma questão de fato e ficção que poderia ser resolvida de duas formas. Mas, para a autora, não havia uma simples resolução. Ela diz que durante a escrita do memorial seus pais foram ficcionalizados já que ela havia criado personagens para eles. Fato, no texto, é potencialmente ficção tanto para o leitor quanto para o autor. Podemos chama-los de ficção, então? Blaise, no que ela chama uma Autobiografia Pós-Moderna (1993),
comenta algo semelhante de uma perspectiva inicial em ficção. Ele escre ve: "A ficção de cada um é quase completamente autobiográfica. 0 que a faz ficção, geralmente é seu nível de disfarce ou transformação. Assim, enquanto muitos escritores abordam ou atribuem suas próprias experiências para outros personagens, eu de alguma forma chamo as experiências das outras pessoas como as minhas experiências" (p.201).
Para Blaike, então, podemos dizer que tudo, incluindo autobiografias e memorial, éfato porque tudo é autobiográfico. Para ele, assim como para Torgovnick, fato e licção são questöes de disfarçar ou transformar, e
de ficcionalizar. Para pesquisadores narrativos, esses autores oferecem alguma pos sibilidade para pensar sobre essa questão de fato e ficção e sobre ser capaz
de se mover prospectivamente. No entanto, quanto mais nos engajamos a pesquisa narrativa, nnais essas questões permanecem conosco. E embora talvez näo tenhamos respostas, podemos continuar nossas investigaçðes.
232D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
Riscos,
perigose abusos: "eu, o crítico"
Os riscOs, cÙes
a
perigoS
e
abusos
na
narrativa são, também, preocupa repetidamente consideradas ao longo de todo processo de
serem
pesquisa narrativa. Embora essas questões sejam sinalizadas ao longo do livro,
queremos,
nesta
seção final, abordá-las mais uma vez. Nesta seção, completa de possíveis riscos, perigos e abusos. Ao
não damos uma lista invés disso, simplesmente lembramos os pesquisadores narrativos ini-
ciantes da necessidade de ouvir as suas críticas ao entrarem no campo de pesquisa e ao iniciarem a compor seus textos de campo, textos interme-
diários de pesquisa e a versão final do texto de pesquisa. Nossa visão é de que toda resposta é válida em algum nível e sempre contém a semente de uma discussão importante.
Tomemos, por exemplo, um dos pontos centrais da narrativa, a saber, a qualidade intersubjetiva da pesquisa. Desfazer o criticismo de que a pesquisa narrativa é ultrapessoal e interpessoal é correr o risco do perigo de narcisismo e solipsismo. Um outro perigo é compor textos de pesquisa narrativa que sejam o que chamamos de enredo Hollywoodiano, o enredo no qual tudo termina bem no final. Enredos assim podem ser aqueles nos quais uma censura
meticulosa e inflexível, algumas vezes encontradas em críticas etnográficas, ou podem ser aquelas nas quais as boas intenções dos pesquisadores e participantes são encontradas em todos os aspectos do estudo, um tom
açucarado, algumas vezes encontrado em programas de avaliação e impleem textos
de pesquisa é
são hesitantes, não säo do que eles não são condicionais, não
tipo sugerido
Spence (1986)
esse
principal desse tipo de enredo
mentações. A
marca
por Geertz
Bateson, vistos
e
no
capítulo
um.
chamou
de enredo incondicional "enredo processo, de criação dessa higienização, em uma narque vai a todo tempo Suavizado" (p.211). Este é um processo textos de pesquisa. O protextos de campo e rativa enquanto se compõe deve ter para saber como balancear Dlema, portanto, é que o pesquisador obscurecido devido a e s s a a
suavidade contida
Suavidade. para o
ro
enredo
Reconhecer a
leitor.
que fica
é abrir u m a outra porta narrativa escorregadia alerta a s histórias n o contadas de estar tão
É u m a questão
quanto aquelas contadas. Volver uma
com o
Kermode Baseamo-nos em
não contadas ideia de histórias
uais um leitor
cuidadoso
Eitores discutindo
irá
(1981) para desen-
c o m o narrativas
misteriosas
narrativos
as
ajudam
seus
feitas,
uma
ouvir. Pesquisadores de histórias as seleções
conscientemente
Pesquisa narrativa
233
possivel história alternativa, e outras limitações vistas do ponto de vista da vantagem do "Eu", o crítico. Uma das formas que aprendemos para pensar sobre os riscos, pe-
rigos e abusos ao longo da pesquisa é olhar através dos nossos múltiplos "eus" como pesquisadores narrativos. Um dos "eus e o critico da narra-
tiva. Pesquisadores narrativos não podem, como diz Welty (1979), evitar a tarefa do criticismo. Ela escreve, "Histórias escritas e análise crítica são dons distintos, como assoviare chupar cana, e o escritor, proficiente em ambos os dons, é duplamente dotado. Mesmo quando ele nao consegue fazer as duas coisas ao mesmo tempo" (p.107). Pesquisadores narrativos nao podem seguir o dictum, mas precisam encontrar maneiras de tornarem-se um tipo de "Eu', o crítico". A noção de crítica segue a proposta de
Welty, que vem da teoria literária, de que o fazereo criticar são duas atividades relacionadas. Um dos
problemas de se estar tão duramente entranhado na noção de ser o "Eu, o crítico" é que há um sentido monitorador negativo, a possibilidade de limitar a pesquisa. Precisamos encontrar maneiras de estarmos atentos sobre o ou dizem de nossos trabalhos aqueles de que pensam perspectivas fronteiriças reducionistas ou formalistas. E precisamos estar alertas e
e
conscientes sobre
textos de
as
questões relacionadas aos textos
de campo
pesquisa ponto de vista que considerem os três espaços tridimensionais da pesquisa narrativa. Denominamos esse estado de alerde
um
ta de despertabilidade.
Deliberadamente escolhemos ao
invés de
uma
linguagem de estado de alerta linguagem do criticismo a fim de organízaro trabalho de uma
pesquisa narrativa consistente, mas sem -armadilhas
e
sinais de "PARE". Uma
cruzar
guardas, portões, portas-
linguagem
do estado de alerta nos constante estado de aler-
permite proceder um encaminhamento com um ta em relação aos riscos, ao narcisismo, ao solipsismo, ao enredo simplista, aos cenários e personagens unidinmensionais. Este estado de alerta é
mais bem promovido em de é valorizada, onde o
comunidades responsivas
pensar sobre outras
Mesmo com de pesquisa,
comunidades responsivas
encorajamos
samente para
levantam deveria dos
234
a revisão dos
questões
ser
a
mal
sobre
no
nos mesmos
textos de
uma
quais a diversida-
possibilidades é encorajado.
trabalho durante
e aos
pesquisa,
pesquisa.
nas
Nossa
compreendida. Comentários
outros os
a
o
atentar
processo cuidado-
quais inevitavelmente
posição,
no
entanto, não
críticas podem vir de enreformalistas e reducionistas. Esses comentários precisam ser responD.
Jean Clandinin |
F.
Miclhael
Connely
e
didos
em
termos
de
pesquisa narrativa e, em particular, em termo uma determinada pesquisa narrativa em particular. Precisamos estar alertas às criticas, mas na0 necessariamente aceita-las. O eu sobre o qual falamos, para responder as críticas com um espirito é
de alerta, versa,
um
talvez melhor
ilustrado
por
uma
história. Em
pesquisador narrativo iniciante descreveu
quisa sobre a experiëncia de mulheres brasileiras da
lher brasileira
recente
con proposta de muárea rural. Uma pes uma
sua
no
grupo perguntouo que a pesquisadora esperava encon trar, sendo alguém de fora da cultura e não conhecedora daquela linguagem. A pesquisadora respondeu que embora ela no fosse daquela cultura, ela
falava Português. Uma discussão ocorreu sobre a propriedade/o sentido de uma
pesquisa cross-cultural sendo conduzida por alguém de fora (outsider) Para nós, questões interessantes de um outro tipo foram também
levantadas. Vemos essa conversa como parte do estado de alerta, como parte do tornar-se alerta por parte do pesquisador narrativo iniciante, que não precisa considerar a questão da língua. Ela não precisa considerar que diferença isso faz, para ela, ser uma "insider" ou no
em relação
àquela cultura. Mas, a resposta triunfante dela - que ela falava Portugu ès
-mascara a questão mais geral de estar alerta para trabalhar nesse es-
Nós não assumiríamos paço de pesquisa narrativa tridimensional.
auto-
maticamente, por exemplo, que a falta da língua necessariamente prote
geria
sua
é to pesquisa. Tudo dependeria. Sua situação
dramática
como
mascarar as maneiras do dia-a-dia, do momento a momento nos quais
as
pessoas
textos de
precisam
pesquisa
textos estar alertas sobre como os
posicionados
são
ao
longo
de campo
das dimensões
e
os
temporal,
pessoal e social, e espacial. Tomando
uma
uma pessoa que esteja situação oposta, suponhamos memória. Lingua não é um problema. e relate uma
fazendo autobiografia A mesma pergunta feita recobra
sua
memória.
mensional que
Faz diferença
b r a s i l e i r a se aplica a pessoa que pesquisadora contidas no espaço tridiQuais são as condições
a
condicionao
se a
sentido que
memória é
uma
se
pode
fazer
lembrança de
um
daquela
memória?
adulto sobre
a
me-
contada é apresentada como sendo de se a história ou infância, mória de apresentada como um registro de uma memoria disso, Além uma criança; diferente de uma memória de umn é temporalmente um diário de infåncia diário. As condições sobre vividos, relatados pelo adulto sobre os eventos a s s i m c o o em uma conrecobrada fazem dierença é as quais a memória de pesquisa e etc.
versa,
e n uma em u m a carta,
entrevista
Pesquisa narrativa
235
Despertabilidade
-
estado de alerta
narrativa como um tipo capitulo dois, caracterizamos a pesquisa desafia a pesquisa aceita e as de pesquisa fluida, um tipo de pesquisa que de pesquisa que necessita Suposiçòes de representações. Este é um tipo chamamos estado de alerta. de uma reflexão contínua, num ir e vir, do que
No
A pesquisa narrativa, posicionada como é nas fronteiras dos modelos de
pesquisa reducionistas e formalistas, está em estado de desenvolvimento, um estado que demanda que nós pesquisadores estejamos alertas e aten
tos sobre todas as nossas decisöes de pesquisa. AO nos movermos para o campo, enfrentamos desafios, dos outros e
de nós mesmos, sobre o que significa fazer pesquisa narrativa. Os outros e talvez nós mesmos encontrem conforto e um senso de estar à vontade com
os tipos mais estáveis de pesquisa. Nós precisamos estar atentos sobre o que estamos fazendo como pesquisadores narrativos, de forma que possa mos continuar a aprender o que de fato significa fazer pesquisa narrativa.
Como dito, um auxílio tem sidooengajamento nesse tipo de investigação tendo uma comunidade, ou comunidades, com as quais possamos interagir e discutir sobre os princípios desse tipo de pesquisa. Comunidades que nos auxiliem a problematizar e questionar nosso vivenciar e contar de
histórias sobre
campo de pesquisa. Na seção anterior, notamos a importância de mantermo-nos ateno
tos ao escrevermos os textos de pesquisa e ao recebermos feedback de
nossos pares via críticas e revisões, principalmente daqueles que traba-
lham com formas mais estáveis de fazer pesquisa, como as de base formalista e reducionista. Ainda assim, imaginamos que esses desafios com a
pesquisa narrativa ainda sero vividos por muitos anos. Mas, ao ficarmos atentos às críticas e comentários sobre nossos estudos, poderemos desenvolver critérios para avaliar o valor das pesquisas narrativas que fazemos. Em 1990, em nosso principal artigo sobre crevemos
uma
confiabilidade,
"0 que faz
da validade
generalizações'".
"Como outros métodos rios que não os de não transformar a
linguagem para
se
pesquisa narrativa, es
seção intitulada e
das
qualitativos, a
uma
narrativa
validade, confiabilidade
e
boa narrativa? Limites da Nesse artigo escrevemos,
se
baseia
em
outros crité-
generalizações. E inmportante
linguagem dos critérios na pesquisa narrativa criada por outras formas de pesquisa. A
conduzir
em uma
linguageme os critérios
pesquisa narrativa estão ainda em desenvolvimento em nossa comunidade de pesquisa" (Connelly Clandinin, 1990, p.7). 236
uma
D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
Ressaltamos vários critérios possíveis aplicados, tais como os criterios de
aparencia
verossimilhança de Van Maanen (1998), critério que enfatiza a possibilidade de reconhecimento do campo no texto de pesqu e
sa; e o critério de transferabilidade de Lincolne Guba (1985), que dispen-
sa o critério de generalização. Escrevemos sobre a importância de evitar
"a ilusão de causalidade" (Crites, 1986, p.168), a relação de aparente causa e efeito que parece existir ao narrar eventos em uma sequência temporal. Dissemos que boas narrativas são
aquelas que apresentam qualidade con
vidativa, explicativa, aquelas que apresentam autenticidade, aquelas que apresentam adequação e plausibilidade. Esses critérios ainda estão em desenvolvimento, em elaboração, mas encorajamos que pesquisadores narrativos reflitam sobre eles. No entanto, ao voltarmos a nossa questão, posta em 1990
0 que torna uma
narrativa boa? - percebemos que precisamos mudar a questão a fim de encaminhar nossa discuss o
mais adequadamente. Nossa questão agora
não é tanto o que torna uma narrativa boa - o que frequentemente implica uma discussão sobre o
q u e faz u m b o m t e x t o d e p e s q u i s a n a r r a t i v a -
mas,
sim, o que pode tornar uma pesquisa narrativa boa. Esta pergunta re-elaborada nos permite não somente pensar sobre questões relacionadas aobs
textos de pesquisa, mas também a pesquisa narrativa como um todo. Dentro de nossa comunidade de pesquisa narrativa, nos demandamos informações sobre quais critérios queremos que sejam usados para avaliar nossos trabalhos. As vezes, desenvolvemos novos critéérios que
(1996) que por exemplo, no ressonáncia narrativa, e o trabalho de Whelane Huber (1999), no qual se
funcionam, fala
em narrativas
círculo de
trabalho de Conle
como
correspondentes ou
temos a
extendidas. Outras vezes, em nosso
aos crit rios conversas, retornamos
nomeados acima, critérioos
esses que continuam a fazer sentido na avaliação do todo de uma pesquisa
narrativa em particular. Ao
a s fronteiras e continuarmos nosso trabalho
linites da pesqui-
a necessidade de desenvolvermos critérios narrativa, atentamos para que funcionem, considerando o espaço tridimensional da pesquisa nar sa
rativa. No entanto, é
a
despertabilidade vivenciar de
precisa
caracterizar o
quisa
refletindo sobre
que,
em nossa
nossos estudos
perspectiva, mais
narrativos, estejaumos
nós no campo, escrevendo textos de campo, ou escrevendo textos de pes e
quais
criterios usar em uma
determinada pesqui-
sa narrativa.
Pesquis.a narrativa
237
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D. Jean Clandinin | F. Michael Connely
Analysis
and Interpret
Craft of Memoir Roct ston:
Hou
Índice Remissivoo
Bowers,L.: 213. Brewer, B.: 199 Bruner, J.: 203.
A Ad hoc: 35, 49 Ad interinn: 35, 49
C
Apos o Fato (Geertz): 33, 49
Caixas de memórias: 134, 158.
Alvarez, J.: 214, 216
Carr, D.: 33
Ambiguidade: 35, 38, 90, 129, 130, 137,
Carr, E.: 146, 178.
203
Cartas como texto de campo: 149, 1 50,
Amizade: 182, 221, 222
151.
Análisee interpretação de textos de
Categorização
campo: 176
187
Anais: 155
Categorização de gênero:
Anderson, K: 153, 154
Causalidade: 65, 237.
Anderson, L. W: 55
Certeza e causalidade
Anonimatoe confidencialidade: 224 Antropologia: 13, 30, 32, 36-39, 47, 49,
formalista: 67, 68, 71, 73,
Chamada por histórias (Coles): 41. Chatman, S.: 203-205.
50.
Chineses no Canadá: 88.
Apaixonando-se pelos participantes;
Choque cultural:
observação fria
dos
participantes:
121
79, 188, 193
90, 91.
Clandinin, D. J.: 7, 8, 23, 25, 26, 85, 107
Aristóteles: 201.
144, 168, 197, 222.
Artefatos (familiar, pessoal e social)
Code, L.: 183.
como textos de campo: 134, 158.
Codificação de textos de campo
Associação Internacional para
narrativos: 215
Avaliação
a
do Sucesso Educacional: 17,
54. 221. Assinatura: 167, 184, 194-199, 215, 184Audiencia: 124, 144, 145, 150, 167, 215. 187, 194, 195, 197-199, 203, 139, 143, 144. Autobiografia: 76, 88, 106,
Coles, R.: 30, 33, 43-50, 81
Complexidade da pesquisa narrativa: 136, 139, 171
Comportamento: 22, 42,
54-58, 61, 6-4.
Comunidade Acadêmica: 199. Comunidades responsivas: 96, 234.
232, 235.
Connelly, F. M.:
B
Conle, C.: 237.
Bach, H: 113, 149, 167.
Conhecimento prático pessoal: 31, 79,
7, 8, 23, 25, 85, 107, 144. 174, 197, 222, 236.
111, 183.
Barone, T. E.: 202. Bateson, M. C: Visões
periféricas:
33, 36.
Beirnstein, R. J: 72. psiquiatricos: 11 Biografias de pacientes Blaise, C.: 89,231,232. 55, Bloom, B. S.: 14, 54,
56,
58,
Conhecimento pr.itico protissional: 8, 67, 93, 209, 210
Continuidade: 30, 32,36.18,53,o1,00,81S 5,104,189,207.
Corpo
e
Mente (Johnson): 71.
80.
Booth, WN. C.: 72
Pesquisa narrativa
245
Criança: 20, 21, 30. 31, 59, 63, 64, 78, 93, 94.96. 101, 102, 104. 114, 117, 122, 128, 132, 137, 140, 146-150, 152, 161, 168, 175, 188, 204, 209, 226, 229, 235. Critério para uma boa narrativa: 236.
Crites. S.:237. Critica a pesquisa narrativa: 85, 116,
Educação: politicas e interseções: 111. Eisner. E. W.: 202 Enredo hollywoodiano: 233. Entrevistas: 44, 46, 90, 116, 134, 143, 152-155, 173, 177, 189. Escola da Rua Baía: 100-113, 115, 124,
228, 233, 235.
127, 130, 131, 135 157. 169, 172, 174, 179, 180-183, 191, 194, 222, 225, 227,
Cronicas: 155, 213.
229, 230.
Cuban, L:22.
Escrita e resenha do livro: 74.
Cultura: 32, 61, 77-79, 123, 207, 214, 235
Estrutura de anais e crónicas: 155.
Curriculo: 8, 54, 55, 58, 61-63, 65, 117,
Etica na pesquisa narrativa: 206, 220-
167, 180.
226.
Czarniawska, B. Narrando as
Espaço tridimensional da pesquisa narrativa: 89, 92, 99, 129, 133, 139, 172,
organizações: 33, 39.
177, 186, 187, 192, 194, 203, 205, 208, 215, 237.
D
Etnografia: 33, 76, 104, 167, 170, 173.
Dados: ver textos de campo Davies, A.: 128, 129, 132, 137, 138-140, 142-152, 154, 157, 159-161, 171, 172, 176, 178, 180. DeCarion, D.: 149.
Experiencia multicultural: 87. Experimentando a forma narrativa: 214. Expressões narrativas: 58, 117.
Extrospectivo: 26, 84, 85, 90, 127, 219
Denzin, N.: 33, 202. Despertabilidade: 15, 220, 234, 236, 237.
F
Dewey, J.: 13, 18-20, 22, 29-31, 53, 54,
Falsos começos e finais mortos: 166, 181, 184.
57,61, 66, 70-72, 80, 85, 108, 125, 201 203.
Fato e ficção: 40, 76, 214, 220, 230-232.
Diário de um diretor de escola: 131.
Fenton, V.: 113, 126, 127, 130,
Dietrich, C. E.: 204.
Fischer, M. M. J: 33, 202.
Dificuldade da narrativa: 14, 90, 203, 216.
Fins e meios: 61, 68, 201.
Dillard, A.: 123, 184, 191. Dimensoes da pesquisa narrativa: 47, 85, 89, 99, 139, 161, 162, 174, 186, 192, 235. Discurso académico fronteiriço: 182. Distancia relacional: 1 19, 121, 148, 158. Documentos como texto de campo: 157.
146
Formalismo: 15, 66, 72, 74, 77, 190. Formas de pesquisa com base em artes: 203. Fronteiras teóricas: 68.
Fotografia como texto de canmpo: 134, 149, 157, 158.
Fundamentação teórica: 74, 75, 206, 211.
Doyle, W: 22.
G E Edel, L: 121, 122, 203, 213.
246
D.
Geertz, C.: 30, 33-41, 44, 46-50, 65, 100, 106, 107, 115, 196, 202, 233.
Jean Clandinin | E Michael Connely
Generalização: 76, 237.
Leitura em voz alta: 216.
Glaser, B. G.: 173.
Lincoln. Y.: 33, 202, 237.
Goldberg N.: 184.
Long Him: 86-89, 91, 92, 96, 97,
Guba, E. G.: 237. Guia ético para pesquisa humanos: 221,225.
102,120. com seres
Lugones, M.: 89.
M H
MacDonald, A. M.: 213.
He. M. F: ver Ming Fang He
Macintyre, Alasdair: 31, 32.
Heilbrun, C.: 333.
Mallon, T. A.: 145, 213.
Hierarquia de objetivos: 61, 63.
Marcus, G. E.: 33. 202.
Histórias de familias e em familias como
Mark, J.: 31, 166.
texto de campo: 156.
Marginalização: 35, 93, 95.
Histórias não contadas: 107, 233.
Huber. J: 113, 175, 199, 215, 226, 237.
Memória: 14, 55, 69-71, 76, 87, 88. 91. 92,95, 97, 103, 119, 123, 124. 137, 138, 147, 157, 158, 161, 185, 189, 191., 192,
208, 228, 231, 235. Memorial: 144, 204, 231, 232.
Identidade e assinatura: 196.
Metáforas: 13, 20, 29, 31, 37, 39, 47,212,
Identidade institucional: 39.
213.
Imaginação:
18, 41, 44, 101, 197, 198.
Método na Pesquisa narrativa: 172.
Infancia: fato ou reconstrução; histórias
Mickelson, J. R.: 168. 169, 204.
lembradas: 96
Ming Fang He: 86, S8, 102, 171, 205, 223.
Inglés
como
segunda lingua:
Introspectivo:
88.
26, 84, 85, 90, 127, 219.
Minister. K.: 154.
Mishler, E. G.: 153. Molloy, S.: 143.
Jack, D.: 153, 154.
N
Johnson, M.: 31, 32, 69, 70, 71, 166, 183,
Narcisismo: 233,234.
213.
Narrativa descritiva: 46. Narrativa dominante: 14. 22, 54, 56-58. 61-69,71-73, 80, 90. 223.
K Kerby,
A. P: 100.
Kermode. F: 233.
Narrativa institucional: 102, 226.
Narrativa como fenomeno e metodo de pesquisa: 32, 48.
Kroma, S.: 109. Kuhn, T. S.: 56, 74.
Narratologia: 85.
NII
Instituto de Educaçào Nacional
dos Estados Unidos: 103.
L
Notas de campo como textos de campo
.agemann, E. C.: 19, 22, 54.
47
Lakoff,G.:
29, 31, 213.
NUDIST: 177, 192
Pesquisa narrativa
247
213. Sarton, M.: 145, 146,
Schafer R.: 33. O'Brien. T: 158.
Schmidt,
Oakeshott. M.: 68-71.
O "EU" O
pesquisador:
quinto
momento:
I: 189,
190.
122. Schön: 68, 69, 70, 71. 39, 167, 198.
Schon. D. A. 242
33.
Schroeder, D: 221.
Schwab. J.: 57, 83, 84, 165. Shuster, M.: 187, 188, 193.
P Paisagem de
conhecimento
profissional:
138. 139, 210.
Skinner Q:74, 76.
Pesquisa retrospectiva: 34.
Pesquisa
Pesquisa
Educaço:
em
área de Humanas: 33, 45.
Pesquisa Pesquisa
nas
Sosniak, L. A.: 5.
8, 18-22, 54.
fluida: 57, 165, 236. na
Sinal Narrativo: 64.
Ciências Sociais: 18,19.
Phillion, J: 77-80, 127, 130-132, 146, 170, 171, 180, 194, 196, 226.
Spencer,
D.: 33, 233.
Stone, E.: 156. Strauss, A.: 173.
Sweetland, W.: 199, 215, 226.
159,
Polanyi, M.: 56, Polkinghorne,
183.
D. E.: 30, 33, 45-50, 81.
T Temporalidade: 29, 39, 50,
53, 61-63, 66,
Popper, K.: 72.
69, 80, 85.
Prince, G. A.: 85.
Termo de Consentimento: 221, 222.
Propp, V.:
76, 77.
Textos enm coautoria: 7, 199.
Psiquiatria: 32, 41-44 Psicoterapia: 13, 30,
33.
Textos de campo: 119, 133-159, 163,
175 Texto de pesquisa: 6, 15, 21, 46, 84, 86, 91,92, 94, 144, 151, 168, 171, 175, 178,
R Reducionismo: 15, 69, 70, 72, 189.
181, 184-200, 202, 204, 213, 215, 216, 218, 219, 226, 229, 231, 233, 237.
Reflexão na ação: 68, 69.
Textos provisórios: 179-181, 184, 200,
Relativismo narrativo: 125.
201.
Retrospectivo e prospectivo, na escrita
Thompson, P: 154.
de textos de pesquisa: 84, 85, 95, 139,
Thorndike, E.: 22, 54, 56, 57, 80.
219. Rist, R.: 104. ose, C. P: 205.
Russel, H.: 75.
S Sala de aula: 30, 31, 64, 65, 74, 75, 77-79,
94, 95, 108, 109, 111, 113, 116, 121, 128, 132, 134, 137, 138, 142, 143, 145, 146, 148, 150, 152, 160, 168, 170, 172, 175,
Torgovnick, M.: 231, 232. Trabalho de campo: 90, 104, 164, 165. 187, 189, 193, 197, 199, 215, 226.
Transferabilidade: 237.
U Unidade narrativa: 13, 29, 32, 48. Uso de
192, 208, 210, 223, 229.
248
computador para organizar
lextos de campo: 177.
D. Jean Clandinin | E. Michael Connely
V
Whelan, K.: 92, 93, 113, 175, 199, 215,
Van Maanen, J.: 237,
226, 237.
Verossimilhança: 237.
William, W. C.: 43.
Voz: 38, 94, 112, 113, 129, 131, 142, 167,
Wolcott. H. F: 203.
184-186, 194-199, 214-216, 228.
Workshop: 230.
W
Z
Webb. K.: 221
Zinsser, W.: 191
Welty, E.: 205, 206, 234.
Pesquisanarrativa
249
Pesquisa Narrativa "A literatura sobre
disseminada
pesquisa
teoricamente
e
grande façanha.
Este livro
é
narrativa
incompleta.
lúcido, fluido,
tem
sido, até agora,
Clandinin
amplamente
Connelly
e
criaram
magnificamente discutido
uma
também exemplos. Os alunos encontraro riqueza de argumentos para dar suporte as suas
rico de
pesquisas e
teoria e
os
professores encontrarão tudo que métodos de pesquisa narrativa". os
e
precisam
para ensinara
Yvonna S. Lincoln, professora do Departamento de Educacional da Universidade A&M do Texas
Administração
"Este livro revela
jornada de dois estudiosos que pelas duas últimas décadas têm explorado a forma pela qual narrativa aprofunda nosso entendimento sobre experiência educacional. Seus encontros, com questões aparentemente intratáveis, a
a
a
provêm um modelo intelectual de coragem. O livro Pesquisa Narrativa nos
convida a seguir nesta jornada válida a ser compartilhada." Elliot
W. Eisner
com
-
os autores.
Professor
nos
E esta é
cursos
uma
de
jornada altamente
Educação
e
Artes da
Universidade de Stanford. "Uma história iluminadora de como se chega à narrativa e como se procede com a pesquisa narrativa. Este livro sobre o estudo da experiência demonstra como a narrativa emerge das margens para o centro do discurso acadêmico." Amia Lieblich professora do Departamento de Psicologia da Universidade Hebréia
Apoio:
Editora filiada à
Associação Brasileira das Editoras Universitárias
ISBN 978-85-7078-279-3