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Zitiervorschau

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CINEMA NEGRO BAIANO

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Cinema Negro Baiano

Copyright © organização Cintia Maria, Jamile Coelho, Mile Silva e Lecco França Copyright © 2021 Editora Emoriô

Coordenação editorial e executiva Cintia Maria e Mile Silva Edição de imagens e capa Jamile Coelho Projeto Gráfico Stock Indesig

Editoração Cintia Maria e Matheus Gabriel Revisão do texto Lecco França

Fotografias Acervo pessoal dos realizadores e realizadoras Este livro segue as novas regras do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) _______________________________________________________________

Cinema negro baiano / organização Mile Silva...[et al.]. -- 1. ed. -- Salvador, BA : Editora Emoriô, 2021. Vários autores. Outros organizadores: Lecco França, Cintia Maria, Jamile Coelho ISBN 978-65-995422-2-0

1. Cinema - Bahia (BA) 2. Cinema - História 3. Negros no cinema - Bahia (BA) I. Silva, Mile. II. França, Lecco. III. Maria, Cintia. IV. Coelho, Jamile. 21-84041 CDD-791.43098142 ______________________________________________________________________ Índices para catálogo sistemático: 1. Negros : Bahia : Estado : História : Cinema : 791.43098142 Cibele Maria Dias - Bibliotecária - CRB-8/9427

O projeto tem apoio financeiro do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura e da Fundação Cultural do Estado da Bahia - FUNCEB (Programa Aldir Blanc Bahia) via Lei Aldir Blanc, direcionada pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo, Governo Federal. Editora Emoriô Todos os direitos desta edição reservados à Editora Emoriô. Rua das Vassouras, s/n, Centro Histórico, Salvador, Bahia www.editoraemorio.com Instagram: @editoraemorio

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SUMÁRIO APRESENTAÇÃO

CINEMAS NEGROS: DO RECÔNCAVO À KOVA

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CINEMA NEGRO FEMININO BAIANO: ANCESTRALIDADE, ESTÉTICA E IDENTIDADE

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MEMÓRIAS, IDENTIDADES E CULTURAS AFRODIASPÓRICAS NO CINEMA NEGRO BAIANO

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IRUN ORÍ: FIO CRESPO QUE LIGA NARRATIVAS ENTRE ÁFRICA E DIÁSPORA

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DIVINA MEMÓRIA: A RELIGIOSIDADE NO CINEMA COMO UM CAMINHO À ANCESTRALIDADE

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FESTIVAIS, MOSTRAS E CINEMAS NEGROS NA BAHIA: UMA HISTÓRIA EM CURSO

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OLHAR ESTRANGEIRO: A PERSPECTIVA DE UM CINECLUBISTA SOBRE O CINEMA PRETO BAIANO

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ENTREVISTAS

LINHA DO TEMPO DO CINEMA NEGRO BAIANO (PÓS ANOS 2000) CATÁLAGO DE PROFISSIONAIS DO AUDIOVISUAL NEGRO BAIANO

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APRESENTAÇÃO

O livro Cinema Negro Baiano surgiu de um desejo antigo em visibilizar pela escrita as trajetórias e obras de cineastas negros/as/es da Bahia, resgatando e projetando suas memórias, narrativas e histórias, que integram uma parte significativa do cinema baiano, ainda escondida, menosprezada e até mesmo excluída da historiografia hegemônica, além de atualizar os debates teóricos-críticos com conceitos e chaves analíticas condizentes com as particularidades dessas produções audiovisuais. Foi uma grande conquista, e ao mesmo tempo um desafio, reunir, em um prazo tão curto, tantas informações e materiais desses bonitos e tortuosos caminhos trilhados pelos/as/es nossos/as/ es artistas precursores/as do audiovisual negro no Estado. Dividida em quatro partes, a presente publicação é composta por artigos e ensaios escritos por importantes pesquisadores/as brasileiros/ as, entrevistas com profissionais que atuaram e ainda atuam em diferentes momentos da história do cinema negro baiano, pequenas biografias e conjuntos de obras de diferentes profissionais do cinema e uma linha do tempo traçada a partir dos anos 2000. Na primeira seção, intitulada “Artigos e ensaios”, sete textos objetivam trazer discussões teóricas, abordagens temáticas, análises críticas e resumos biográficos. Os/as autores/as colaboradores/as tiveram total liberdade para selecionar os filmes, os cineastas e os tipos de abordagem mais convenientes, estilísticas, formais e analíticas, cabendo apenas aos organizadores/as sugerir possíveis temas, de acordo com a trajetória profissional e de pesquisa de cada pesquisador/a. Em “Cinemas negros: do Recôncavo à Kova”, a pesquisadora Maíra Zenun apresenta uma reflexão sobre os conceitos de cinema negro, a partir de sua trajetória acadêmica afrodiaspórica pela América, África e Europa, sem perder o olhar para a Bahia, esse mundo nosso tão à parte. Já em “Cinema Negro Feminino Baiano: Ancestralidade, Estética e Identidade”, as pesquisadoras Edileuza Penha de Souza e Ana Luiza Maciel Marques exploram as vertentes do cinema negro baiano a partir da perspectiva feminina, com ênfase nas trajetórias das cineastas Urânia Munzanzu, Glenda Nicácio, Jamile Coelho e Safira Moreira. Na sequência, o artigo “Memórias, Identidades e Culturas Afrodiaspóricas no Cinema Negro Baiano”, de Letícia Maria de Souza Pereira, debruça-se sobre o tema das memórias e culturas afrodescendentes na produção audiovisual negra da Bahia, ilustradas especialmente no curta-metragem O dia de Jerusa, da cineasta baiana Viviane Ferreira. Já em “Irun Orí: fio crespo que liga narrativas entre África e a Diáspora”, a

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pesquisadora Evelyn Sacramento analisa como padrões fenotípicos e de estética brancocentrada no audiovisual afetam pessoas negras, em especial mulheres, e analisa o curta-metragem Irun Orí, da cineasta baiana Juh Almeida, uma contranarrativa discursiva que celebra e valoriza as estéticas negras do corpo. Na sequência, o artigo “Divina memória: a religiosidade no cinema como um caminho à ancestralidade”, de Morgana Gama de Lima e Taissa Dias, apresenta uma pertinente discussão sobre a questão religiosa em produções do audiovisual baiano e, mais especificamente, do cinema negro local, analisando diferentes perspectivas e abordagens de manifestações religiosas cristãs e afrodescendentes, em filmes contemporâneos, a exemplo de Café com canela, de Glenda Nicácio e Ary Rosa, e Travessia, de Safia Moreira. Já em “Festivais, mostras e cinemas negros na Bahia: uma história em curso”, a professora e estudiosa Izabel de Fátima Cruz Melo investiga as estratégias de circulação de filmes do cinema negro baiano, a exemplo de mostras e festivais brasileiros, e reitera a importância de eventos locais para a divulgação, fortalecimento e formação de plateias para as produções de cinema negro na Bahia, como a Mostra Ousmane Sembene de Cinema (MOSC) e a Mostra Itinerante de Cinemas Negros Mohamed Bamba (MIMB). Para finalizar essa seção, o cineasta, professor e cineclubista Clementino Junior, no ensaio “Olhar Estrangeiro: a perspectiva de um cineclubista sobre o cinema preto baiano”, relata a importância do seu contato com produções audiovisuais negras da Bahia, na sua atuação enquanto cineclubista e cineasta, e analisa os impactos de políticas públicas para o audiovisual na distribuição do cinema negro produzido no Estado e no Brasil. A segunda parte do livro, “Entrevistas”, reúne quatro entrevistas, organizadas, transcritas e editadas por Lecco França, com personalidades do cinema negro baiano de diferentes fases dessa história: Roque Araujo, Antonio Olavo, Lindiwê Aguiar e Gabriela Barreto. Já a terceira parte, “Linha do Tempo do Cinema Negro Baiano”, organizada por Jamile Coelho, traça uma síntese revisionista de fatos que marcaram uma das fases da história do cinema negro baiano, a da retomada, a partir dos anos 2000. Finalmente, a quarta e última parte do livro, “Catálogo de Profissionais do Audiovisual Negro Baiano”, reúne pequenas biografias e conjuntos de obras de cineastas selecionados/as através de convocatória pública. Uma longínqua e rica história não poderia ser contemplada em apenas uma publicação, o que justifica uma série de nomes e obras que não foram citadas nesse primeiro momento. Esse livro é apenas o começo desse processo de descoberta, retomada e revisitação das narrativas e trajetórias de cineastas negros/as da Bahia que contribuíram significativamente para o mais de um século de cinema no Brasil. Assim, o nosso desejo é que esse projeto possa se disseminar em tantos outros estudos e publicações, a partir de agora, sobre o cinema negro produzido na Bahia.

Lecco França Curador, crítico cinematógrafico e organizador do livro CNB

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CINEMAS NEGROS: DO RECÔNCAVO À KOVA Maíra Zenun Quando o sol penetra no dia dá um dia de sol muito bonito muito belo (Stela do Patrocínio, 2009)

(Longo) Preâmbulo Escrever e ser publicada é, de certa forma, um poder. Poder usufruir da possibilidade de ocupar um espaço e demarcar ideias; suscitar questões, e, quem sabe, provocar ações. E eu, aqui, só estou replicando o que já foi dito. Muitas vezes, e por muitas outras pessoas, que vieram antes de mim e/ ou que caminham comigo. Contudo, e apesar disso, acredite, a força que mais tem me movimentado, e modificado, ao longo desta minha curta trajetória acadêmica, está na responsabilidade dos encontros e das partilhas, e em tudo o que circula em nós, a partir disso. A ideia de circularidade, aliás, ou iyipo1, como um tipo de movimento incessante, necessário e fecundo, está nos saberes relatoriados por Mestre Nego Bispo – quando ele diz que o pensamento quilombola, que o formou, é do tipo circular – com começo, meio e começo; ao contrário do pensamento colonialista, que não circula, por ser vertical e retilínio (SANTOS, 2015). Esta ideia também está presente no filme Òrun Àiyé - A Criação do Mundo (2015), exibido em 2017, na Mostra Internacional de Cinema na Cova – de quem falarei mais adiante –, quando as realizadoras Jamile Coelho e Cintia Maria escolhem o baobá, símbolo de “preservação da memória e da tradição africana” (SOUZA, 2017, p. 425), para povoar o cenário do filme. A árvore, ali, retoma o seu significado, passa a significar esse lugar de encontro, de escuta e aproximação; que “acolhe os vivos e os ancestrais”, e que “mantém a força do patrimônio simbólico expresso, principalmente, por reverenciar a ancestralidade como polo irradiador” (SOUZA, 2017, p. 425) de afetos e sabedorias. Neste sentido, inspirada por conhecimentos muito precisos, e atenta ao que vem sendo dito, eu gostaria de aproveitar o convite que me foi feito a participar do livro Cinema Negro Baiano com um artigo sobre diferentes abordagens conceituais em torno da noção que envolve a publicação; para, de certa maneira, apresentar um breve balanço a respeito do que venho escrevendo desde o início do meu processo doutoral – ciclo investigativo que realizei como aluna do Departamento de Sociologia, da Universidade Federal de Goiás, financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) –, a respeito deste tipo particular de arte, que se auto intitula (ou é chamada) de cinema negro. Tendo em conta todo o trajeto: desde o que suscitou a elaboração do projeto científico, até o trabalho de campo e a escrita da tese, intitulada A Cidade e o Cinema

1 A palavra iyipo, da língua Iorubá, significa circularidade, redondo, em órbita de, ciclo. E diz respeito à noção de movimento em torno do centro ou arco; como algo redondo, que permite expansão e circularidade.

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Filme Òrun Àiyé - A Criação do Mundo (2015) [Negro]: o caso FESPACO2. A verdade é que, ao chegar a este ponto crucial desta minha breve jornada (que culminou na recente defesa do trabalho final e na conclusão do curso), compreendo que esta releitura pode, de alguma forma, contribuir para que este campo de estudos tenha mais e mais ferramentas de reflexão sobre a sua própria história. E, de quebra, acredito que este exercício pode me ajudar a reconhecer, e melhor perceber – do provérbio “se quer saber o final, preste atenção no começo” – certos pontos desta minha caminhada, compartilhada. Para tanto, farei esta retomada em diálogo e também a partir de alguns trabalhos realizados por outras profissionais do campo, a respeito das conquistas e desencadeamentos ocorridos durante os últimos anos de desenvolvimento da noção de cinema negro. Afinal, como procuro trazer ao longo desta revisão, em poucos anos – especialmente nos últimos cinco –, esta categoria analítica sofreu importantes reflexões e colaborações do pensamento intelectual negro. E se, anos atrás, tratava-se de um conceito ainda em processo, “uma forma de tipologia em desenvolvimento” (ZENUN, 2015), ao menos no Brasil, parece que, atualmente, a discussão assentou, ganhou contornos mais precisos, preciosos: uma vez que denegriu3 por completo. E, ao meu ver, isso tem a ver, especialmente, com os seguintes novos cenários: primeiro, com o fortalecimento das redes de discussão e exibição; segundo, com o surgimento de novos espaços de formação técnica, especializada, e a criação de políticas públicas que abriram as portas das universidades para a população negra brasileira durante os mandatos do Partido dos Trabalhadores (PT); 3) e em terceiro, mas especialmente importante, com o envolvimento e protagonismo – imprescindível – de mulheres negras, pensadoras e cineastas,

2 Trata-se de um trabalho resultado, uma escrevivência, em que me propus a ir ao encontro de um dos maiores festivais de cinema africano do mundo, o Festival Pan-Africano de Cinema e Televisão de Ouagadougou (FESPACO), que acontece em Ouagadougou, Burkina Faso, desde 1969. Em 2019, sua 26ª edição, completou 50 anos. A tese foi defendida em abril de 2019, sob a orientação da Profa. Dra. Andréa Vettorassi. 3 A partir da referência do projeto de performance-conversa Denegrir, apresentado em 2019 pelo Núcleo Antirracista do Porto (NARP), que foi inspirado no pensamento do filósofo Renato Nogueira (2011), trago o termo, também ressignificado, como ato de enegrecer práticas e pensamentos, na luta pela ocupação de espaços historicamente negados aos corpos racializados. Sobre o trabalho de Renato Nogueira, ele pode ser consultado através do link: https://www3.ufrb.edu.br/seer/index.php/griot/article/view/500/222.

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sempre e mais ainda, envolvidas com a questão. Mas, atenção, eu não quero jamais dizer com isso, de maneira alguma, que o racismo estruturante do sistema capitalista colonial moderno, vigente (em privilégios e/ou impactos nefastos) nas sociedades contemporâneas, tenha sido superado ou de algum modo parcialmente resolvido. Pelo contrário, o que desejo com o que está aqui proposto, é dialogar com o fato de que, em relação ao tipo de dominação epistêmica em causa, a resistência é uma forma de ação existente desde sempre, contínua; e este legado é também resultado. Os ganhos devem ser reconhecidos e elencados, porque são o fruto, o sumo, e se devem a uma luta incessante e sucessiva, agenciada pelos mesmos corpos-alvo, subalternizados por este atual sistema-mundo (CASTRO-GÓMEZ; GROSFOGUEL, 2007); que é responsável também pelo surgimento e fortalecimento de um movimento como este. “É a arte de botar nome para poder não ser dominado”, como disse Mestre Nego Bispo, ou “se não se nomeia uma realidade, sequer serão pensadas melhorias para (essa) (...) que segue invisível” (RIBEIRO, 2018, p. 41). Por isso, e para ir finalizando este preâmbulo que, de tão grande, pode se tornar exaustivo, quero fazer um último apontamento sobre este fato. Uma vez que isso tudo – sobre denominação, dominação e subalternização –, promove e têm impactos nos modos de sentir, de pensar, de escutar, refletir e, especialmente, relacionar. Tanto que, em termos teóricos e metodológicos, o que apresento aqui é também fruto de acúmulos e ausências registradas durante esta minha escrevivência4, traçada ao longo desta última década, em que tenho estado em diálogo, e venho participando em diferentes espaços de discussão, experimentação, produção e exibição de filmes feitos em referência e em articulação com o tema e a prática da autorrepresentação de pessoas negras no cinema mundial. Algo mais a respeito da questão da representatividade, e da sua concreta necessidade, em oposição às representações, excessivas, que têm sido praticadas – pelo cinema capitalista colonizador –, a respeito dos corpos racializados. Ou seja, poder fazer parte desta tessitura, teve severas implicações sobre o que penso e o que produzo a respeito, como demonstro a seguir.

4 Por questões teóricas exaustivamente defendidas ao longo da tese, a adoção do conceito de escrevivência, de Conceição Evaristo (2017), enquanto metodologia para um trabalho desenvolvido no âmbito das Ciências Sociais, foi fundamental para lidar com os apagamentos e as visibilidades promovidas como forma de conhecimento, e(m) suas diversas redes de produção.



Filme Café com Canela (2017)

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Sobre como as redes fazem o “pulo do gato” Foi na sua quarta edição, no dia 27 de julho de 2018, que o filme Café com Canela teve, senão a primeira, uma das primeiras exibições fora do Brasil, durante a programação da Mostra Internacional de Cinema na Cova – África e suas Diásporas, que acontece desde 2016, como parte da programação do Kova M Festival5, realizado pela população do bairro da Cova da Moura, Amadora, na periferia da Grande Lisboa, em Portugal. Inspirada no FESPACO, no Encontro de Cinema Negro Zózimo Bulbul: Brasil, África, Caribe e Outras Diásporas, do Rio de Janeiro, no trabalho realizado pelas mulheres de Sergipe, com a Egbé - Mostra de Cinema Negro; nas obras da cineasta e pesquisadora Edileuza Penha de Souza, que coordena a Mostra de Cinema Negro Adélia Sampaio; na pesquisa desenvolvida pela historiadora e coordenadora do Fórum de Cinema Negro (FICINE)6 Janaína Oliveira; no surgimento do Coletivo Tela Preta, na Bahia; no cinema produzido pela queniana Ng’endo Mukki; e em tantas outras iniciativas que acontecem mundo a fora, que a Mostra da Cova surgiu, focada em filmes realizados por/para/sobre pessoas negras em todo o mundo. Ao funcionar como um circuito exibitivo independente, a ideia sempre foi a de criar um espaço para realizadores negros e negras, afrodescendentes, africanas e africanos que fazem cinema, cujas obras estão ainda muito invisibilizadas pelo mercado. Enfim, são já alguns anos de um trabalho que é muito de parceria e coletividade, e que já contabiliza um acervo de quase cem filmes exibidos – entre curtas, médias e longas –, dezenas de artistas e pensadores convidados a debater essas obras, além de centenas de pessoas que compuseram a plateia de todas as sessões de cinema e conversa nessa mostra. Mas, o que ou a quem isso interessa diretamente: uma mostra de filmes negros em Portugal, no que se refere ao propósito anunciado para este artigo? O que é sobre este campo de estudos em expansão, cada vez mais fortalecido no Brasil e que tem ganhado novos desdobramentos, especialmente na Bahia, com ênfase no Recôncavo baiano, após a abertura do curso de Cinema e Audiovisual, na cidade de Cachoeira, com mais de uma década de funcionamento (MENDONÇA, 2018)? Digamos que, com o pouco de vivências que tenho acumulado nas perambulações que faço entre congressos, mostras/ciclos/festivais e produções cinematográficas negras que tenho participado, tendo a crer (no sentido de crença, mesmo), cada vez mais e mais, que o cinema precisa ser entendido, percebido, e fortalecido em relação a todas as suas etapas. Especialmente, no que toca a sua circularidade – iyipo. Ocorre que esta leitura ampliada, que faço agora, não foi de todo imediata. Este entendimento, de que pensar a respeito de tudo o que é feito o cinema, e encarar de

5 O Kova M Festival, criado em 2011, assume-se como sendo “uma iniciativa propagadora de cultura, cujo objetivo visa fomentar, no seio da comunidade do Alto Cova da Moura e arredores, uma dinâmica de desenvolvimento social e comunitário, combatendo, desse modo, o estigma que assola o bairro. Visa ainda valorizar e promover o seu património cultural e humano, assim como a sua riqueza étnica, contribuindo para a integração na comunidade onde se insere. Pelas suas sete edições anteriores, o Kova M Festival conquistou um espaço particular na agenda cultural da Amadora. Nas suas últimas edições, cerca de 8 mil pessoas foram mobilizadas, direta ou indiretamente”. A coordenação é feita pela Associação Cultural Moinho da Juventude. Para mais informações, acessar https://www.facebook.com/moinhodajuventude/?rf=420091851427591. 6 O Fórum Itinerante de Cinema Negro (FICINE) é “um espaço de formação e reflexão sobre a produção mundial de cinema, fotografia e audiovisual que tem os/as negros/as como realizadores/as e as culturas e as experiências negras como tema principal. O conceito abrange cinematografias distintas que se estendem dos países africanos às suas diásporas”. Sobre este grupo de pesquisa, registrado na CAPES, consultar o seguinte endereço eletrônico http://ficine.org/oquee/.

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frente um fenômeno social, um processo, veio aos poucos, e é resultado de acúmulos, encontros, leituras, interpretações e práticas. E, mesmo que eu fuja desta emboscada, compartimentalizada, tal fissura por uma interpretação dilatada se deve, a meu ver, a lógica sociológica que dá o grau de todas as lentes que utilizo para enxergar tantas práticas interligadas. Por esta razão, me parece necessário comentar que as leituras que fiz durante a graduação em Ciências Sociais e o mestrado em Sociologia, de autores da Escola de Frankfurt, contribuíram para a forma de olhar sobre, e as escolhas e os entendimentos que fui adquirindo ao longo desse processo. Inclusive em relação a adoção, mais tarde, de novos referenciais teóricos, decoloniais, antirracistas, contra-hegemônicos, para dialogar com o tema. Essa influência marxista logo se vê nos meus primeiros trabalhos acadêmicos sobre os cinemas negros, onde trago uma discussão bastante cautelosa e sociologicamente cientifizada. Contudo, olhando para trás, eu sei que já ali, naquela fase, havia uma preocupação metodológica em enxergar o cinema como uma: (...) extensa gama de atividades que se desdobra em uma prática coletiva. E que acaba por representar a coisa-cinema total em si, a gama. Que tanto é técnica, intelectual, de fruição, metodologia e feitura. Quanto de ocupação político-espacial, ligada também ao consumo e/ou à militância social e política das pessoas. Algo tão complexo, que precisa que se cumpra um espiral de etapas para conseguir se realizar por completo – desde a elaboração, até́ a produção, execução, distribuição e/ou comercialização, exibição, recepção e, por que não, análise dos processos e das obras (ZENUN, 2019, p. 37).

Tanto que, no artigo “Cinema negro – sobre uma categoria de análise para a sociologia das relações raciais”, publicado em duas partes pelo FICINE, em outubro de 2014, trato o termo como uma espécie de instrumento de análise, a ser usado para que possamos perceber também como aconteceu o desenvolvimento deste campo de estudos em particular. Naquela abordagem, a minha intenção era, objetivamente, “problematizar as ideias sobre o cinema negro em forma de categoria analítica” como “uma escolha metodológica [própria] de quem busca pensar a produção cinematográfica de territórios africanos ou diaspóricos”, a partir do que já teria sido escrito e tratado a respeito. A noção de cinema negro que utilizo naquela escrita, foi, portanto, em referência a algumas das rotas traçadas pela expressão “cinema negro”, e na maneira como ela já tinha sido utilizada fora da Academia, em diferentes épocas e locais. Diferentes, sim. Divergentes, nem tanto. Posto que, como busco argumentar no artigo “Cinema Negro Africano: sobre a estética de uma categoria nativa”, publicado no livro AVANCA|CINEMA 2015, o cinema logo foi reconhecido como uma ferramenta importante na reformulação de imagens e discursos (...) ele rapidamente passou a ser percebido como forma de estratégia visual e política, útil e necessária ao processo de ressignificação de velhas construções simbólicas sobre as culturas e identidades negras (ZENUN, 2015).

Ou seja, e este é um dado relevante para o processo de desenvolvimento conceitual do termo: é fora da Academia que ele surge, enquanto tipo/gênero cinematográfico, em sintonia com as principais pautas e agendas das lutas antirracistas no Brasil e no mundo. Quanto ao termo em si, será nessa publicação de 2015 que desenvolvo a ideia de que se trata de: (...) uma categoria nativa em processo; forma de tipologia em desenvolvimento, que ajuda a interpretar certas propriedades específicas a tipos específicos de cinema. O interessante é que esta tipologia vem se transformando juntamente como vem se transformando as formas de representação no cinema das populações negras mundiais. Trata- se, portanto, de um conceito que ajuda

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a encontrar regularidades e avaliar a possibilidade de agrupar obras que parecem semelhantes segundo um dado critério, a fim de construir metáforas que fomentem a representação social de indivíduos e identidades negras (ZENUN, 2017).

Contudo, e é aí que está para mim o grande “pulo do gato”, na medida em que esta nomenclatura vai sendo mote para todo um debate acadêmico a respeito, que vai se desenhando, cada vez mais, em diálogo e em rede, a partir dos anos 1960. Sobre isso, cabe dizer que, exatamente nessa época, o Cinema Novo, que não foi um movimento social negro – muito pelo contrário –, traz a expressão quando vai falar sobre a forma como retrata personagens negras, inaugurando assim, a discussão no Brasil (ZENUN, 2015). Sem resolvê-la, é verdade, pois, como bem descreve a historiadora Janaína Oliveira: na década de 1960 no Brasil, vemos as expressões da vida negra no cinema restritas, em linhas gerais, aos contextos das religiões de matriz africana, da escravidão, da favela, da bandidagem e do samba, que por sua vez tendem a ser apresentados em uma perspectiva depreciativa. A ruptura com este universo representacional acontece em meados dos anos 1970, quando atores negros passam a trabalhar na direção de filmes, realizando aquelas que são consideradas obras pioneiras do cinema negro no Brasil, tal como aponta Noel Carvalho nos estudos que realiza sobre a presença negra no cinema brasileiro (Carvalho 2005, 2006, 2012) (OLIVEIRA, 2016).

Será, portanto, a partir desta época, que algumas questões vão se delineando, vão se tornando mais urgentes, mais concretas e inegociáveis, a respeito do que, de fato, se trata essa prática. Trocando em miúdos, ao reler esses dois textos que escrevi, compreendo que tal categoria nativa, criada no início do século XX, para referir obras/movimentos cuja perspectiva de criação (dos enredos, das estéticas e retóricas) advém da própria população negra – filmes produzidos por pessoas negras, sobre elas mesmas – , ao ser apropriada pela Academia – como ocorreu no meu próprio caso, mesmo sendo eu uma pessoa negra –, é transformada em uma categoria de análise, sobre estas mesmas narrativas que, a partir de 1970, serão exclusivamente autorrepresentadas. Pois bem, então quer dizer que eu estou falando de um encaminhamento, um tipo de desenrolar do termo que foi se dando ao longo do tempo. E que culmina em um entendimento comum, às pessoas que estão estudando e realizando esse cinema. Ou, como descreve Edileuza Penha de Souza: A adesão a esse conceito de cinema negro nos permite identificar então gerações sucessivas de militantes negros e negras que somente foram capazes de demarcar teorias e, consequentemente, ideologias, por meio de suas experiências de vida. Em outras palavras, Cinema Negro é um conceito cunhado na luta diária de combate ao racismo, ao preconceito e toda e qualquer discriminação. É, pois, um conceito corporificado pela militância negra que se finca no território e na territorialidade e nos orienta que é possível transcender da porteira para dentro, pois é nesse processo ‘que os integrantes da comunidade compartilham conhecimentos, sentimentos e emoções comuns, que se estabelecem e se fortalecem os vínculos de aliança e se estrutura identidades’ (Luz, 1992, p. 59) (SOUZA, 2020, p. 178-179).

Ainda a respeito dessa questão, há dois artigos meus que merecem ser rapidamente citados, e que levantam essa discussão. Em 2016, foi publicado o texto “FESPACO e descolonização: sobre o papel do cinema na luta anticolonial em África”, onde apresento “uma breve discussão sobre o papel do cinema na luta contra a colonialidade do saber” (ZENUN, 2016); e, em 2017, o artigo “Cinema Negro

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FESPACO (2019) Africano Decolonial: apontamentos sobre a história de uma luta”, escrito por mim e pela professora Edileuza Penha de Souza, em que estabelecemos uma relação entre o conceito de cinema negro e os contextos de luta por libertação colonial – ambos publicados nos anais AVANCA|CINEMA 2016/2017. Neste último, inclusive, desenvolvemos uma bela analogia, comparando o cinema africano a um baobá, para falar sobre o cinema como um instrumento de transformação, elegido em África e nas diásporas. Se por um lado, em 2016, há um maior enfoque sobre a importância de “descolonizar o pensamento e o olhar sobre o mundo, para enfim conseguir descolonizar a imagem” (NTHIONG, 1986 apud ZENUN, 2016); o trabalho de 2017 vem ressaltar que: a cinematografia africana já nasce negra graças as suas condições primárias de incentivo, que encontraram na luta anticolonial e antirracista (e uma não existe sem a outra), o adubo, a terra e as sementes necessárias para fazer reflorescer o seu próprio conhecimento imagético. O baobá do cinema africano, portanto, seria esta enorme e resistente árvore, que possui um tronco muito grande e alto, e uma copa super extensa, formada por milhares de pequenas ramificações que se abrem ao máximo para fora – mas que estão visivelmente ligadas, truncadas, com uma base comum na resistência ao colonialismo. Afinal, é da força de pensamentos advindos do Pan-Africanismo, do Afrocentrismo e da teoria Decolonial, que o cinema negro africano irá se valer para voltar a contar as suas próprias histórias. Entender-se, inclusive e a partir, como parte de um mesmo campo cinematográfico, resistente aos discursos subalternizantes, é uma das estratégias políticas e de sobrevivência deste cinema feito para a África, e por ela mesma (SOUZA; ZENUN, 2017).

O que estávamos querendo destacar, neste caso, é sobre a importância das redes, pela manutenção e fortalecimento dos processos. Semeadura. E nesse sentido, Janaína Oliveira, em relação ao cinema brasileiro também vai reforçar esse entendimento, como nós, retomando o mesmo fio da meada, ao dizer que: Há poucos anos atrás falar em cinema negro no Brasil era falar de um projeto em construção. Um projeto que, articulado as lutas históricas dos movimentos negros, demandava por mudanças na representatividade negra dentro e fora das telas de cinema, tal como ocorreu em outros países da diáspora (OLIVEIRA, 2016).

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Abordando a mesma discussão lançada por Edileuza Penha de Souza, em sua tese Cinema na panela de barro: mulheres negras, narrativas de amor, afeto e identidade (2013), Janaína Oliveira afirma ainda que: Vale a pena ressaltar, mesmo que a título de ilustração, que estas jovens mulheres negras se posicionam firmemente nas querelas acerca da representatividade no setor audiovisual brasileiro. Fazem-no com embasamento histórico, cinematográfico e conhecimento de políticas públicas. Estamos presenciando o florescimento de uma geração que tem fortes possibilidades de alterar, de um modo geral, o status atual das representações da população negra no audiovisual, e das mulheres negras de forma específica (2016, OLIVEIRA).

Um outro dado importante para este processo está, portanto, no resultado de décadas de organização e militância, como eu já havia anunciado, por acesso a políticas públicas no setor do audiovisual. Processo de reivindicação formalmente inaugurado pelo “Manifesto de Recife” (ZENUN, 2014), lançado em 2001, durante a 5ª. edição do Festival de Cinema de Recife, em que um grupo de profissionais da área aponta a necessidade de ações afirmativas e de incentivos: “Atualmente, após praticamente quatro décadas de existência, o cinema negro nacional finalmente ganhou então forma e corpo, despontando na força de um movimento. E este movimento é incontestável” (OLIVEIRA, 2018). Portanto, se em 2016, Janaína Oliveira faz menção a um processo em vias de, em 2018, a autora retifica a sua própria elaboração, afirmando que, de todas essas discussões levantadas, surge enfim um movimento que será, sem dúvidas, resultado e fruto do caminho trilhado por muitas e muitos que vieram antes. O que não pode deixar de ser dito, mais uma vez, é o fato de que houve, entre os anos de 2003 e 2014, a implementação de propostas e iniciativas descentralizadoras de incentivo à cultura no país, e essa nova política de Estado foi fundamental para começar a transformar o setor. No caso especial da Bahia, além da inegável força feminina que impulsiona esta frente, e de onde somos presenteadas, por exemplo, com obras como o já mencionado Òrun Àiyé: a criação do mundo (2015), Cinzas (2015), de Larissa Fulana de Tal, e o próprio Café com Canela (2017) – filmes que foram exibidos na Mostra de Cinema na Cova – , há uma série de conjunturas que propiciam o florescimento do setor na Bahia, impulsionando o fortalecimento social e econômico da região, além de potencializar a criação de novos olhares sobre a própria população local, majoritariamente negra. Eu mesma, devo a minha trajetória a estas conquistas. Cabe lembrar que o meu percurso sobre o tema, e a prática, de um cinema negro, foi iniciado lá nos idos dos anos 2008, quando descobri o trabalho da professora Edileuza que, por conta das ações afirmativas implementadas na Universidade de Brasília, ministrava o curso Cinema Negro. Foi nessa mesma época que tomei conhecimento sobre o FESPACO, e, desses dois encontros, saí fortemente motivada pela vontade de perceber – o que é, onde acontece, como acontece, por que acontece, por que assim se intitula, o que significa e por que significa – este tipo, específico, esta variante, conjugada e plural, de fazer e pensar cinema, que está sempre em relação e/ou referência a alguma problemática socioeconômica, estrutural, inaugurada e estabelecida pelo racismo colonial. Hoje, percebo que, na época em que comecei a delinear a análise pretendida e escrever sobre o assunto, o meu interesse girava mais em torno da aparição, e consequente desenvolvimento, da expressão cinema negro. Mais até, inclusive, do que propriamente no que diz respeito às formas de realizar/desenvolver/fazer circular essa arte, enquanto processo e resultado de relações de produção estabelecidas sob o parâmetro da colonialidade. Hoje em dia, depois de tantos caminhos, tantas voltas, percebo que me interesso muito mais

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sobre como a forma de fazer, no tocante às relações sociais postas em prática, se realiza em arte e transforma a sociedade. Muito mais, do que propriamente, no que concerne às elaborações intelectuais a respeito do tema. E será, talvez, por esta razão que, para começar um novo ciclo, e encarar sem arestas os próximos passos, encerro este capítulo da minha jornada doutoral, digamos assim, com esta breve leitura sobre como o conceito de cinema negro foi sendo tratado nos últimos anos, a partir de alguns trabalhos contemporâneos ao meu próprio processo de pesquisa, e que foram aqui mencionados. Ao adotar esta estratégia, assim repetitiva, assim circular e tão pessoal, pretendi que esta análise nos levasse, pelas mãos, ao entendimento do porquê, ao passo que a ideia sobre este campo se denegriu, a sua atuação e performance indubitavelmente “refletem as subjetividades estéticas e discursivas inerentes às populações negras afetadas pela herança racista do escravismo colonial” (ZENUN, 2014). Ocorre que, tendo em conta que os percursos se desviam, que os caminhos se entrelaçam, e que, por vezes, os objetivos se desalinham, se reorganizam e traçam novas rotas, amparadas em outras estratégias, por novos conhecimentos ou práticas; adianto que, o processo instaurado lá atrás, no início desta busca in continuum, sobre o entendimento de um determinado cinema-arma – prático e cognitivo – alicerçou o surgimento de outras percepções, assim que muitas outras vozes se somaram a um percurso que nunca foi solitário ou surdo. Tanto que, ao longo do caminho trilhado, fui também me voltando para as tensões estéticas referentes à presença/ausência de pessoas negras na equipe de produção, para além da questão da presença nas telas – ou sobre, de que maneira, a representatividade, poderia vir a garantir formas de representação menos estereotipadas. Uma vez que, “um cinema feito como ato político, portanto, será aquele que tocará em muitos pontos” (ZENUN, 2020, p. 107) e “desta turma, de pessoas fazedoras de histórias de cinema; histórias que contam sobre fluxos e descendências e memórias, sobre corpos contra o sistema, em resistência, resistindo, friccionando, interpelando e desconstruindo” (ZENUN, 2020, p. 102-103). Há muitas, há várias. Asè!

Filme Cinzas (2015) 16

Re-começo Na intenção de apresentar aqui um apanhado do que foi sendo elaborado sobre o conceito de cinema negro ultimamente, em diálogo especial com as autoras Edileuza Penha de Souza e Janaína Oliveira – que acompanharam de perto o meu processo de pesquisa e estiveram na minha banca de Doutorado –, estou certa de que muita coisa ficou de fora e uma série de aspectos sobre a questão mereceriam ainda uma atenção mais atenta e pormenorizada. Afinal, não se pode falar de tudo, mesmo que se queira, quando escrevemos sobre algo. E mesmo quando desejamos apresentar um trabalho inequívoco e completo, eu mesma já não acredito nisso. E que bom poder mudar de opinião, encontrar novos aportes, novas respostas... escoar para outros rios. A verdade é que, quando algo que escrevemos se torna um texto público, as interpretações – e que bom que é assim – serão sempre as mais diversas. O que eu percebo, olhando em volta, é que muito do que temos dito, tem servido de semeadura para o que está sendo pensado e acontecendo. Daí a necessidade de reconhecer o tamanho da responsabilidade em participar – como alguém que (ainda) está em um processo de aprendizagem – dessa costura. É por esta razão que eu gostaria muito de fechar esta porta, abrindo uma nova janela: para que esta conversa não cesse, assim como a produção urgente de muitos filmes negros, que nasceram de tantas trocas. Iyipo, eu repito. Porque é fundamental estar em rede! E também porque, como já foi trabalhado pela professora Edileuza Penha, é importante levar em conta que fazer e pensar sobre filmes negros significa adentrar em uma dinâmica e atmosfera super complexa, resultado da interação entre realizadores, criadores, pensadores e espectadores, em uma menção direta à Teoria dos[as] Cineastas (SOUZA, 2017). A questão é que a bibliografia sobre os cinemas negros7 – dito aqui no plural – feitos no Brasil e no mundo é já bastante extensa, mas de maneira nenhuma concludente. Por se tratar de um processo em expansão muito veloz, e pelo fato de algumas peças estarem sempre se rearranjando ao longo desse rastilho – por conta da relação política já detectada sobre o cinema funcionar como gatilho para a consolidação de novos referenciais culturais e estéticos –, me arrisco a voltar àquela sessão na Cova da Moura, quando Café com Canela foi exibido, e ovacionado, para reafirmar a importância das relações que estão sendo estabelecidas, no encalço desta história. Ter a oportunidade de conhecer e participar da cena que dá corpo a esses cinemas fora do Brasil (em especial na Europa Ocidental e nos países africanos que estão sendo representados no FESPACO), me fez perceber como mulheres negras, em especial àquelas da diáspora europeia, tem produzido um cinema interventivo e pulsante, se valendo de referências adquiridas a partir do diálogo com filmes, debates e estruturas de produção estabelecidas no Brasil, na Bahia, e no Recôncavo baiano, mais especificamente. Portanto, para um próximo momento desta minha trajetória intelectual, pretendo continuar a me debruçar sobre a questão da autorrepresentação – uma vez que a questão é política, mesmo, e de sobrevivência –, pensando ainda no que precisamos fazer a seguir, depois de constatar que o movimento já existe, porque o racismo e a sua estrutura, também.

7 Nunca é demais lembrar que, ao falar de filmes negros feitos por todo o mundo, pretende-se destacar um tipo de cinema-outro plural, feito da arte de tornar visível o que o cinema branco (que se autodefine universal) procura, por opção político-estratégica, sistematicamente invisibilizar e desumanizar sujeitos, através da reiteração de interpretações racistas sobre sociedades que foram (estão) colonizadas, em suas mentes, corpos e instintos (ZENUN, 2019).

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Referências bibliográficas CASTRO-GÓMEZ, Santiago; GROSFOGUEL, Ramón. El Giro Decolonial: Reflexiones para una Diversidad Epistêmica más Allá del Capitalismo Global. Bogotá: Siglo del Hombre Editores; Universidad Central, Instituto de Estudios Sociales Contemporáneos y Pontificia Universidad Javeriana, Instituto Pensar, 2007. MENDONÇA, Tatiana. Curso de cinema de Cachoeira faz 10 anos com produções premiadas. Matéria do Jornal A TARDE, disponível em https://atarde.uol.com.br/muito/noticias/2000651-curso-de-cinema-de-cachoeirafaz-10-anos-com-producoes-premiadas. 2018. OLIVEIRA, Janaína. “Kbela” e “Cinzas”: o cinema negro no feminino do “Dogma Feijoada” aos dias de hoje. In FLAUZINA, Ana; PIRES, Thula (org.). Encrespando (ONU, 2015-2024). Brasília: Brado Negro, 2016, p.175-198. SOUZA, Edileuza Penha de. Mulheres negras na construção de um cinema negro no feminino. Aniki, vol.7, n.o 1 (2020). SOUZA, Edileuza Penha de; ZENUN, Maíra. O Cinema Negro Africano Decolonial: apontamentos sobre a história de uma luta. AVANCA|CINEMA 2017. Edições Cine-Clube de Avanca: Portugal, 2017. SOUZA, Edileuza Penha de. Cinema na panela de barro: mulheres negras, narrativas de amor, afeto e identidade. Tese (Doutorado). Universidade de Brasília, Programa de Pós-graduação em Educação, 2013. ZENUN, Maíra. Feliz, cidade, Félicité? - ou notas breves sobre um filme anticolonialista. Africanidades – Revista do MAFRO. Edição 1, novembro de 2020. Disponível em: http://www.mafro.ffch.ufba.br/sites/mafro. ffch.ufba.br/files/africanidades_revista_do_mafro_numero_um_1.pdf. ZENUN, Maíra. A Cidade e o Cinema [Negro]: o caso FESPACO. - Universidade Federal de Goiás, Faculdade de Ciências Sociais (FCS), Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Goiânia, 2019. ZENUN, Maíra. Cinema Negro: sobre uma categoria de análise para a sociologia das relações raciais. Site Fórum Itinerante de Cinema Negro. 2014. Disponível em: http://ficine.org/?p=1097. ZENUN, Maíra. Cinema Negro Africano: sobre a estética de uma categoria nativa. AVANCA|CINEMA 2015. Edições Cine-Clube de Avanca: Portugal, 2015. ZENUN, Maíra. FESPACO e descolonização: sobre o papel do cinema na luta anticolonial em África. AVANCA|CINEMA 2016. Edições Cine-Clube de Avanca: Portugal, 2016. ZENUN, Maíra. Sobre a colonialidade do pensamento em imagens e a reinvenção da negritude no FESPAÇO: maior festival de cinema africano. Rebeca - Revista Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual, vol. 5, n.2, Jul-Dez. 2016.

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CINEMA NEGRO FEMININO BAIANO: ANCESTRALIDADE, ESTÉTICA E IDENTIDADE Edileuza Penha de Souza Ana Luiza Maciel Marques Me equilibro na linha do infinito Não sei se caio ou se fico Sou dona de um peito apertado Atado em desejos infindos Motor de pernas e braços Corro devagar Porque meu tempo é outro O que eu quero é logo (“Na Beira” - Luedji Luna) Do ponto de vista colonialista, o Brasil nasceu na Bahia. No entanto, sabemos que aqui já habitavam cerca de até dez milhões de indígenas. E que esses, sim, são os verdadeiros donos do país. É lamentável que a política de extermínio das nações indígenas esteja a todo vapor e se agrava com o atual governo, pois como afirma Ailton Krenak: Essa tensão não é de agora, mas se agravou com as recentes mudanças políticas introduzidas na vida do povo brasileiro, que estão atingindo de forma intensa centenas de comunidades indígenas que nas últimas décadas vêm insistindo para que o governo cumpra seu dever constitucional de assegurar os direitos desses grupos nos seus locais de origem, identificados no arranjo jurídico do país como terras indígena (KRENAK, 2019, p. 20).

É em estado vizinho à Bahia que desembarcaram os primeiros negros e negras da perversa colônia1 e juntos, índios e negros vão inaugurar o que podemos ainda chamar de Brasil. Embora não seja objetivo deste artigo compreender a história de civilização e desigualdades, entender que nas regiões Norte e Nordeste está concentrada a população indígena e que a Bahia é a unidade da federação mais negra do Brasil nos ajuda a entender porque o cinema negro brasileiro nasceu na Bahia, com aqueles e aquelas que participaram de um dos mais importantes processos de luta e resistência contra o regime escravocrata, a Revolta do Malês2.

1 Segundo historiadores, os primeiros escravizados africanos chegaram no Brasil pela Capitania de Pernambuco, entre 1539 e 1542. 2 Revolta, ocorrida em 1835, de trabalhadores e trabalhadoras escravizados/as, em sua maioria, muçulmanos, como cravado na expressão malê, que na língua iorubá significa imalê ou muçulmano. Sobre o assunto, leia: “Ganhadores: A greve negra de 1857 na Bahia”, de João José Reis.

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Cineasta Camila de Moraes Ao defender que somente é possível pensar em cinema negro no Brasil, a partir dos movimentos de resistências negra, Edileuza Souza (2013) destaca aqueles em que o letramento foi elemento fundamental para a organização do Movimento Social Negro (MSN) antes e após a assinatura da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888. E, se anteriormente a essa data fatídica, a luta era por liberdade, após maio de 1888, negros e negras passam a reivindicar o direito à educação formal. Entende-se que essa reivindicação tinha e tem não apenas o objetivo imediato da pauta em questão, mas sobretudo se baseia na crença de que o acesso à educação formal era e é potencial semente plantada para o futuro de transformação e inclusão da população negra na sociedade brasileira (SOUZA, 2013). Essa compreensão de mundo se materializa na urgente e necessária redistribuição de políticas públicas de qualidade, onde saúde, educação, trabalho, moradia, segurança e o bem viver sejam direito de todas as pessoas e não apenas de algumas. Junto à pauta específica de gênero e raça, é essa demanda que nos possibilita a afirmação de que o Cinema Negro Brasileiro (CNB) somente é possível no presente, porque historicamente esteve adicionado na luta por educação do povo negro. Nessa perspectiva, este artigo tem por objetivo contextualizar o Cinema Negro Feminino Baiano, como um dos frutos e vitória de nossa ancestralidade africana. No Oceano Atlântico repousam nos braços de Iemanjá3 todos que por muitas razões não suportaram a travessia. Aqui chegaram aqueles e aquelas que bravamente lutaram pela vida e fundaram a maior nação negra fora do Continente Africano. Portanto, é fundamentalmente necessário compreender

3 Orixá das águas salgadas, é considerada a mãe de todos os orixás. Na Bahia, é também conhecida como, Inaê, Janaína, Princesa do Aiocá ou Arocá, Princesa do Mar, Rainha do Mar, Sereia do Mar.

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Cineasta Eliciana Nascimento a crença na ancestralidade como responsável pela existência da população negra, ou seja, nossos ancestrais que atravessaram o oceano nos legaram o bem maior, a vida. Acreditar nessa dádiva foi o que os permitiu chegar até aqui, que pudéssemos reconstruir suas memórias, territorialidades e identidades; e à vista disso, na contemporaneidade, entender que o Cinema Negro no Feminino somente é possível por conta desses três pilares. Nosso objetivo inicial era firmar o reconhecimento das cineastas Camila de Moraes, Cintia Maria, Eliciana Nascimento, Glenda Nicácio, Jamile Coelho, Larissa Fulana de Tal, Pamela Peregrino, Safira Moreira, Urânia Munzanzu e Viviane Ferreira como diretoras negras que consolidam o Cinema Negro Baiano no Feminino, e trazer informações que diretamente conectassem suas produções fílmicas a suas ancestralidades individuais e coletivas, sempre presentes em suas lentes, a quem dedicam cuidados que corporificam um cinema de técnicas, emoções, estética, afetividade e compromissos, prenhe de valores de territorialidade e comunalidade. No entanto, o prazo exíguo para apresentação do artigo, agendas lotadas e sobrecarga de trabalho nos impuseram escolher dentre esse grupo de expoentes do Cinema Negro Baiano no Feminino as cineastas Jamile Coelho, Glenda Nicácio, Safira Moreira e Urânia Munzanzu, pautadas pela aproximação afetiva com elas. Ao longo da escrita, trocamos mensagens adentrando questões muito mais pessoais e íntimas do que sobre seus filmes e suas carreiras, estas cujas narrativas estão mais facilmente disponíveis a consultas pela internet. Contamos, assim, com a generosidade de cada uma na partilha de suas histórias, memórias e tempo, sem o que este artigo jamais seria possível, e as torna, junto conosco, coautoras deste texto.

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Cinema Negro Baiano no Feminino Uma matéria publicada na internet, em janeiro de 2021, de autoria da jornalista Ana Paula Orlandi, inicia-se com a seguinte afirmativa: “A cineasta brasileira é branca, de classe social abastada e vive na região Sudeste, onde estão concentradas cerca de 80% das empresas produtoras de filmes no país” (ORLANDI, 2021). A união de gênero e raça confere ainda mais perversidade aos dados apresentados, como constatam as pesquisas realizadas desde 2014 pelo Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa4 (GEMAA), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). A pesquisa “A cara do cinema nacional: gênero e cor dos atores, diretores e roteiristas dos filmes brasileiros” (20022012) constata a exclusão de mulheres negras do cinema nacional. O estudo, coordenado por Márcia Rangel Cândido e Luiz Augusto Campos, desenvolveu uma análise quantitativa dos filmes nacionais de maior bilheteria entre 2002 e 2012, constatando que nenhum deles foi roteirizado e/ ou dirigido por cineasta negra (SOUZA, 2020). Essas pesquisas vinham orientando políticas públicas para o setor do audiovisual brasileiro que até 2016 movimentava mais de 20 bilhões de reais por ano, 1,67% do PIB brasileiro. A invisibilidade de diretoras negras reforça ainda mais as desigualdades no mercado do audiovisual brasileiro. Neste sentido, apresentar algumas das diretoras, roteiristas, negras e baianas passa

4 Criado em 2008, o GEMAA é um núcleo de pesquisa sobre ações afirmativas, atualmente tem focado seus trabalhos na representação de raça e gênero na política e no jornalismo, cinema, telenovelas, revistas, videogames e outros. O Grupo acaba de lançar o artigo “Gênero e raça no cinema brasileiro”, disponível em: .

Cineasta Larissa Fulana de Tal

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também por demarcar um lugar de existência. Sim, existir, como um dote que herdaram de suas ancestrais, afinal: “Carolina Maria de Jesus sonhou em escrever, Adelia Sampaio sonhou em fazer filmes, Clementina de Jesus sonhou em fazer música. Mulheres Negras que como nossas mães e avós sonharam que poderíamos realizar e concretizar desejos de fazer o que quiséssemos” (SOUZA, 2020, p. 9). E, se sabemos pouco sobre o Cinema Brasileiro realizado por mulheres, negros e indígenas, menos ainda sabemos quando reunimos gênero, raça e etnia em um só lugar, como é o caso de cineastas negras e indígenas. Atentas a esse fato, nossa escolha por apresentar um pequeno número de mulheres negras do cinema negro baiano passa também por entender que suas construções fílmicas consolidam a ascendência espiritual e familiar presente em suas lentes. Essas cineastas nos apresentam técnicas, emoções, estética, afetividade e compromissos de um cinema que fala de vida e pertencimento, um cinema que conta nossas histórias com respeito. Astuciosas, criativas e sensíveis, essas diretoras negras norteiam seus filmes a partir de valores sedimentados na territorialidade e na comunalidade negra que herdaram de suas ancestrais. Pautamos aqui o Cinema Negro Baiano no Feminino a partir de três perspectivas. A primeira, das cineastas que nasceram na Bahia e que, mesmo ganhando projeção internacional, permanecem na cidade, como é o caso de Cintia Maria5, Jamile Coelho, Larissa Fulana de Tal6 e Urânia Munzanzu. A segunda, daquelas que nasceram na Cidade de São Salvador e por razões pessoais e profissionais moram em outro estado, ou mesmo em outro país, como é o caso de Eliciana Nascimento7, Viviane Ferreira8 e Safira Moreira. A terceira representação do Cinema Negro Feminino Baiano é dada por aquelas que não tiveram o privilégio de nascer na Bahia, mas que lá encontraram o porto seguro de suas identidades e foram adotadas pelo cinema baiano. Essas cineastas estão aqui representadas por Camila de Moraes9, Glenda Nicácio e Pamela Pelegrino10. Dadas as condições já mencionadas, buscamos trazer pelo menos uma representante de cada segmento que representa o Cinema Negro Feminino Baiano.

5 Idealizadora e gestora da Nubas, Estandarte Produções. Diretora da animação Òrun Àiyé - a criação do mundo (2015), Corações Encouraçados (2019), Limbo (2021) e das webséries documentais Circuito Negro (2018) e Aqualtunes (2018). 6 Diretora dos curtas Axé (2012), Lápis de Cor (2014) e Cinzas (2015). Nasceu em Salvador, Bahia. Graduanda do curso de Cinema e Audiovisual da UFRB, é realizadora no movimento de cinema negro Tela Preta. 7 Mestra em Cinema MFA (Master of Fine Arts) pela San Francisco State University - EUA. Entre sua produção está o filme O tempo dos Orixás (2015) gravado em Salvador. Cineasta, negra, baiana, antes de morar nos Estados Unidos, fundou a Candace Cine Video, empresa de produção cinematográfica e fez coprodução do documentário Insurreição Rítmica (2008). Atualmente trabalha na Califórnia como produtora e editora de comerciais de vídeos corporativos, enquanto prepara seu primeiro longa. 8 Mestra em Políticas de Comunicação e Cultura pela Universidade de Brasília (UnB). Cineasta e advogada de formação, é uma das fundadoras do Odun Produções onde dirigiu Peregrinação (2014) e Dê sua ideia, debata (2008); os videoclipes D’origem Africana (2013) e Amor ao Rap (2012). Seu trabalho de destaque foi O dia de Jerusa (2014). Acabou de lançar seu primeiro longa-metragem Um dia com Jerusa (2019). É a atual presidente da SPCINE. 9 Jornalista, gaúcha, nascida em Porto Alegre, graduanda no curso de Bacharelado Interdisciplinar em Artes da UFBA, Camila dirigiu o documentário de longa-metragem O Caso do Homem Errado (2017). Adotou e foi adotada pela Bahia. 10 Professora Assistente da Universidade Federal do Sul da Bahia (CSC/Porto Seguro), Pâmela é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde pesquisa relações entre a cenografia, o cinema de animação em stop motion, o teatro de formas animadas, expressões visuais de comunidades tradicionais de povos de terreiros e intercruzamentos entre educação, imagem e cena. Entre suas animações está o filme Òpárá de Òsùn: quando tudo nasce (2018).

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Cineasta Urânia Munzanzu

Urânia Munzanzu: “O tabuleiro de acarajé das minhas avós e tias-avós e minha câmera são duas ferramentas de luta política interligadas e de continuidade das nossas existências” A cineasta Urânia Munzanzu provém de uma família do subúrbio de Salvador, das palafitas do bairro do Uruguai. Sua mãe, a mais velha das filhas, ajudou sua avó a erguer a primeira casa da família. “A primeira casa que elas tiveram, que minha avó teve no chão, foi minha mãe que ajudou a aterrar numa área na Massaranduba. Foi lá que elas construíram a primeira casa” (MUNZANZU, 2021). Dona Sonia de Oliveira Rodrigues, sua mãe, é hoje uma mulher aposentada, mas tal como as mulheres comerciantes do continente africano, a vida inteira trabalhou como sacoleira. Renegando suas origens, atualmente boa parte de sua família materna é evangélica, mas a matriz materna de Urânia vem do terreiro Ilê Axé Opó Afonjá, um dos terreiros mais antigos de Salvador, onde sua avó foi iniciada por Mãe Senhora11. A família de seu pai, seu Werico Rodrigues da Silva, veio do Pelourinho, onde todos da família se mantêm no Candomblé. Da infância, Urânia guarda muitas lembranças, e recorda da tia Marlene, mãe de santo do Terrreiro Ilé Ibirin Omi Axé Ayira, mais conhecido como Vintém de Prata. Recorda as histórias que ouvia sobre sua bisavó, uma mulher negra proprietária de uma barraca no Mercado do Ouro, onde vendia comida para os estivadores. Sua bisavó paterna fundou junto com as irmãs um Terreiro na Liberdade. A roça ainda existe e ficou por muitos anos aos cuidados de um famoso babalorixá conhecido como Mário Malvadeza. Atualmente a casa está aos cuidados de uma prima do seu pai. A cineasta abre suas memórias com as recordações da avó paterna, com quem conviveu até os 13 anos, lá no Pelourinho. Sua avó era baiana de acarajé. Seu pai, “um ponto fora da curva”, era auditor fiscal do antigo Banco do Estado da Bahia (BANEB), tinha um bom emprego, e como muitos dos nossos, desde muito cedo 11

Maria Bibiana do Espírito Santo (1890 - 1967) foi a terceira Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá em Salvador, Bahia.

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se tornou arrimo de família. Mestre em Antropologia, jornalista, moradora do bairro Dois de Julho12, Urânia nunca tinha cogitado ser diretora de cinema, até que um dia uma moradora em situação de rua lhe encomendou um filme: Quem me dá essa profissão foi uma mulher moradora de rua daqui. Ela me pediu para fazer [um filme] sobre ela. E até então, eu nunca pensei [pausa] nunca pensei sobre isso, nunca nem imaginei, nunca sonhei que isso seria possível. Na verdade, foi essa mulher que enxergou isso, me deu um filme, me deu uma história para contar. No começo, eu resisti muito, mas ela me convenceu, daí comecei o Projeto. Comecei sem escola de cinema, sem ter aparentemente ferramentas. Sei que essas ferramentas também podem ser adquiridas por outros caminhos, como foi o meu. Acho muito bacana, louvável, essa geração mais nova que encontrou a escola de cinema. Eu tenho 48 anos, não fui para a escola de cinema, porque não tinha, nem aqui na Bahia. Eu não tinha como estudar fora da Bahia, eu não tinha essa possibilidade. Então eu fiz Jornalismo e o cinema chegou na minha vida pelos caminhos de Exu. Não teve um plano, o cinema, se impôs como uma ferramenta política possível para mim e eu abracei… (MUNZANZU, 2021).

Dona da expressão, que toma emprestado de outras intelectuais negras, Urânia codifica seu Cinema de Cozinha13 como um cinema negro feminino, e explica: É ali [na cozinha] que você alimenta o corpo, mata a fome. E essa coisa da fome também está muito ligada à nossa constituição enquanto diáspora. A fome sempre foi uma coisa que nos acompanhou. Então é ali na cozinha que você aplaca a fome. Que você, enfim, se dê conta disso. [De] amenizar essa dor, que a fome traz. Assim, a fome em muitas dimensões, não uma coisa só do corpo, é na cozinha que você começa a engendrar uma forma de manter a ancestralidade viva. Porque todo o movimento que você faz dentro do candomblé, dentro do culto à ancestralidade, qual é o motivo? É alimentar o Ori, é alimentar o santo. É para isso que você faz santo, é para isso que você vai para o Candomblé, é para isso (MUNZANZU, 2021).

Para Urânia, todas as mulheres negras – entre as quais se inclui – que hoje fazem cinema, estão abrindo trincheiras no audiovisual. Porque, ao contrário das muitas referências que se tem hoje, elas não encontraram espelhos e explica: “Não tinha mulher preta fazendo cinema em posições de decisão e de destaque ou ocupando espaços que pudessem influenciar na produção das narrativas. Tem algumas produtoras, algumas pessoas que fazem produção, mas dirigindo, roteirizando. Posso estar falando aqui uma coisa que não procede, mas eu não conheço daqui da Bahia, daqui de Salvador”. E se é na cozinha onde ela encontra seus alimentos ancestrais, é da literatura negra baiana que ela se nutre. Juntos a cozinha e a literatura compõem sua existência e sua inspiração artística: As minhas referências maiores estão na literatura negra, então todo meu repertório que alimenta no cinema que eu tenho como referência de narrativa está na literatura negra. Eu posso citar um monte de gente que já tá produzindo aqui há algum tempo: Poetas de bloco afro, como Buziga, posso falar de Ilê, 12

É um bairro tradicional de Salvador localizado próximo ao centro. A data é alusiva à vitória sobre as forças coloniais na guerra de independência, que expulsaram os portugueses de Salvador. Dois de julho está na constituição estadual da Bahia como uma data magna do Estado. 13 Grifo das autoras.

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de Jonatas Conceição, dos Poetas que produziram no universo de musicalidade do bloco afro que também foram para escrita, então aí tem Fábio Mandingo que é uma referência grande para mim. Basicamente está na literatura como Lívia Natália etc., posso dizer que são referências para as minhas produções. Para pensar a forma e cor sem sombra de dúvidas as minhas memórias do Pelourinho, da minha Infância, adolescência e Juventude no pelourinho. Todas as pessoas com quem eu convivi e muitas delas não estão mais aqui, nenhuma delas teve uma câmera na mão e puderam contar suas histórias através da imagem em movimento como eu posso fazer, mas elas também faziam cinema todo tempo e me deram grandes referências. Essas são minhas referências assim políticas estéticas para eu produzir.

É na sua dissertação de Mestrado, recém-defendida, que Urânia descreve todo o processo do filme Merê (2017). Filme que marca um momento ímpar na sua trajetória de cineasta, pois foi a primeira travessia até o continente africano. Ao entender que desde muito cedo produz narrativas, vai se dando conta que seu cinema nasceu muito antes dela se entender como roteirista e diretora. A dissertação serviu para compreender que seu cinema está fincado em sua família. Ao finalizar o último capítulo reverenciando suas avós, pessoas que lhe proporcionaram todos os alimentos do “cinema de cozinha”, Urânia Munzanzu compreende que ali na cozinha de suas avós se traçava o que estava determinado no seu caminho: fazer filmes para contar as histórias dos seus, “fazer filme para fazer política de insurgência negra feminina”: Acho que recebi de ‘voinha’ o repertório para contar sobre nós. O cinema, eu recebi de Rilda, do povo da rua que sempre esteve com minhas ancestrais, quando elas vendiam nas ruas da cidade. O tabuleiro de acarajé das minhas avós e tias-avós e minha câmera são duas ferramentas de luta política interligadas e de continuidade das nossas existências de mulheres negras (Munzanzu, 2021).

Desse modo, ao aprender a fabricar sonhos e possibilidades, ela, foi, inclusive, aspirando à profissão de cineasta como mais um ofício que recebeu de sua avó.

Cineasta Urânia Munzanzu 26

Cineasta Glenda Nicácio

Glenda Nicácio: “Fazer cinema é como fazer pipocas de chocolate” Nascida em Poços de Caldas, Minas Gerais, filha de operários, seu pai, Rafael Nicácio Neto, trabalhava em uma fábrica, e sua mãe, Magali Custódio Nicácio, labutava em um restaurante. Da infância, Glenda guarda muitas lembranças afetivas, do quanto seus pais foram elementares na sua formação, na profissional que ela se constituiu. Seus pais residiam no quintal da casa de sua avó paterna. Então, por várias vezes, quando estavam no trabalho, era sua avó, dona Milza Aparecida Mendes Nicácio, quem a levava para creche e muitos outros passeios. “Eu era a companheira de minha avó, para ir viajar, pegar ônibus e fazer farofa [risos]”, afirma Glenda. Mesmo com as modestas condições financeiras, seus pais sempre se esforçaram para levá-la para os lugares: Não éramos muito de viajar por causa do orçamento, mas íamos muito para a praça tomar sorvete aos domingos, acho que por isso eu quero tanto aproveitar os domingos, aprendi com eles. Nas manhãs de domingo íamos todos assistir teatro na praça e um cineclube no Instituto Moreira Salles, de Poços de Caldas (NICÁCIO, 2021).

Essa compreensão a levou a refletir sobre o quanto é significativo crescer sob proteção e o que isso fornece positivamente à vida adulta de todas as pessoas, ainda um privilégio para negros e negras. Ao narrar o quanto seus pais e sua avó foram elementares para a sua descoberta do novo, ela, emocionada, é tomada por lembranças afetivas. Lembra do quanto seus pais confiaram e confiam nela. Glenda ingressou no mercado de trabalho muito cedo, aos 17 anos:

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Nesse período que eu tinha feito o Sisu14 para a UFRB15, minha família estava muito desestruturada em relação a dinheiro. Meus pais estavam desempregados e eu tinha minha irmã, que é oito anos mais nova que eu. Eu estava trabalhando, na época, em uma sapataria. Eu acho que foi uma confiança, uma generosidade muito grande, de chegarem para mim e falar “é isso mesmo que você quer?”. Eles acreditaram em mim. Eu falei que queria e meu pai juntou uma parte da grana que tinha guardado para passar o tempo de desemprego e veio fazer minha matrícula. Depois voltou comigo, porque eu era menor de idade, na época tinha 17 anos. Não tinha, naquela época, conhecimento de fazer a matrícula à distância. Ele me trouxe e ficou três dias comigo, depois só voltou de novo para a Bahia ano passado [2020], nove anos depois, veio conhecer minha casa. Agora sim, a minha casa com meu espaço, meus gatos, meus cachorros. (NICÁCIO, 2021).

Consciente do sofrimento que a distância causa em seus pais e do quanto eles são compreensivos, Glenda sonha em um dia poder trazê-los para mais perto, e afirma: Eles são muito meus apoiadores, eles vibram muito com o que faço, e não tem aquela lógica de “não vai dar certo”, para eles têm outra lógica “se você não sabe ou se ninguém te contou como faz, vamos pensar como nós faríamos e de nossa forma vai dar certo”. Foi a coisa mais valiosa que eles me ensinaram. Eu perguntei para minha mãe e ela disse que não sabe se ensinou isso não [risos], mas tenho certeza que foi ela.

Glenda nunca teve uma relação muito próxima com o cinema, e ressalta o quanto o cinema comercial é inacessível para a população preta e pobre. Começou a fazer teatro na escola, no conservatório. Participou de uma companhia de Belas Artes que havia na sua cidade e lá passava horas a fio assistindo a saraus. Vasculhando suas memórias, foi observando que o gostar pela Direção de Arte veio dessa época, que nos faz lembrar de Conceição Evaristo quando ela diz: “Tudo me causava uma comoção maior. A poesia me visitava e eu nem sabia…”16:

Me aproximei do teatro na escola, de fazer uma peça, de ter muita facilidade para decorar o texto e de gostar mesmo daquilo. Pensei até mesmo em fazer teatro como curso na universidade. Os trabalhos na faculdade, eu sempre busquei trabalhar com cinema e educação. E isso é muito eu, isso faz parte da minha história se você pensar que a escola é onde chega tudo e não tem aula ou dinheiro fora daqui só tem aquele ambiente fora de casa e a escola foi muito esse lugar para mim e acredito que isso foi que facilitou meu acesso com a arte (NICÁCIO, 2021).

A maturidade dos seus quase 30 anos de idade e um currículo singular de quem já assinou a direção de quatro longas-metragens possibilitam a Glenda uma reflexão profunda sobre o que é fazer cinema para uma cineasta negra. Como afirma, fazer cinema é a coisa mais valiosa de sua vida, no entanto, essa produção só é possível porque ela é herdeira dos ensinamentos de seus pais e 14

Sistema de Seleção Unificada. Criado no governo do presidente Lula, o Sisu é um sistema informatizado do Ministério da Educação, no qual instituições públicas de ensino superior oferecem vagas para candidatos e candidatas participantes do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Aqueles e aquelas com melhores notas no ENEM são classificados e selecionados. 15 Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. 16 Frase final da epígrafe de abertura do livro Poemas da recordação e outros movimentos, publicado em Belo Horizonte, pela editora Nandyala, em 2008.

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avó: “O que eu pratico em cinema vem de antes, vem de muito antes”. Ainda em uma conversa com Glenda, marcada para falar da vida e matar a saudade, acompanhada por uma cerveja (sua bebida favorita), ela revela que “fazer cinema é como fazer pipoca de chocolate, por mais técnicas que se tenha, ela acaba sendo concretizada por outras vias, às vezes de um jeito que não estava escrito em lugar nenhum [nem no roteiro, nem nas receitas]”. Quando se faz pipoca, achando que estamos no caminho certo, mesmo não sendo assim, ele é próprio, é autoral, e, como a pipoca, vamos saboreando outros gostos, diferentes, mas também deliciosos: Eu [uma vez] estava tentando fazer uma pipoca doce, com chocolate. Eu amo, mas é uma das coisas na cozinha que sempre tento e nunca acerto. A panela sempre sai queimada, o doce torra, não importa quantas vezes eu siga as instruções da receita na internet. Então, quando me sinto um pouco frustrada, eu ouço a voz da minha mãe, perguntando: ‘Tá, já que desse jeito não tá dando certo, como você vai fazer agora?’. ‘Como a gente pode fazer?’. É sobre isso que é o cinema que eu acredito e pratico. E não à toa retorno para os meus pais. [pausa]. Existia (existe!) neles uma forma, que eu sempre achei muito peculiar, que era de não aceitar o ‘não dá pra fazer porque falta’, seja numa receita de comida, seja num trabalho escolar ‘para casa’: eles sempre criavam alguma coisa para dar conta de algo que estava faltando, e no final não faltava nada! De alguma forma, minha família sempre viveu dentro desse sistema de sabotagem, e o compartilharam comigo enquanto valores, enquanto modos de sobrevivência – o que eu agora chamo de estratégia, de modos de produção. Quando eu falar sobre isso com meus pais, eles vão (com certeza) negar, e dizer que não sabotaram nunca nada, que só tentaram viver em paz. Sabotagem talvez nem seja uma palavra da qual eles gostem. Mas eu juro que foi com meus pais que eu a aprendi. (NICÁCIO, 2021).

Glenda escolheu o calor, as cores e os sabores da Bahia para viver. Além da direção, no cinema desenvolve múltiplas funções que têm podido partilhar em atividades voltadas à prática do cinema e educação nas escolas públicas da região de Cachoeira e São Félix, onde vive. Em parceria com Ary Rosa17, criaram a produtora de cinema Rosza Filmes Produções, responsável pela produção dos longas-metragens ficcionais Café com Canela (2017), A Ilha (2018), Até o Fim (2020) e Voltei (2021).

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Diretor, Roteirista, Diretor de Som e Produtor Executivo.

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Cineasta Jamile Coelho

Jamile Coelho: “Cinema é a arte que nos dá a possibilidade de transcender o que os olhos não dão conta” A diretora de arte, cineasta e animadora Jamile Coelho vem de uma família materna, que antes de morar em Paripe, morava no São Caetano, também bairro da periferia de Salvador. Ao contrário de muitas cineastas negras, sua mãe e quase todas as suas tias estudaram magistério, apenas uma das seis irmãs optou pelo curso técnico de Enfermagem. Aos 42 anos, sua mãe, Dona Dalva, mulher negra, professora da educação básica, iniciou o curso de Licenciatura para as séries iniciais do ensino fundamental. Suas tias maternas também ingressaram na educação superior. Em 1991, sua tia Dilma foi a primeira pessoa da família a ingressar na Universidade Federal da Bahia (UFBA) para cursar Biblioteconomia. Foi ela quem abriu as portas da Academia e mostrou que a universidade pública, que o ensino superior, é sim uma possibilidade para todos. Ao contrário de sua mãe, seu pai, um homem branco, não foi à universidade e vem de uma família abastada que migrou para São Paulo, moradora dos bairros de Pinheiros e Higienópolis. Jamile cresceu assistindo a filmes da Sessão da Tarde e lembra que, como muitas adolescentes de sua geração, consumia muitos filmes por meio da televisão. No entanto, já nesse momento de sua vida, se encanta com os desenhos animados e se apaixona pelos filmes do diretor Tim Burton. A Fuga das Galinhas (2000), dos diretores Nick Park e Peter Lord também mexeu significativamente com sua imaginação. Instigada com os movimentos dos bonecos, nasceu daí a vontade de fazer cinema. Em 2008, realizou seu primeiro curso relacionado ao cinema, de produção de locação, e posteriormente ingressou em uma faculdade privada, onde permanece por muito pouco tempo, pois foi aprovada no vestibular da UFBA para o curso de Bacharelado em Artes. Desde então, sua formação tem sido contínua e no seu currículo inclui diferentes formações com profissionais da animação internacional, a exemplo de Barry Purves e Tim Allen. Empreendedora, Jamile Coelho é sócia da Estandarte Produções, e junto com a também cineasta

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Cintia Maria produzem incessantemente inúmeros produtos audiovisuais. Já dirigiu as produções, em stop motion, Talvez Futuro (2011) e o episódio piloto da série Òrun Àiyé – A Criação do Mundo (2015). Destacam-se também as séries Circuito Negro e Aqualtunes, ambas de 2018. Sua última animação em 3D, Corações Encouraçados (2019), assim como seus demais trabalhos, vêm percorrendo o mundo através de muitos festivais. Atualmente dedica-se à finalização dos longasmetragens Retrato da Bahia, um documentário, e Cores da Diáspora, rodado em Angola, e prepara o I Festival Internacional de Animação da Bahia (FIAB). A partir de sua atuação na Estandarte Produções, se organiza para a consecução de interesses comuns comprometidos com a cultura, a promoção da igualdade – especificamente em relação a gênero e raça –, a democratização dos saberes e a diminuição das desigualdades. O investimento social aplicado na produtora ampliou o seu entendimento de que a educação e a cultura são o principal caminho para o combate às desigualdades sociais. Dessa forma, organizase no sentido de levar sua experiência e seu comprometimento social para o Terceiro Setor, podendo atender a mais pessoas, por meio de trabalho engajado sem fins lucrativos. Assim, em 2015, a produtora transformou-se em um núcleo de desenvolvimento de ações voltadas aos povos e comunidades tradicionais, o Núcleo Baiano de Animação e Stop Motion (NUBAS), que atua em articulação com universidades e a sociedade civil em geral. A Nubas, então, engajou-se na formulação de projetos voltados para a promoção, valorização e divulgação das culturas tradicionais brasileiras, utilizando como instrumento a técnica da animação stop motion, com o protagonismo e participação dos citados grupos. Generosa, Jamile tem um coração do tamanho do mundo, paciente como seu jabuti, tem o cinema como espaço de culto à memória. Reservada, mas não tímida, ela aprendeu em casa princípios que são referências de sua vida e trabalho, e como diz a canção no nosso querido Gilberto Gil, “toda menina baiana tem um santo que Deus deu”. Sim, Jamile Santos Coelho carrega consigo os Santos, Orixás, Inquices e Voduns que Olorum lhe deu.

Cineasta Jamile Coelho 31

Cineasta Safira Moreira

Safira Moreira: “Fazer cinema é remontar memórias em busca de si e dos seus” Neta da lavadeira Maria do Carmo, que há quase trinta anos fez a passagem, a cineasta Safira Moreira nasceu em Salvador, filha de Joana Angélica Moreira e Francisco de Souza. Sua bisavó materna se chamava Elvira dos Anjos e sua tataravó, Sirila. Remontar e reconstruir a árvore genealógica da família não tem sido tarefa fácil, mas em 2020, através do contato com sua tia-avó Ignez, Safira conseguiu chegar até Dona Sirila. Esse grande mergulho na sua ancestralidade tem permitido muitas descobertas. Sua mãe e sua avó nasceram em Itaquara, interior da Bahia, próxima ao município de Jequié, “um pequeno povoado que era cortado por uma estrada de ferro”, afirma Safira, lembrando da estação de trem da cidade. Da parte do seu pai, ela ainda sabe pouco, seu avô era militar, nascido no Ceará, tendo migrado para o Piauí, onde nasceu seu pai. Filho mais velho, quando tinha apenas 2 anos de idade, foi com a família para Belo Horizonte, onde nasceram todos os seus irmãos, e foram criados por sua avó paterna, que era dona de casa. Seu pai, que não tem formação acadêmica, é conhecido como Chico da Prata. Ourives, autodidata, suas joias com simbologia dos orixás adornam o corpo de muitas celebridades que passaram pela Bahia. Maria do Carmo, sua avó materna, sempre trabalhou como empregada doméstica e lavadeira em Salvador. Quando engravidava, já nos últimos meses de gestação, voltava para Itaquara, para que sua bisavó cuidasse das crianças. E não demorava muito, depois do nascimento das crias, voltava novamente para a capital em busca do sustento da família. Elvira e Maria do Carmo não tiveram a oportunidade de estudar, e foi Joana Angélica, que mesmo com o pouco estudo da infância e adolescência, quem ensinou Dona Maria do Carmo a escrever o próprio nome. Aos 10 anos de idade, Joana Angélica foi morar em Salvador. Somente depois de adulta voltou para escola, já aos 50 anos, após suas filhas já inseridas na universidade, onde cursou Pedagogia, na Universidade Estadual da Bahia (UNEB), pagando, simbolicamente, uma dívida que ela tomou para si, “era uma dívida que ela falava que tinha com ela mesma e é isso aí, ela conseguiu essa conquista mesmo, esse diploma aos 54 anos de idade, essa formação em Pedagogia”. Safira chegou ao cinema por meio das artes. Ser filha dos artistas e ourives Chico da Prata e de Angélica Moreira, possibilitou que desde muito pequena fosse interiorizando uma estética privilegiada que consumimos em seus filmes:

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Meu pai, enquanto artista criando joias, e minha mãe, chef de cozinha, que por muitos anos trabalhou em galerias de artes, como a da família Carybé18, a galeria Oxum Casa de Arte, no Pelourinho. Local onde eu passei muitas tardes na infância e acho que ali começa a minha aproximação mais intensa com as artes, não tinha como fugir disso. Desde cedo criei uma relação muito forte com a fotografia, um fascínio muito grande pelas câmeras fotográficas, pela possibilidade de registro, então quando eu desperto para o que eu quero fazer, a primeira coisa que me vem é desejo de fazer fotografia. Algum tempo depois, fotografia para cinema. Eu entro nas escolas de cinema, o Centro Afro Carioca19 e depois na Darcy Ribeiro 20com desejo de fazer direção de fotografia (MOREIRA, 2021).

Filha de pais cinéfilos, Safira desde criança frequentava videolocadoras, e, embora tivesse para si e sua irmã os filmes infanto-juvenis, acabava por assistir em casa quase tudo aquilo que seus pais viam. Já na adolescência, passou a ter cadastro próprio em várias locadoras do centro da cidade, onde passava horas e horas, fazendo suas próprias escolhas. Fotógrafa, roteirista e diretora, no momento Safira trabalha na série fotográfica Olhares Negros, inicialmente mobilizada no Instagram, onde ela convida pessoas negras a lhe enviarem uma fotografia e a partir dessa fotografia, um relato, que dá origem aos episódios. Sobre esse projeto, Safira afirma: A partir desse olhar de pertencimento dessas pessoas com essas memórias, esse projeto tem se desdobrado em outras coisas. Atualmente eu estou desenvolvendo um projeto de uma série de mesmo nome, no qual eu convidei cinco fotógrafos baianos para compartilhar suas histórias e, a partir daí, desenvolver os roteiros. Estou no processo de desenvolvimento de roteiro, um projeto que foi contemplado pela Aldir Blanc21, também tenho trabalhado em Cais, que é meu primeiro longa-metragem documental, contemplado pelo Fundo Avon Mulheres do Audiovisual, e que, no final do ano, foi também contemplado pelo Rumos Itaú, um projeto que tem 70% da captação, e um projeto que mostra essa minha busca pela imagem que fala da minha avó Maria do Carmo, uma mulher negra, que criou sozinha seus próprios filhos e netos. Minha avó é muito fundamental para a mulher que eu sou hoje, então tenho trabalhado nesse projeto há quase três anos, passando por diversos laboratórios [de roteiros] do Brasil e fora do Brasil também, recentemente em dois laboratórios na Colômbia, em Tenerife, nas Ilhas Canárias e esse ano vamos passar por mais alguns espaços de mercado, no DocMontevideo, no Festival de Documentários de Buenos Aires, no SANFIC no Chile. Estou 18

Artista plástico, nasceu na Argentina e adotou a Bahia como lar onde viveu longos anos de sua vida. Sobre o pintor, gravador, desenhista, ilustrador, ceramista, escultor, muralista, pesquisador, historiador e jornalista, ler FURRER, Bruno. Carybé. Salvador: Fundação Emílio Odebrecht, 1989. 19 Fundado pelo cineasta Zózimo Bulbul, o Centro Afro Carioca de Cinema desenvolve projetos e ações culturais com foco na valorização da produção cinematográfica africana e afrodiaspórica, visando a formação técnica e artística, é responsável pela organização do Encontro de Cinema Negro Zózimo Bulbul, Brasil, África, Caribe e outras Diásporas. 20 Situada no Rio de Janeiro, a Escola de Cinema Darcy Ribeiro foi idealizada e fundada por Irene Ferraz, em outubro de 2002, com a proposta de desenvolver novos parâmetros curriculares em funções específicas do cinema e do audiovisual. 21 Lei nº 14.017, proposta pela deputada federal Benedita da Silva, aprovada em 29 de junho de 2020, que beneficia produtores culturais devido a calamidade da COVID-19 no ano de 2020.

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nessa etapa de desenvolvimento de roteiro para, em breve, muito breve, ter a possibilidade de filmá-lo. A previsão é de conseguir filmar ele no primeiro semestre de 2022, antes disso é fazer essa imersão ainda maior da história da minha família (MOREIRA, 2021).

Safira nasceu no bairro do Engenho Velho da Federação. Aos 20 anos é uma diretora consagrada e teve seu primeiro curta-metragem, Travessia (2017), premiado em diversos festivais brasileiros e internacionais, além de ter sido exibido na abertura do Festival Internacional de Rotterdam. Para ela, ser uma cineasta negra: Representa a possibilidade de contar outras histórias e de criar uma contranarrativa, de criar uma contra-memória, de pautar nossas complexidades, nossas subjetividades... É um lugar de muita sensibilidade… Eu lembro muito do Seu Matheus Aleluia22 enquanto compositor, que ele se coloca como “operário da sensibilidade” e eu me coloco um pouco nesse lugar também, nesse fazer cinematográfico enquanto uma operária da sensibilidade, então fazer cinema é estar nesse diálogo constante com as imagens, com os sons, com tudo que nos cerca e o que resulta de tudo isso (MOREIRA, 2021).

Safira, que quando nasceu recebeu o nome de uma das mais belas pedras preciosas, é uma jovem negra encantadora. Libriana, carrega consigo harmonia, elegância, estilo e beleza que também são marcas de seu trabalho.

Considerações para finalizar “Venci a resistência a escrever sobre o amor” (Lívia Natália) Tomamos emprestado o verso da poeta baiana Livia Natália (2017), porque, para produzir conteúdos audiovisuais negros, para ser uma cineasta negra, é preciso vencer muitas resistências para fazer filmes com e sobre amor. Como muitas outras, Glenda Nicácio, Jamile Coelho, Safira Moreira e Urânia Munzanzu não têm feito outro movimento, senão vencer resistências e filmar com amor. Elas reproduzem em seus filmes cuidados e memórias que ancestralmente carregam em si. Herdeiras dos povos Nagôs23 e Haussás24, estes responsáveis pelo histórico de lutas por emancipação na Bahia da primeira metade do século XIX, suas referências não estão no cineasta de “uma câmera 22

Cantor e compositor baiano, nasceu em 1943 em Cachoeira, e é conhecido por suas profundas pesquisas musicais na área da religiosidade africana. 23 Provenientes da grande área iorubá que compreende sul e centro da atual República do Benim, ex-Daomé, de parte da República do Togo e de todo sudoeste da Nigéria. Os Nagôs são também representados pelos povos Kètu, Egba, Egbado e Sabé. Esses vieram para a Bahia e foram responsáveis pela implantação da cultura nagô no Estado, reconstituindo suas instituições e procurando adaptá-las ao novo meio, com o máximo de fidelidade aos padrões básicos de origem, fidelidade essa muito bem representada pelos Terreiros de Candomblé da Bahia. 24 Conhecidos também como Hauçás ou Haúças, se encontram principalmente no norte da Nigéria e no sudeste do Níger. Embora haja populações dos Haussá espalhadas em vários países da África Ocidental, é no Egito, Sudão, Camarões, Gana, Costa do Marfim e Chade onde encontramos sua maior concentração.

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na mão e uma ideia na cabeça”25, mesmo porque, faz muito pouco tempo que temos a possibilidade de ter uma câmera nas mãos. Ademais, para as cineastas negras, foi preciso muito mais que uma ideia na cabeça. Elas, cada uma, com seu histórico e família, fazem filmes que têm atravessado os oceanos. E somente sob a concepção da ancestralidade que podemos compreender que “o Cinema Negro nasceu lá na Bahia…”, assim como foi na Bahia que tem florescido o cinema dessas diretoras. O esforço de conceituar um Cinema Negro Feminino Baiano vem da resistência, da memória e da identidade. Fazer filmes com amor é a edificação do cinema que Glenda, Jamile, Safira, Urânia e muitas outras têm protagonizado. Elas trazem para seus filmes os ensinamentos ancestrais e os coadunam com técnicas, estéticas, sensibilidade e compromisso, resultando em um cinema de muitos caminhos, pois é demarcado pelo respeito às experiências de vida de suas famílias e da comunidade onde estão inseridas: Seus filmes irradiam o reconhecimento de domínio das técnicas; representam cultura e mundo dos valores ancestrais em que a comunicação em diferentes circunstâncias legitima e constroem um conjunto de informações e emoções trazidas pela diversidade; um território onde cada cineasta se constitui como símbolo de empoderamento (SOUZA, 2017, p. 13).

Em documentários, ficções e animações elas fazem valer as palavras do Mestre Zózimo Bulbul26: “O cinema é uma arma e nós negros [e negras] sabemos atirar”. A Bahia produz um Cinema Negro no Feminino que move o mundo. Um cinema no qual técnica e estética se fundem como marca de identidade, pertencimento e afeto.

Referências bibliográficas CANDIDO, Márcia Rangel; DAFLON, Verônica Toste; FERES JÚNIOR, João; MORATELLI, Gabriella. A cara do cinema nacional: gênero e cor dos atores, diretores e roteiristas dos filmes brasileiros (20022012). Textos para discussão (IESP – UERJ), n. 6, p. 1-25, 2014. Disponível em: http://gemaa.iesp. uerj.br/images/publicacoes/TpD/TpD6_Gemaa.pdf Acesso em: 5 mar. 2021. COELHO, Jamile. Depoimento cedido a Edileuza Penha de Souza. Março de 2021. KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. MOREIRA, Safira. Depoimento cedido a Edileuza Penha de Souza. Março de 2021. MUNZANZU, Urânia. Merê Mahi, Insurgência Feminina negra nos terreiros Jeje do Recôncavo: Algumas notas sobre a travessia da Bahia ao Benim. Dissertação de Mestrado, Programa de Pósgraduação em Antropologia da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Bahia, 2021. MUNZANZU, Urânia. Depoimento cedido a Edileuza Penha de Souza. Março de 2021. 25

Ator, cineasta e escritor, Glauber de Andrade Rocha, nasceu na cidade de Vitória da Conquista, em 14 de março de 1939. Faleceu no Rio de Janeiro, em 22 de agosto de 1981, quando se preparava para rodar o longa-metragem Império de Napoleão.

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Zózimo Bulbul foi modelo, ator, roteirista e diretor de cinema, trabalhando em mais de trinta filmes. Foi o primeiro negro a ser protagonista de uma novela brasileira. Em 1974, dirigiu o clássico Alma no Olho. Como produtor e roteirista, seu trabalho teve como foco a valorização da identidade negra.

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NATÁLIA, Lívia. Dia Bonito pra Chover. Rio de Janeiro: Malê, 2017. NICÁCIO, Glenda. Depoimento cedido a Edileuza Penha de Souza. Março de 2021. REIS, João José. Ganhadores: A greve negra de 1857 na Bahia. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. SOUZA, Edileuza Penha de. Cinema na Panela de Barro: Mulheres Negras, narrativas de amor, afeto e identidade, 2013. Tese (Doutorado em Educação), Universidade de Brasília (UnB). Brasília, 2013. SOUZA, Edileuza Penha de. Contando nossas próprias histórias: Mulheres negras arquitetando o cinema brasileiro. In: AVANCA: Edições Cine-Clube de Avanca, 2016. SOUZA, Edileuza Penha de. Ancestralidade e Memória na animação Òrun Àiyé – O cinema negro feminino e as tessituras da identidade. In: AVANCA: Edições Cine-Clube de Avanca, 2017. SOUZA, Edileuza Penha de. Diretoras Negras: Construindo um cinema de identidade e afeto. In: FREITAS, Kênia e ALMEIDA, Paulo Ricardo Gonçalves de (Org.). Diretoras Negras no cinema brasileiro. Brasília: Caixa Cultural, 2017. SOUZA, Edileuza Penha de. Prefácio. In: CAZÉ. Bárbara Maia Cerqueira (Org.). Mulheres negras na tela do Cinema. Vitória: Pedregulho, 2020.

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MEMÓRIAS, IDENTIDADES E CULTURAS AFRODIASPÓRICAS NO CINEMA NEGRO BAIANO Letícia Maria de Souza Pereira

Introdução As memórias sobre/de a história e as culturas negras plasmadas pelo cinema negro baiano constituem o cerne desse artigo, que objetiva examinar as representações simbólicas e os diferenciados lugares socioculturais ocupados pelos afro-brasileiros. Nesse sentido, busca-se pensar o cinema baiano produzido por diretores/as negros/as e nos seus “lugares de memória” (NORA, 1993). O fio condutor da pesquisa é a memória, a qual, a partir dos Estudos Culturais, torna possível pensar, na contemporaneidade, a coexistência de múltiplas reminiscências, possibilitando a criação de novos significados e novos sujeitos no cenário sociopolítico cultural. A fundamentação teórica se constitui de proposições, discussões e perspectivas sobre as relações raciais em diáspora (BHABHA, 2005; HALL, 2003), destarte, conecta-se pesquisas que colocam sob rasura a tradição hegemônica do cinema (CARVALHO, 2006a; DE, 2005; STAM, 2008), revelando como o racismo e as hierarquizações étnico-raciais têm operado negativamente nas representações cinematográficas, e destacam a potência criativa das estratégias de resistência e de luta contra a sub-representação. No tocante ao recorte temático, selecionei como corpus o curta-metragem O dia de Jerusa (2014), dirigido pela baiana Viviane Ferreira, inspirado na cinematografia africana e produzido pela Odun Formação & Produção. De modo geral, as interpretações deste estudo revelam uma espécie de “corpografias negras” (PEREIRA, 2017) de resistência no uso da linguagem audiovisual, reconfigurando as memórias afrodiaspóricas, com o objetivo de preencher as lacunas históricas, culturais e sociais, elaborando uma conexão com a construção da identidade e a reivindicação da auto-representação simbólica. Essa conexão é constantemente recriada e atualizada pelas produções fílmicas e, também, por outras ações, tais como uma preocupação com a formação técnica e artística, a criação de grupos de pesquisas e/ou produtoras independentes (coletivos), a publicação de literatura específica, a realização de seminários e mostras com a finalidade de promover e visibilizar o cinema negro, no intuito de incluir na “constelação mnêmica” as memórias afro-brasileiras e baianas.

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Cineasta Safira Moreira

O cinema como “lugar de memórias” Na contemporaneidade, a cultura é dominada pelas imagens, valores, comportamentos e identidades veiculadas pelos produtos midiáticos (KELLNER, 2001, p. 77). Nessa perspectiva, a comunicação e a cultura estão fortemente interligadas e envolvem as diferentes experiências dos sujeitos. Jesús Martín-Barbero (2001) destaca a cultura em sua pluralidade de conflitos e disputas, assim, as estratégias de mediação abrangem a apropriação e as relações dos sujeitos com os processos socioculturais. Nessa perspectiva, analisa-se o cinema como “lugar de memória”1 (NORA, 1993) e meio de 1

De acordo com Pierre Nora, a midiatização modificou o modo de transmissão e conservação de valores – os usos da memória. Os “lugares de memória”, em sua análise, se constituem da necessidade de criação de arquivos, como suportes externos, pois constata a impossibilidade de existência de uma memória espontânea. Nora não cita o cinema como um “lugar de memória” em sua pesquisa, mas entende-se que é possível incluir

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comunicação, já que a linguagem cinematográfica constrói narrativas visuais e sonoras que se revelam importantes disseminadoras de conteúdos que estabelecem formas de dominação, os quais representam e constituem o imaginário simbólico da sociedade, ou seja, existe nessas produções uma “vontade de memória” e, assim, a necessidade de criar arquivos: filmes. Os produtos midiáticos e as tecnologias estão, na atualidade, sendo usados como recurso de referências individuais e coletivas, em um desejo de manutenção de pertença e construção da identidade (seja étnica, social, nacional e/ou de gênero). Em meio aos diversificados e múltiplos discursos da história e da memória, busca-se viabilizar uma estratégia de embate entre o “esquecer” e o “lembrar”. Assim, as narrativas cinematográficas, lidas como espaço de construção e controle da memória coletiva, possuem papel preponderante na constituição de um discurso de homogeneização nacional, tornando-se “um” dos imaginários de um território, desenhando perfis, transmitindo ideias e valores que irão compor os discursos oficiais e extraoficiais de uma nação específica, assim como podem rasurar esses discursos. Para Stuart Hall, As culturas nacionais são compostas não apenas de instituições culturais, mas também de símbolos e representações. Uma cultura nacional é um discurso – um modo de construir sentidos que influencia e organiza tanto nossas ações quanto a concepção que temos de nós mesmos... (HALL, 2005, p. 50, grifo do autor).

Neste sentido, depreende-se que os discursos veiculados pelo cinema brasileiro, em seu termo abrangente, não têm representado em equidade todos os grupos étnicos que compõem o país, nem sua complexidade cultural, nem os conflitos; e, principalmente, têm influenciado negativamente quanto às representações sobre as histórias e culturas afro-brasileiras e baianas. Assim, é preciso considerar também a existência de esquecimentos estratégicos e lembranças que condicionam hierarquias de poder e que podem assumir um caráter de “tradição cultural” a serem eternizados conforme seus objetivos. Outra reflexão importante nos estudos de memória é do teórico Maurice Halbwachs (1990), no tocante ao processo de “negociação” entre a memória coletiva e as memórias individuais, já que a memória do “Outro” precisa apresentar lembranças comuns – os indicadores empíricos 2– para que a reconstrução ocorra. Segundo o autor, uma História é repleta de muitas memórias, nessa perspectiva, cabe afirmar que o cinema baiano também é composto por múltiplas memórias, a partir das quais são construídas redes de imagens carregadas de ideologias, contradições e apagamentos. As câmeras cinematográficas registram lugares e imagens previamente selecionadas pelo/a diretor ou diretora, que através do projetor/tela direciona o olhar do telespectador na cena, ainda se inclui a essa dinâmica o conhecimento prévio de outras representações que vão compor uma espécie de “educação da memória”. A leitura proposta neste artigo visa – através da seleção de alguns registros sobre o cinema baiano e/ou brasileiro, a parte materializada do aparelho mnêmico –, analisar quais dispositivos e/ou suportes de memória são utilizados nas representações de/sobre o/a negro/a nas produções cinematográficas.

a linguagem cinematográfica como arquivo que compõe as três instâncias: material, funcional e simbólico, citadas pelo autor (NORA, 1993, p. 5-13). 2 Os indicadores empíricos são os diferenciados pontos de referências: os patrimônios arquitetônicos, datas e personagens históricos, entre outros, como o cinema (HALBWACHS, 1990, p.54-55).

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Corpografias negras em telas A expressão “corpografia”, apropriada do texto literário “Poemanto: ensaio para escrever (com) o corpo”, do poeta Ricardo Aleixo (2010), lido como conceito norteador deste artigo, refere-se à “presentificação” do corpo (negro) em cena. As corpografias negras do cinema baiano configuram importantes capitais simbólicos, pois “tudo é texto, mesmo que não todo legível... Mas nem tudo é palavra. Nem a palavra pode tudo. Porque também somos imagem...” (ALEIXO, 2010). Assim, busca-se, a partir das corpografias negras, essa espécie de “escrita” e ao mesmo tempo “inscrição”, desenvolver estratégias de análise das narrativas fílmicas, ou seja, flagrar os movimentos, os rastros, as relações de poder, os enfrentamentos, os modos de subjetivação e práticas de resistência operadas (PEREIRA, 2017). Conforme Noel dos Santos Carvalho (apud DE, 2005, p.18), o cinema mudo é considerado o “período silencioso” marcado pela quase ausência de negros/as. Essas narrativas correspondem às produções realizadas entre 1898-1929, todavia muitos filmes deste período – por falta de uma apropriada conservação –, perderam-se com o tempo, em incêndio e pela má qualidade de armazenamento (CARVALHO, 2006a, p.18). A análise sobre a representação dos negros/as e de suas culturas só foi possível através de informações e/ou pistas retiradas em matérias de jornais e outros arquivos de apoio (STAM, 2008, p.97). Os filmes Dança de um baiano3 (Afonso Segreto, 1899), que faz referência à dança na cidade Salvador, a cidade mais negra do Brasil e a segunda fora do continente africano; e Dança de Capoeira (Afonso Segreto 1905), que apresenta a capoeira como técnica corporal introduzida pelos negros escravizados bantos4; constituem pistas (as inferências possibilitadas a partir dos títulos) sobre a existência de corpos negros/as em cena. As “vistas animadas”, ou seja, os filmes da época (documentários e reportagens) registram a presença negra, porém são imagens restritas às bordas e/ou fundo de enquadramento (CARVALHO, 2006a, p.17-18). Observa-se nessas produções um empenho pelo favorecimento dos “esquecimentos” sobre qualquer tentativa-movimento que leve efetivamente às representações das culturas e histórias afro-brasileiras e baianas. Nos anos 1920-1930, a linguagem cinematográfica passou a operar um maior controle das imagens, com a possibilidade do planejamento das filmagens através da realização de cortes, nos quais negros/as, indígenas, e demais não-brancos passaram a ser eliminados das cenas. A decupagem5, segundo Noel Carvalho, “foi utilizada no cinema para produzir eugenia racial à brasileira” (apud DE, 2005, p.19). Essa exclusão étnica visava forjar uma imagem de progresso, eliminando o que se entendia por “males” da sociedade brasileira, seguindo aos padrões de eugenia, com vistas à superioridade da raça6 ariana em uma construção eletiva e hierárquica. 3

Vale lembrar que, até início do século XX, a cidade de Salvador era conhecida como “cidade da Bahia”, assim, o termo “baiano” refere-se aos nascidos na capital soteropolitana (RISÉRIO, 2004). 4 Conforme a Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana, de Nei Lopes (2004, p.166-167). 5 Segundo Ismail Xavier, para definir decupagem é preciso, “em primeiro lugar, a rigor, falar em decupagem/ montagem, pois uma pressupõe a outra – são logicamente equivalentes. O uso dos dois termos deve-se a uma ordem cronológica encontrada na prática, onde decupagem identifica-se com a fase de confecção do roteiro do filme, e montagem, em sentido estrito, é identificada com as operações materiais de organização, corte e colagem dos fragmentos filmados. Em segundo lugar, aos que estranharam o fato de eu dar ênfase ao som num discurso sobre a decupagem, lembro que esta, em um sentido mais amplo, corresponde à construção efetiva de um espaço-tempo próprio ao cinema” (XAVIER, 2005, p.37) 6 O conceito de Raça aqui utilizado baseia-se em dois pressupostos, segundo Antônio Guimarães: 1) o reconhecimento de que raças biológicas não existem. Raça é uma construção social, destituída de fundamentos biológicos. 2) A denúncia de que a ideia de raça se modifica a todo momento e é manifestada de diferentes

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Não há registro de diretores/as negros ou negras no período do Cinema Silencioso na Bahia, ou sequer no Brasil, fato destacado por Robert Stam: A falta de realizadores negros nesse período não chega a surpreender, dado que fazer filmes era, de modo geral, uma atividade de classe média, e os negros brasileiros raramente pertenciam a ela. Ademais, boa parte da produção cinematográfica inicial era trabalho de imigrantes portugueses e italianos, como os Segreto (STAM, 2008, p. 120-121).

Ainda conforme Stam, se o cinema brasileiro do período mudo era simbolicamente ‘branco’, o cinema nas décadas seguintes pode ser chamado de ‘moreno’ (o ideal de Freyre), ou mesmo de ‘mulato claro’ (2008, p.127). Neste segundo momento, o Cinema Mestiço (a partir da década 1930) traz narrativas que vão formar a trama, os símbolos e os rituais da nação, composta por diferentes classes sociais, etnias e gêneros. Particularmente, no Brasil, essas representações apontam a mestiçagem como uma das marcas principais do discurso nacional, que, desde o século XIX, vê na constituição do povo brasileiro o seu principal elemento. Consoante o texto “A forma nação: história e ideologia”, de Etienne Balibar, nenhuma nação possui uma base étnica natural, mas do mesmo modo como as formações sociais são nacionalizadas, as populações incluídas nelas, distribuídas nelas, ou dominadas por elas são “etnicizadas”, isto é, representadas no passado e no futuro como se elas fossem uma comunidade natural, dispondo por si próprias de uma identidade de origens, de culturas e de interesses que transcendem os indivíduos e as condições sociais (BALIBAR, 1991, p. 9).

Entende-se que, ao forjar uma unidade étnica7, o discurso nacional constitui seu povo a partir de uma representação inventada, o que Balibar denominou de “etnicidade fictícia”. Essa fabricação cria um sentimento de pertencimento entre os diferentes povos que compõem a “comunidade política e imaginada”8. A grande questão que se impõe é: quais as consequências políticas dessa construção? Já que, no Brasil, o ideal da mestiçagem – como tentativa de forjar uma unidade ao discurso nacional – constrói uma tradição de relação harmônica. Este ideal invisibiliza os conflitos gerados no trânsito das relações raciais, em uma tendência (bem-sucedida) de favorecimento apenas para um dos grupos étnicos que compõe o Brasil-mestiço: o branco. A ideologia do branqueamento, uma das faces do “racismo à brasileira”, cria, através de pactos sociais, estratégias de manutenção dos privilégios para o branco, na perspectiva das representações afro-baianas, como o filme Banana da Terra (1939), que traz a jovem portuguesa Carmem Miranda, que ganha status de símbolo nacional e fama internacional como uma baiana9 vendedora de quitutes, com suas indumentárias, trejeitos e danças. Ela protagoniza uma espécie de mímica de baiana. Para Homi Bhabha (2005), a mímica é uma estratégia ardilosa de autoridade e ambivalência, pois, ao mesmo tempo em que representa a diferença, a recusa, articulando contradições entre “realidade” e “desejo”; ou seja, “são resultados de uma recusa que nega as diferenças do outro, mas que produz em seu lugar formas de autoridade e crença múltipla que alienam as pressuposições do maneiras e formas (GUIMARÃES, 2002, p. 53). 7 Para Hall, “termo que utilizamos para nos referirmos às características culturais – língua, religião, costume, tradições, sentimentos de ‘lugar’ – que são partilhados por um povo” (HALL, 2005, p. 62). 8 Referência ao conceito de Benedict Anderson para a nação (1989, p.16). 9 Baiana é o nome dado para mulheres, em sua maioria negra, pertencentes às religiões de matrizes africanas. A profissão “baiana de acarajé” foi regulamentada pelo decreto municipal de Salvador/BA, nº 12.175/1998. Em 2012, a figura da baiana foi reconhecida como Patrimônio Imaterial da Bahia.

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discurso ‘civil’” (2005, p.137). Esse projeto mimético faz a espoliação de elementos culturais negros, a tal “baiana”, para tornar-se “legitimamente” nacional, precisava ter um corpo branco. Ainda sobre o filme Banana da Terra, salienta-se a presença negra na Era dos Estúdios (período das Chanchadas), ainda que discreta, na trilha sonora com “O que é que a baiana tem?”, de Dorival Caymmi, na presença de músicos negros e nas danças afrodiaspóricas de fundo (STAM, 2008, p.131132). Ella Shohat e Robert Stam, ao discutirem a “Dialética da presença/ausência”, reforçam: Na mesma linha, o desenho da Disney, Alô, amigos (Saludos Amigos, 1941) apresenta a música afro-brasileira ou mesmo os instrumentos de origem africana (berimbau, cuíca) em um retrato animado da cidade africanizada de Salvador, na Bahia, mas proíbe rigorosamente a sugestão de que a cidade é habitada de fato por populações negras (SHOHAT; STAM, 2006, p. 324).

Na Bahia, conforme Maria do Socorro Carvalho, em seu livro A nova onda baiana: cinema na Bahia 1958/1962 (2002), a produção cinematográfica desenvolve-se durante o processo de modernização da cidade de Salvador junto com a expansão do setor de turismo, dos meios de comunicação de massa e das manifestações culturais nos fins dos anos 1950 e início dos 1960. Carvalho (2002) aponta a cidade de Salvador, como um polo cinematográfico em ascensão, especialmente pela forte efervescência cultural. Os debates, as projeções e as novas ideias advindas do Clube de Cinema da Bahia, fundado pelo crítico Walter da Silveira, em 1950, tinha o objetivo de incentivar a arte cinematográfica. Nesses encontros, eram exibidos filmes e debates sobre a cinematografia mundial, fomentando a assunção do Ciclo de Cinema Baiano (1958-1962) com as primeiras produções da Bahia: Glauber Rocha (Pátio, 1958), Luís Paulino dos Santos (Um dia na rampa, 1958), Roberto Pires (o primeiro longa-metragem baiano, Redenção, 1958), entre outros. Na tentativa de flagrar as emergências da presença do/a negro/a no Cinema Novo, dois textos, embora de abrangência nacional, se configuram como importante arquivo: “O cinema de assunto e autor negros no Brasil” (1963), do crítico David Neves e “Preto-e-branco ou colorido: negro e o cinema brasileiro” (1979), do cineasta Orlando Senna, os primeiros registros críticos atentos à experiência negra. Indiscutivelmente, o Cinema Novo modifica o modo de representação e participação do negro no cinema, introduzindo muitos atores na cena nacional: Antônio Pitanga (BA), Waldyr Onofre (RJ), Zózimo Bulbul (RJ) – estes, inclusive, tornam-se diretores do Cinema Negro –, Haroldo de Oliveira (RJ), Léa Garcia (RJ), Luiza Maranhão (RS), Milton Gonçalves (MG), etc.

O cinema negro baiano: memórias em disputa O cinema negro baiano, entendido com uma “guinada subjetiva” de cineastas e atores identificados à cultura e história afrodiaspóricas, é um campo de produção em constante diálogo com o cinema nacional, que se constitui nas fissuras do poder propondo uma discursividade específica, marcada por uma sintaxe própria e plural, devido às múltiplas possibilidades temáticas, técnicas e criativas. No texto “Revisitando o cinema negro brasileiro: por uma estética de resistência”, Cássio Tomaim diz: (...) O cinema negro é um conceito que expressa uma tendência mundial de cineastas preocupados em problematizar o negro a partir de uma representação afirmativa da sua cultura. Por isso, não é possível falarmos em cinema negro, mas, sim, em cinemas negros, que têm origem nas lutas políticas dos movimentos sociais pelos direitos civis negros, deflagradas na década de

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1970 em vários países do mundo, inclusive no Brasil, e são ainda, ressonância da luta pela descolonização da África nessa mesma década (TOMAIM, 2011, p. 95).

Os citados Cinemas Negros – produções norte-americanas, africanas, brasileiras, baianas, caribenhas e latino-americanas – são, nessa perspectiva, (re)escritas diversificadas, interpretações alternativas para as representações realizadas pelo cinema sobre suas histórias e culturas. São narrativas fílmicas que suplementam o potencial cultural dos relatos de memórias e inscrevem diferenciadas corpografias negras. As memórias acionadas pelo Cinema Negro10 levam em consideração o processo contínuo de atualização de fatos esquecidos e/ou ignorados pelas imagens plasmadas pelo cinema hegemônico, uma estratégia de luta pela constituição da população negra enquanto sujeitos históricos e parte importante do patrimônio e da formação socioeconômica do país. Segundo Hugo Achugar, esse movimento de restauração do passado está diretamente ligado à memória nacional e aos lugares de enunciação das políticas de memória. Nessa perspectiva, os processos de reconstituição não são neutros, envolvem seleção do que preservar e do que apagar da memória coletiva, na tentativa de impedir “a perda maior da identidade”. (ACHUGAR, 2006, p.245). O processo de reconstituição das memórias africanas e afrodiaspóricas pelo Cinema Negro baiano, ou seja, um possível novo espaço propulsor do “direito à memória”, para citar Achugar (2006, p. 237); não é oferecido sem disputa, é preciso, no caso da linguagem cinematográfica, dominar as tecnologias, revisar as imagens e relatos, além de propor novos enquadramentos. No Brasil, só foi possível encontrar filmes denominado como produções do Cinema Negro11 a partir de 1970. Essa tendência, relativamente recente, insere-se em um contexto mais amplo de mudanças teóricocríticas ocorridas no Brasil, a partir de meados do século XX, devido à rediscussão dos papéis políticos e culturais de diferentes grupos identitários marcados pela subalternização social, dentre eles, os afrodescendentes. Na obra O negro encena a Bahia (2012), a pesquisadora Luna Nery, por exemplo, apresenta quatro significativas produções do cinema negro baiano: Na boca do Mundo (1977), dirigido pelo ator baiano Antônio Sampaio (Pitanga), inspirado nos diretores do Cinema Novo e considerado por ela como o mais provocativo diretor negro; Dança Negra (1969), curta-metragem de estreia do diretor Agnaldo Azevedo (Siri), que fala de suas raízes culturais, e que também dirigiu Adeus Rodelas (1989), entre outros filmes ligados à cultura popular; No tempo de Glauber (1986), dirigido por Roque Araújo, importante figura do Cinema Novo; e o documentário A Irmandade da Boa Morte (1981), do diretor Alonso Rodrigues, sobre a festa de Nossa Senhora da Boa Morte (Cachoeira/BA). A Sociedade de Estudo da Cultura Negra do Brasil12 (SECNEB), fundada em 1974, na cidade de 10

Apesar de compreender a diversidade de representações produzidas pelos cinemas negros, de modo geral, será usado o termo no singular, embora entenda a não existência de um modelo, ou padrão estético que uniformize o registro de diferentes experiências afrodiaspóricas plasmadas nas narrativas cinematográficas. 11 As denominações “filme negro”, de David Neves (1968, p. 75), “cinema negro/povo”, utilizado por Orlando Senna (1979, p. 215), assim como outros intelectuais que chamaram o Cinema Novo de “cinema negro”, por seu interesse em registrar a população negra e por sua associação ao cinema africano (DE, 2005, p. 76), não está relacionado com o Cinema Negro abordado nesse artigo. O termo “negro” associado ao Cinema Novo é lido aqui como um termo genérico para povo, sem intencionalmente discutir o lugar étnico-racial dos negros e negras na Bahia e/ou no Brasil. 12 Segundo Marco Aurélio Luz, era uma instituição de caráter cultural, cientifico e reflexivo capaz de estabelecer uma mediação entre os líderes das comunidades negras e a sociedade oficial (LUZ, 1994, p. 41).

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Salvador, também produziu uma série de documentários13, através de seu núcleo de cinema, ligados à dimensão mítica e simbólica das religiões de matriz africana. Resultam dessa experiência o curtametragem Orixá Ninú Ilè (Os orixás do interior da terra), em 1978, e o média-metragem Iya-mi Agdá (mito e metamorfose das mães nagô), em 1979, ambos dirigidos por Juana Elbein dos Santos14, com assessoria e participação de Deoscoredes M. dos Santos (Mestre Didi) e integrantes da comunidade Ilé Odé Ewe. A SECNEB executa ainda o filme de longa-metragem Egungun (1982), dirigido por Carlos Brajsblat, junto à comunidade do Ilé Agboula (casa tradicional da nação Nagô). O objetivo desses documentários era “impulsionar uma revisão profunda da percepção histórica do negro, do seu patrimônio cultural e de suas instituições” (LUZ, 1994, p. 40-43). Havia um desconforto por parte dos praticantes das religiões de matriz africana no tocante aos filmes exóticos que eram produzidos sobre sua história e cultura, por isso a necessidade de criar uma organização que pudesse realizar filmes de dentro dos terreiros e, sobretudo, respeitando os segredos. Os filmes da SECNEB não são considerados exatamente Cinema Negro, os diretores não tinham a intenção de fundar um cinema diferenciado e marcado pelas questões étnicas, mas suas obras ganham destaque, conforme João Carlos Rodrigues, por produzirem filmes “que fizessem uma revisão do conceito histórico do negro, e ainda formasse uma equipe de produção e direção” (2001, p.99). Enfim, pelo desejo de realizar produções menos estereotipadas e por viabilizar uma participação mais atuante da comunidade negra na realização dos filmes, é que essas três narrativas fílmicas foram citadas como espaços de corpografias negras. A constituição do Cinema Negro no Brasil é marcada por diferentes expedientes organizados por grupos de cineastas negros, no desejo de criar propostas para institucionalização de suas narrativas fílmicas, no final dos anos 1990, as cidades do Rio de Janeiro, Recife e São Paulo passam a reivindicar espaços para as novas formas de representação racial no cinema. Seja na criação do primeiro “Encontros de realizadores e técnicos negros” (SP, 1999), na “Mostra de Diretores Negros (SP, 2000), mas especialmente na apresentação do “Manifesto Dogma Feijoada: gênese do Cinema Negro Brasileiro” (SP, 2000), o “Manifesto Recife” (PE, 2001), entre outros eventos e documentos que expõem o desejo por novas maneiras de pensar o cinema brasileiro. 13

O entendimento para documentário nessa pesquisa está baseado na abordagem de Jean-Louis Comolli, no qual destaca: “subjetivo é o cinema e, com ele, o documentário. Não há a menor necessidade de lembrar essa verdade, que, contudo, geralmente se perde de vista: o cinema nasceu documentário e dele extraiu seus primeiros poderes (Lumière)” (COMOLLI, 2008, p. 169). 14 Antropóloga argentina, esposa de Mestre Didi e coordenadora geral do SECNEB.

Cineasta Roque Araújo

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Divulgação do Cineclube Tela Preta Nesse sentido, o Cinema Negro Baiano também constitui redes e parcerias para fomentar, na contemporaneidade, a distribuição, o debate e a exibição de suas produções na disputa pela memória. Para citar alguns agenciamentos, o selo Tela Preta, coordenado por Larissa Fulana de tal, no curso de bacharelado em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB), funde cinema e engajamento político, destacando-se por produzir filmes, como Canções de Liberdade (2012), de David Ayan, e Cinzas (2012), de Larissa Fulana de Tal); realizar eventos, como o Seminário Cinema Negro: África e diáspora desafios e perspectivas (UFRB); e pela criação do Manifesto Tela Preta, que propõe a realização de um cinema fundado no tripé: produção, autoria e cosmovisão negra. A UFRB realiza também, entre as atividades do curso de graduação em Cinema, a Mostra com Mulheres e o Festival de Documentários de Cachoeira/BA, no qual apresenta dois programas: o Programa por um Cinema Negro Feminino e Programa Adélia Prado (referência a primeira cineasta negra do Brasil). No interior da Bahia, podemos citar ainda a Mostra de Cinema Negro de São Felix, já na segunda edição. Em Salvador, a Mostra Itinerante de Cinema Negro Mahomed Bamba, completou, em 2021, o seu quarto ano de existência. Desde 2018, a MIMB vem promovendo o debate, exibindo filmes e realizando alguns concursos, como o Concurso Cultural de filmes produzido por celular. Vale também mencionar a criação de produtoras, como a Eparrêi Filmes e Dois Arroz Filmes e Produções, coordenadas pela cineasta Elen Linth, diretora do filme Além dos muros (2014), Transviar (2018), Maré (2018), entre outros, e a produtora de audiovisual “¡Candela!”, sob a coordenação de Ceci Alves, diretora dos filmes Doido Lelé (2009), Da alegria, do mar e de outras coisas (2012) e O velho rei (2013). Para finalizar, com a certeza que não daria conta de esgotar todos os agenciamentos fomentados pelo Cinema Negro da Bahia, destaco o Núcleo Baiano de Animação Stop Motion (NUBAS), sob a coordenação das diretoras Cíntia Maria e Jamile Coelho (Talvez futuro, de 2011, e Òrun Àiyé: a criação do mundo, de 2015), que se constitui como um quilombo urbano; entre os seus programas educacionais, culturais e de desenvolvimento comunitário estão o LabCine (que visa democratização do acesso ao audiovisual), o Cineclube Antônio Pitanga (que difunde as produções do audiovisual)

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Oficina realizada pela Nubas e Boca de Brasa (voltado para formação e intercâmbios). No cenário baiano, contamos ainda com uma diversidade de cineastas negras, tais como: Eliciana Nascimento, de O tempo dos Orixás (2014), Júlia Morais, com Avesso (2016), Lara Rodrigues, com O amor é um cão dos diabos (2016), Thamires Santos, com O dia que ele decidiu sair (2015), Urânia Muzanzu, com Merê (2017) e Vilma Neres, com Nana & Nino e o tempo de brincar (2015). Portanto, as produções cinematográficas, os eventos, mostras e seminários sobre o cinema negro na Bahia, assim como a possibilidade de acesso a filmes junto à Diretoria de Audiovisual da Bahia (DIMAS), o Instituto Radiodifusão Educativa da Bahia (IRDEB), a Fundação Cultural Palmares (nacional e local), entre outros, são pistas, rastros de uma escrita que têm nas corpografias negras baianas as ressiginificações das memórias sobre as culturas afrodiaspóricas no audiovisual.

Em exibição: O dia de Jerusa (2014) No filme O dia de Jerusa (2014), de Viviane Ferreira, as corpografias aparecem marcadas pela interseccionalidade de raça e gênero. As personagens Silvia (Débora Marçal) e Jerusa (Léa Garcia) representam identidades femininas assinaladas por temporalidades diferentes: a jovem pesquisadora e a senhora aniversariante. Contrariando as representações simbólicas sobre as mulheres negras, a narrativa fílmica de Viviane Ferreira pode ser lida a partir das lutas do movimento feminista negro, seja pela quebra dos estereótipos ou pela alteração do papel social imposto às mulheres negras. Uma representação simbólica sem objetificação sexual ou exotização, imagens que contribuem para a construção de novos lugares sociais na luta antirracista e sexista. A corpografia apresentada também é marcada pela denúncia contra a violência impostas às mulheres negras. A personagem Silvia é uma jovem que trabalha com pesquisa de opinião, seu espaço de trabalho é hostil, com o assédio moral da chefe; nas ruas está exposta a todo tipo de situação, como a de assédio sexual. Silvia não se acomoda nesse lugar e se inscreve para o exame de vestibular, o ingresso na universidade é lido como uma possibilidade de ascensão social. Jerusa é uma senhora, que vive sozinha com suas memórias, vítima de violência patrimonial provocada pelo ex-marido, porém nem só de lembranças tristes vive a aniversariante, a história ancestral e de resistência de sua avó e de sua mãe a retroalimenta de orgulho e assinala positivamente a participação das mulheres na luta contra a escravidão e a subserviência.

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As histórias individuais das personagens e o modo como se dá o encontro de duas gerações diferentes de mulheres negras, com suas memórias e trocas evidenciam uma mudança no registro dessas corporeidades em cena, especialmente, por homenagear a transmissão de saberes através da tradição oral. Segundo Viviane Ferreira, o cinema que me disponho a fazer perpassa minhas observações e vivencias cotidianas, então é o cinema que eu sinto em minha pele, que reflito no brilho dos fios de meu cabelo. Mas, no Brasil, existe um cenário de total agressão às subjetividades negras. Por isso, não podemos parar de produzir nunca, e os diretores e diretoras negros vêm resistindo. O dia que abandonarmos nossas histórias, nossa estética e subjetividades, significa que o racismo venceu (NWABASILI, 2014).

Outra característica da narrativa produzida pela cineasta negra é o da afetividade, também no espaço da rua. Na cena em que um casal é flagrado namorando sob lençóis, contrariando as imagens que normalmente são produzidas sobre pessoas em situação de rua, na cena vemos humanidade e amor. A dramatização da crueldade como sujeito sócio-midiático é a marca da atual reflexão sobre as artes e a mídia. Viviane Ferreira desvia seu olhar do que vem predominando nos estudos sobre cidade, marcados por uma “estética da crueldade”, fruto de uma realidade desigual (DIAS; GLENADEL, 2004, p. 7). Ferreira percorre o caminho do amor, apesar das precárias condições de moradia, os personagens da cena “apaixonados na rua” respondem com sorriso a interrupção do seu namoro. É no espaço das ruas que outros corpos negros transitam, a cidade de São Paulo apropriada por um catador de papel que desfila com sua carroça no início e final do dia; o jovem Kleber que declama um trecho do poema “Minha mãe”, de Cruz e Souza, o citado casal; o senhor da lanchonete, enfim, essa diversidade de corpos compõe um cenário múltiplo e diferenciado por não carregar as cenas com representações negativas ou estereotipadas. Esses corpos operam uma função pedagógica enquanto território de resistência e afirmação identitária. Especialmente, no tocante ao corpo da mulher negra, o curta O dia de Jerusa é uma lição para a história de negligência imposta pelo sistema de relações sociais marcados pelo machismo e pelo racismo; o corpo feminino negro é comumente associado ao exótico ou ao erótico. Em 2020, foi lançado o longa-metragem Um dia com Jerusa, um desdobramento do curta citado. Um filme lindíssimo e já premiado. Filme Um dia com Jerusa (2020)

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Considerações preliminares O Cinema Negro Baiano é, no sentido desse estudo, um espaço ativo e diverso de formação cultural alternativa, que, através da linguagem cinematográfica, reconfigura as memórias afrodiaspóricas. Esse “lugar de memórias” constitui-se arquivo material, funcional e simbólico, para retomar o termo de Pierre Nora (1993, p. 7), ou seja, são suportes externos que ajudam a estimular o processo contínuo de atualização da população negra da Bahia como sujeitos históricos e parte singular na constituição da nação brasileira. As lembranças acionadas pela narrativa fílmicas de Viviane Ferreira encontram-se na convergência de diversas redes de solidariedade, com um roteiro composto por memórias pessoais e coletivas que simbolicamente representa as demais produções e agenciamentos aqui citados. Importante compreender que as “corpografias negras em telas” (PEREIRA, 2017) produzem inscrições/rastros que visam preencher lacunas históricas, culturais e sociais. A presentificação desses corpos negros/as, historicamente marcados por representações estereotipadas, por invisibilizações e/ou visibilidades controladas pelo racismo e pela política de branqueamento, promovem alterações nos discursos e práticas de representação garantindo a constituição das suas identidades, possibilitando a visibilidade de diferentes experiências de autorepresentação.

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IRUN ORÍ: FIO CRESPO QUE LIGA NARRATIVAS ENTRE ÁFRICA E DIÁSPORA Evelyn Sacramento No contorno de minhas renúncias uma senhora pesqueira acolhe, melindrosa, qualquer indício de lágrima Das dores, uma a uma é desfeita na beira de meus cuidados e na findura das mãos trança, zelosa os fios que ainda não veio1. (Louise Queiroz, 2019) O corpo negro nasce com marcas indisfarçáveis: o cabelo crespo, os lábios grossos, o passado histórico, os traços culturais. O preconceito racial tratou de inscrever essas marcas como símbolos negativos e de reprovação, trazendo os fenótipos europeus como belos e vendáveis, “o racismo, ao contrário promove uma inquietação obsessiva com a pureza do sangue, sendo o traço da identidade se encontra inscrito no corpo do indivíduo” (NASCIMENTO; THOMAZ, 2008). Em relação às mulheres negras esses aspectos se intensificam ainda mais, fazendo com que seus modos de existência sejam pautados pela opressão, a partir da combinação do racismo e do sexismo, como aponta a intelectual negra Lélia Gonzales: A mulher negra é o grande foco das desigualdades [sociais e sexuais] existentes na sociedade. É nela que se concentram esses dois tipos de desigualdade, sem contar com a desigualdade de classe, com a desigualdade social2.

Sendo o Brasil um país em que a maioria da população se autodeclara pretos e pardos, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua do IBGE, esses números chegam a 56,10% da população. Ainda assim, na televisão (novela e publicidade) e no cinema, a presença de negros e negras é incipiente, e quando ocorrem, muitos destes personagens são 1

Trecho do poema “Re-nascimento”, da autora baiana Louise Queiroz, presente no livro Girassóis Estendidos na Chuva, lançado em 2019, pela editora Paralelo13s. 2 Racismo e machismo mantêm mulheres negras no grupo de menores salários do país: intelectual Lélia Gonzales se dedicou a explicar o impacto da combinação racismo e sexismo sobre mulheres negras. Disponível em: . Acesso em: 5 de março de 2021.

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carregados de estereótipos negativos, homens e mulheres atravessados por símbolos racistas e papéis reducionistas. Durante décadas foram transmitidas pelas antenas de TV, personagens femininos sexualizados, a empregada doméstica fogosa, que mantém romance secreto com filho dos patrões, a puta, a prostituta, ou a senhora que cozinha delícias, mas seu rosto não estampa as propagandas e os produtos. Quase nenhum diálogo, nenhum conflito, o corpo e a pele dessas mulheres comunicam sem antes que elas falem: (...) Dificuldade de vislumbrar, de imaginar as mulheres negras além dos estereótipos, em suas contradições, subjetividades, formas de re(existência) e, principalmente, em sua capacidade de cotidianamente reconstruir sua humanidade, negada pela violência do racismo, do sexismo, da pobreza e da invisibilidade (FERREIRA, 2016. p. 261).

Essas formas de representar e serem representadas moldou imaginários e a forma como as mulheres negras são vistas para além das telas. Sendo deste modo, ferramentas importantes para a manutenção da cultura colonial, que se repete e reafirma a cada personagem. As mídias audiovisuais, como cinema e novela, estão fortemente ligadas às construções de identidades de uma nação. O que historicamente é visto nas telas é, como pontua Joel Zito Araújo (2001), “o caso exemplar da decadência do mito da democracia racial”. Se, por um lado, exaltase uma sociedade igualitária, por outro, através da mídia, revela-se a forma como essa sociedade se expressa e quer ser vista, colocando os negros subservientes, marginalizados ou simplesmente ausentes em suas produções. O padrão branco é o padrão de referência na teledramaturgia brasileira, predominando também no cinema e na publicidade, isso vem desde a construção da identidade racial brasileira que privilegiou a estética branca. Entende-se aqui que o ser humano branco não se encontra enquanto corpo racializado, eles são vistos como o comum, seres universais. Por outro lado, a pessoa negra, é vista como o Outro, ou seja, corpos racializados como diferente, como incompatível, como conflitante, como estranho(a) e incomum (KILOMBA, 2014. p. 176). A pesquisa do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa3 (GEMAA), da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), revela que existem intensas desigualdades de gênero e raça nas áreas de direção, roteiro e atuação dos filmes superiores a 500 mil espectadores entre os anos 1970 e 2016. A pesquisa mostra que nesse recorte, os homens brancos dirigiram 98% dos filmes, foram roteiristas destes filmes com cerca de 71%, ainda que as mulheres brancas figurem entre os 6%, apenas Julciléa Telles4, foi identificada como uma roteirista negra. Já no elenco principal, a história narrada e escrita por homens brancos, tem como protagonistas homens e mulheres brancas, com cerca de 50% e 36% respectivamente. Os homens brancos estão atrás das câmeras, são os roteiristas e protagonistas de suas próprias histórias, seguido das mulheres brancas. 3

O boletim GEMAA 2: Raça e Gênero no Cinema Brasileiro (1970-2016) conta com base nos dados disponibilizados pelo Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual (OCA-ANCINE), seguindo as informações de gênero e raça das pessoas que desempenham as atividades de direção, roteiro e atuação, fazendo um recorte entre, homens negros e brancos, mulheres negras e brancas, além de homens e mulheres sem identificação de raça. 4 Julciléa Telles (1955) é uma atriz brasileira que teve seu auge na pornochanchada, encarnando o papel da mulher negra sensual em diversos filmes na época, depois foi para as telenovelas atuando na TV Manchete e na TV Globo. Em 1981, ela dividiu o roteiro do pornochanchada A Gostosa da Gafieira, juntamente com Roberto Machado.

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O boletim ainda traz um dado alarmante: nenhuma diretora negra aparece no comando de uma produção de grande bilheteria no recorte de 46 anos que a pesquisa avalia. O estudo revela uma verdade inconveniente, nessas quase cinco décadas as mulheres negras acumulam longos anos de invisibilidade. Adélia Sampaio foi a primeira cineasta negra a realizar um longa-metragem, pioneira dentre as cineastas brasileiras e realizadora do primeiro filme que aborda a lesbianidade no cinema brasileiro, esquecida pela história do cinema: É importante destacar que a visibilização de Adélia foi possível a partir, do trabalho de outras mulheres negras, primeiro através da pesquisadora de cinema negro Edileuza Penha de Souza que trouxe em sua tese intitulada Cinema na Panela de Barro: Mulheres Negras e suas narrativas de amor, afeto e identidade, defendida em 2013, pelo Departamento de Educação da Universidade Federal de Brasília, a informação de que Adélia é a primeira cineasta negra brasileira. E mais recentemente, através do artigo publicado no site Blogueiras Negras “O racismo apaga a gente reescreve: Conheça a diretora negra que fez história no cinema nacional”, escrito por Renata Martins e Juliana Gonçalves, a trajetória de Adélia Sampaio alcançou repercussão nacional (SACRAMENTO, 2017, p. 5).

Já na Bahia, segundo dados do Observatório do Audiovisual Baiano5, através do Boletim Temático nº 2, que aborda a participação feminina no audiovisual do Estado da Bahia, esses dados se repetem. A pesquisa, que explora as principais funções técnicas6 do setor, sendo: direção, roteiro, produção executiva, direção de fotografia e direção de arte, dentro desse recorte, analisou todas as 110 obras realizadas no período de 2008 a 2020. Ela confirmou o que já tinha sido apontado pelo boletim do GEMAA analisando o cenário nacional: na Bahia também há uma baixa representação das mulheres nos cargos de maior prestígio, como no caso da direção – com apenas 23%, sendo que de todas categorias, é na produção que há uma maior presença feminina, com 56% dos cargos. Esses dados são muito sintomáticos, pois mostra que as mulheres não ocupam cargos de comando, mas por outro lado, executam o trabalho da produção que é fundamental para que o filme aconteça. O boletim também destaca a intersecção de cor, raça e etnia, ainda que não se debruce exatamente sobre essa relação, apenas faz um breve mapeamento sobre outras pesquisas acadêmicas que abordam sobre a intersecção gênero e raça no audiovisual baiano, como a monografia “Nada sobre elas, sem elas: reflexões sobre a participação da mulher negra na produção audiovisual baiana”, de autoria de Driele Mota Gomes7. Neste texto, a autora busca compreender acerca da participação de mulheres no cinema baiano. Ela constatou que, na produção audiovisual baiana, há uma maior presença das mulheres negras no circuito alternativo. Vale acrescentar que a presença dessas mulheres não acontece somente através dos cargos técnicos, existe também uma importante atuação no campo dos festivais de cinema independente. Em Salvador, por exemplo, acontecem a Mostra Itinerante de Cinemas Negros Mahomed Bamba (MIMB), que reúne filmes de homens e mulheres negras, e a mostra Cinequebradas, com filmes 5

O Observatório do Audiovisual Baiano é um projeto de pesquisa que tem como objetivo acompanhar o audiovisual baiano. Em parceria com o Observatório da Economia Criativa da Bahia, ele foi financiado, em 2019, pelo edital Setorial do Audiovisual, com apoio financeiro do Governo do Estado da Bahia, através do Fundo de Cultura, Secretaria da Fazenda, Fundação Cultural do Estado da Bahia e Secretaria de Cultura da Bahia. 6 Essa avaliação é semelhante à que a Agência Nacional do Cinema (ANCINE) publicou, em um recorte entre 2015 e 2018. 7 A monografia pode ser acessada no repositório da UFBA, através do link: http://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/31090. Acesso em 10 de março de 2021.

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Cine Quebradas produzidos por e para mulheres pretas LBTQIA+. Já na cidade de Cachoeira acontece a mostra Mulheres, Ativismo e Realização (MAR), que faz uma curadoria de filmes realizados por mulheres negras e brancas, entre outras realizações. É interessante notar que toda a “europeização” que a mídia tradicional busca reforçar, não existiu sem que houvesse uma forte contracorrente, justamente como uma estratégia para pautar a diferença. Deste modo, reconhecer a diferença se faz necessário. O filósofo camaronês Achille Mbembe (2021) pontua sobre o uso da diferença como forma estratégica para determinados grupos, “(...) seja como um modo de garantir direitos que de outra forma não teriam, seja como um modo de justificar a concessão de tais direitos a grupos inteiros de pessoas”8. O cinema negro encontra fôlego nos projetos alternativos à grande mídia e que a sua inserção nela, ainda que em pequena medida – diante das grandes produções – tem sido uma resposta a um público que se expande cada vez mais combativo e empoderado em relação a questões como raça e representação e que não se veem nas telas, contemplando uma reivindicação que historicamente é uma das principais lutas de diversos movimentos negros. De fato, a reivindicação por uma representação negra na mídia é uma reivindicação dos movimentos negros, que “no final da década de 1970, período de retomada da ação da militância negra após a ditadura militar, com o Programa de Ação do Movimento Negro Unificado, de 7 de julho de 1978, apresentava propostas de ações na mídia” (ARAÚJO, 2002). O cinema negro é construído independente, longe dos grandes espaços de produção: A adesão a esse conceito de cinema negro nos permite identificar então gerações sucessivas de militantes negros e negras que somente foram capazes de demarcar teorias e, consequentemente, ideologias, por meio de suas experiências de vida. Em outras palavras, Cinema Negro é um conceito cunhado na luta diária de combate ao racismo, ao preconceito e toda e qualquer discriminação. É, pois, um conceito corporificado pela militância negra que se finca no território e na territorialidade e nos orienta que é possível transcender da porteira para dentro, pois é nesse processo “que os 8

Por que julgamos que a diferença seja um problema? Disponível em: Acesso em: 10 de março de 2021.

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integrantes da comunidade compartilham conhecimentos, sentimentos e emoções comuns, que se estabelecem e se fortalecem os vínculos de aliança e se estrutura identidades” (SOUZA apud LUZ, 1992, 59).

Deste modo, pensar a diferença estrategicamente é construir o próprio cinema negro, enquanto categoria estética e política, se fortalecer enquanto grupo e criar estratégias para que as disparidades de produção sejam reduzidas: (...) Após a reintrodução e ressignificação da noção de raça no âmbito das reivindicações dos movimentos, o que precisamos hoje é um “essencialismo estratégico” por parte dos negros. Autoidentificarse como “negro” hoje significa ao mesmo tempo uma questão de afirmação e orgulho para a raça como também uma reivindicação de direitos. Essa postulação de essências por parte dos movimentos sociais é uma estratégia política importante porque tem o poder de “aglutinar identidades” em torno de um objetivo político (...) (MUNIZ, 2010). A diferença, desta forma, é utilizada de forma estratégica pela população negra, como forma de garantia de direitos e como forma de organização. Raça é um conceito que simboliza e significa interesses sociais relacionados, se autodenominar negro ou branco é principalmente uma aliança política.

Irun Orí: fio crespo que conecta a história de mulheres entre África e diáspora De Adélia Sampaio para cá, muito mudou. Boa parte das jovens cineastas da atualidade se pautam no pensamento feminista para construírem suas próprias narrativas fílmicas e pessoais, questionando o local de invisibilização que ainda teima em ser reservado para elas. Nesse cenário de reivindicação de narrativas negras, surge no Brasil um movimento de mulheres negras que rompe com todo uma estrutura de invisibilidade e busca alternativas independentes e coletivas para construir o cinema negro no feminino: Essa terminologia vem sendo usada no Brasil e no mundo, como um cinema arquitetado por cineastas negras. Em sua maioria, elas são mulheres negras e militantes que encontraram no audiovisual a possibilidade concreta para denunciar e combater o racismo, o machismo, a homofobia, e as múltiplas formas e especificidades de discriminações e preconceito tão arraigadas na sociedade. Nessa perspectiva, cresce a atuação de mulheres negras como produtoras, realizadoras, montadoras, cenógrafas, roteiristas, câmeras e diretoras (SOUZA, 2020, p. 180).

Na Bahia, destacam-se nomes como Ceci Alves, Dayane Sena, Everlane Moraes, Fabiola Silva, Larissa Fulana de Tal, Glenda Nicácio, Daiane Rosário, Taís Amordivino, Ana do Carmo, Júlia Morais, Jamile Coelho, Cíntia Maria, Thamires Santos, Adriele Regine, Laís Lima, Vilma Martins, Juh Almeida, entre tantas outras mulheres negras espalhadas pela capital e interior do Estado. Neste artigo, nos debruçaremos sobre a obra Irun Orí (2019), dirigido pela cineasta baiana, Juh Almeida. Nascida em Catu, interior da Bahia, ainda na juventude mudou-se para Salvador. Mulher, negra, lésbica. Cineasta. Escreve, Dirige e Fotografa. Diretora na Prodigo Films, fotógrafa na Clava.Co,

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Filme Irun Orí de Juh Almeida membra da Women Photograph, do Coletivo de Mulheres e Pessoas Transgênero, do Departamento de Fotografia do Cinema Brasileiro9 (DAFB) e Associação de Profissionais do Audiovisual Negro (APAN). Expressa através do seu olhar de forma documental, experimental e poética vivências e narrativas negras, mesclando assim vida e obra. O DAFB é um grupo criado para organizar as profissionais do mercado e fortalecer e estimular a participação delas neste segmento, visando suprir uma demanda no cinema e no audiovisual sobre a presença feminina, ainda insipiente no cenário profissional comparada a presença masculina. Através do coletivo, as integrantes visam discutir a questão da inserção feminina no mercado audiovisual, trabalhar medidas que promovam essa inserção e disponibilizar em seu site, os portfólios e contatos das profissionais que atuam no mercado audiovisual brasileiro. Já a APAN foi idealizada com o objetivo de pautar uma política audiovisual afirmativa a nível nacional: (...) São pilares estruturantes de formação, constituição e política da APAN a valorização da negritude e a defesa dos interesses de uma perspectiva inclusiva com atenção ao recorte racial em relação a todos os elos da cadeia produtiva audiovisual, sendo eles a concepção, produção, distribuição e exibição10.

A associação também tem como eixos de atuação, a valorização da negritude, promoção da autoestima, inclusão de profissionais negros, inclusão/valorização da pessoa negra, difusão de conteúdo do conteúdo do audiovisual negro, formação, combate ao racismo através do audiovisual, emancipação dos profissionais e empresas no mercado de trabalho. Além disso, ela funciona em forma de rede para mapear e conectar profissionais negros e negras de diferentes áreas, residentes 9

Site do DAFB: https://dafb.com.br/. Acesso em: 10 de março de 2021 Site da APAN: https://apan.com.br/sobre/. Acesso em: 10 de março de 2021..

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Filme Irun Orí de Juh Almeida em todo Brasil, possibilitando dessa forma, entender as particularidades de cada Estado, e buscar soluções de modo macro e micro no tocante ao audiovisual negro brasileiro, e, dessa forma, atuar na construção de políticas públicas que visem a garantia de direitos destes profissionais. É importante notar que, ao integrar associações e coletivos que pautam equidade de gênero e raça no campo do cinema nacional, um posicionamento político estará inscrito em seus filmes. Esse compromisso não está apenas na narrativa a ser contada, mas também na equipe por trás desses projetos. Ao longo da carreira, Juh Almeida dirigiu e roteirizou os curtas metragens Náufraga (Bahia, 2018), vencedor na categoria de melhor curta-metragem baiano no XIV Panorama Internacional Coisa de Cinema, Irun Orí (Bahia/Moçambique, 2019), também premiado como melhor curta baiano no mesmo festival, filmes que, de forma documental, ensaística e poética, narram sobre o universo feminino, e Eu, Negra (Bahia, 2021). Em seu perfil profissional, a realizadora afirma que “pesquisa Cinema Negro e se interessa por documentário e está conectada a toda atividade humana ligada a manifestações de ordem estética ou comunicativa e realizada a partir das emoções e das ideias”. Em reportagem, também relata que começou sua relação com a imagem fotográfica quando ganhou uma câmera da mãe ainda na infância11. Foi a partir da fotografia que ela passou a enxergar o mundo de forma poética, experimental e sensível. Em Irun Orí, a realizadora inicia a narrativa a partir de um lugar muito íntimo, a relação das mulheres negras com o cabelo, e esse fio crespo que liga as vidas das mulheres negras, desde a África e a 11

Arte que pulsa conta a história da fotografa Juh Almeida. Disponível em: Acesso em: 6 de março de 2021.

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diáspora dos povos africanos. Fade in, tela preta, logo da APAN escrito em caixa alta junto ao símbolo Sankofa no centro da tela, logo em seguida a marca do coletivo DAFB, e por último, a dedicatória “Para Lázaro Roberto, Lente Negra, que veio antes de mim”. Lázaro Roberto é um importante fotógrafo de Salvador, conhecido por registrar festas populares e manifestações do movimento negro desde a década de 1990. Juntamente com os fotógrafos Raimundo Monteiro e Ademar Marques, fundou o Zumvi Arquivo Fotográfico, que atualmente conta com um acervo com cerca de trinta mil fotografias – sendo que pelo menos vinte mil fotografias são de autoria do próprio Lázaro. É interessante notar que a carreira de Juh Almeida começou na fotografia, e dedicar esse filme a Lázaro Roberto é prestar homenagem àquele que veio antes, e que, ainda que com poucos recursos financeiros, começou a pensar a fotografia como registro para documentar a cultura e o movimento negro de Salvador. É nesse território que se inicia Irun Orí, situando o espectador onde está enraizado o filme que irão assistir, marcando também um filme que foi construído de forma independente e autoral, escrito e dirigido por Juh Almeida. No idioma milenar iorubá, a palavra irun significa cabelo e orí, cabeça. Juntas essas palavras formam o título do filme. Realizado em Salvador e Maputo, ele aborda a relação das mulheres negras com o cabelo (e para além dele), em um entrelaçamento que segue gerações. O filme começa com imagens ensaísticas de mulheres negras de cabelos trançados, correndo em uma região de mata. Essas imagens remetem-se à forma estratégica pela qual mulheres negras escravizadas faziam tranças que sinalizavam as rotas de fuga nas matas, para que não se perdessem do caminho para os quilombos, referência confirmada pela realizadora em entrevista: “(...) as mulheres trançavam mapas nos cabelos umas das outras para não se perderem nos caminhos de fuga para os quilombos, e foi a partir daí que surgiu Irun Orí” (ALMEIDA, 2020). Mesmo que a história oficial não confirme que os desenhos das tranças eram utilizados como rotas

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de fuga para mulheres escravizadas, por meio de dados históricos e/ou científicos, é interessante pensar, ou até mesmo fabular, através das estratégias usadas pelas mulheres negras nesse período para fugir da escravização, que a realizadora pensa na fuga como a possibilidade de uma nova vida, de ser livre principalmente. Em diálogo a essas imagens, Juh Almeida traz uma sequência de fotografias de mulheres e crianças com o cabelo trançado ou por fazer, utensílios utilizados para fazer as tranças, enquanto se ouve, a conversa de uma criança com sua avó e o processo afetivo de trançar os cabelos, tendo como fundo sonoro, o movimento do pente desembaraçando, o toque nos fios, a reclamação da criança, “a senhora tá puxando, vó!”, em uma imagem afetiva para muitas mulheres negras. Sendo o cabelo uma parte do corpo muito importante para elas, através e por causa dele, que muitas tiveram suas primeiras experiências com o racismo. Assim, a primeira estratégia de se livrar do racismo é esconder os traços que indicam essa negritude, mudando a textura dos fios, a forma mais simples e ao mesmo tempo a mais invasiva, buscando um padrão de beleza claramente inalcançável, sendo esse um processo doloroso e que marca as mulheres negras desde muito novas: Tendo a compreensão do racismo como sendo um sistema de poder que exclui e inferioriza o outro, faz com que o cabelo crespo e a cor da pele transformem-se em sinais mais perceptíveis das identidades étnico-raciais, e esses passam a ser ponto de conflito no que diz respeito à formação dessas mesmas identidades, suscitando os estereótipos (FIGUEIREDO; LOPES, 2018).

Nesse sentido, o cabelo natural, as tranças, o black power, ou qualquer outro estilo que evoque os traços identitários negros, que reforcem a pertença à etnia negra, estão trazendo uma reflexão sobre a representatividade, ressignificando esse corpo negro que foi marcado pelo racismo, e uma possibilidade de descolonização. Deste modo, tal como aponta a realizadora, “Irun Orí vai muito

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além do cabelo. Essa é a premissa, mas ele mexe com memórias, com árvore genealógica, com passado, com futuro e, acima de tudo, com ancestralidade” (ALMEIDA, 2021)12. O filme atravessa o Atlântico e chega ao Salão da Constance, em Maputo, Moçambique. Nesse espaço é que a parte documental do filme acontece, ao abordar sobre a vida de trançadeiras da África e da diáspora, que ganham a vida trançando o cabelo de outras mulheres, a exemplo de Constance, personagem fundamental da narrativa, que é apresentada na sequência. Constance é uma mulher que tra(n)ça a vida a partir do cabelo das mulheres que frequentam seu salão. Através de seu depoimento13, ela conta que aprendeu a trançar cabelos aos 15 anos de idade, e viu nas tranças uma forma de sobrevivência. Com essa renda, ela mantém sua casa, cria sua filha e compartilha a vida com o marido, desse modo, ela traz uma nova perspectiva sobre os cabelos. Como a realizadora pontua, Irun Orí, para mim, é antes de tudo uma convocação à comunidade negra ao aquilombamento, ao pensar coletivo, ao alinhamento de debates. Eu acredito na comunicação como ferramenta crucial para construção e progresso. E o que seria essa história, se não nossos ancestrais nos ensinando sobre identidade e a importância de sermos aliados, e de como nossos cabelos fazem parte desse movimento e nos ensina sobre nos reconhecermos e nos apoiarmos? (ALMEIDA, 2020)

O cabelo para Constance é o meio com o qual ela ganha a vida, como ela mesmo diz (possivelmente sendo indagada pela diretora): “é a forma de resistência para mim, para as minhas filhas e para o meu marido”. Através das tranças foi possível escapar da pobreza e poder sonhar com dias melhores com a sua família, comprar um terreno, construir uma casa, dar conforto às filhas. Constance, 12

“Cabelos como caminhos para a liberdade: para se ajudarem na luta contra a escravidão, mulheres negras trançavam nas cabeças, umas das outras, rotas de fuga para os quilombos; filme Irun Orí documenta essas histórias orais”. Disponível em: https://yam.com.vc/sabedoria/790563/cabelos-da-mulher-negra-como-caminhos-para-a-liberdade. Acesso em 7 mar. 2021. 13 A análise realizada refere-se à primeira versão filme, a versão final não tem mais fala na parte documental.

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através do cabelo, entrelaça as relações com as suas clientes, e o cabelo para a narrativa, se torna um fio condutor que liga África e Brasil. Para emaranhar essas duas cidades, Salvador e Maputo, o filme finaliza com a leitura do texto da escritora e poeta baiana Louise Queiroz, seguido de imagens de diversas mulheres negras com seus cabelos trançados. Louise é uma mulher negra e lésbica de Salvador, cuja escrita é permeada pela vivência enquanto tal, na qual ela narra, com sensibilidade, suas vivências e silêncios, traçando uma relação com a ancestralidade. A autora reflete sobre o fio do cabelo como uma condição ancestral que une a vida de mulheres negras: Há um território lavrado no crespo dos orís, ali rotas são traçadas e repassadas como bússola. Os pés que conhecem cada seixo e atalho, não se dobram aos perigos e armadilhas. Dandara é viva em cada passo: raiz bordada em trilha. O banzo refaz a flecha de Zeferina, decepa as mãos de açoite, lacera as bocas que silenciam. Há um caminho inteiro adornado em sua cabeça: movimentos, lembranças, atalhos, quilombos e ilhas. Quanto de sua história seus dedos tocam enquanto trançam, no corpo dos fios, uma memória insolúvel? Trazemos na boca um impulso de voz antiga que atravessou a barriga do oceano e, ainda em fúria, se mantém altiva. Em sonância, aquilombamos e ecoamos todas as vozes do agora. Vozes que desvelam sabedoria e, enlaçadas umas nas outras, sustentam as que ainda virão. Orí, uma estrada que une, comunica e aporta uma travessia (QUEIROZ, 2019).

O texto, que foi lido por Jamile Cazumbá, é um convite para pensar sobre a condição da mulher negra, desde a África ao Brasil, estabelecendo uma conexão com o fio de cabelo que une essas vidas. É também, uma possibilidade de pensar formas coletivas de narrativas sobre a autoria de mulheres negras. Nesse sentido, é importante destacar como o cinema negro no feminino, configura-se enquanto uma categoria de filmes de autoria de realizadoras negras, que são produzidos de forma independente, e ancorados na territorialidade e perspectiva da comunidade negra. Através dessas produções, as mulheres negras têm a possibilidade de ver e serem vistas nas telas de cinema,

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Filme Irun Orí de Juh Almeida possibilitando também que as subjetividades dessas mulheres sejam destacadas, um contraponto ao que se acostumou a ver nas telas de cinema tradicionais durante décadas. Como observa Beatriz Nascimento, É preciso imagem para recuperar a identidade, tem que tornar-se visível, porque o rosto de um é o reflexo do outro, o corpo de um é o reflexo do outro e em cada um o reflexo de todos os corpos. A invisibilidade está na raiz da perda da identidade.

O cinema negro no feminino deste modo recupera essa identidade, ao dar visibilidade para narrativa de mulheres negras, como um campo estratégico para que elas, enquanto realizadoras e espectadoras dessas produções reivindiquem essas identidades. Irun Orí é um convite a olhar para os becos da memória ancestral e encontrar nesse movimento uma história que resiste como fio de cabelo entrelaçado. O filme provoca uma valorização do cabelo crespo, evocando um cinema político identitário, conectado com a ancestralidade das mulheres negras.

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Baiano. Disponível em: Acesso em: 6 mar. 2021. CABELOS COMO CAMINHOS para a liberdade: para se ajudarem na luta contra a escravidão, mulheres negras trançavam nas cabeças, umas das outras, rotas de fuga para os quilombos; filme Irun Orí documenta essas histórias orais. Disponível em: https://yam.com.vc/sabedoria/790563/ cabelos-da-mulher-negra-como-caminhos-para-a-liberdade. Acesso em: 7 mar. 2021. DE JESUS, Jessica Oliveira. A Máscara. Cadernos de Literatura em Tradução, n. 16, p. 171-180, 2016. LOPES, Dailza Araújo; FIGUEIREDO, ngela. Fios que tecem a história: o cabelo crespo entre antigas e novas formas de ativismo. Opará: Etnicidades, Movimentos Sociais e Educação, v. 6, n. 8, 2018. MBEMBE, Achille. Por que julgamos que a diferença seja um problema. Tradução: José Geraldo Couto, Goethe-Institut Brasilien, dezembro 2016. MUNIZ, Kassandra. Sobre Política Lingüística ou Política na Linguística: Identificação Estratégica e Negritude. In: FREITAS, Alice Cunha (Org.). Linguagem e Exclusão. Uberlândia: EDUFU, 2010. NASCIMENTO, Sebastião; THOMAZ, Omar Ribeiro. Raça e nação. Raça, novas perspectivas, p. 193, 2008. QUEIROZ, Louise. Tecitura. In: QUEIROZ, Louise. girassóis estendidos na chuva. Salvador: Boto-corde-rosa livros arte café; ParaLeLo13S, 2019. SACRAMENTO, Evelyn dos Santos. Adélia Sampaio: uma cineasta que ousou ser. In: Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress, 2017, Florianópolis. Anais Eletrônicos. Florianópolis, p. 1-10. ISSN 2179-510X. SILVA, Conceição de Maria Ferreira. Mulheres Negras e (in) visibilidade: imaginários sobre a intersecção de raça e gênero no cinema (1999-2009). (2016) 297f Tese (Doutorado em Comunicação) – Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2013. SOUZA, Edileuza Penha de. Cinema na panela de barro: mulheres negras, narrativas de amor, afeto e identidade. 2013. 204 f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2013 SOUZA, Edileuza Penha. Mulheres negras na construção de um cinema negro no feminino. Dossiê Mulheres e espaço no cinema contemporâneo, v. 7, n. 1 (2020).

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DIVINA MEMÓRIA: A RELIGIOSIDADE NO CINEMA COMO UM CAMINHO À ANCESTRALIDADE Morgana Gama de Lima Taissa Dias Uma das formas pela qual a questão religiosa se constrói no cinema brasileiro e, especialmente, no cinema negro baiano, é através da subjetividade de seus personagens. Uma subjetividade que, embora emoldurada e mediada por dispositivos ficcionais do cinema, não deixa de estar associada a preconceitos herdados ainda no período colonial. A presença desse “elo colonial” pode ser percebida, por exemplo, quando no cinema brasileiro a representação da religiosidade é caracterizada pela predominância da encenação de rituais do catolicismo como norma, enquanto para outras expressões religiosas há uma tendência em se atribuir o lugar do exótico, subalternizado, periférico e alienado. Muitas dessas significações associadas a expressões religiosas não-hegemônicas podem ser interpretadas como um desdobramento da herança colonial no cinema feito no Brasil, sobretudo, se considerada a proveniência e a base formativa de boa parte das pessoas que assumem o lugar da realização. É preciso lembrar que a presença de novos sujeitos nesse campo, incluindo cineastas negros e negras, ainda é um fato recente, sobretudo, quando consideramos esse recorte no eixo de produção cinematográfica do estado da Bahia. Talvez uma das raras exceções, seja o ator Antônio Pitanga que, ainda na era do Cinema Novo, dirigiu o filme Na boca do mundo (1979), drama que, através do triângulo amoroso entre um homem negro, uma mulher parda e uma mulher branca, encenava conflitos relacionados à questão da mestiçagem no Brasil. Por outro lado, com a chegada de cursos na área de cinema, especialmente na região do Recôncavo Baiano, essa situação começou a mudar. Se durante muitos anos, o traço religioso de uma personagem servia como âncora para reforçar a sua condição de subalternidade e alienação na sociedade – fato reforçado inclusive por uma questão étnica, visto que a maioria das personagens religiosas é negra – com essa nova geração de cineastas a questão religiosa no cinema tende a ganhar novos contornos. A religião deixa de ser um aspecto associado a personagem com o fim de subalternizá-la, mas sim de promover sua emancipação, mostrando através da expressão religiosa a permanência e sobrevivência da ancestralidade, a despeito de todo um processo de negação e inferiorização de tais expressões ao longo da história.

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Com base nessa perspectiva, este ensaio pretende começar trazendo um breve histórico de como a religiosidade foi representada no cinema baiano de modo geral para, depois, mostrar como a produção contemporânea realizada por cineastas negros e negras, radicados na Bahia, tem possibilitado uma “virada de chave” em relação ao pertencimento religioso na ficção. Um pertencimento que, através dessas novas narrativas, deixa de estar reduzido a um signo de alienação das classes populares e se apresenta como um convite à memória e à restauração de vínculos e tradições recalcados pelo processo de colonização. Ao retomar essas tradições, tais filmes tendem a apresentar o pertencimento religioso como parte da constituição identitária de suas personagens, porém, de forma fluida e dialógica, como parte de um processo mais amplo de descolonização cultural ainda em curso na sociedade brasileira.

A religião é do povo: fé como alienação Tudo começa com a busca por representar a cultura popular no cinema. Em meados dos anos 1960, a produção cinematográfica brasileira permitiu que, pela primeira vez, os costumes, tradições e a influência da religião nas culturas populares se tornassem conhecidos a um público mais amplo. Ao mesmo tempo que tais produções demonstravam a riqueza das tradições populares, fazendo o Brasil conhecer o próprio Brasil, a abordagem crítica sobre a religião acabou servindo de argumento ideal para justificar a condição precária na qual essas pessoas viviam e a sua falta de engajamento nos movimentos políticos. A Bahia e a região do Nordeste brasileiro, de certo modo, sempre figuraram no cinema a partir desse referencial, sobretudo, em relação ao sincretismo que emerge de suas matrizes religiosas. Para tanto, basta lembrar do filme O pagador de promessas (1962), dirigido por Anselmo Duarte. Nele, Zé do Burro (Leonardo Villar), faz um pedido a Iansã pela cura de seu animal de estimação (um burro), mas decide pagar a promessa na Igreja de Santa Bárbara, santa que, pelo sincretismo religioso, corresponde à orixá. Estava posto o conflito. Enquanto para aquele homem pagar a promessa na Igreja era um simples gesto de gratidão pela graça alcançada, para o padre era uma heresia. E assim, a narrativa do filme colocava em evidência a estrutura de toda uma sociedade em que mais importava a preservação de hierarquias e valores associados a tradições religiosas hegemônicas, do que em considerar como legítima a experiência espiritual proveniente das classes mais populares. O conhecido cineasta baiano Glauber Rocha também deu importância à abordagem de questões religiosas em seus filmes. Começando em Barravento (1961), seu ponto de partida é a influência do candomblé no cotidiano de uma vila de pescadores. Os pescadores de xaréu têm problemas com a rede de pesca, ganham pouco para sustentar suas famílias, se sentem pressionados pelos comerciantes. Em contrapartida, para além das condições precárias de trabalho, é a crença religiosa e o respeito à Iemanjá, orixá das águas salgadas, que promove a unidade do grupo e orienta suas decisões. Apesar de toda a visibilidade que o cineasta confere às expressões religiosas de matriz africana, encenando seus rituais e forma de funcionamento, sua visão está baseada na ideia de “religião como ópio do povo”. Esse é o discurso de Firmino (Antônio Pitanga), ex-morador da vila que retorna da cidade grande como uma figura provocadora que questiona os valores e crenças utilizados pela comunidade, argumentando que não era necessário recorrer aos ritos religiosos para superar os problemas. No contexto da narrativa, foi o distanciamento de Firmino da comunidade, que o fizera mudar de perspectiva. Por outro lado, os letreiros iniciais do filme indicam que esse discurso, antes de ser da personagem, era proveniente da interpretação que o próprio diretor tinha sobre o aspecto

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religioso, como se lê: “No litoral da Bahia vivem os negros pescadores de ‘xaréu’ [...]. Permanecem até hoje o culto aos deuses africanos e todo esse povo é dominado por um misticismo trágico e fatalista” (grifo nosso). É com base nesse mesmo argumento que seu filme Deus e o diabo na terra do sol (1964) se constitui. Do litoral para o sertão, muda-se a paisagem, mas o ponto de vista sobre a religião continua o mesmo: uma estratégia de escape para lidar com dificuldades socioeconômicas. Na narrativa, o vaqueiro Manoel, diante das intempéries da seca no sertão, busca alternativas para sobreviver: primeiro na religião, depois no cangaço. Sob a influência do beato Sebastião, o vaqueiro faz sacrifícios, carrega de joelhos uma pedra sobre a cabeça, acreditando estar diante da solução para os problemas da seca. Se por um lado o cineasta dava visibilidade às tradições religiosas sertanejas, sustentadas pela devoção genuína de seus adeptos, essa visibilidade, mais uma vez, se apresentava como um reconhecimento às avessas, na medida em que sua apresentação servia de pretexto para justificar a religião como um instrumento de alienação do povo, marginalizando ainda mais os seus praticantes. Por isso, a relação de Glauber Rocha com a questão religiosa em seus filmes é vista como uma “equação insolúvel” (XAVIER, 2007), pois ora ele parece apresentar um discurso favorável ao pertencimento religioso, conferindo uma visibilidade renegada em outras produções cinematográficas, ora parece se opor a esse pertencimento, sugerindo a condição alienante de suas personagens por meio dos conflitos da narrativa. Para Jean-Claude Bernadet (1996), o tema da religião teria ganhado relevância no cinema brasileiro em algumas produções dos anos 1960 mais em virtude da importância do conceito de alienação para o movimento político da época, do que de uma constatação fruto da experiência ou convivência com aquelas comunidades. Era o cineasta intelectualizado no desejo de falar pelo povo e para o povo, mas sem fazer, ele mesmo, parte dessa vivência. O fato de eles se colocarem como agentes de conscientização das massas os impedia de perceber que o gérmen do projeto revolucionário, que tanto almejavam, já há muito se apresentava no seio das comunidades, porém em uma outra linguagem e dinâmica. A dinâmica do sagrado. Esse preconceito sobre a questão religiosa no campo da produção cinematográfica sofreu uma pequena mudança após o Golpe de 1964. Com o sentimento de frustração dos realizadores acerca do projeto de conscientização coletiva das massas, os filmes começam a apresentar um posicionamento mais favorável em relação às religiosidades, tratando-as não mais como fonte de alienação, mas como um fenômeno que tinha o potencial de agregar e mobilizar pessoas. Isso aconteceria não necessariamente por uma ideologia – como assim se deduzia pela política – mas por laços de afeto, partilha, solidariedade, desejo de bem comum. Como exemplo, surge a produção de documentários como Iaô (1974), dirigido por Geraldo Sarno, em que o cineasta baiano não só registra como, ele mesmo, participa de um ritual do candomblé. Já não era a religião do outro alienado ou do migrante nordestino oprimido na capital paulista, como no seu outro documentário, Viramundo (1965), mas era a religião como experiência. Apesar dessa mudança, já no final dos anos 1980, a crítica ao pertencimento religioso retorna como abordagem da narrativa no cinema mediante a popularidade de novas expressões religiosas como as igrejas evangélicas, algo que fica evidente, mesmo décadas depois, em filmes como Ó paí ó (2007), dirigido por Monique Gardenberg, e feito em Salvador, e Jardim das Folhas Sagradas (2011), de Pola Ribeiro. Nos dois filmes a diversidade religiosa que circula na sociedade baiana aparece de forma demarcada através de personagens que professam diferentes religiões – de um lado, a matriz africana, e de outro, o cristianismo de origem protestante. Nas duas produções, a hegemonia do catolicismo é deixada de lado para dar destaque a essas duas expressões religiosas que convergem pelo fato de estarem associadas a pessoas de camadas populares da sociedade, mas que sempre são apresentadas pelo viés do conflito. Em Ó paí ó, o conflito é encenado pela síndica evangélica que

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tem brigas constantes com os vizinhos, entre eles, uma mãe de santo. Já no filme Jardim das Folhas Sagradas, o conflito religioso se instala quando um homem, que é casado com uma evangélica, decide seguir os fundamentos do candomblé e se tornar um pai de santo. Enquanto na década de 1960 o filme de Anselmo Duarte parecia questionar a separação e hierarquia entre as religiões, as narrativas contemporâneas parecem mais preocupadas em mostrar diferenças e demarcar territórios de identidade. Por outro lado, foi como parte desse processo de diversificação religiosa que, aos poucos, as narrativas produzidas por cineastas baianos também deixaram de apresentar o pertencimento religioso como parte de uma identidade homogênea, atributo de um grupo ou classe social subalternizada. Ao invés disso, a questão religiosa passou a ser tratada de forma mais particular e subjetiva, articulada à trajetória não de um grupo ou classe social, mas a de um indivíduo, uma pessoa. Se por um lado, o discurso sobre a religião é reduzido à história de um sujeito, sua abordagem, inversamente, se torna mais complexa e mais rica trazendo consigo também as variáveis que constituem esse sujeito, incluindo questões de raça e gênero. Por isso, para além das imagens que permeiam o imaginário coletivo e que, em parte, estão relacionadas à forma como o pertencimento religioso foi construído no cinema, as novas produções dirigidas por mulheres negras do cinema baiano subvertem as concepções intelectualizadas acerca da religião como um atributo das classes populares, construindo novas narrativas no cinema fruto de experiências individuais e coletivas de afeto que se constituem com e através da religião. Foi preciso que uma nova geração de cineastas assumisse o lugar da realização cinematográfica para que, enfim, a religiosidade pudesse ser interpretada e narrada segundo parâmetros distintos do discurso hegemônico. Não mais restrito às instituições religiosas, nem como escape de camadas pobres da população diante da falta de alternativas, mas antes uma escolha pessoal e deliberada que vê na relação com o sagrado um caminho de reencontro. Reencontro consigo, mas também reencontro com outros e outras através de uma memória que, embora coletiva, nem sempre foi narrada.

O povo sou eu: religião, afeto e ancestralidade no cinema Essas realizadoras negras fazem do cinema um lugar para contar suas histórias e, através delas, recontar a própria História. Elas partem de sua própria vivência com a experiência religiosa e operam, ao mesmo tempo, a reapropriação de uma memória coletiva ancestral recalcada por mecanismos complexos e nem sempre perceptíveis de apagamento. Nesse aspecto, as narrativas fílmicas que se apresentam nessa nova geração, ao invés de mostrar o aspecto religioso como uma espécie de devoção institucionalizada e imposta, instrumento de alienação e dominação das pessoas, revelam a vivência da religião como um resgate de memórias afetivas e familiares. Uma experiência que, ao invés de aprisionar o sujeito, o emancipa e o mobiliza a construir laços com outros sujeitos. E é pela construção de laços com outros sujeitos, ou melhor, pela busca de resgatar esses laços, que Safira Moreira fundamenta seu trabalho no audiovisual. Nascida em Salvador, em seu primeiro curta-metragem, Travessia (2017), a realizadora faz da ausência de fotografias de famílias de pessoas negras, o gancho para sua intervenção no presente: criar novos registros agora com famílias em que homens, mulheres e crianças negras sorriem diante da câmera, protagonizando e ocupando o espaço da imagem que lhes foi negada ou na qual antes participavam apenas como coadjuvantes. É também de outra ausência que surge a sua segunda produção, o curta Nascente (2020). Feito durante o período de quarentena decorrente da pandemia de Covid-19, a memória abordada na

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produção não advém de arquivos alheios, mas da sua própria família. E é assim que a cineasta inicia a narrativa registrando a si mesma diante de um espelho coberto de folhas e, em seguida, acompanha uma mulher que coloca uma porção de pipoca em um altar com imagens de santos. Sem narração e sem palavras, a câmera passeia pelos cômodos da casa e, pouco a pouco, outras mulheres negras vão surgindo em cena até que no último plano o reflexo da cineasta no espelho já não aparece mais sozinho, mas reaparece cercado pela companhia de outras mulheres. Aqui, memória e ancestralidade se entrelaçam, porque a cineasta não consegue enxergar a si mesma sem enxergar essas outras mulheres que cercam sua existência. Uma memória que se faz viva no presente através das gerações, mas que também encontra nas tradições religiosas espaço para se disseminar, seja em oferta aos santos, aromas e danças que expressam mais a liberdade de suas praticantes do que uma imposição. Parte dessa nova geração também surge graças aos cursos de formação em cinema no estado da Bahia. Se o Recôncavo Baiano é reconhecido pela importância de suas diversas festas e tradições religiosas, não se imaginava pouco mais de dez anos atrás que também o seria por suas realizações cinematográficas. Foi em 2008 que a recém-fundada Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), inaugurou, no campus da cidade de Cachoeira, o curso de Cinema e Audiovisual. Entre as produções que nasceram na Universidade e alçaram voos nacionais e internacionais, está o premiado Café com Canela (2017). Mineiros, os diretores Glenda Nicácio e Ary Rosa se conheceram na UFRB e assinaram juntos a direção de uma das mais importantes obras do cinema baiano contemporâneo. O filme venceu o Júri Popular do Prêmio Petrobrás de Cinema no 50º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro em 2017. Também foi selecionado para o Festival Internacional de Cinema de Roterdã em 2018. Café com Canela se tornou o segundo longa-metragem brasileiro de ficção dirigido por uma mulher negra a entrar no circuito nacional de exibição. Apenas Adélia Sampaio havia chegado às salas de cinema brasileiras 34 anos antes, com Amor Maldito (1984). Café com Canela narra o reencontro de duas mulheres negras, Violeta (Aline Brune) e Margarida (Valdinéia Soriano). A primeira é uma mulher jovem, que vive feliz ao lado do marido e dos dois filhos, em Cachoeira. Ela é responsável pelos cuidados da avó idosa e acamada. Além disso, faz coxinhas, que vende de bicicleta pela cidade e arredores. Em um dia de trabalho, na cidade de São Félix, ela bate à porta de Margarida, sua antiga professora, e a reconhece. Margarida vive reclusa, tomada pela depressão após a perda do filho. As duas passam a se encontrar com frequência e,

Filme Café com Canela de Glenda Nicássio e Ari Rosa (2017) 67

entre cafés com canela, a jovem irá ajudar a ex-professora a lidar com suas perdas e dores. Com a quase totalidade do elenco e equipe negros, assim como a população das cidades retratadas, o filme reflete características marcantes da vida no Recôncavo, como a vida comunitária, a musicalidade e a religiosidade. Já nas primeiras cenas em que Violeta cuida da avó, Roquelina (Dalva Damiana de Freitas), percebemos no quarto objetos religiosos ligados tanto ao cristianismo quanto às religiões de matriz africana. Rosários de contas, crucifixos e imagens de santos católicos estão dispostos ao lado da vela amarela, da quartinha de água, dos colares de contas e imagens de Oxum e Oxalá. No plano fechado, em que a avó é alimentada pela neta, vemos no pescoço da velha senhora uma guia de contas pretas e vermelhas. Longe de causar qualquer espanto pela reunião de elementos de matrizes diversas, e ao contrário da comum representação de conflito entre religiões cristãs e de matriz africana no cinema brasileiro, a cena reflete a religiosidade que se exerce no dia a dia por muitos habitantes do Recôncavo. Diversas festas religiosas da região têm origem no sincretismo religioso. É o caso do Bembé do Mercado e da Festa da Purificação, em Santo Amaro, e das festas de Nossa Senhora da Ajuda e de Nossa Senhora da Boa Morte, em Cachoeira. Esta última é promovida pela confraria de mesmo nome, umas das mais antigas irmandades negras do país. Composta exclusivamente por mulheres negras, a Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte foi fundada em Cachoeira por volta de 1820. As irmandades negras tiveram um papel fundamental na resistência à escravidão no Brasil e na afirmação da identidade afro-brasileira. Praticavam o catolicismo, religião oficial e obrigatória, e também mantinham vivas tradições ancestrais africanas. Já no âmbito social, as irmandades se organizavam para dar a negros e negras condições dignas de vida e trabalho (SANTOS, 2020). Ainda hoje, a tradição religiosa das irmandades permanece viva. Em Cachoeira, a Festa da Boa Morte acontece todos os meses de agosto há mais de 200 anos, reunindo religiosos católicos e do candomblé, turistas, artistas e estudiosos. Esta religiosidade híbrida, ligada à história e à resistência de negros e negras à escravidão no Brasil, ainda é vivenciada, especialmente pelas gerações mais antigas. É essa naturalidade e fluidez da religiosidade que não corresponde a dogmas específicos (ou corresponde a mais de uma matriz dogmática simultaneamente), mas permanece fervorosa, que nos mostra Café com Canela. Se os filhos de Violeta se chamam Cosme e Damiana, em referência aos santos católicos, ela cozinha assobiando uma cantiga popular dedicada a Oxum1. Há uma bela cena em que a música assobiada pela jovem vai se fundindo ao som extradiegético. O assobio ganha instrumentos de percussão e marca a transição para a cena seguinte, em que Violeta está no quarto da avó, alimentando-a. A música continua e no móvel, ao fundo da cena, vemos novamente a figura de Oxum, entre as demais imagens religiosas. O culto à divindade das águas doces é um dos elos entre avó e neta e marca a importância da ancestralidade na configuração da experiência religiosa das personagens. Em outro momento, Violeta deixa o quarto da avó, que havia adormecido. Antes de sair, ela liga o rádio, que “toca” um ruído de águas correntes, barulho que nos remete novamente a Oxum e que retorna, justamente, no momento da morte de dona Roquelina, reafirmando o vínculo da divindade com a personagem. O ruído de água, outrora discreto no som do rádio, na ocasião de sua morte aumenta gradualmente, enquanto Violeta chora abraçada ao marido, e imediatamente silencia na cena seguinte. O quarto da avó, agora inabitado, é preenchido por um misto de penumbra e luzes (que parecem vir de uma janela fora de campo) formando um conjunto de sombras que “dançam” na parede como o fluir das águas de um rio. A sombra da imagem de Oxum também se move. 1

Oxum é uma divindade feminina entre os Orixás, deuses iorubás. É considerada rainha das águas doces, senhora da beleza, da fertilidade e da riqueza.

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Filme Café com Canela de Glenda Nicássio e Ari Rosa (2017) Oxum irá aparecer em sua forma humana (Michelle Matiuzzi) em outro momento do filme. Depois do reencontro e aproximação com Violeta, Margarida começa a se recuperar da dor da perda e resgatar hábitos antigos. Em um sonho, ela descobre o espelho da casa, que vivia tampado por uma manta, e olha a própria imagem. Uma mulher nua, coberta por joias douradas, com o corpo molhado, atravessa o quarto e se posiciona atrás dela, com as mãos estendidas. Se pensarmos nas características atribuídas a Oxum, como a feminilidade, a beleza e a riqueza, podemos associar a cena à transformação vivida pela personagem. Após anos de dor e angústia, Margarida está pela primeira vez diante do espelho, olhando-se de frente. O espelho, inclusive, é um dos objetos carregados por Oxum, segundo a cultura iorubá. Acolhida pela divindade, que lhe estende os braços, Margarida está se transformando. Vale lembrar que os arquétipos das orixás femininas na mitologia iorubá frequentemente carregam características de beleza, maternidade e vaidade. Mas ao contrário da concepção ocidental em que essas características são opostas às noções de força, atitude e transformação, as divindades femininas africanas são também guerreiras, agregando características consideradas no ocidente como masculinas. Assim, quando percebemos a influência de Oxum sobre Margarida, falamos de uma transformação que vai além da beleza e da vaidade, englobando força, atitude e mudança. O elemento religioso aqui, longe de relegar o indivíduo à inércia à espera da ação divina, é a força que o impulsiona à capacidade de conduzir o próprio destino. Outra produção que aborda a influência de uma orixá feminina é Pattaki (2019). “Filme-oferenda”2 para Iemanjá, é o nono curta dirigido por Everlane Moraes e ganhou destaque ao ser indicado para o Sundance Film Festival, em 2020, na categoria de melhor curta pelo Prêmio do Grande Júri, além de circular na 23ª Mostra de Cinema de Tiradentes (2020), 4º Festival Ecrã (2020) e Festival Internacional de Roterdã - Mostra Soul in the Eye (2020). Everlane nasceu em Cachoeira (BA) e foi criada em Aracaju (SE), onde cursou Artes Visuais na Universidade Federal de Sergipe (UFS). O trabalho da diretora baiana também é fruto do período em que viveu em Cuba, quando se graduou na Escuela Internacional de Filme y TV (EICTV-Cuba). Apesar de jovem, aos 33 anos, já atuou como produtora, diretora de arte e assinou a direção de dez filmes. Em Pattaki, tudo transborda. As luzes que desenham distorcidas imagens da cidade em espelhos d’água; o ruído da maré ou de uma simples gota diante da ensurdecedora ausência da fala; os olhos vidrados diante da lua cheia; a velha, mulher-ilha, cercada de água de todos os lados. No filme de 2

A expressão faz parte da sinopse do filme, divulgada na mostra CachoeiraDoc de dezembro de 2020.

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Everlane Moraes, todas as enchentes levam a Iemanjá. Iemanjá é a senhora das águas salgadas. Seu nome tem origem iorubá3, Yèyé omo ejá, e significa “Mãe cujos filhos são peixes”. Tem profunda relação com a maternidade e a ela são atribuídos os mistérios do fundo do mar. Também a ela, segundo a cultura iorubá, foi confiado o cuidado com as cabeças de todos os seres humanos. Conta um itan4 que Olodumare5, ao designar um reino e poder a cada orixá, determinou que Iemanjá cuidaria de Oxalá6. Iemanjá, contrariada, vivia a reclamar. Se a cada orixá cabia um nobre posto, por que ela viveria a cuidar da casa, dos filhos e do marido? Tanto reclamou que o ori7 de Oxalá se transtornou diante das queixas, e ele enlouqueceu. Iemanjá, para curá-lo, ofereceu-lhe água fresca e um poderoso banquete. Oxalá se restabeleceu e Olodumare deu a Iemanjá a missão de cuidar do ori de todos os mortais, tornando-a a “Senhora das cabeças” (PRANDI, 2001). Pattaki é um belíssimo retrato da poderosa influência de Iemanjá sobre as mentes humanas. No filme, é noite de lua cheia e cada uma das personagens se entrega silenciosamente aos encantos da senhora das águas. A fotografia explora luzes difusas que criam um clima de nebulosidade. As sombras das diversas formas da água no filme balançam sobre paredes, rostos, objetos. Tudo isso parece nos remeter aos mistérios do fundo do mar. Diante de uma mesa farta de flores, velas e alimentos, Iemanjá surge de braços abertos. Talvez esteja oferecendo um banquete às cabeças por ela hipnotizadas. Se, como já ressaltamos, por diversas vezes no cinema brasileiro os deuses eram o pano de fundo para as ações ou inércia humanas, seja cultuando-os ou respondendo às interferências divinas, em Pattaki a divindade é a própria ação. No filme, Iemanjá é a protagonista. Seus mistérios, seu cuidado, suas águas, nos convidam a uma experiência em que o sagrado é vivido na própria pele. 3

É um termo que designa genericamente as línguas faladas pelos Iorubás, um dos maiores grupos étnicos da África Ocidental. Os povos Iorubás vivem em sua maioria na Nigéria, mas também estão presentes em Benim, Gana, Togo e Costa do Marfim. 4 Itan é um termo iorubá que pode ser usado no singular ou plural e remete aos mitos, canções e outros elementos da cultura iorubá. 5 Olódùmarè, na tradição iorubá, é o Ser Supremo, criador dos homens e dos Orixás. 6 Oxalá foi o primeiro Orixá criado por Olodumare e por isso é frequentemente cultuado como a maior dos Orixás. Também conhecido como o senhor do branco e da paz. 7 Ori, em iorubá, significa “cabeça”.

Filme Pattaki de Everlane de Moraes (2018)

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Filme Pattaki de Everlane de Moraes (2018) Pattaki também reflete a ligação de Everlane Moraes com Cuba. Um letreiro no fim do filme nos informa que a obra é inspirada no poema “O peso da Ilha”, de Virgílio Piñera, grande escritor cubano do século XX. A obra “brutal” (CABRITA, 2012) versa sobre as mazelas do ser humano e de Cuba. As metáforas e referências diretas revelam detalhes da vida em um país cercado de água por todos os lados. Outro elo com Cuba é a própria Iemanjá. De colonização espanhola, o país recebeu africanos escravizados entre os séculos XVIII e XIX. Assim como no Brasil, heranças africanas, como o culto às divindades iorubás, foram incorporadas à cultura local. Hoje, o culto à Iemanjá permanece vivo em religiões como a Santería, em que é chamada de Yemaya, e no sincretismo com santas católicas como La Virgen de la Regla, a padroeira dos cubanos e dos portos de Havana. No caso do Brasil, embora as referências às divindades iorubás tenham sido incorporadas à cultura geral, sua expressão no imaginário coletivo ainda parece ser restrita. Muito se sabe na cultura popular sobre a vida e os feitos de santos católicos, por exemplo, independentemente da profissão ou não da fé católica. O mesmo não acontece com as divindades africanas, sobre as quais ainda pairam o desconhecimento e o preconceito, que também são refletidos pelos filmes. É sabido que o cinema, além de arte, é uma prática social, que dialoga com conceitos e imagens coletivos, compartilhados pelos membros de determinada cultura. No filme, Everlane Moraes não está simplesmente abordando a religiosidade. Pattaki dá à divindade africana a devida importância na constituição de nossa cultura e nos oferece um instigante repertório para alimentar o imaginário coletivo com referências da matriz africana. No âmbito do documentário, uma produção que busca in loco essas raízes ancestrais africanas é Merê (2017), dirigido por Urânia Munzanzu. O filme mostra a ida de lideranças femininas do candomblé da nação8 Jeje-Mahi ao Benim em busca de suas origens. A produção foi a primeira obra audiovisual brasileira produzida em África e dirigida por uma mulher negra. Merê destaca o protagonismo das mulheres negras na religiosidade de matriz africana. Nos depoimentos, elas reconstituem parte da trajetória da nação Jeje-Mahi no Brasil e se emocionam com a possibilidade de estar na terra de seus ancestrais. O que vemos é um registro de parte importante da história das religiões de matriz africana no Brasil feito pelas próprias sacerdotisas. Se tradicionalmente esta religiosidade foi documentada por antropólogos a partir de epistemologias colonizadoras, Merê, como nos informa a narração inicial do filme, “é a construção de narrativas desde dentro” . 8

Os candomblés se organizam em nações de acordo com os troncos linguísticos e as tradições culturais a partir das quais se originam. São nações do candomblé: Kêtu, Angola, Jeje e outras.

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Se, como é sabido, os modos de ver no cinema foram configurados a partir da perspectiva branca e masculina, o olhar de Urânia Munzanzu contribui não só para dar visibilidade a outras mulheres negras, mas como ferramenta metodológica na criação de novos modos de ver. Mais do que uma “compreensão antropológica” (XAVIER, 2007) da religiosidade popular, pode contribuir para criar novas epistemologias para o cinema.

Considerações finais Ao analisar a produção cinematográfica brasileira e, especialmente, a produção baiana pelo viés da religião é possível perceber a diferença e o impacto que os filmes realizados por cineastas negras têm operado para criar novos modos de compreensão sobre a própria cultura brasileira. Isso porque mesmo os cineastas que valorizavam a cultura popular em suas tradições religiosas, ao apresentálas como instrumento de alienação do povo, demonstravam uma nova faceta do colonialismo. Não o colonialismo que impõe uma expressão religiosa com o fim de dominar, mas aquele que diante da perda de hegemonia, prefere negar a religião do outro, associando o vínculo religioso a um processo de subalternização e marginalização, como forma de continuar exercendo poder. As estratégias mudam, mas a lógica é a mesma. Enquanto os filmes mais antigos se preocupavam em apresentar a questão religiosa, de forma quase didática, encenando rituais, comportamentos de seus adeptos e o seu funcionamento no âmbito institucional (igrejas, templos, terreiros), a vertente inaugurada por essa nova geração de cineastas, especialmente mulheres negras do cinema baiano, faz a religiosidade retornar ao seio original: a comunidade. É como parte de uma comunidade e sua memória que tais expressões se forjam. Apresentá-las como um instrumento de alienação é, simplesmente, ignorar a ancestralidade que atravessa e constitui o vínculo com o sagrado. Os filmes aqui brevemente analisados, ao invés de antecipar explicações sobre o que a religião significa, em uma espécie de objetificação do fenômeno, partem de experiências de suas personagens. Assim, mesmo que o espectador não possua o repertório necessário para interpretar os símbolos, signos e referências da religião apresentada, ele compreende pela partilha de sentimentos, sensações, afetos. Escolhas narrativas que refletem uma consciência acerca do processo de apagamento histórico de referências africanas na cultura brasileira e por isso, compreendem a importância e a

Filme Merê de Urânia Munzanzu (2017) 72

potência de trazer essas referências através do particular, do cotidiano, da memória. Uma relação que olha para o passado não como um mecanismo para obter o controle em relação ao futuro, mas como uma referência necessária para continuar a lutar no presente. Lutar pela memória sabendo que, diante da existência de vários centros e margens no curso da História, alguns fatos e acontecimentos serão, convenientemente, deixados de fora (GABRIEL, 1989). Trazer narrativas relacionadas à religiosidade no cinema, é mais do que reivindicar o retorno de uma memória popular, mais do que a sua mera visibilidade ou reconhecimento como tradição. Nesses filmes, a memória popular vai além da ideia de um “lugar” (NORA, 1993), como algo a ser lembrado com fins de monumentalização, mas como uma experiência a ser compartilhada. Uma experiência que uma vez encenada, narrada no cinema, tem o potencial de fragilizar os muros do preconceito e trazer renovação à perspectiva que se tem sobre religião na sociedade. Não se trata da religião do povo, sinônimo de um grupo homogêneo, subalterno e alienado, mas de uma experiência que pode ser de todos, inclusive a nossa. E é por esse processo de subjetivação da religiosidade no cinema, apresentado por essa nova geração de cineastas, que o vínculo religioso se dissolve e se multiplica em meio às múltiplas redes de pertencimento que atravessam e constituem um sujeito. Um vínculo com o divino, mas ao mesmo tempo, um vínculo com toda a memória que o precede, transcende e ultrapassa, mas que ao ser lembrada, narrada, contada pode se tornar um dos mais revolucionários e potentes gestos de descolonização na contemporaneidade.

Filmografia AMOR maldito. Direção: Adélia Sampaio. Rio de Janeiro: A. F. Sampaio Produções Artísticas; Gaivota Filmes; Portal Filmes, 1984 (80 min.). BARRAVENTO. Direção: Glauber Rocha. Salvador: Iglu Filmes, 1961 (80 min.). CAFÉ com canela. Direção: Ary Rosa e Glenda Nicácio. São Félix: Rosza Filmes, 2016 (102 min.). DEUS e o diabo na terra do sol. Direção: Glauber Rocha. Rio de Janeiro: Copacabana Filmes, 1964 (118 min.). IAÔ. Direção: Geraldo Sarno. Rio de Janeiro: Saruê Filmes; Mariana Filmes, 1976 (70 min.). JARDIM das folhas sagradas. Direção: Pola Ribeiro. Bahia: Studio Brasil Cinema e Televisão, 2011 (90 min.). MERÊ. Direção: Urânia Munzanzu. Brasil/Benim: Griot Filmes, 2017 (15 min.). NASCENTE. Direção: Safira Moreira. Salvador: Programa IMS Convida, 2020. Online (5 min.). Ó PAÍ ó. Direção: Monique Gardenberg. São Paulo/Rio de Janeiro: Dezenove Som e Imagem; Dueto Filmes, 2007 (96 min.). PATTAKI. Direção: Everlane Moraes. Cuba: Fundación del Nuevo Cine Latinoamericano; Escuela Internacional del Cine y TV San Antonio de los Baños, Cuba, 2018 (21 min.). TRAVESSIA. Direção: Safira Moreira. Rio de Janeiro: Escola Darcy Ribeiro de Cinema, Instituto Brasileiro de Audiovisual, 2017 (5 min.). VIRAMUNDO. Direção: Geraldo Sarno. São Paulo: Thomas Farkas, 1964-1965 (70 min.).

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Referências bibliográficas BERNADET, Jean-Claude. Cinema e religião. In. XAVIER, Ismail. O cinema no século. Rio de Janeiro: Imago, 1996. p. 187-194. CABRITA, Antonio. “A ilha em peso / Virgilio Piñera”. raposas a sul - As lebres de António Cabrita (blog). Postado em 27 de setembro de 2012. Disponível em: http://raposasasul.blogspot.com/2012/09/ailha-em-peso-virgilio-pinera.html. Acesso em: 10 mar. 2021. GABRIEL, Teshome. Third Cinema as guardian of popular memory: towards a third aesthetics. In: PINES, Jim; WILLEMEN (orgs.). Questions of Third Cinema. London: British Film Institute, 1989. (p. 53-64) LIMA, Morgana Gama de. Singularidades evangélicas: uma reflexão sobre personagens religiosas no cinema brasileiro contemporâneo. Dissertação (Mestrado). Programa Multidisciplinar de PósGraduação em Cultura e Sociedade, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2014 (178 p.). NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Projeto História - Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de História da PUC-SP, n. 10. São Paulo, dez. 1993. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/revph/article/ view/12101. Acesso em: 9 mar. 2020. PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. SANTOS, Mariana de Mesquita. As irmandades negras na encruzilhada do “sincretismo”: leituras sobre o Catolicismo e as religiosidades afro-baianas nos séculos XIX e XX. Em Tempo de Histórias - Revista do Corpo Discente do Programa de Pós-Graduação em História da UnB (Brasília-DF), n. 36, p. 9-28, jan./jun. 2020. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/emtempos/article/ view/31701/26473. SILVA, Taíssa Dias da; COELHO, Sandra Straccialano. Além do estereótipo: uma análise de Mãe Santinha, de O maior amor do mundo. Esferas, n. 18, 2020. Disponível em: https://portalrevistas. ucb.br/index.php/esf/article/view/11853. XAVIER, Ismail. Barravento: alienação versus identidade. In. Sertão-mar: Glauber Rocha e a estética da fome. São Paulo: Cosac Naify, 2007. (p. 23-51).

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FESTIVAIS, MOSTRAS E CINEMAS NEGROS NA BAHIA: UMA HISTÓRIA EM CURSO Izabel de Fátima Cruz Melo Ausência total do mundanismo tradicional dos festivais, abertura para todas as experiências cinematográficas e um acentuado clima de trabalho. (Guido Araújo) Eu vou insistir em dizer que não é um festival, eu não quero um festival que tem prêmio e tal. Eu quero um Encontro de cineastas pretos, sabe? Para nós negros brasileiros falarmos com a arte latino-americana e com os africanos. A ideia foi essa. (Zózimo Bulbul)

Cio da terra Ao se falar em história do cinema, em geral há uma concentração dos olhares nos filmes, algo que se prolonga ao pensarmos nos festivais e mostras cinematográficas/audiovisuais. Contudo, a abordagem que pretendemos aqui, se propõe a colocar outra possibilidade, compreendendo o cinema como “mais que o filme”, ou seja, pensando-o como um processo amplo que transita e articula desde a formação, realização, distribuição, curadoria, programação conservação, preservação, crítica, cineclubismo, pesquisa, entre outros aspectos, nos interessa aqui justamente pensar os festivais como espaços formativos, além ou melhor, junto com a circulação dos filmes. Por isto, iniciamos nosso texto com as citações de Araújo e Bulbul, respectivamente tratando da Jornada de Cinema da Bahia e do Encontro de Cinema Negro, visto que elas tensionam desde os anos 1970, no caso da Jornada, um entendimento ainda muito corrente e cultivado contemporaneamente, dos festivais e mostras como lugares constituídos exclusivamente de disputas e celebração. Estas falas aqui sublinhadas apontam para possibilidades formativas, pensadas em um sentido aberto, que se constitui além do sentido escolar, pelos diálogos, articulações e trocas. Deste modo, nos é cara a perspectiva de Tatiana Carvalho Costa que, em franco diálogo com Beatriz Nascimento e Abdias do Nascimento, propõe o QuilomboCinema como categoria: Um QuilomboCinema que agrega direta ou indiretamente realizadores, pesquisadores, críticos, curadores e produtores que colocam na gira um conjunto de obras e de pensamento sobre elas e que tensiona a própria noção de Cinema Brasileiro Contemporâneo (2019, p. 225).

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Alargando um pouco mais a proposição de Costa, afirmamos que o QuilomboCinema tensiona a noção de cinema brasileiro de forma ampla, por colocar em cena estes sujeitos com novos interesses e pontos de vista, proporcionando outras entradas para se pensar e escrever a(s) história(s) do(s) cinema(s) no Brasil. Assim este artigo propõe um desenho inicial, portanto provisório e aberto a reestruturações, a respeito da presença dos cinemas negros nos festivais e mostras na Bahia, que é o ponto de ancoragem da proposta. Consideramos importante sublinhar que, apesar da sua importância para o campo cinematográfico, os festivais e mostras são objetos recentes na história e historiografia do cinema e em geral tem suas abordagens constituídas em um ordenamento eurocentrado, assim como a narrativa hegemônica a respeito do cinema (DE VALCK, 2007; VALLEJO, 2016). Entretanto, buscamos com o QuilomboCinema a elaboração de um olhar opositivo a esta escrita e pensamento dos festival studies, tentando observar de forma ampla quais caminhos e estratégias os realizadores e demais pessoas negras presentes no campo baiano estabeleceram para transitar, se organizar e firmar em espaços que muitas vezes engendraram silenciamentos com os quais nos deparamos ao lidarmos com a história. Neste texto, que já reiteramos como um primeiro momento, uma aproximação, nos interessa menos fazer um recorte temporal preciso, movimento que é metodologicamente esperado em relação aos historiadores e mais perseguir entre as ruínas e lacunas as possibilidades de iluminação dialógica/dialética entre o passado e o presente. Nesta perspectiva, podemos encontrar e deslocar na narrativa corrente do cinema na Bahia e no Brasil, pessoas e trajetórias como as de Luiz Paulino dos Santos e Agnaldo “Siri” Azevedo.1 Paulino, aparece resumido a uma teleologia que o vincula a uma perspectiva que transforma o Ciclo Baiano de Cinema ou Nova Onda Baiana e suas produções a uma plataforma “pré-Cinema Novo”, além da polêmica em torno de Barravento. No que tange a Siri, provavelmente um dos primeiros cineastas negros baianos, tornado um ilustre desconhecido, apesar da sua significativa produção documental em 16 e 35 mm entre as décadas de 1970/1990 e que circulou em diversos festivais brasileiros, inclusive obtendo diversas premiações. Seguindo ainda por este caminho, Luiz Orlando da Silva é uma presença incontornável2, pois como cineclubista, intelectual e militante do movimento social negro se constituiu como um mediador cultural fundamental no campo cineclubista baiano e brasileiro. Articulando a sua atuação inicial, mas não exclusivamente pelo Clube de Cinema da Bahia (CCB) em fins dos anos 1970 e da Jornada de Cinema da Bahia, uma ampla circulação de filmes, debates e pensamento cinematográfico, Orlando extrapola o dito centro de Salvador, em conexão com os bairros considerados periféricos e com outros estados do nordeste, pois ele era o responsável por organizar a distribuição e circulação da Dinafilme (Distribuidora de Filmes do Conselho Nacional de Cineclubes) na região. Além destas pessoas aqui rapidamente mencionadas, há muitas outras que poderiam e certamente serão acrescidas do desdobramento e aprofundamento da pesquisa, tais como Antônio Olavo, que se interessa e se aproxima do campo cinematográfico no mesmo período que Orlando e Siri, mas só realiza seu primeiro filme em 1993, Conceição Miranda e Lu Cachoeira, amigos e parceiros de

1 A respeito de Siri, cf: FRANÇA JUNIOR, Edevard Pinto. A Bahia de Agnaldo Siri Azevedo entre sujeitos, linguagens e temporalidades: representações da cidade do Salvador no documentário O Capeta Carybé (19501996). Dissertação. Programa de Pós Graduação em História. Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Guarulhos: Universidade Federal de São Paulo, 2018. 2 Sobre Luiz Orlando, cf: MELO, Izabel de Fátima Cruz Melo. Cinema, circuitos culturais e espaços formativos: novas sociabilidades e ambiência na Bahia. Tese de Doutorado. Programa de Pós Graduação em Meios e Processos Audiovisuais. Escola de Comunicação e Artes. Universidade de São Paulo: São Paulo, 2018 e CARIBÉ, Pedro Andrade. Cinema de Terreiro: o audiovisual negro de Luiz Orlando nos cineclubes em Salvador. Tese de Doutorado. Programa de Pós Graduação em Comunicação. Universidade de Brasília, Brasília, 2019.

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Cineclubista Luiz Orlando Orlando no movimento cineclubista, que transitavam e ainda o fazem, pouco visíveis nas narrativas históricas, mas sempre presentes e persistentes nas suas relações com o cinema na Bahia desde os anos 1970/80 até a atualidade.

Canção do sal Ao observar já citadas lacunas e ruínas, criamos este caminho provisório que coloca em relação o passado e o presente, produzindo história como uma operação formal, estética e política. Nesse sentido, o que aparentemente seria um desvio, torna-se essencial, pois as trajetórias citadas acima, seus modos de fazer cinema e mesmo os silenciamentos estão imbricados com a existência dos festivais e mostras. Dizemos isto pois ao observá-los pelo viés formativo, nos interessam mais os cursos, seminários, mesas, mostras especiais e paralelas, por onde essas pessoas transitaram tanto como organizadores, público, debatedores quanto com seus próprios filmes, do que necessariamente as premiações. Neste sentido, consideramos bastante significativa a reflexão de Orlando ao tratar das relações entre o CCB, a Jornada, os cinemas africanos e as lutas anticoloniais Uma coisa que é preciso ressaltar também para o cineclubismo baiano, a Jornada de Cinema e o Clube de Cinema da Bahia, foram fundamentais, foi o lugar onde as pessoas começaram a travar conhecimento, não só eu como os outros, com o cinema nacional e com o próprio cinema de outros países, principalmente com os países africanos, que era muito difícil ver um filme africano em Salvador, e quem começou, ao meu ver, foi a Jornada de Cinema da Bahia, que começou a divulgar, principalmente o cinema angolano, moçambicano, e por extensão, por causa do cinema se começou a conhecer pessoas do porte de Amílcar Cabral, Agostinho Neto, né? Se interessar... eu me lembro, não sei se foi na própria Jornada que começou a se falar, ou logo depois da Jornada, travar conhecimento com o apartheid que praticamente ninguém conhecia. (...) E a Jornada ajudou muito a difundir a ideia de pan-

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africanismo, luta contra os regimes de exce... contra o colonialismo. O conhecimento que as pessoas não tinham. Lembro que o primeiro filme que eu vi sobre contra o apartheid, se não foi na Jornada, foi no Clube de Cinema da Bahia, que fez uma programação desse tipo. E é importante essa ligação também, Clube de Cinema da Bahia e eram divulgadas pelo Clube de Cinema, não só para o movimento cineclubista, como para outras entidades. Só que no caso do movimento cineclubista, como ele tinha uma atuação mais nas áreas periféricas da cidade, o Clube de Cinema da Bahia teve um papel muito importante. Tanto assim, que na década de 80, quando o movimento estava no auge, nós formamos duas vezes o júri popular da Jornada, foi formado pelo movimento cineclubista (SILVA, 2005).

Embora longo, o trecho reafirma e indica possibilidades de aprofundamento e relação dos aspectos formativos dos festivais, inclusive com os movimentos sociais, construindo um movimento que pode nos levar de volta e conectar com as citações que abrem nosso texto. Aqui Orlando enfatiza a importância da Jornada dos anos 1980, com o Brasil ainda vivendo os estertores da ditadura, ainda como um ponto de convergência entre cinema e política, como um dos espaços seguros para os movimentos sociais de forma geral e cineclubistas, além de uma janela de difusão de filmografias e pautas político-raciais pouco conhecidas naquele momento e que ganhariam espaço, graças a articulação dos movimentos negros e suas entidades. Na perspectiva dos cinemas negros, cabe sublinhar a presença de Zózimo Bulbul e o seu Alma no Olho (1974), na VII Jornada, em 1977, no qual foi premiado com o Troféu Humberto Mauro de Melhor Filme em 35 mm. Apesar disso, curiosamente a ressonância do filme e mesmo a presença e possível influência de Bulbul e do cinema negro como uma categoria estética e política reivindicada pelas pessoas negras do campo cinematográfico baiano permanece pouco visível até por volta dos anos 2010, quando temos uma reorganização do campo cinematográfico não apenas baiano, mas brasileiro, no qual o cinema negro é reposicionado a partir das novas gerações, reconhecendo nele o seu patrono. Deslizando novamente nas temporalidades, há um aparente hiato entre os anos 1990 e 2010, no qual consideramos necessário destacar algumas então jovens presenças negras em processo de formação, tais como Ceci Alves, Marcos Pierry, Íris de Oliveira e Daiane Silva, entre outras, que transitam do ponto de vista da escolarização formal, pelas graduações, tais como o curso de

Zózimo Bulbul no filme Alma no Olho 78

Comunicação Social da UFBA, que apesar de não ter uma habilitação específica, tem algumas disciplinas e professores vinculados ao campo cinematográfico, o curso de Cinema da FTC, os cursos profissionalizantes do Liceu de Artes e Ofícios, entre outros, mas também pelos festivais, como a Jornada que permaneceu ativa até 2012, o Imagem em Cinco Minutos e o Panorama Coisa de Cinema, desenvolvendo atividades relacionadas a crítica, produção, realização, edição, pesquisa, docência e as relações entre cinema, cineclubismo e educação. Avançando novamente para os anos 2010, que, como pontua Janaína Oliveira, pode ser considerado um marco no cinema negro brasileiro por ser o momento da ampliação das políticas públicas de educação e implementação das ações afirmativas, tanto nas universidades quanto no campo específico do audiovisual, pela Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura (OLIVEIRA, 2017, p. 23). No caso baiano, podemos acompanhar estes desdobramentos tanto pela criação da habilitação de Cinema no Bacharelado Interdisciplinar de Artes da UFBA, em Salvador, e especialmente pela criação do curso de Cinema na UFRB, em Cachoeira, ambos em 2008. E nesta perspectiva, há uma relativa centralização da formação cinematográfica e audiovisual nas universidades, mas ainda assim, os outros espaços formativos, tais como os festivais e cineclubes seguem adensando assim a capilaridade do debate e da circulação das obras. Em se tratando da produção contemporânea do cinema negro, Cachoeira e a UFRB têm tomado centralidade no cenário brasileiro, a partir da produção cinematográfica dos seus estudantes. Graças a essa articulação tem-se viabilizado formas coletivas de agência no campo cinematográfico, que proporcionam uma espécie de movimentação que à sua maneira se apropria dos temas e formas de produção, intervindo nos debates, além de multiplicar as jovens presenças negras na produção, realização, crítica, curadoria e pesquisa, por exemplo. Dentre algumas, podemos destacar tanto como egressos ou ainda estudantes, Glenda Nicácio, Larissa Fulana de Tal, Thamires Vieira, Evelyn Sacramento, Clarissa Brandão, Ulisses Arthur, Fabio Rodrigues Filho, David Aynan, Juan Rodrigues, Álex Antônio, entre outras e outros que têm circulado entre festivais, mostras, programas de pós-graduação, residências artísticas e produtoras. No que tange a relação com festivais, estes realizadores têm transitado pelos circuitos de festivais brasileiros e estrangeiros, como o próprio Cachoeiradoc, que foi criado em 2010 como uma das atividades de extensão do curso de Cinema da UFRB, e que tem como uma das suas características o viés formativo, tanto pelo desenho da sua programação, quanto, sobretudo, pela participação dos estudantes da graduação, na produção, curadoria e júri, além também dos filmes na programação e parte significativa das pessoas citadas acima desempenhando uma ou mais funções dentro do festival.

A de Ó (Estamos chegando) – na verdade já chegamos e estamos Entretanto, observamos que, além do aumento na participação de festivais já existentes, há nas novas gerações vinculadas aos cinemas negros, a criação de espaços próprios para a circulação da sua própria produção, por perceberem o afunilamento e as barreiras interpostas pelo racismo que continuam a existir no campo cinematográfico bem como na sociedade brasileira. Mesmo considerando o avanço significativo das já citadas políticas de ações afirmativas, elas isoladamente não são suficientes para romper com as atualizações do imaginário da colonialidade racista e patriarcal que continua a vicejar no Brasil. Assim, ainda que os profissionais e artistas negros e negras sejam qualificados, criativos e inventivos, continuam encontrando curadorias majoritariamente embranquecidas que, na maioria das vezes, não conhece e nem se propõe a conhecer o repertório

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Mostra Osmane Sembène de Cinema trazido pelos cineastas negros, porque continuam a reproduzir os imaginários e estereótipos cristalizados pelo racismo. Nesta perspectiva, temos visto o aumento de programas dentro de festivais hegemônicos, tentando abrigar, de forma nem sempre adequada esta produção, mas especialmente, a criação de novos festivais e mostras de cinema negro em diversos estados do Brasil e também em outros países. No caso da Bahia, podemos destacar a Mostra Ousmane Sembene de Cinema (MOSC), a Mostra Itinerante de Cinemas Negros Mohamed Bamba (MIMB) e a Mostra de Cinema Negro de São Félix. A MOSC foi idealizada em 2017, na cidade de São Francisco do Conde, que faz parte do Recôncavo Baiano, por Assaggi Piá, pesquisador e realizador audiovisual, e Ro Mends, produtora e cineasta, ambos graduandos do Bacharelado e Licenciatura Interdisciplinar em Humanidades da Unilab, e realizada através do projeto de extensão CineMalês, vinculado a Unilab – Campus São Francisco do Conde. O nome da mostra homenageia Osmane Sembène, cineasta senegalês considerado como o pai do cinema africano, por construir através dos seus filmes um contraponto à visão do cinema colonial europeu nos países africanos. Isto se torna um dado bastante significativo ao levarmos em consideração que a universidade a qual a mostra está vinculada tem no seu horizonte o diálogo e a interlocução entre os países africanos lusófonos e o Brasil. A MIMB foi idealizada em 2018, em Salvador, pela cineasta e produtora Daiane Rosário e é organizada coletivamente com a participação de Taís Amordivino, Julia Moraes, Kinda Rodrigues, Loiá Fernandes e Naymare Azevedo, nas funções de coordenação geral, curadorias nacional e internacional, produção e produção executiva. A mostra traz no seu nome uma homenagem ao professor e pesquisador nascido na Costa do Marfim e naturalizado brasileiro, Mohamed Bamba, falecido em 2015, e que teve uma expressiva contribuição na docência e na pesquisa, evidenciando na sua produção estudos sobre os cinemas africanos e seus caminhos de circulação e recepção. Segundo Rosário, a homenagem deriva da importância de Bamba na sua contribuição para A construção de uma ótica de um cinema negro e africano em um universo totalmente embranquecido. (...) Porque ele estava no lugar certo, na hora certa. Viveu nosso tempo presente, resgatou nosso passado e ampliou nossos saberes, levando a gente a pensar no futuro. A MIMB é resultado disso (PRIMO,

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2019).

Ou seja, a partir do relato de Daiane do Rosário é possível inferir a importância de Bamba na sua formação enquanto estudante negra, em um curso de cinema no qual há uma participação minoritária de professores ou professoras negras no seu corpo docente, bem como das temáticas e abordagens que se aproximem das experiências e vivências negras. Sob esta perspectiva, que evidencia o olhar opositor de Daiane do Rosário e das suas companheiras de trabalho em relação aos saberes estabelecidos dentro do campo cinematográfico. Por fim, a Mostra de Cinema Negro de São Félix, criada em 2019 por Marvin Pereira e Luciana Brasil, além de contar na produção com Clarissa Brandão, Ellen Katarine, Lis Carvalho e Jeferson Batista, se propõe a levar para a cidade de São Félix, também parte do Recôncavo Baiano, os debates e filmes sobre o cinema negro, criando mais uma janela de exibição fora das grandes cidades e circuitos estabelecidos. Estas três mostras têm como características comum serem iniciativas organizadas por jovens produtores e realizadores negros, que proporcionam espaços de difusão, circulação e formação dentro dos cinemas negros, compondo suas programações com exibição de filmes negros brasileiros, latino-americanos e do continente africano, além de cursos, oficinas e palestras. Outra característica significativa é a descentralização das atividades para cidades do interior do estado, que não teriam uma tradição vinculada ao cinema, no caso da MOSC e São Félix, quanto para bairros tidos como periféricos em Salvador, no caso da MIMB, que desde o título aponta para o caráter itinerante da sua programação. Na nossa perspectiva, estas características em comum dialogam com desafios históricos enfrentados pelas pessoas negras que fazem parte do campo cinematográfico, haja vista a já citada preocupação do cineclubismo dos anos 1980 em fazer os filmes e os debates chegarem em espaços distantes do centro de Salvador. Além disso, consideramos essencial não perder de vista a existência de uma aprendizagem intergeracional nos cinemas negros, e aqui podemos considerar tanto as presenças de Luiz Orlando e Mohamed Bamba, como luminares preciosos nestes caminhos até aqui provisórios, e que certamente se desdobrarão também entre as novas gerações que se sucedem e se misturam articulando a ginga do QuilomboCinema, posto que a História, enquanto saber organizado a respeito do passado, é um território sob disputa, e precisamos estar atentos para tensioná-la e rasurá-la para evitar os silêncios e propor novas possibilidades sempre que preciso, afinal de contas, os cinemas negros estão em curso e na gira do espaço, dos tempos e das aprendizagens.

Referências bibliográficas CARIBÉ, Pedro Andrade. Cinema de Terreiro: o audiovisual negro de Luiz Orlando nos cineclubes em Salvador. Tese de Doutorado. Programa de Pós Graduação em Comunicação. Universidade de Brasília, Brasília, 2019. CESAR, Amaranta [et alli]. Desaguar em cinema: documentário, memória e ação com o CachoeiraDoc. Salvador: EDUFBA, 2020. COSTA, Tatiana Carvalho. QuilomboCinema: ficções, fabulações, fissuras. Catálogo 24º forumdoc. bh – Festival do Filme Documentário e Etnográfico de Belo Horizonte. Org. Carla Italiano, et ali. Belo Horizonte. Associação Filmes de Quintal, 2020. DE VALCK, Marijke. Film Festivals. From European Geopolitics to Global Cinephilia. Amsterdam: Amsterdam University Press, 2007.

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OLHAR ESTRANGEIRO: A PERSPECTIVA DE UM CINECLUBISTA SOBRE O CINEMA PRETO BAIANO Clementino Júnior

O Estrangeiro Quando me iniciei no cineclubismo, antes de fundar o Cineclube Atlântico Negro (CAN), cineclube mais antigo em atividade a tratar do retrato dos africanos em diáspora no cinema mundial, sentia nos cineclubes fluminenses que frequentei na primeira década deste século a ausência ou tímida presença de produção sobre a temática ou realizada por cineastas negros em telas independentes. Foi no período da retomada do movimento cineclubista e da criação do coletivo cineclubista Associação de Cineclubes do Estado do Rio de Janeiro (ASCINE-RJ), em 2004. Quando me iniciei como realizador audiovisual, enquanto animador com meus primeiros curtasmetragens a partir de 2000, não raro me encontrava em festivais de cinema em outros estados com, no máximo, mais um realizador preto. O mineiro Joel Zito Araújo já havia se consolidado como documentarista com o longa-metragem A Negação do Brasil (2000), e os curtas-metragens e clipes do paulistano Jeferson De alavancaram uma carreira referencial na produção de longas-metragens. Para um realizador e educador audiovisual autodidata e preto, como eu, sempre me incomodou a forma como o retrato do negro no cinema brasileiro vinha sendo contado por intelectuais brancos engajados, mas que persistiam em impor seus olhares sobre os corpos e histórias do negro no Brasil. Quase sempre retratos aquém do ideal ou com total insensibilidade na abordagem temática e uma certa preguiça em abandonar estereótipos, uma vez que o padrão do imaginário já estava estabelecido sobre os corpos pretos. E com isso vemos um dos filmes fundantes do Cinema Novo, Barravento (1962), o longa de estreia na direção do baiano Glauber Rocha, também visto por alguns destes como um representante do cinema negro, obra realizada em Salvador e protagonizada pelo soteropolitano Antônio Pitanga e pela gaúcha Luísa Maranhão. O filme é provocador, dentro das questões urgentes políticas do período pré-golpe militar, e em um momento em que o cineclubismo, do qual Glauber Rocha foi atuante, era um espaço de trocas e encontros dos futuros movimentos de luta contra a ditadura. Isso persistiu até o surgimento do Centro Afro Carioca de Cinema e de pesquisas acadêmicas sobre o protagonismo de pretas e pretos nas narrativas audiovisuais. Até então a principal referência para abrir uma discussão sobre o cinema negro brasileiro se via presente na primeira edição do livro do jornalista João Carlos Rodrigues, O Negro Brasileiro e o Cinema, e

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nas discussões acadêmicas e artísticas surgidas em paralelo a retomada do movimento cineclubista com o “Manifesto Dogma Feijoada”, capitaneada por cineastas pretos de São Paulo, como Jeferson De, Ari Cândido Fernandes e Noel de Carvalho, aliados a outros como Zózimo Bulbul. Importante mencionar as naturalidades de personagens e obras neste (con)texto, na ambição de criar uma mistura de mapa mental e linha do tempo e tentando responder a seguinte pergunta: em que momento descubro o cinema e o cineclubismo feito por pessoas pretas na Bahia? Acredito que quando começo a perceber uma mudança no comportamento da cadeia audiovisual, e que eu não era mais um sujeito só na utopia de fazer e exibir cinema feito por pretas e pretos. Mais especificamente, na Jornada Nacional de Cineclubes, na cidade de Moreno/PE, em 2010, quando, dentre duas centenas de cineclubistas de várias partes do país, e em um dos já raros eventos culturais com algum apoio do governo federal através da Secretaria de Audiovisual do Ministério da Cultura (SAV), encontrei dezenas de cineclubistas pretas e pretos. Aliás, um número muito acima do que esperava, diante de outros encontros nacionais (onde estive, ou vendo por fotos) em que sempre fomos poucos, e por vezes não tínhamos condições de fazermo-nos presentes no evento, por falta de dinheiro ou patrocínio para viagem e estadia. De posse de minha handycam e várias fitas em formato Mini DV, realizei um documentário memorial sobre as experiências de quem consegui entrevistar, chamado Ojú Onà1, algo como o “olho da rua”. Esse documentário é uma encruzilhada de experiências com audiovisual, afrocentradas ou não, porém engajadas sempre, pois o cineclube prevê engajamento desde sua criação, há pouco mais de um século na França. Dentro da diversidade de depoimentos encontro quatro experiências cineclubistas específicas tocadas por pretas e pretos na Bahia, três delas bem periféricas, e outra bem mais política, no universo sindical. Tom Nascimento estava presente representando o coletivo Cineclube Clã Periférico, o griot Jorge Conceição representando o Cineclube Imaginário, Márcia Nascimento representando o Cineclube Ceafro e Gleciara Ramos representando duas iniciativas, os cineclubes Leãozinho e Lua Digital. O encontro com esses representantes pretos e pretas dentro de um panorama maior e cada vez mais presente do cineclubismo baiano me fizeram refletir sobre a minha própria prática no então ainda novo (apesar de seus três anos de atividade) Cineclube Atlântico Negro, mas ao mesmo tempo persistia a dificuldade na formação de acervo de cineastas pretas e pretos brasileiros para um eixo temático tão específico. Mesmo exibindo filmes priorizando o retrato de pretas e pretos, sem obrigatoriedade de um lugar de fala no fazer, mas de proporcionar debate a partir de um conteúdo minimamente comprometido com as identidades e as pautas étnico-raciais, a produção que chegava às minhas mãos, a partir dos efeitos das primeiras políticas públicas ainda estavam distantes de uma maior representatividade baiana e preta na produção brasileira.

Políticas públicas para produção Em 2005, as respostas dos ativistas do audiovisual periférico carioca aos questionamentos de um grande nome do Cinema Novo que questionava as propostas de descentralização dos recursos de cultura nos editais, que sempre privilegiavam o Sudeste (em especial Rio/São Paulo) em detrimento do restante do país, repercutiram para uma tentativa de democratização do acesso aos recursos de produção cultural. Esse impacto se manifestou primeiro em projetos da área cultural para além do audiovisual (as cotas na produção vieram só mais tarde como regra em edital). Pensando a autoria preta, surgem iniciativas de baixíssimo orçamento via Fundação Palmares, que foram financiadas em simultâneo, o Prêmio Palmares de Vídeo, e o DVD Obras Raras - O Cinema Negro na Década de 1970, projeto que restaurou e digitalizou obras fundantes da autoria negra no cinema brasileiro, como Alma no Olho, de Zózimo Bulbul, além dos demais filmes do cineasta, e os únicos 1

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Documentário disponível em https://vimeo.com/20703027. Acesso em 13 mar. 2021.

longas de Antônio Pitanga, Waldir Onofre e Haroldo Costa. Sobre o prêmio da Palmares só um dos seis curtas-metragens foi gravado em Salvador, e é difícil encontrar a informação, pois todos constam como filmes brasileiros e não regionais na capa do DVD e em inúmeras divulgações pela internet, incluindo a própria página da Fundação Palmares, mas cuja pista principal foi o tema do documentário, Makota Valdina. Destes seis trabalhos só identifiquei a paulistana Lilian Solá Santiago como quem manteve uma carreira de produção audiovisual após o prêmio, ela realizou o curta que originou seu segundo filme, o média-metragem Balé de Pé no Chão, sobre a pioneira da Dança Afro Moderna, Mercedes Batista. O documentário sobre Makota Valdina foi realizado pela baiana Joyce Rodrigues. Do primeiro DVD / edital do Prêmio Palmares de Comunicação até os resultados de década e meia de discussões para reserva de financiamento em editais, e uma urgência na janela de exibição em mostras e festivais, não foi um caminho tranquilo. Sobre o mencionado DVD, tive um contato maior com a obra pelo fato de minha mãe, a atriz e Iyalorixá Chica Xavier, então conselheira da Fundação Palmares, ter feito parte da comissão de seleção, e eu, como o “filho do audiovisual”, assisti como curioso a todo o seu processo de avaliação dos projetos. Naquela altura, já prestes a me tornar cineclubista pelo Cineclube ABDeC-RJ (onde atuei de janeiro de 2007 até início de 2008), me chamava a atenção uma primeira iniciativa, da qual não pude participar como cineasta experiente, então com sete curtas-metragens produzidos, e por minha mãe também estar envolvida com a seleção. Porém, fiquei feliz em ver o volume de projetos identitários apresentados, de uma forma geral ainda de maneira amadora e com problemas de formatação e coerência – problema não exclusivo de pretas e pretos, mas da formação em audiovisual como um todo que ainda peca em preparar os artistas para orçar e defender seus projetos – porém elencando um primeiro time de voluntários a serem pioneiros na produção audiovisual. Nos anos seguintes, a Fundação Palmares tentou emplacar um segundo projeto, o Curta Afirmativo, onde um dos editais teve uma liminar cancelando-o sob alegações de preconceito por privilegiar apenas proponentes pretas e pretos. Importante notar que durante o período dos governos progressistas no século XXI, as iniciativas inclusivas dentro dos editais gerais foram apenas realidade na segunda década, já perto do fim dos recursos e da crise política que mudou o quadro nos anos mais recentes e extinguiu os recursos federais à cultura, principalmente ao audiovisual. A concentração dos recursos na Fundação Palmares, que era um dos setores com menor aporte financeiro dentro do Ministério da Cultura, fez com que os realizadores e realizadoras que estrearam suas primeiras, por vezes únicas, produções a partir do Curta Afirmativo, pudessem pela primeira vez produzir um filme com recursos semelhantes aos demais editais de curtas-metragens, na época 100 mil reais por filme. A Bahia foi o estado com o maior número de contemplados na lista final e na de espera, aparecendo no recorte racial e regional como o que contemplou mais jovens, de 18 a 29 anos, público-alvo deste edital. Neste edital do Curta Afirmativo já se identificam nomes que permaneceram produzindo cinema oito anos depois. Este mesmo edital foi perseguido com liminares de juízes propondo algo similar ao inexistente “racismo reverso” em uma ação de política pública inclusiva no audiovisual. Outro edital federal que descentralizou a produção do audiovisual foi o DOCTV, edição IV, onde, em uma reunião da SAV-MinC com todas as regionais da Associação Brasileira de Documentaristas e Curta-metragistas (ABD), em Brasília, eu como representante regional pelo Rio de Janeiro, vimos o recurso ser distribuído em uma proporcionalidade menos desigual. Os estados com maior produção teriam dois projetos contemplados para a produção de documentários para exibição na TV Brasil, e alguns com menor cadeia produtiva teriam ao menos um documentário contemplado, o que contribuiu nas poucas edições neste formato para incentivar a formação e consolidação de um mercado audiovisual, e que se acrescentou algo, em estados que já contavam com editais e ações locais, uma opção de visibilidade nacional de sua produção, como a Bahia. Outra política pública importante de mencionar é o Cine Mais Cultura, iniciativa de implantação em cidades com pouca população e sem salas de cinema de kit de equipamentos para formação

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de cineclubes ou potencialização de cineclubes que já existam nesses locais. Tive o prazer de ser parecerista em um edital nacional e poder ver dentre centenas de inscrições a realidade de várias cidades brasileiras abaixo de 40 mil habitantes. Até 2012 já tinham sido disponibilizados equipamentos para mais de mil iniciativas cineclubistas. O fruto dessa política pública foi a persistência de alguns cineclubes, e o surgimento da atividade em cidades onde as pessoas tinham vontade de usar o audiovisual como ferramenta de transformação, mas não tinham acesso ou recursos como projetor, telão, player de DVD, mesa de quatro canais, microfones e caixas amplificadas. Esta iniciativa, junto com os Pontos de Cultura que em grande quantidade já dispunham de tais equipamentos, viabilizaram o surgimento de um circuito alternativo de difusão que recebeu programações diversas de outros projetos como o Tela Verde (filmes de temática ambiental), os de temática étnico-racial já mencionados, dentre outros.

Exibições no CAN de filmes baianos Contudo, o acesso de produções baianas diversas no Cineclube Atlântico Negro, e acredito que em outros cineclubes mais ativos no movimento cineclubista nacional via CNC, foram através das parcerias da SAV-MinC com a Diretoria de Audiovisual da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Dimas), no ano de 2011. Em eventos recebi dois kits de DVDs que alimentaram o acervo do Cineclube, apesar de pouco exibidos porque, já naquela época, estarmos evitando o uso de DVDs, em função da instabilidade na hora da exibição, mas que, por outro lado, alimentaram a percepção sobre uma rica e produtiva cadeia audiovisual local. O primeiro foi a importante caixa de DVDs Bahia 100 Anos de Cinema, que contou com diversas obras importantes e algumas cultuadas e menos conhecidas, que foram restauradas e digitalizadas para o público. A outra coletânea foi a Memória em 5 Minutos, uma coletânea das 13 edições do Festival 5 minutos da Bahia, com 84 micro-metragens em vídeo apresentadas no festival entre os anos de 1994 e 2009. São kits que popularizaram e derrubaram o muro de visibilidade sobre uma produção “além Cinema Novo” da produção independente baiana até àquela altura, mas para recortes temáticos como o do CAN, exceto pela notável presença de personagens pretas e pretos nestas duas coletâneas, ainda eram raras as obras assinadas por realizadores pretas e pretos, pensando uma das regiões de maior população preta do país. País que, como um todo naquela altura, não inspirava em seus catálogos de cinema uma representatividade considerável de autoria e realização de artistas pretas e pretos no audiovisual.

Encontro promovendo encontros O impacto mais positivo e agregador dentro desse panorama apresentado foi o DVD Obras Raras O Cinema Negro na Década de 1970, apresentando pioneiros negros do cinema brasileiro, que foi a ação artística e memorial que deu partida nas atividades do Centro Afro Carioca de Cinema, e que se consolida em 2007 com a primeira edição do Encontro África-Brasil de Cinema Negro, mais tarde rebatizado de Encontro de Cinema Negro Zózimo Bulbul - África / Brasil / Caribe e outras diásporas. Para um público mais repleto de aspirantes do que de realizadores nas primeiras edições, ao momento mais recente no qual a plateia se via mais repleta de realizadores do que de público em geral, lotando salas de cinema históricas no Rio de Janeiro, como o Odeon, o evento era a oportunidade de estarmos próximos às obras e, na maioria dos casos, também dos realizadores. Com o passar dos tempos as obras frutos dos editais mencionados começam a se fazer mais presentes, os rostos de cineastas brasileiras e brasileiros, pretas e pretos se fazem mais presentes a cada edição, debatendo, interagindo, formando redes e parcerias, e, naturalmente, contribuindo

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para uma maior circulação de filmes. O Encontro de Cinema Negro Zózimo Bulbul chega à maturidade quando seu fundador parte para o Orun, mas o seu legado continua a partir de outras pessoas, principalmente das mulheres, formadas ao longo das inúmeras jornadas de produção e curadoria da Mostra, das viagens ao FESPACO, maior festival panafricano de cinema em Burkina Faso, e dos catálogos que dão uma ideia do crescimento e da evolução da produção audiovisual preta brasileira a partir do festival. É a partir de 2016, momento em que mudanças políticas estão iminentes e que o fomento à produção audiovisual míngua, que o Encontro chega a sua melhor estrutura de equipe, começam a se visibilizar um maior número de produções baianas com uma perspectiva negra, e onde estes cineastas começam a circular mais, inclusive produzindo em outros estados, como os casos de Viviane Ferreira, radicada em São Paulo, Safira Moreira, que realizou seu curta-metragem mais famoso, Travessia, como conclusão de um curso de cinema no Rio de Janeiro, e Everlane Moraes, baiana radicada em Sergipe, e com formação em cinema em Cuba. Apesar dos três exemplos estarem em constante trânsito em outros territórios, de alguma maneira elas são porta-vozes de uma produção emergente que consolida o que a intelectual Bell Hooks (2019) denomina como “olhar opositivo”: três mulheres negras baianas, estreando ou evoluindo em sua cinematografia, com idades na faixa dos 30 anos, e que, através de temas, trazem um olhar afetuoso à ancestralidade, ao feminino e a outros retratos de pretas e pretos para além dos estereótipos, outrora apresentados em obras brasileiras sobre estes corpos. As mulheres colocando-se e vendo-se em outros papéis. Um reflexo de muitas lutas que elas mesmas reconhecem como vindas de quem as lutou anteriormente.

Vendo e ouvindo vozes e olhares negras A pesquisa do Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação Afirmativa (GEMAA), da IESP-UERJ, denominada “Cor e gênero no cinema comercial brasileiro: uma análise dos filmes de maior bilheteria” (CANDIDO et al, 2016), identificou ainda em 2016 a baixa representatividade de pessoas pretas e pardas na produção de longas-metragens nos principais cargos, em especial roteiro, produção e direção. Retornando ao “olhar opositivo” de hooks, essas três cineastas são um exemplo deste conceito, do qual se propõe a coragem de olhar, e para além disso, que esse olhar de mulheres pretas mude a realidade. A interseccionalidade retratada em mulheres pretas baianas, trazendo inclusive o componente regional, dentro de uma sub-representação autoral na cadeia audiovisual brasileira de então, é representativa de barreiras ainda persistentes, quando falamos de longasmetragens autorais, inclusive quando pensamos em ficção. Viviane Ferreira lançou seu primeiro longa-metragem, Um Dia Com Jerusa, em 2019, até então somente em documentários de longametragem se encontravam obras realizadas por cineastas pretas. Ao pensarmos a importância do mercado audiovisual baiano, de onde vieram nomes importantes de um dos principais movimentos cinematográficos nacionais, onde nasceu a ABD durante a Jornada de Cinema da Bahia, em 1973 (durante um bom tempo um dos principais festivais de cinema, ocorrendo de 1972 à 2009), e com inúmeros e duradouros outros festivais que fazem a diferença no panorama de exibição, a produção audiovisual baiana tem uma circulação tímida, ao menos aos meus olhos enquanto espectador “estrangeiro”. Porém o panorama audiovisual aos olhares do resto do país ampliou seu campo de visão para as produções do Nordeste, e uma das grandes contribuições para uma maior visibilidade da produção preta baiana foi a implementação do curso de cinema em uma das universidades mais negras do Brasil, a UFRB, no caso, o campus em Cachoeira/BA. Cabe destacar que os filmes mais bem sucedidos feitos por estudantes desta universidade vêm de uma dupla de cineastas que não são nascidos na Bahia, mas que, com sua série de filmes situados no Recôncavo Baiano, e em parceria com seus colegas locais, tem exemplificado uma potência de

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experimentação a partir de filmes que tem no território, na presença preta e na linguagem local os seus dados mais marcantes, conquistando festivais e trazendo um olhar do restante do Brasil para essa produção. E uma vez que esses filmes citados, além de tantas outras obras que vêm sendo realizadas por tantas e tantos outros cineastas cruzam esta fronteira, o mercado exige um ineditismo destas obras, o que dificulta o acesso de cineclubes a estas. Algumas parcerias ainda são feitas entre festivais de cinema mais engajados com movimentos sociais e com a rede de educação, de fazer circular itinerâncias com recorte curatorial dos filmes selecionados, mas ainda são poucos estes eventos e nem toda a produção de destaque, exemplificadamente da produção preta baiana, estará inscrita nestes eventos. É quando a luta por mercado entra em colisão com um compromisso com o público que, por vezes, não tem acesso aos festivais. Mesmo quando os festivais acontecem em formato online, como vem acontecendo em função do longo período de pandemia pelo Covid-19, que além de fechar as poucas salas de cinema que exibem produção nacional, migrou todos os festivais para o streaming, em plataformas não populares nem acessíveis, o que mantem o distanciamento entre o público preto e o cinema identitário pensado para este público, mas em telas e plataformas para quem pode usufruir ou acessar.

E o front cineclubista? Os cineclubes, com ou sem isolamento social, permanecem como base inicial de formação do olhar e de exercício do pensamento crítico no audiovisual. Volto minha memória à Jornada Nacional de Cineclubes de 2010, e lembro a Jornada seguinte, encontro menor e sem financiamento que aconteceu na Ilha de Itaparica em 2015, onde ainda se faziam ativos no debate o então presidente do Conselho Nacional de Cineclubes Jorge Conceição, a secretaria Gleciara Ramos, e alguns poucos outros cineclubistas que ingressaram na diretoria. Lá conheci Claudio Lyrio, de Itabuna, no movimento a frente do Cineclube Mocamba, e só para mencionar outros atuantes pelo interior do estado citaria o Clã Periférico que permanece ativo em Salvador, assim como o Cineclube Zé Pereira, Viola de Bolso (Eunápolis), os Cineclubes ACAI e Encantarte (Itabuna), e Cineclube Dilazenze Malungo (Ilhéus), além de uma grande rede articulada de cineclubes que mesmo sem direção de pretas, pretos e pretes, promovem uma programação voltada para temáticas étnico-raciais. Dialogam com a atividade cineclubista outras expressões culturais afro, como teatro, música, capoeira, e se firmam como espaços de articulação para experiências outras. Como menciona Leda Martins ao conceituar a “Oralitura”: “Os sujeitos e suas formas artísticas que daí emergem são tecidos de memória, escrevem história” (MARTINS, 2003. p 16). Os sujeitos formados pelos cineclubes baianos, cada mais conhecedores de suas histórias e representações em uma perspectiva afrocentrada, através do audiovisual, farão emergir a partir de seu reencontro com a ancestralidade novas formas de narrar suas histórias.

Referências bibliográficas CAETANO, Maria do Rosáreo (org.). ABD 30 anos: mais que uma entidade, um estado de espírito. São Paulo: Instituto Cinema em Transe. 2005. C NDIDO, Marcia Rangel; DAFLON, Verônica Toste; FERES JÚNIOR, João. Cor e gênero no cinema comercial brasileiro: uma análise dos filmes de maior bilheteria. Revista do Centro de Pesquisa e Formação, São Paulo, n.3, p.116-153, novembro 2016. EVARISTO, Conceição. “Escrevivência” a escrita que nasce das vivências.

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Conexão Literatura, nº 24, 2017, p. 5-10. Disponível em: . Acesso em: 13 mar. 2021. HOOKS, bell. Olhares negros: raça e representação. 2019. Editora Elefante. 356 p. MARTINS, Leda. Performances da oralitura: corpo, lugar da memória. Letras (Santa Maria). Santa Maria, v, 25, p. 55-71, 2003.

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ARTIGOS E ENSAIOS Autoras e autores

MAÍRA ZENUN é Doutora em Sociologia pela Universidade Federal de Goiás, com a tese “A Cidade e o Cinema [Negro]: o caso FESPACO” – disponível em https://repositorio.bc.ufg.br/tede/handle/ tede/10037. Mestre em Sociologia pela Universidade de Brasília e Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. É também poeta, imigrante-artista, mãe, companheira. É mulher negra brasileira, em trânsito, e gosta de flores. Nascida no Rio de Janeiro, se criou em Petrópolis, cresceu para a vida em Brasília e, desde 2016, vive na Linha de Sintra, Amadora, Portugal. E-mail: [email protected]. EDILEUZA PENHA DE SOUZA é Documentarista e Pesquisadora. Organizou a Coleção Negritude Cinema e Educação – Caminhos para implementação da lei 10.639/2003. É a idealizadora e organizadora da Mostra Competitiva de Cineastas e Produtoras Negras Adélia Sampaio. ANA LUIZA MACIEL MARQUES é Estudante de Graduação em Artes Visuais na Universidade de Brasília. Pesquisa animação, arte negra e a arte sensorial. Foi monitora de dois eventos da Mostra Competitiva Adélia Sampaio, do Colóquio de Psicologia e Desenvolvimento Humano e do I Simpósio de Crítica Literária Dialética. LETÍCIA MARIA DE SOUZA PEREIRA é Doutora pelo Programa de Literatura e Cultura da Universidade Federal da Bahia (UFBA). MORGANA GAMA é mestra em Cultura e Sociedade (IHAC/ UFBA) com doutorado em Comunicação e Cultura Contemporâneas (PósCom/UFBA). Autora da dissertação “Singularidades evangélicas: uma reflexão sobre personagens religiosas no cinema brasileiro contemporâneo” (2014). TAÍSSA DIAS é jornalista (UnB) e mestranda do Programa de Pós-graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas (PósCom/UFBA). Pesquisa a representação de pais e mães de santo no cinema brasileiro contemporâneo de ficção. É confirmada Makota Nzumbaianga no candomblé Angola.

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EVELYN SACRAMENTO é Bacharel em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (2013) e Mestre pelo Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Estudo Étnicos e Africanos pela Universidade Federal da Bahia. Desde a graduação dedica-se à pesquisa sobre cinema negro e cinema africano, se debruçando principalmente na trajetória da cineasta senegalesa Safi Faye. É cofundadora do projeto Lendo Mulheres Negras atuando como produtora, facilitadora de cursos, e mediadora de rodas literárias. No cinema atua como figurinista e diretora de arte, além de ser curadora em festivais e mostras. IZABEL DE FÁTIMA CRUZ MELO é Professora da Universidade Estadual da Bahia (UNEB – DCH I) e Doutora em Meios e Processos Audiovisuais (ECA/USP). CLEMENTINO JUNIOR é Educador Audiovisual, Cineasta, Doutorando em Educação (Geasur/ Unirio) com enfoque em Educação Ambiental e fundador do Cineclube Atlântico Negro.

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DE ELETRICISTA A DIRETOR DE FOTOGRAFIA, UMA HISTÓRIA DO CINEMA BAIANO CORPORIFICADA - ENTREVISTA COM ROQUE ARAÚJO Por Lecco França CNB - Quais são as suas primeiras lembranças do cinema na Bahia? RA - Na minha época de garoto, eu ia ao cinema assistir a tudo quanto era filme. Eu nasci praticamente em frente ao cinema, na Ribeira, onde tinha o Cinema Itapagipe. Dois cinemas na Bahia, inclusive, o Itapagipe e o Jandaia, tinham a chamada “geral” onde você via a projeção de um filme ao contrário. Quando a pessoa não tinha dinheiro para comprar um bilhete na inteira, comprava um na geral e tinha que assistir ao filme do lado contrário. Eu sempre ia assistir na frente, mas, às vezes, quando ia ao Jandaia nos fins de semana ver filmes de bang bang com algum colega que não tinha dinheiro, eu pagava a dele e a gente ia para a geral. Era muito engraçado, quando, por exemplo, você via cenas de luta em que o ator batia com o braço direito e, na parte de trás, você via com o esquerdo. Foi marcante também quando acompanhei, pela primeira vez, uma filmagem, no caso, o filme Redenção (1958, direção de Roberto Pires). Ver como eram feitas as cenas de um filme, o uso da claquete, por exemplo, porque como naquela época não tinha som direto, então se batia com a claquete. Outra lembrança, muito engraçada, era ver o diretor de produção desse mesmo filme, o Valter Web, que trabalhava no cartório, digitando na máquina de escrever tudo que o ator estava falando, para fazer a continuidade do som depois, a dublagem. Isso foi muito significativo para mim porque eu nunca tinha visto uma coisa daquela antes, um cara com uma máquina de escrever escrevendo com uma rapidez imensa tudo o que o ator falava! Essa também é uma lembrança que eu nunca esqueci, da formação do som através de uma máquina de escrever, quando não se tinha um gravador de som.

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CNB - O que te levou a trabalhar no cinema? RA - A minha ida para trabalhar com cinema foi uma situação inusitada, porque eu não queria fazer cinema, a princípio, eu fui levado a fazer. A febre que hoje no Brasil é a internet, em 1955, era a eletricidade, principalmente quando foi inaugurada a Hidrelétrica de Paulo Afonso. Naquela época, a luz aqui na Bahia era desligada à meia-noite, após esse horário não se tinha mais luz na rua. Então, diante da demanda de mão de obra, eu fui fazer um curso de eletricista e me formei ainda naquele ano. Em seguida, eu fui trabalhar na Secretaria de Viação e Obras Públicas do Governo do Estado da Bahia, local onde hoje está o Palácio dos Esportes, na praça Castro Alves. Foi lá que, em 1956, o governador da época, Antonio Balbino, e o secretário de viação, Josafá Carlos Borges, assinaram um convênio com a construtora Norberto Odebrecht para a construção do Teatro Castro Alves (TCA). Eu fui designado para colocar o primeiro ponto de luz para a construtora levantar os barracões para a o início da obra, fiquei então responsável pela parte elétrica, representando o Estado. Em 1958, com o teatro quase todo finalizado, o cineasta Roberto Pires, que morava ali perto na terceira casa depois do TCA, estava filmando o seu primeiro longa-metragem, Redenção, produzido pela Iglu Filmes, inclusive, o primeiro longa-metragem da história do cinema baiano, e queria filmar nos barracões, particularmente uma cena de escritório. Contudo, o secretário de viação só cederia o espaço se o eletricista responsável, que era eu, pudesse acompanhar a filmagem. O Roberto, então, veio falar comigo e eu aceitei a empreitada. Ele filmou tudo em apenas um dia e, quando terminou a filmagem, me deu uma gratificação, que era mais do que o meu salário inteiro como chefe de eletricidade no TCA. Então eu pensei: “fazer cinema é bom”, e estou aqui até hoje. Foi assim que eu iniciei a minha carreira no cinema. Eu já participei de mais trezentos filmes, tanto no Brasil quanto fora. Uma coisa muito interessante é que eu fiz vários filmes como eletricista, depois atuei como maquinista, na área de efeitos especiais, como assistente de câmera, acompanhei a edição e a montagem, e finalmente fui fazer direção de fotografia. Então a relação do meu nome com o cinema baiano tem a ver com o fato de ter participado do primeiro filme de sua história, assim como de muitas produções importantes ao longo de sua história, como Barravento, Tocaia no asfalto, A grande feira, Seara vermelha e O pagador de promessas. Eu não colaborei em alguns filmes daqui porque fiquei um tempo fora da Bahia, o filme Bahia de todos os santos, por exemplo, eu não fiz porque eu não estava aqui.

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CNB – Como foi exercer diferentes funções no cinema? Recorda-se de alguma experiência marcante? RA - Quando eu comecei a trabalhar com fotografia no cinema, o primeiro desafio que eu tive foi no longa-metragem Cercado pelo ódio (1981, direção de Ulisses Alves Pereira). Após aceitar o convite para participar do filme como assistente de diretor de fotografia, eu escolhi refletor, escolhi a luz e partimos para uma fazenda em Japeri, no estado do Rio de Janeiro. Ao chegarmos na fazenda, entretanto, descobrimos que ela estava sem luz elétrica e o filme tinha uma cena noturna, um jantar com várias pessoas sentadas à mesa. Então eu tive que iluminar aquela sala toda, a sala de uma fazenda, com vela e iluminação a gás. Aquilo foi muito trabalhoso para mim, mas eu me sai muito bem, a cena ficou maravilhosa. Já trabalhando com efeitos especiais, uma das primeiras experiências que tive foi em Tocaia no asfalto (1962, direção de Roberto Pires), na cena eu que se vê um disparo e o buraco de uma bala na testa de um homem. Para isso, eu usei um fio de náilon de uma coluna para outra dentro da locação, no Teatro Castro Alves, o maquiador Toninho, de São Paulo, fez a maquiagem aumentando a testa do personagem Zé Coió e nela fez um buraco onde colocou uma cápsula com sangue. Orlando Senna, que foi o assistente de direção, ficou responsável de puxar o náilon na hora em que Agildo Ribeiro, que interpreta o pistoleiro Rufino, atira no canto do revólver, onde colocamos bastante vaselina e o festim com cera. Quando Agildo aperta o gatilho, o festim estoura e cai a fumaça do cano do revólver. Ao mesmo tempo em que ele atira, Orlando puxa o náilon. Foi tão rápido que você não sente o sangue descendo simultaneamente. Essa cena foi feita dessa forma. E na montagem ficou simultaneamente. Foi o tiro mais perfeito da história do cinema. Também trabalhei com efeitos especiais no filme Dragão da maldade contra o santo guerreiro (1969, direção de Glauber Rocha), usando efeitos elétricos, o que foi bem diferente da experiência anterior.

CNB - O senhor trabalhou como ator em alguns filmes do cinema baiano. Em quais filmes atuou? Como foi essa experiência? RA - A minha primeira participação na frente de uma câmera foi no filme A grande feira (1961,

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direção de Roberto Pires), na cena em que eu estou no cabaré tomando cerveja. Depois atuei em Tocaia no asfalto (1962, direção de Roberto Pires), na cena que eu estou no trem e Agildo morre. Em Deus e o diabo na terra do sol (1964, direção de Glauber Rocha), eu sou um dos cangaceiros, Macambira. Nesse filme era muito engraçado o fato de eu atuar na frente das câmeras e por trás das câmeras, nas cenas em que se utilizava o travelling, por exemplo. Eu emborcava o bornal com os fios nas costas e empurrava o carrinho até chegar ao final e parava, aí corria e já entrava em cena na ponta de quadro, porque quando a câmera chegasse, eu já estava lá. É um filme em que eu apareço bastante. Foi um papel muito importante nesse filme, um cangaceiro. Eu atuei também no primeiro longa de Olney São Paulo, O grito da terra (1964), onde eu fiz o capataz do coronel Sebastião. Ele era responsável pela fazenda, pelo armazém e tudo que tinha nela. Na trama, o coronel manda o meu personagem matar o professor (interpretado por Lidio Silva), mas não faz isso. O capataz toca fogo na casa em que o professor estava, que pertencia ao coronel, mas pede para ele sair de lá antes. Esse filme, inclusive, é marcante para a história do cinema baiano porque toca na questão da fome no sertão e a situação do retirante. Em Entre o amor e o cangaço (1965, direção de Aurélio Teixeira), eu fiz o papel de Caveira, cangaceiro do bando de Lampião, que acompanhava Corisco. Eu estava sempre ao lado do capitão, interpretado pelo Milton Nogueira. Esse filme foi rodado na cidade de Milagres e eu sou conhecido lá como Roque Caveira justamente porque o meu personagem usava um figurino cheio de caveira, tinha um chapéu com três caveiras, carregava dois punhais, e cada punhal tinha uma caveira, os dez anéis que usava nas mãos, cada um anel tinha uma caveira. Também atuei no filme Trópicos (1967, direção de Gianni Amico), uma coprodução Brasil e Itália, rodada nos dois países, em que eu sou um dos atores principais, junto a Antonio Pitanga e Joel Barcellos. Em O rei dos milagres (1973, direção de Joel Barcellos), outra coprodução Brasil e Itália, eu atuei fazendo um milionário chamado Washington, junto com Glauber Rocha, que fazia um governador. Eu, inclusive, atuei em quase todos os filmes de Glauber

CNB - Fale um pouco de sua trajetória profissional no cinema baiano, atuando em filmes de diferentes cineastas, como Glauber Rocha. RA – Em Barravento (1962, direção de Glauber Rocha), além de ajudar como eletricista, eu também ia buscar o almoço da equipe na pensão de Dona Lúcia, mãe de Glauber, localizada nos Barris. A

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gente conseguiu um jipe e, quando dava 11 horas, eu saía de Buraquinho, principal locação do filme, para buscar as marmitas. Entretanto, a amizade com Glauber só se fortaleceu durante as gravações de seu segundo longa, Deus e o diabo na terra do sol (1964). Só que, enquanto Glauber estava escrevendo o roteiro e visitando algumas locações, eu recebi um telegrama de São Paulo me convidando para trabalhar em Seara vermelha (1963, direção de Alberto d’Aversa). Então eu fui para Juazeiro fazer o filme como chefe de equipe e levei daqui de Salvador o Arnaut Conceição para ser maquinista chefe, porque ele era um grande marceneiro. Na mesma época ainda fiz Lampião, rei do cangaço (1964, direção de Carlos Coimbra) e O caipora (1964, direção de Oscar Santana). Entretanto, durante as filmagens deste último, uma forte chuva na região deixou a equipe ilhada em uma fazenda durante 18 dias. Esse atraso, consequentemente afetou o início das gravações do filme de Glauber, que aguardava o meu retorno. Para terminar O caipora, Moacir Ribeiro construiu um estúdio dentro do Moinho São Salvador, em Caminho de Areia, para finalizarmos as gravações. Eu trabalhei 72 horas direto para terminar esse filme e finalmente iniciar Deus e o diabo na terra do sol. Um episódio muito engraçado durante as gravações do filme foi quando Glauber me pediu para guardar todo o dinheiro da produção, sendo que quem deveria ficar com isso era o produtor, (Luiz Augusto) Gugu Mendes, que na época tinha se casado com a atriz Ioná Magalhaes e estava em lua de mel com ela. Então eu fiquei em um quarto sozinho em Monte Santo, coloquei todo o dinheiro em uma daquelas antigas malas de couro e deixava trancado lá. Sempre que saía, trancava a porta e ficava com a chave. Todo dia de manhã, Glauber ligava para mim e pedia para dar dez mil reis a Agnaldo Siri, na época diretor de produção, para comprar água mineral e lanches para a equipe. Ninguém mais sabia que o dinheiro estava comigo na minha mala, só eu e Glauber. Ele criou uma confiança em mim muito grande. Depois que terminaram as gravações, ele me convidou para ir ao Rio de Janeiro ver a montagem do filme, então eu deixei o meu emprego aqui no estado e fui com Glauber para o Rio de Janeiro, onde fiquei 30 anos. Lá acompanhei ele em todos os seus filmes. CNB - Como foi essa longa temporada no Rio de Janeiro? RA - Quando eu cheguei no Rio de Janeiro, eu fui muito bem aceito por toda a categoria de cinema. Eu fui trabalhar na LCBarreto (fundada em 1963), do Luiz Carlos Barreto, chegando a morar na casa dele, até que ele alugou uma casa na rua das Palmeiras, n. 15, onde também tomava conta de todos os equipamentos da produtora. Eu participei de vários filmes no Rio de Janeiro, como Menino de engenho (1965, direção de Walter Lima Jr.). Também tive o prazer de ter feito o primeiro longametragem de Eduardo Coutinho, O homem que comprou o mundo (1968), com Flavio Migliaccio e Rogéria. Na época, de dez filmes que iam ser rodados lá, eu era convidado para os dez, embora eu

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só pudesse participar de um. Sempre fui diferente e ativo, o que me levou a ser preferência de vários cineastas. Eu também fui diretor do sindicato da categoria, que na época vivia uma situação muito difícil. Para filmar durante a ditadura militar, era preciso ter uma carteira da Polícia Federal, sem ela você podia até ser preso. Eu comecei buscando unir a categoria, que tinha 1350 profissionais vinculados e chegamos ao número de 5900. Aproveitando que o Ministro do Trabalho, Arnaldo Prieto, tinha uma irmã que era atriz, começamos a nos mobilizar também pela regulamentação da profissão de artistas e técnicos. Então eu, Otavio Augusto, Francisco Milani, Angela Leal, Celso Perry, Jorge Lafond e Jorge Melo levamos para ele o projeto da regulamentação e conseguimos que o presidente Ernesto Geisel assinasse a lei 6533 em 24 de maio de 1978. Eu também participei da cobertura de três copas do mundo, como diretor de fotografia, em 1964, na Alemanha, para a Agência Nacional, no México, em 1970, para o Canal 100, e em 1978, na Argentina, para o grupo Milton Reis, que ganhou a concorrência para filmar a copa do mundo. Trabalhei por sete anos na cobertura da seleção brasileira. Na época, onde o Brasil jogasse, eu tinha que estar presente para fazer a cobertura, então eu tinha uma equipe grande. Essa foi uma experiência diferente, ao invés de filmar ator, filmar jogo, o lance da velocidade da bola, a reação da torcida quando o time fazia um gol ou levada um gol.

CNB - O senhor também dirigiu alguns filmes. Comente um pouco dessa experiência atrás das câmeras, na direção. RA - Eu dirigi o meu primeiro curta-metragem, O dendê, em 1976, em seguida, eu fiz Ouricuri (197677) e Caprinos e ovinos no nordeste brasileiro, todos de 10 minutos, porque, na época, foi decretado pelo Conselho Nacional de Cinema que cada filme estrangeiro que fosse projetado no Brasil tinha que acompanhar um filme brasileiro de 10 minutos, e o diretor receberia 5% da bilheteria. Esses foram os meus primeiros filmes como diretor, montador e diretor de fotografia. O primeiro longa que eu produzi e dirigi foi No tempo de Glauber (1987), sem qualquer financiamento e ajuda do governo, apenas com investimento pessoal, o dinheiro que ganhei fazendo cinema ao longo de minha vida. Eu fiz esse filme para homenagear Glauber Rocha. Em 2012, lancei o documentário Glauber Rocha em defesa do cinema brasileiro. Teve outros que atuei na codireção, como O tiro: disparo de prazer e morte (2012), junto com Juca Fonseca, A paixão e o capadócio, Mestre Olavo da Paixão, Parque São Bartolomeu e Uma viagem para o universo da arte. Agora mesmo estou

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terminando de montar o filme Uma viagem ao universo das máscaras. Estou fazendo esse filme com o objetivo de ele seguir para a universidade poio muitos estudantes não têm como sair do país para filmar e pesquisar as máscaras. Nele eu abordo todos os aspectos das máscaras, as suas várias partes, seus usos e finalidades nas sociedades primitivas, as máscaras na África negra, e as máscaras no teatro. Filmei as máscaras carnavalescas no Brasil, no México, na França, em Veneza e na Grécia. Eu tenho tudo isso filmado, 78 horas de material, e estou quebrando a cabeça para escolher o que botar no filme. Já estou há cinco anos me dedicando a isso. É um trabalho que vai me marcar muito como diretor de cinema. Eu também fiz vários roteiros de filmes de longametragem. O meu primeiro roteiro “Em caminho da terra de sol” até hoje não foi filmado. Nele eu abordo um reformatório de menores, onde cada garoto que vai para lá, sai pior do que entrou. Um outro roteiro é “O dia a dia dos orixás”, mas não é um filme sobre o candomblé. Nele eu mostro as entidades no seu o cotidiano, tem casamento, tem separação, tem guerra, cuja cena conta com 1300 guerreiros em combate. Ainda tenho vários roteiros prontos aguardando condições de filmar, como “Quando as mulheres da favela chegam ao poder”, “Cachoeira sobre cachoeira” e “Porto Seguro, a cidade mãe do Brasil”.

CNB - O senhor fundou o Instituto Roque Araújo e colabora na Cinemateca da Bahia. Qual a importância da memória para o cinema baiano, na sua opinião? RA - Por eu ter viajado, ter saído do país, filmado fora e ter conhecido a situação de outros países que morei, como Itália e França, eu vi museu de tudo, museu de máquina fotográfica, museu disso, museu daquilo. Então eu imaginei fazer no Brasil um museu diferente porque aqui não tinha um museu de cinema e audiovisual, juntando tudo em um só. Então eu escolhi a Bahia para fazer esse museu, com o objetivo de mostrar todos os equipamentos criados para o cinema e para televisão, mostrar para as futuras gerações como começou o cinema, como ele era antes do digital. Antigamente, para você filmar com uma câmera de motor elétrico, como aconteceu no filme Seara vermelha, por exemplo, o assistente de câmera tinha que levar dez malas com equipamentos porque as lentes eram grandes e o motor elétrico precisava de um gerador instalado a 500 metros de distância. A câmera funcionava com um motor trifásico. Quem começa hoje não precisa carregar uma filmadora de 35mm, que pesava 12kg, o dia todo no ombro, ou uma filmadora de lítio que pesava ainda mais, 25 kg, e que tinha que estar sempre no tripé. Hoje as pessoas, com uma máquina tipo fotográfica e HD filma tudo. Tem várias facilidades para poder fazer cinema. Contudo, muitos não conhecem os equipamentos do passado. Esse é o objetivo do Museu de Cinema e Audiovisual Roque Araujo. Entretanto, até hoje eu não consegui um prédio aqui em Salvador que sirva de sede para o museu. Eu consegui montar o museu em Cachoeira, com 1900 peças, consegui montar um museu em Porto Seguro, na Passarela do Descobrimento, com 1300 peças, só que em Salvador, as 3800 peças embaladas e armazenadas em três salas na Diretoria de Audiovisual da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Dimas) estão aguardando um espaço de visitação para os soteropolitanos. Tanto prédio fechado na cidade e ainda não me deram um para montar o museu. O meu sonho sempre foi esse, montar um museu do cinema em Salvador, cidade onde eu nasci, e até hoje não consegui fazer isso. Já fiz várias exposições na Biblioteca Central dos Barris, na sala Alexandre Robatto, já viajei, em exposição itinerantes, para Vitória da Conquista, três vezes, levando a exposição para lá durante o festival de cinema organizado na cidade, levei duas vezes para Ilhéus, duas vezes para Juazeiro, e para Santo Antônio de Jesus. Só aqui em Salvador ainda não me deram esse espaço. Será que eu não mereço porque sou filho da terra? O Instituto Roque Araújo foi criado com o objetivo de oferecer cursos de cinema, principalmente aqui que tem carência de várias funções, como continuísta, efeitos especiais e dublagem, formação não contemplada nas universidades.

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“EU TENHO UMA PAIXÃO MUITO GRANDE PELO CINEMA, MAS POR AQUILO QUE O CINEMA É CAPAZ DE TRANSFORMAR” - ENTREVISTA COM ANTONIO OLAVO Por Lecco França CNB - Fale um pouco sobre a sua trajetória profissional no cinema, o que te levou para essa área? AO - Eu nasci em Jequié e estudei lá o primário, o ginásio, o primeiro e segundo anos científicos. Em 1974, eu vim cursar o terceiro ano científico aqui em Salvador e no final desse ano prestei vestibular para o curso de Geologia na Universidade Federal da Bahia. Conclui a graduação, recebi o diploma, mas nunca exerci a profissão. O ano seguinte, 1975, foi muito marcante para a política nacional. Vivíamos ainda um período duro da ditadura militar e uma das frentes de resistência a ela era os estudantes do Brasil inteiro. Aqui na Bahia, dentro da Faculdade de Geologia onde eu estudava enquanto calouro, participei da deflagração da primeira greve estudantil, greve geral que se originou justamente na Faculdade de geologia, no Instituo de Geociências, e se espalhou para a universidade inteira. Foi a primeira greve depois das grandes mobilizações de 1968, que na época teve uma repressão violenta e o movimento estudantil precisou recuar. O ano de 1975 marcou a retomada dessas ações, que mobilizou 15 mil estudantes na UFBA. Eu tenho muito orgulho de ter participado desse movimento. Além de ter sido um ano muito importante para o país com essas mobilizações políticas, foi, particularmente para mim também, porque logo nos primeiros meses eu soube da existência de um curso de cinema na cidade que era promovido pelo cineasta e professor Guido Araújo. Eu me inscrevi para participar dele, um mês e meio, após a conclusão do curso, Guido informou que havia duas grandes produções de cinema que estavam sendo realizadas na Bahia

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e que estava precisando de estagiários. Uma era Tenda dos milagres, dirigida por Nelson Pereira dos Santos, e a outra, Dona flor e seus dois maridos, com direção de Bruno Barreto. Seguindo a orientação de Guido, fui eu e mais dois colegas, também candidatos à vaga, procurar o pessoal da produção de Tenda dos milagres, mais especificamente a Tizuka Yamasaki, que era assistente de direção, na rua das Laranjeiras, ali próximo ao Terreiro de Jesus, mas não achamos ela. Para não perder a viagem, fomos procurar a equipe de Dona flor, cuja base de produção era no Hotel Pelourinho, ali na rua Alfredo Brito, antiga rua das Portas do Carmo. Depois do contato com eles, eu me candidatei para ser um dos estagiários, fui selecionado e me agreguei à equipe como assistente de Emiliano Ribeiro, que era o assistente de direção do Bruno. Eu cuidava de toda a figuração do filme, inscrevia os figurantes, e foram centenas deles, selecionava-os, óbvio, a partir do pedido da produção e da direção. Eu selecionava e enviava os telegramas comunicando o resultado, recebia esses figurantes na base de produção e posteriormente destinava eles para o assistente de direção. Então essa foi a minha primeira experiência no cinema, trabalhando um filme grandioso, que durante muito tempo foi a maior bilheteria do Brasil. Trabalhei alguns meses nesse filme e, assim que ele foi finalizado, surgiu outra grande produção aqui na Bahia, em 1976, a de Os pastores da noite, uma produção mais forte, franco-brasileira, dirigida por Marcel Camus, diretor francês conceituado e vencedor do prêmio Cannes. O pessoal da produção me procurou querendo que eu fosse trabalhar com eles. Inicialmente eu fiz uma proposta de remuneração, que eles não aceitaram, mas, alguns dias depois, eles toparam e mandaram me buscar. Trabalhei na mesma função do filme anterior, cuidando da figuração. Essas duas experiências foram muito importantes porque era o chamado “cinemão” e foi isso que me possibilitou conhecer o meio e ganhar, principalmente, a vivência com a minha observação. Para mim tudo aquilo era novo e tudo me chamava atenção. Em 1977 cheguei a trabalhar em alguns curtas-metragens em 35 mm, como Diga aí Bahia, um filme do Emiliano Ribeiro e do Alvaro Freire, por exemplo, sempre como assistente de produção, nada tão importante, mas eu estava ali. Contudo, o boom do cinema na Bahia, que não era nem cinema baiano, mas o cinema produzido na Bahia, acabou e eu precisava trabalhar para sobreviver, pois meu pai já tinha falecido alguns anos antes e eu precisava contribuir, inclusive, com o meu sustento e de minha família. Então, eu fui trabalhar com a imagem estática, não mais com a imagem em movimento, com a fotografia. A partir de 1977 eu me torno fotógrafo e segui nessa carreira que me foi muito útil para, mais tarde, em 1993, voltar a trabalhar com o cinema.

CNB - Como você avalia a situação atual do mercado audiovisual na Bahia? Para um(a) realizador(a) negro(a) é mais difícil? AO - Certamente é sempre mais difícil para um realizador negro, contudo, já foi muito pior. Quando eu comecei a trabalhar com cinema e quando eu retornei à área em 1993 dirigindo meu primeiro filme de longa-metragem, Paixão e guerra no sertão de Canudos, não existiam editais, enquanto política pública, e sim, eventualmente uma ou outra chamada que escolhia um filme de longametragem, entre cinco a sete que concorriam. Na época, o cinema carregava consigo o peso de ser uma arte produzida com grandes estruturas e muitos recursos. Ele era feito em película de 35mm e isso exigia uma infraestrutura e maquinário muito pesado para ser viabilizado. Claro que existiam outras possibilidades, como o 16mm e o Super 8, mas o cinema, vamos dizer assim mais profissional, aquele que te permitia uma remuneração mais segura para tua sobrevivência, era em 35mm, que não era acessível para muitos quanto mais para os realizadores negros. Eu vou citar um exemplo aqui da Bahia para a gente perceber que essa história não é de hoje, vem de muito antes. Um dos maiores cineastas negros baianos, Agnaldo Azevedo, conhecido como Siri, dirigiu dezenas de curtas metragens e nunca conseguiu dirigir um longa. Brilhante, ele trabalhou com os maiores cineastas do Brasil, foi diretor de produção e assistente e direção de Glauber Rocha em Deus e o diabo na terra do sol, em 1964, e nunca dirigiu um longa. Por que ele não quis? Claro que não, ele

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não teve as condições e os recursos financeiros que possibilitariam fazer um longa. Porque talentoso ele era demais, e não somente ele, tantos outros realizadores negros aqui na Bahia, que hoje estão invisibilizados. Eu cito outro exemplo, Arnaut Conceição, um grande profissional do cinema, que trabalhava no maquinário, e que também dirigiu curtas-metragens. Provavelmente ele também tinha o seu desejo de dirigir algum filme de longa-metragem, mas não conseguiu. Somente a partir de 2002, com o advento dos editais amplos, resultado da reivindicação de entidades da classe, como a Associação Baiana de Cinema e Vídeo (ABCV), a Associação Brasileira de Documentaristas (ABD) e a Associação de Produtores e Cineastas (APC), ao então governador Jacques Wagner, nós conquistamos editais para o audiovisual diferentes dos anteriores, que tinham recursos mais reduzidos e um número de comtemplados muito mais limitado. O primeiro deles foi ainda em 2012 e, a partir daí, quase que anualmente são lançados editais. Aliado a essas conquistas das políticas públicas, temos um outro fator importantíssimo, que é o avanço da tecnologia, que permite hoje com um equipamento muito modesto, com um custo muito menor, produzir obras de curta, médio ou longa-metragem com uma ótima qualidade. Hoje cinema é audiovisual, antigamente era película 35mm, quem não fazia cinema assim, fazia vídeo. Eu, inclusive, passei por situações como essa, quando um diretor consagrado, amigo meu, disse que eu não fazia cinema, fazia vídeo. Por conta dessa e de outras, eu ousei colocar escrito no cartaz do meu primeiro filme a classificação de “filme documentário em vídeo”. Eu dizia que o roteiro era de cinema, a edição era de cinema, a fotografia também, a linguagem idem, e o suporte, magnético, mas o fundamental eram os outros elementos. Então hoje com a tecnologia e essas políticas públicas, conquistas históricas do setor que vem de longe permitiram que a produção de cinema, a feitura de obras audiovisuais fosse muito maior do que antes. Ainda temos muito a conquistar, por exemplo, é preciso ter uma lei transformando os editais em uma política de Estado, não uma política de governo. Para que eles sejam anuais, é preciso uma lei que destine 1,5% do orçamento do Estado para a cultura, então essas coisas precisam ampliar agora, é preciso caminhar hoje sempre com esse reconhecimento de quem caminhou no passado e possibilitou que o nosso caminho hoje fosse mais fácil. Por mais

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difícil que seja hoje, no passado era impensável como foi para Siri dirigir um longa ele, deve ter sonhado, mas nunca conseguiu realizar. Hoje quem sonha com condições maiores de realizar esse sonho, então eu acho que as dificuldades hoje devem ser vistas no sentido de que precisam ser superadas, mas a superação é estrutural. Eu creio que são os governos federal, estadual e municipal que não alcançam ainda a importância da cultura para mudar as mentalidades de um povo, e aí eu incluo também o governo estadual da Bahia, que investe muito pouco nisso. No ano passado, por exemplo, 2020, um ano terrível de pandemia, o que a Secretaria de Cultura do Estado, assim como a Secretaria de Cultura do município de Salvador investiram na área cultural? Foi muito pouco, nem edital lançou, por exemplo, aliás teve apenas um edital muito pequeno, muito frágil. O dinheiro que veio da Lei Aldir Blanc foi um dinheiro federal. No dia que eles alcançarem, a situação muda.

CNB - Um aspecto que se tem discutido muito na área é a questão da profissionalização. Ao longo da história do cinema brasileiro muitos cineastas começaram a atuar sem uma formação específica. Hoje, existem muitos cursos técnicos e universitários de formação. Aqui na Bahia, por exemplo, temos o Curso de Cinema e Audiovisual da UFRB, em Cachoeira, e a Área de Concentração em Cinema e Audiovisual dentro dos Bacharelados Interdisciplinares da UFBA. Como você avalia isso? Você sentiu necessidade de buscar uma formação? Se sim, quais foram as suas formações nessa área até então? AO - Sem dúvida é valioso porque você adquire conhecimento e técnica, exercita a sociabilização, porque cinema é uma arte coletiva. Até é possível fazer um filme sozinho, teve gente que já fez, mas não é comum, nem recomendável. O cinema exercita o trabalho coletivo, a tolerância e a diversidade, porque se você não faz sozinho, precisa aceitar o outro, então eu acho que os cursos de cinema que surgiram na Bahia são importantíssimos, contudo, não tenho nenhuma dúvida, que a maior formação para um profissional ou uma profissional do cinema e do audiovisual é o fazer, a prática, a vivência. Entre 1990 e 1992 eu decidi fazer meu primeiro longa-metragem, foi nesse período que voltei a fazer cinema. Eu precisava construir o roteiro do filme sobre Canudos, então eu conversei com muitas pessoas, li muitos livros, mas não encontrava o eixo da construção desse roteiro. Em um belo dia, lendo o jornal à noite, na época, eu morava sozinho em Itapuã e trabalhava como porteiro, li uma entrevista de Akira Kurosawa, um dos grandes gênios do cinema mundial. Ele dizia assim: “Quer fazer cinema, quer escrever roteiro? Pegue papel e lápis e vá escrever teu roteiro”. Aquilo foi o giro da chave para mim, eu fechei o jornal, peguei papel e lápis e fui, de fato, escrever meu roteiro. Em seguida, fiz o meu filme. Aquele primeiro rascunho, que eu nem vou chamar de tratamento, foi o definitivo? Certamente que não, mas foi por onde eu comecei, eu escrevi e reescrevi várias vezes, apresentei ele para outras pessoas, recebi críticas, modifiquei-o e ele virou o meu roteiro, fiz meu filme com base nele. Então acho que a formação, na prática, no dia a dia da profissão, é fundamental, porque eu conheço muita gente que tem a teoria e não consegue se situar, não consegue definir um enquadramento, optar por uma luz, não consegue definir o que deve entrar ou sair em uma composição de imagem. Por isso, acredito que é fundamental essa vivência, porque isso vai te dar um pertencimento daquilo que você quer construir e acho que isso tem ocorrido. É impressionante como que essa juventude negra tem criado, tem produzido e tem realizado, inclusive tenho com a impressão, posso até estar enganado que as mulheres negras estão mais ativas do que os homens nesse movimento recente da produção audiovisual, pelo menos se eu citar alguns nomes dessa geração seria mais de mulheres do que de homens. Eu fico muito feliz porque precisamos alterar essa valorização de memórias, alterar essa hegemonia cultural, principalmente a Bahia, que é um estado negro. Então acho importante as escolas [de cinema], mas mais do que elas, a existência de obras que possibilitem o agregar e o construir desse aprendizado nas novas gerações do audiovisual.

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CNB - Sobre a questão do cinema negro no Brasil, o que você pensa sobre essa discussão? Para você essa categoria tem alguma importância e por quê? AO - Em qualquer sociedade existe sempre relações de dominadores e dominados como regra, e muitas vezes isso se trava como disputa política, não é uma relação pacífica. Quando o primeiro homem negro foi escravizado no Brasil, no momento em que ele pisou aqui, começou a resistência à escravidão, então essa relação entre dominantes e dominados é permanente. Onde as representações e expressões negras não são dominantes e hegemônicas surge a necessidade de afirmação, como o cinema negro. Quando se fala em literatura brasileira, qual é essa literatura? Ela é hegemonicamente branca. Então há a necessidade de se afirmar uma literatura negra para contrapor essa hegemonia. A música brasileira também é hegemonicamente branca. Então existe a necessidade de se contrapor a essa hegemonia branca na música, afirmando a música negra. Essa afirmação é a politização desse conceito, marcando o aspecto étnico-racial, que permeia a existência da sociedade brasileira. As questões étnico-raciais estão aí, no cinema não pode ser diferente. Como hoje a sub-representação é enorme, é preciso afirmar um cinema negro, porque o cinema brasileiro é um cinema branco. E quem é que tem condição de fazer o cinema negro? Quem vive essa problemática da sub-representação, quem tem identidade negra, quem tem o pertencimento dessas questões. São os negros e as negras. Esse é o primeiro pressuposto, mas não é o único. Não basta ser negro ou negra para fazer cinema negro. Eu dou um exemplo clássico: Adélia Sampaio, a primeira mulher negra a dirigir um filme no Brasil, em 1984, o Amor maldito, que não é cinema negro. É um filme importantíssimo, corajoso, ousado, contundente, produzido no final da ditadura militar, do governo do general Figueiredo, que denuncia o preconceito nas relações de gênero e sexualidade no país e denuncia a falácia da estrutura do judiciário brasileiro, mas não trata das questões étnico-raciais, portanto, não é cinema negro. Do mesmo modo que você tem cineasta negro dirigindo filmes que não são cinema negro, você tem diretores brancos que são aliados do cinema negro. Eu cito um outro filme clássico, o Ganga Zumba, de Cacá Diegues. É um filme maravilhoso, também importante, que contribui para a afirmação da autoestima do povo negro, mas também não é cinema negro. É difícil imaginar que o cinema chega ao Brasil em 1898 e demorou cinquenta anos para o primeiro homem negro conseguir dirigir um filme, Cajado Filho, em 1948. Agora quando se fala em cinema negro de uma forma mais ampla, no sentido de uma presença negra no cinema, a história é muito mais antiga. Durante o Cinema Novo, por exemplo, com filmes dirigidos basicamente por cineastas brancos, houve um fortalecimento da presença negra com atores brilhantes não só da Bahia, como de outros lugares do Brasil. Eu rapidamente cito alguns, como Antonio Pitanga, que protagonizou trabalhos importantíssimos já nos anos 1960, Lidio Silva, que atuou em alguns filmes de Glauber Rocha, como Barravento e Deus e o diabo na terra do sol, no qual ele protagonizou o antológico beato Sebastião, uma figura que toma conta do filme, personagem que encantou não só quem assiste ao filme, mas os que participaram das filmagens na época, pois muitos que ouviram seus sermões em Monte Santo acreditavam que era real, que ele era o ressurgimento de um novo beato, um novo Conselheiro. É um ator que precisa ter um resgate devido da sua memória, que merece um documentário. Cito ainda os atores Mario Gusmão, Juarez Paraíso, que protagonizou o personagem Pedro Arcanjo, no filme Tendas dos milagres de uma forma maravilhosa, Cal dos Santos, que hoje mora na Itália, e Mira Fonseca, atriz que fez sucesso internacional, em 1966, quando lançaram o filme Pastores da noite. Essa presença negra é poderosa. Na época que eu comecei, não se discutia esse conceito de cinema negro, não se discutia a memória negra, algumas décadas atrás tudo era normalizado, produzido e consolidado pelo branco, então essa é uma questão recente. A sociedade brasileira nem racismo tinha e hoje está percebendo que tem segregação, que tem discriminação e preconceito e que isso só se combate com as mudanças de mentalidades, um processo longo e demorado que tem a ver com a estrutura

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do passado.

CNB - Você considera que tem um trabalho de militância em torno das questões raciais ou crítica social? Se sim, de que forma isso é trabalhado? AO - Eu não faço cinema apenas para meu deleite próprio, eu tenho uma paixão muito grande pelo cinema, mas por aquilo que o cinema é capaz de transformar. Tem alguns filmes, por exemplo, que mudaram a minha vida. Quando eu era adolescente, lá em Jequié, eu assisti a um filme chamado O corcunda de Notre Dame, no Cine Auditório, baseado em uma obra de Vitor Hugo chamada Nossa Senhora de Paris. Ao assistir aquele filme, eu me encantei com a história, que me levou a ir ao encontro da literatura. Foi a partir dele que eu fui buscar o livro de 400 páginas, li-o e depois desse não parei mais de ler. Quando cheguei a Salvador, em 1975, um outro filme mudou minha cabeça, Atas de Marusia, de Miguel Littin, que é sobre uma insurreição de mineradores no Chile. Aquele filme mudou a minha vida, porque ele rasgou o véu que cobria as desigualdades sociais na sociedade brasileira e mundial. Eu justamente faço cinema porque acredito nele pela sua capacidade de transformar as mentalidades, de transformar a vida das pessoas, e por isso a minha opção pelo documentário, eu só faço documentário porque são trabalhos que buscam contribuir para a valoração da memória social, e particularmente da memória negra. Eu faço cinema para contar belas histórias de pessoas que estão invisibilizadas, histórias que me encantam, que me apaixonam, e quero que essas histórias encantem e apaixonem outras pessoas. Eu passei quatro anos, de 1989 a 1993, para realizar o meu primeiro filme Paixão e guerra no sertão de Canudos. A história de Canudos é uma encantadora e a maioria da população de lá era negra. Antônio Conselheiro era um líder negro e a história oficial do Brasil ainda não reconhece isso, um dia vai reconhecer. Na certidão de nascimento dele está escrito pardo, no seu auto de exumação está moreno, dezenas de pessoas que o encontravam chamavam-no de pele queimada, pele morena, e esses termos, na sociedade escravista brasileira daquela época, significavam negro. O ser branco é um capital simbólico extraordinário e ninguém queria abrir mão disso, ninguém chamava um branco de não branco. Após a conclusão desse filme, tive a felicidade de ver ele se espalhar pelo mundo, porque antes de eu lançar no Brasil, inclusive, ele foi lançado nos Estados Unidos. Estive presencialmente lá. A versão em inglês do filme também circulou em países da Europa, o que contribuiu muito para que Canudos deixasse de ser uma marginal da história do Brasil e que outros temas dessa história viessem à tona também, rasgando esse véu que a encobre. No Brasil, circulei com esse filme em dez estados, foram dezenas de lugares onde o exibi, com uma televisão de 29 polegadas, uma caixa de som e uma fita VHS. Após as exibições, aproveitava para vender cópias do filme, e era dessa venda que eu sobrevivia. Cheguei a vender milhares delas, todas numeradas, cuja última numeração registrada indicava 14 mil cópias em VHS, ainda nem era DVD. Canudos é o tema na história do Brasil que mais desperta o interesse na opinião pública, na juventude e no meio cultural, não tem outro assunto com tanta repercussão, nada de Guerra do Paraguai ou Farroupilha. Aqui na Bahia, em primeiro lugar é o Dois de Julho, mas no Brasil é Canudos.

CNB - E o seu segundo filme, Quilombos da Bahia, como foi a produção? AO - Depois de Canudos, eu passei um longo tempo sem filmar, eu até pensei que depois desse filme, que foi premiado nacional e internacionalmente, seria mais fácil conseguir fazer outro, mas não foi. Quilombos da Bahia, meu filme seguinte, só foi lançado em 2004, já usufruindo das então recentes políticas públicas do governo Lula. A Petrobrás, por exemplo, financiava filme de muita gente, mas nunca financiou um meu. Quando houve uma mudança no governo brasileiro, quando Lula assumiu, eu inscrevi um projeto meu para Petrobras, que foi, finalmente aprovado

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e financiado, pela empresa. Então eu fui para o trabalho de campo meus parceiros de sempre, um deles, Raimundo Bujão, que construiu junto comigo esse filme. Nós visitamos 69 comunidades quilombolas em 28 municípios do estado, 12 mil quilômetros percorridos e 90 dias de filmagem, que resultaram no Quilombos na Bahia. Naquela época nem se conhecia bem o que eram essas comunidades quilombolas. Todo mundo falava em quilombo, referindo-se apenas ao Quilombo de Palmares, era a ideia de quilombo que se tinha, não era regra, com exceções, de um povoado isolado, aguerrido, arredio e distante da civilização. As emissoras de televisão, inclusive, contribuíam para isso, fazendo, de vez em quando, reportagens com suas câmeras chegando nessas comunidades e mostrando crianças correndo, como se estivessem fugindo, para reforçar a ideia em um povo primitivo. Era tudo mentira, uma falácia. Sabe porque era mentira? Porque nas comunidades que eu visitei uma das presenças menos predominantes era da juventude, você tinha pessoas idosas, pessoas maduras, crianças e adolescentes. Não tinham jovens, que estavam, em sua maioria, em São Paulo, trabalhando, retornando depois durante a festa de padroeira, no final do ano, trazendo a camisa da moda, o disco da moda, o tênis da moda, o penteado da moda. Traziam tudo de mais moderno que tinha em São Paulo. Então quando me deparei com aquilo, constatei que não existia comunidade primitiva, nada disso, e esse filme contribuiu para retirar da invisibilidade essas comunidades quilombolas, que, inclusive, não se identificavam enquanto tal, como comunidades tradicionais, rurais. Foi a partir das políticas públicas do governo Lula que elas, percebendo que essas ações trariam benefícios, em programa como Luz para Todos, Bolsa Família e demarcação de terra, passaram a se aproximar dessa identidade quilombola, que elas tinham abandonado há séculos atras. Eu digo isso porque a palavra quilombo vem da África, do quimbundo, que significa ajuntamentos. Quando os negros escravizados no Brasil fugiam da escravidão, eles formavam os ajuntamentos e os intitulavam de quilombos, com isso atraiu-se a repressão violenta que os destruiu, eliminando milhares deles ao longo das décadas. Então, eles perceberam que se autodenominarem quilombolas atraia a repressão, por isso, a partir disso passaram assumir outras denominações, como Vila Aparecida, Rio das Antas, Barra, Bananal, etc. Ao longa das gerações e dos séculos eles perderam essa identidade quilombola como estratégia de sobrevivência, atitude extremamente sábia. Nos últimos 40 anos, os movimentos negros e as, na época, recentes políticas públicas do governo Lula fizeram com eles voltassem ao encontro dessa identidade quilombola, porque ela agora assegurava-lhes direitos. Quando eu filmei Quilombos da Bahia, em 2004, existiam apenas seis comunidades, três reconhecidas como quilombo e três em processo de reconhecimento. Hoje tem mais de 530, com organização estadual e reconhecimento, uma contribuição importante do filme, não a única, nem a principal. Eu fico muito feliz por meus filmes terem essa função social. As pessoas reconhecem isso publicamente e me convidam para eventos, e eu sempre vou, como de praxe, discreto. Eu agradeço muito ao Raimundo Bujão, a Valdélio Silva e tantas outras pessoas que contribuíram nesse filme.

CNB - Você também fez um filme sobre Abdias do Nascimento, como foi essa experiência? AO - Logo depois do lançamento de Quilombos na Bahia, o conceituado etnógrafo e antropólogo Carlos Moore ligou para mim dizendo que eu tinha que fazer um filme sobre Abdias do Nascimento porque ele era uma figura muito importante, estava completando 90 anos e merecia uma homenagem. Eu já conhecia um pouquinho o Abdias de nome, cheguei a assistir a uma palestra dele, em 1977, na Associação dos Funcionários Públicos, aqui em Salvador, e, naquela época, assistir a uma palestra sobre um livro que abordava questões étnico-raciais era correr o risco de ser preso. Respondi a Carlos que conversaria com Bujão para ver se a gente faria. Contudo, quando perguntei a ele sobre financiamento, ele me respondeu: “Olavo, essa parte é contigo”. Então conversei com Bujão, meu velho parceiro, e fomos fazer o filme, mesmo sem recursos financeiros. Fomos gravando ao longo do tempo, com um pouco daqui, um pouco dali, Abdias fez 92 anos, depois 93. Quando

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ele vinha a Salvador, fazíamos algumas filmagens, fomos ao Rio de Janeiro também, onde gravamos uma grande entrevista com ele. Toda vez que me encontrava, Abdias dizia: “Quero assistir a esse filme”. Imagine, um cidadão de 93 anos querendo ver o filme, era uma pressão. Apenas em 2018, ele já com 94 anos, que a gente conseguiu finalizar o filme, graças ao apoio da Universidade Estadual da Bahia (UNEB), um apoio importantíssimo, e a Secretaria Municipal de Reparação (SEMUR). Contudo, eu ainda tinha um desafio muito grande, porque gravamos um grande depoimento de uma figura nonagenária, de fala lenta e reflexiva, absolutamente lúcida, mas lenta, como transformar isso em um longa-metragem, decidi fazer um longa, pela quantidade e riqueza do material, aliás, eu sempre fiz longa-metragem mais intensamente. Depois que eu descobri na história dele, nascido em 1914, que ele participou de todas as importantes lutas negras no Brasil, como a Frente Negra na luta contra o Estado Novo de Vargas, a fundação do Teatro Experimental do Negro, a luta contra a ditadura militar, a fundação do Museu Afro-brasileiro, a fundação do Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial (MNUDR), eu resolvi fazer um filme que contasse a história de Abdias, abrindo janelas para apresentar essas lutas, além de momentos marcantes do povo negro brasileiro, como a escola de samba do Rio de Janeiro, Salgueiro, campeã carioca em 1960 com o tema sobre Quilombo dos Palmares, Clementina de Jesus cantando, em 1966, Benguelê, que explodiu no país inteiro, Tony Tornado, em 1971, fazendo a cabeça de toda a juventude, não só no cabelo, mas na dança também, inclusive a minha com 15 anos lá em Jequié, com sua apresentação antológica cantando “BR3”. No dia do lançamento, 17 de março de 2008, o Teatro Castro Alves ficou lotado, com mais de 1500 pessoas, inclusive, com a presença de Tony Tornado e Abdias. Para mim foi uma felicidade muito grande poder ter feito esse filme com Abdias em vida. O filme não teve venda comercial, mas foi distribuído para as escolas públicas e teve uma veiculação muito importante também com as versões em francês e inglês.

CNB - O filme seguinte foi A cor do trabalho. Quando surgiu a ideia e como foi o processo de produção? AO - Depois de Abdias, fiquei mais um tempo na geladeira, não por desejo, mas por dificuldades óbvias de recurso. A cor do trabalho só surgiu em 2014 com uma demanda da Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte da Bahia (SETRE), que queria fazer um filme sobre trabalho, então eu propus que fosse sobre o trabalho negro na Bahia, mas sobre o trabalho do ponto de vista de positivação desse legado, não da história do negro escravizado, humilhado, que sofreu e chorou, história que é real, mas que é cansativa, que nós já aprendemos demais, principalmente nas escolas. O que não aprendemos ainda é a resistência e a transgressão a essa opressão, a alegria, a ludicidade, as conquistas e experiências vitoriosas do povo negro ao longo desses 500 anos aqui no Brasil. Então é fundamental construir uma história do trabalho negro na Bahia recuperando esses elementos, esses homens e essas mulheres que travaram grandes lutas, que foram vitoriosas. Precisamos lembrar disso o tempo todo para não pensarmos que o marco zero é agora, e sim, muito antes da gente. Manoel Quirino, por exemplo, fundou, em 1895, o primeiro partido operário na Bahia. A juventude negra hoje precisa saber disso, precisa saber quem foi Manuel Quirino. Ele foi vereador e precursor do design brasileiro, isso que esses brancos e brancas deitam e rolam e são famosos e famosas, mas que quem começou foi Manuel Quirino, em 1890, no final do século XIX. Figuras extraordinárias, como André Rebouças, nome do maior túnel do Rio de Janeiro, e é baiano, Teodoro Sampaio, que tem um túnel aqui na Centenário com o nome dele, Américo Simas, Martagão Gesteira, Juliano Moreira, entre outros, a maioria das pessoas não sabe quem foram eles e que eram negros. Por isso, a história do povo negro merece uma memória digna e grandiosa, porque isso eleva a nossa autoestima. Eu tenho 65 anos e se olhar para o meu passado de sofrimento, de tristeza, de dor e de humilhação, eu vou baixar a cabeça, morrer e me enterrar no buraco, mas se eu olhar para meu passado e ver que já fiz muita coisa, cinco longas-metragens, centenas de palestras,

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etc., isso vai me encher de orgulho e me fazer levantar a cabeça. É essa memória que dá orgulho. Então, A cor do trabalho é isso, a história do trabalho negro na Bahia positivada, sem esquecer que houve a escravidão, mas sabendo que houve, sobretudo, a resistência. Nós encontramos uma psiquiatra negra, em 2014, raro, na época, mas encontramos, o que hoje mudou, com a política de cotas étnico-raciais nas universidades públicas, além de um cirurgião plástico negro, um empresário negro e um industriário negro, e figuras importantes, como a ialorixá Mãe Stella de Oxóssi, o presidente do Olodum, João Rodrigues, o presidente do Ilê Aiyê, Antônio Carlos dos Santos, entre outros. CNB - Que outros trabalhos importantes você gostaria de destacar? AO - Em 2017, eu saí um pouquinho do meu habitual e fiz uma série chamada Travessias negras, que está um pouco na linha de A cor do trabalho. Fiquei encantado quando participei de um encontro universitário com estudantes negros brasileiros, que coisa maravilhosa foi! Na minha época, na década de 1970, tinha apenas três negros na minha turma de Geologia na UFBA, com 50 alunos. Então, resolvi fazer a série, fruto de um edital que eu ganhei da Agência Nacional de Cinema (ANCINE), para falar dessa juventude que olha para o futuro, que adentra nos lugares com a cabeça erguida, que tem força, que apontam novos caminhos, que nos deixam com muito orgulho por eles. Nós selecionamos oito pessoas, quatro protagonistas e quatro mediadores negros, todos jovens e estudantes que adentraram na universidade pelas políticas de cotas, em cursos chamados nobres, como Medicina, Direito e Comunicação. Travessias negras foi um ponto um pouco diferente da minha trajetória, que sempre trabalhei com a memória e com pessoas mais idosas. Nela, eu nem abri mão de falar da memória da família desses núcleos, mas é a juventude que fala dessa vez. Já em 2018 veio meu último filme, 1798 - Revolta dos Búzios, o mais difícil, o mais longo e o mais complexo que fiz, levei treze anos para fazê-lo. Fiquei apaixonado pela história da Revolta dos Búzios, que também tem outros nomes, como Revolta Baiana, Inconfidência Baiana e Revolução dos Alfaiates, é uma história encantadora, assim como muitas outras do povo negro. Foi muito difícil, porque o fato ocorreu há mais de duzentos anos atrás, em 1798, uma história em que hoje você não identifica mais os descendentes dos conspiradores, já que a memória da elite branca foi cruel no sentido de criminalizar as memórias negras. Por exemplo, tem-se conhecimento dos descendentes de Tiradentes até hoje, alguns, inclusive, recebendo pensão do Estado, mas os descendentes dos conspiradores da Revolta dos Búzios, que ocorreu depois da Inconfidência Mineira de 1789, não estão identificados, pois o decreto do governo local da época dizia que eles foram condenados ao enforcamento e declarados como infames, o que atingiu a memória dos seus filhos e netos. Obviamente, a partir disso, esses descendentes passaram a negar essa identidade para sobreviver. Além disso, não tinha uma iconografia sobre a revolta, e a fotografia foi inventada muito tempo depois. Se fosse uma obra ficcional poderia criar algo, mas eu nunca fiz ficção, nem quero fazer, eu queria fazer um documentário. Eu tinha apenas os autos da devassa, o inquérito policial de mais de duas mil páginas manuscritas, que foi publicado em 1998, condensado em mil e poucas páginas. Durante anos eu passei a estudar profundamente esse material, eu busquei fazer o que Walter Benjamim dizia que era preciso, fazer uma leitura a contrapelo para perceber o que não estava dito, o que estava nas entrelinhas, o sentido figurado e as metáforas. A partir dos autos, eu construí o roteiro. Usei uma narração em off, muito confessional e intimista, porque o movimento foi uma conspiração, não uma rebelião. Ele foi reprimido no dia da deflagração, em 12 de agosto de 1798, então eu busquei passar no filme esse movimento clandestino. Todas as imagens são noturnas, de penumbra, silhuetas, detalhes de corpos e de objetos, como simbologia, imagens da cultura negra. Também usei atores e atrizes como narradores adicionais nas falas dos conspiradores, eles não dramatizaram nada, apenas fizeram a narração. O elenco do Bando de Teatro Olodum foi fantástico para isso, Jorge Washington, Valdineia Soriano, Luciana Souza, Ridson Reis, Fábio de Santana, todos eles, porque eu não sabia se o filme ia dar certo, se ia funcionar. A trilha sonora do Maurício

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Lourenço também foi maravilhosa. No dia do lançamento, tínhamos marcado duas sessões, uma 18h e outra 19:30, dez horas da manhã já tinha gente na fila para pegar o convite na Walter da Silveira, às 17:30, a primeira sessão já estava lotada, a segunda sessão também lotou e restou mais de seiscentas pessoas do lado de fora, que não pôde assistir. A minha felicidade foi muito grande com esse filme, porque depois eu fiz um circuito de exibição maravilhoso nas escolas públicas, levando esses bons conteúdos para quem mais necessita, as juventudes negras, o grande público principal dos meus filmes, o que mais almejo, seja exibindo para vinte, seja para trezentas pessoas, com debates sempre depois. A pandemia interrompeu esse processo, tive que parar, mas espero voltar logo. O filme foi difícil, mas muito gratificante ter feito. Infelizmente é o único filme sobre o tema, eu espero que outras pessoas produzam porque esse tema precisa ser nacionalizado. Em 2019, nós tivemos uma conquista muito grande, apresentamos um projeto, ideia minha e de Bujão, para transformar o dia 8 de novembro, data em que houve o enforcamento dos quatro jovens mártires da Revolta dos Búzios, em Dia Municipal em Memória dos Mártires da Revolta dos Búzios. Naquele dia, em 1799, eles saíram da cadeia, onde hoje é a Câmara Municipal, na parte de baixo, foram a pé, amarrados, até a Praça da Piedade, onde foram enforcados com o peso da memória infame. Nós fizemos uma caminhada antológica, em 2019, nesse mesmo dia, quando completou-se 220 anos, refazendo o percurso, dessa vez, da Praça da Piedade à Câmara Municipal de Vereadores, onde o projeto de lei foi aprovado pelos vereadores de Salvador. Isso é o resgate da memória negra. O nosso objetivo agora é transformar essa data em um dia nacional. Não é feriado, mas um dia para se lembrar. Essa é mais uma das funções sociais que eu busco cumprir com meus filmes. Isso é que dá sentido ao meu trabalho, eu faço filme principalmente para que ele encante outras pessoas, não porque é mérito meu ou mérito dos filmes, mas mérito dos temas e das histórias, que pedem para serem contadas. Como é que se admite ter dezenas de filmes sobre a Inconfidência Mineira e um tema e um movimento muito mais importante que ela, a Revolta dos Búzios, que defendeu a independência da Bahia, a República e o fim da escravidão, apenas um?

CNB - Que projetos mais recentes têm se dedicado? AO - No último edital da Secretaria de Cultura da Bahia, eu submeti um projeto, um documentário sobre a Revolta dos Malês, que nem foi classificado, nem na suplência ficou, acho que nem leram. A minha ideia é construir a trilogia 1798 - A Revolta dos Búzios, 1835 - A Revolta dos Malês e 1837 - A Sabinada. A primeira foi uma conspiração, a segunda foi uma rebelião, eles foram para a rua e morreram mais de setenta no dia 25 de janeiro de 1835, e a terceira tomou o poder na Bahia. Francisco Sabino, que assumiu e exerceu o poder durante vários meses, era um homem negro e o movimento tem esse nome por causa dele. A Sabinada foi reprimida e derrotada, mas existiu, e enquanto existiu, foi vitoriosa, praticamente não se conhece isso. Eu tenho trabalhado nesse projeto há alguns anos, ele estava muito bem feito, por isso que acho que nem foi lido. Quem sabe um dia eu faço com ou sem eles. Para finalizar, atualmente estou finalizando um filme sobre os sobreviventes da guerra de Canudos, sobre o pós-guerra, chamado Ave Canudos, os que sobreviveram saúdam, que já era para estar pronto, mas a pandemia atrapalhou tudo. Canudos consagrou-se no mundo inteiro como o lugar onde todos morrerem, mas isso não é verdade. Muitas centenas, talvez milhares de pessoas sobreviveram. A população de Canudos, inclusive, mais uma vez eu digo, era majoritariamente negra. O professor José Calazans dizia que tantos “homens de cor” levaria a supor que Canudos foi o último quilombo. Os principais líderes de Canudos também eram negros, como Antônio Conselheiro, um antiescravista ferrenho, que escreveu suas Prédicas contra a Escravidão e fez sermões para milhares. Não estou exagerando, há um depoimento de um italiano que viu ele pregando para quatro mil escravizados em uma fazenda próximo a São Francisco do Conde, que vinham à noite ver ele e de dia voltavam para suas fazendas. Estou também fazendo o desenvolvimento de um projeto sobre a independência do Brasil do ponto de vista das grandes

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rebeliões que houveram antes de 1822, como a Revolução Mineira, Revolução Carioca, Revolta dos Búzios, Insurreição Pernambucana e Confederação do Equador, também para um edital.

CNB - Para finalizar, que conselho você daria para os jovens negros que querem trabalhar no cinema? AO - É ter perseverança, não se abater com as adversidades que surgirem. Eu quando estava fazendo meu primeiro filme, 19 vezes por dia eu pensava em desistir. Eu só não desistia, porque 20 vezes por dia eu pensava em continuar. Dificuldade sempre vai ter. Fazendo o filme sobre Abdias, entre 2005 e 2008, eu já com dois longas-metragens produzidos e reconhecidos, cheguei a achar que não ia conseguir finalizá-lo, pois tudo conspirava contra ele, mas a gente conseguiu. Quando eu terminei o filme sobre Canudos, ele custou 100 mil dólares. No dia do lançamento nos Estados Unidos, 17 de outubro de 1993, cheguei na sala de exibição com mais de duzentas pessoas e disse que estava muito feliz de estar lá, mas preocupado também porque só tinha conseguido captar 80 mil dólares, ou seja, estava devendo ainda 20 mil. Então eu levei tudo sobre o filme, camisa, VHS, broche e adesivo, para vender lá. Um mês depois, eu voltei ao Brasil devendo ainda 17 mil, consegui arrecadar apenas 3 mil lá. Eu só fui pagar esse restante quatro anos depois, quando eu vendi o filme para a TV Câmara. Com esse dinheiro eu paguei o último devedor. Então as dificuldades existem, mas são elas que tornam mais forte o teu envolvimento. Se alguém chegasse com um milhão de dólares para eu fazer um filme, me atrapalharia todo. As coisas quando são muito fáceis não funcionam, você nem valoriza isso. O que eu diria para essa juventude é que as obras que precisam ser feitas são as que transformam, principalmente para mudar esse Brasil conservador. Um país que levou mais de trezentos anos em um regime de escravidão, isso não é pouca coisa, são muitas e muitas gerações. O Brasil proclamou uma independência, em 1822-23, com a monarquia, enquanto muitos outros países, inclusive da América, proclamaram a independência com a República, que surgiu na França em 1789. A República só veio a ser proclamada no país, em 1899, por um marechal. O país viveu o século XX no revezamento das elites brancas de Minas Gerais e São Paulo, depois veio o Estado Novo, com Getúlio Vargas, que ficou sessenta anos no poder, boa parte com a ditadura, depois veio a democracia burguesa, a ditadura militar, e na sequência a redemocratização com Sarney, Collor, Itamar e Fernando Henrique. O governo Lula foi um respiro nisso tudo. E isso muda? Muda! Como? Com a mudança nas mentalidades. E o que que muda as mentalidades? Só tem duas coisas, educação e cultura. Só. No mais é conversa fiada. Nós temos que forjar uma consciência de transformação e isso quem dá é a educação e a cultura. Eu acredito na cultura, é por isso que eu trabalho com ela. Infelizmente, mais uma vez eu digo, esses gestores no plano federal, estadual e municipal não alcançam a importância que a cultura tem para mudar cabeça das pessoas.

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“IMAGINE QUANTAS LINDIWÊS EXISTEM POR AÍ, QUE PODERIAM TAMBÉM TER SIDO FISGADAS PELO CINEMA SE FOSSEM DADAS A ELAS AS DEVIDAS OPORTUNIDADES” ENTREVISTA COM LINDIWÊ AGUIAR Por Lecco França CNB - Fale um pouco sobre a sua trajetória profissional no cinema, o que te levou para essa área? LA - Então, eu costumo dizer que é aquela história da sorte misturada com o acaso. Eu era uma pré-adolescente de 12 anos, estudante da Escola Parque, que é uma escola modelo localizada na Caixa D’água. Esta escola tem outras unidades, como se fossem filiais, que são as escolas Classe 1 até a Classe 5. Eu estudava na Classe 1, na rua Meireles, no bairro da Liberdade, onde eu nasci e fui criada. Esse projeto de escola, uma iniciativa da Secretaria de Educação daquela época, tinha o objetivo de trabalhar com o Estatuto da criança e do adolescente, publicado em 1990, com jovens de escola pública. Em uma palestra ministrada pelo então juiz Salomão Resedá, que pude conferir com uma turma de amigos, ele sugeriu, provocou e convocou a gente a participar do projeto. Eu mesmo sem saber do que se tratava, mas via os meus amigos interessados decidi também entrar nesse projeto, que a gente chamou de “Voltas e revoltas”, e foi muito interessante porque fez com que a gente se familiarizasse com os nossos direitos desde a infância. O projeto tinha um parceiro

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na época, o Liceu de Artes e Ofícios da Bahia, uma instituição filantrópica, sem fins lucrativos, muito antes, inclusive, de existir as organizações não-governamentais (ONGs) como a gente conhece hoje. Ele tinha um programa de aprendizes com ofertas de cursos e entre as opções oferecidas tinha a Oficina de Vídeo, hoje chamado de Produção Audiovisual. Eles identificaram em mim, mesmo com 12 anos, um potencial para trabalhar com comunicação, liderança e proatividade, algumas características que eles falaram que eu tinha, fizeram-me acreditar que eu teria o perfil ideal para a área e que, na prática, deu certo. Eu fui aprendiz do liceu por dois anos e, nesse período, eu trabalhei em todas as áreas da produção audiovisual, desde a criação, do brainstorm, quando a ideia ainda vai nascer, passando pela produção e pela gravação até a edição e finalização. Então eu tive a oportunidade de conhecer todas essas áreas do audiovisual praticando. O liceu tinha um lema que era “aprender pelo fazer”, então a gente realmente aprendia pela prática. Foi dessa forma que eu adentrei no universo do audiovisual. CNB - Quais dos seus trabalhos destacaria, aqueles que te deram muito orgulho em ter feito? LA - Eu acho que começa pelo primeiro vídeo, o Enquadrocanto (1994), que eu fiz enquanto ainda aprendiz do liceu, para participar do festival Imagem em 5 minutos, que era um festival de cinema que existia aqui em Salvador e um dos mais importantes do Brasil, inclusive. Nessa experiência fizemos um videoclipe com a música “Haiti”, de Caetano Veloso e Gilberto Gil, abordando a realidade do Pelourinho daquela época, recém reformado e entregue à população, mas que mantinha também o processo de exclusão dos moradores locais, da população negra que não era bem quista naquele lugar, dentro do contexto do turismo baiano, de uma alavancada de ações que o estado estava fazendo para estimular o turismo na Bahia. Com este clipe nós ganhamos o primeiro lugar nesse festival e isso foi muito importante porque eu sempre falo que aquilo marcou de alguma forma o meu estilo de trabalho, o que eu queria desenvolver com o cinema. Depois eu dirigi o Dona Dalva, uma doutora do samba (2014), documentário sobre Dona Dalva Damiana de Freitas, de Cachoeira, que tem um trabalho com o samba do recôncavo e recebeu o título de Doutora Honoris Causa pela Universidade Federal do Recôncavo Baiano. É um trabalho que eu gosto muito porque tem a junção do meu desejo em dar visibilidade às mulheres negras e de recontar histórias de personagens que marcam a nossa cultura. Já Corpo sofredor (2014), documentário produzido em parceria com a professora e pesquisadora Angie Gomes Biondi, na época, mestranda da Universidade Federal de Minas Gerais, investiga quais os corpos que ganham os prêmios mais importantes do fotojornalismo, que corpos ocupam estas fotos, o chamado corpo sofredor. Também não posso esquecer de Ebomi Cidalia, que é um documentário curto, de apenas cinco minutos, encomendado pelo professor Jaime Sodré, que fala um pouco de uma pessoa muito importante para as religiões de matriz africana aqui na Bahia, que é filha de Irôco, filha de Mãe Menininha do Gantois e que tem uma história fantástica.

CNB - Como você avalia a situação atual do mercado audiovisual na Bahia? Para um(a) realizador(a) negro(a) é mais difícil? LA - Queria muito dizer que não, mas a partir do momento em que a gente perde trabalhos que conquistamos em processos, por exemplo, como editais, por um conceito antecipado ou por não acreditarem que você é capaz de fazer um trabalho relevante. Não se pode deixar de considerar a dificuldade quando você pertence a grupos que a sociedade, de certa forma, não consegue associar, ainda não sei por que, ao cinema. Então é mais difícil sim para um cineasta negro ou negra, que precisa provar, além de qualidade técnica, de que somos capazes. Eu mesma já tenho mais de vinte anos de trabalho e até hoje tenho que enfrentar essa realidade, e não estou falando de currículo, estou falando mesmo de você ter que provar o óbvio, então é um pouco cansativo nesse sentido e por isso dificulta mais. Claro que quando você já tem uma carreira, uma história solidificada ajuda

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muito, porque seu nome passa a ser um cartão de visitas e isso facilita bastante para que as pessoas não precisem verificar se o meu trabalho atende ou não ao cliente. No geral isso tem mudado muito, e é positivo. A UFRB, por exemplo, foi muito responsável por essa mudança, com a injeção no mercado audiovisual de cineastas negros, aumentando a competitividade. Não se pode ignorar o contexto atual de pandemia e as dificuldades para o audiovisual, que é uma área que eu considero muito forte aqui na Bahia, mas que passa por um momento talvez de esfriamento. Acho, inclusive, que o poder público precisa olhar ainda com mais cuidado para o mercado audiovisual daqui.

CNB - Como você avalia a questão da formação profissional? Você sentiu necessidade de buscar uma formação? Se sim, quais foram as suas formações nessa área até então? LA - Com certeza eu avalio de forma muito positiva esse cenário atual. Quando a gente tem a possibilidade de acessar cursos de audiovisual no próprio Estado isso já faz com que a gente tenha no mercado um pessoal que faça parte desse contexto. Eu acredito muito que o cinema e a produção artística em geral precisam ser feitos também pelos seus protagonistas, sermos protagonistas das histórias que a gente cria. Então penso que passa por isso, em oferecer e popularizar o cinema a partir desses cursos, desses outros canais que se abriram. Para você ter uma noção, quando eu me formei no liceu, em 1995, não tinha nenhum curso profissionalizante de nível superior em audiovisual, só de nível técnico, que era o liceu e algumas instituições que existiam a época, e foram surgindo outras depois. Por isso muitos cineastas baianos têm outras formações, como Pola Ribeiro, por exemplo, que é jornalista como eu. Então acontece de a gente ir para áreas afins para poder desenvolver a produção audiovisual, como o jornalismo, que permite essa integração. No meu caso, logo depois que me formei no liceu, fiquei um longo período sem fazer nenhum curso de nível superior, fazia cursos profissionalizantes e oficinas, além de participar de seminários e palestras, apenas, buscando me reciclar com o que surgia. Muitos anos depois, iniciei o curso de jornalismo, com mais de 30 anos de idade, por necessidade de qualificação e para agregar valor ao meu trabalho.

CNB - Como você consegue recursos para realizar seus filmes, por meio de editais, patrocínios ou você ainda faz filmes com dinheiro próprio. Como funciona? LA - Eu faço filmes sob demanda, prestando serviços para empresas, instituições não governamentais e para o Estado. Normalmente, quando eu consigo produzir um documentário, alguns desses que eu citei anteriormente, pessoas físicas, profissionais liberais e educadores, em sua maioria, me contratam, como o professor Jaime Sodré, que me contratou para fazer o Ebomi Cidalia, e Angie Biondi, que disponibilizou recursos próprios, que ela recebeu como prêmio pela pesquisa que realizou para a produção de Corpo sofredor. Também acesso recursos através de pregão e de editais promovidos pelo Estado, assim como editais e concorrência de instituições não governamentais. Claro que boa parte do meu trabalho hoje vem também, como eu falei antes, em reconhecimento de algumas produções em vídeo que desenvolvi ao longo desses 21 anos de carreira. Eu sempre brinco que por isso eu sempre fico no limbo entre os cineastas, os videomakers e os produtores audiovisuais, porque eu não tenho trabalhos autorais, eu não faço vídeos por conta própria hoje, fiz muito no início da carreira, mas depois que você se torna empresa, porque durante esse tempo, além de cineasta, eu sou gestora de uma produtora, todo e sustentar uma produtora de vídeo aqui com todas as adversidades e sustentar uma empresa é muito complicado, então por isso algumas pessoas não consigam me classificar como cineasta, já que eu não produzo material próprio, mas eu costumo dizer em minha defesa que eu costumo fazer trabalhos que, se não fossem contratados seriam, sim, autorais, como Dona Dalva e Ebomi Cidalia. Isso eu tenho feito esses anos todos, vídeos

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documentários institucionais com temas que eu também abordaria, se fossem autorais.

CNB - Eu queria saber sua opinião sobre as políticas públicas direcionadas a produtores e realizadores negros e negras (por exemplo, o Curta Afirmativa e o B.O Afirmativo lançados pelo antigo MINC). LA - Eu observo isso também de forma positiva, porque dar acesso a produtores e cineastas negros também é uma forma de reparação. São ações importantes para poder, justamente, viabilizar trabalhos de pessoas fantásticas que a gente tem por aí, mas que muitas vezes não têm acesso a grandes financiamentos, porque temos que entender que, como indústria, o cinema tem um ciclo, que as grandes produtoras já estão acostumadas a lidar a muito tempo, enquanto que os produtores negros normalmente surgem em uma realidade que não tão favorável financeiramente. Eu acho que o acesso é importante para justamente poder igualar essa possibilidade de lidar com criação e produção audiovisual. O meu desejo é que todos os cineastas negros não precisem disso por tanto tempo, que a gente possa realmente produzir nossos vídeos sem distinção, sem a necessidade de o tempo todo nos rotular, porque o cinema é muito diverso, muito amplo, inclusive, muitos cineastas negros produzem coisas que estão para além do que a sociedade quer que a gente produza, então eu acho importante que a gente possa ter acesso a editais e financiamentos públicos que viabilizem essa produção.

CNB - Sobre a questão do cinema negro na Bahia e no Brasil, o que você pensa sobre essa discussão? Para você essa categoria tem alguma importância e por quê? LA – Sim, por uma questão não só de políticas públicas. Quando você se reconhece enquanto categoria, você consegue canalizar projetos e recursos para essa comunidade. Outro aspecto muito mais importante do que isso é a representatividade, de você poder falar do universo que a população negra ocupa, ter esse direcionamento. Claro que a gente não pode se perder, como eu disse antes o universo audiovisual é muito diverso e amplo, só que ao mesmo tempo ele ainda é dominado por uma categoria, por um gênero, por uma raça. Então, quando você fortalece movimentos, como o cinema negro, você acaba dando essa possibilidade de visibilização. É fundamental que a gente tenha essa representatividade junto a sociedade, para a que a gente possa se apoderar do que a gente produz. O que nós fazemos é cinema negro, não tem para onde correr. Eu sempre brinco que toda vez que eu falo de cinema negro eu faço uma ressalva porque às vezes eles querem nos imputar coisas que acham que devemos agregar ao cinema negro, como a qualidade ruim da imagem, ou a produção que trata exclusivamente de algo panfletário. É importante quebrar esse engessamento da sociedade de querer nos colocar em um determinado lugar. É cinema negro sim, mas é um cinema também padrão, um cinema como outro qualquer, obviamente diferente por ter essa particularidade de estar sendo feito por pessoas negras.

CNB - Você considera que tem um trabalho de militância em torno das questões raciais ou crítica social? Se sim, de que forma isso é trabalhado? LA - Eu acho que tem sim a militância, mas tem também a diversidade. Tem uma frase que Maíra Azevedo, conhecida como Tia Má, fala, que eu gosto muito. Ela fala que as pessoas querem que o tempo todo nós sejamos um grupo uniforme e não somos. Então a gente pode trazer em um cinema negro, por exemplo, a história de um jogador de futebol que resolve visitar sua comunidade,

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ou a gente pode trazer no cinema negro a história de uma família de mulheres negras que têm uma história com casamento, como é o caso de Filhas do vento, de Joel Zito Araújo. O panfletário, que é como preferem nos colocar enquanto estereótipo, pode fazer parte de uma necessidade também que o cinema negro tem de discutir a questão social, de colocar em tela este Brasil que muitos se recusam a enxergar, a partir desse olhar negro, desse olhar racial, de quem participa, de quem está dentro disso. Claro que é importante que a gente entenda o cinema negro como algo diverso. Observe que, como eu falei, eu tenho trabalhos que não são autorais, mas poderiam ser considerados como tal. Então é importante ter essa noção de organização, de fazer parte desse grupo de cineastas negros, sem desconsiderar que nós podemos falar sobre muita coisa dentro desse universo.

CNB - Quais as suas principais referências do cinema negro baiano e/ou brasileiro? LA - Eu gosto muito do Joel Zito Araújo, que é uma referência para a gente, porque ele faz não só documentários, mas também filmes de ficção, é um cineasta fantástico por trazer a diversidade, desde o protesto das questões sociais e raciais que a gente precisa discutir até um romance de ficção que não precise ter ali um necessariamente a abordagem racial, apesar de serem feitos por atores negros, como é o caso de Filhas do vento. Gosto muito também de um cineasta de uma geração mais recente, o Jeferson De, que fez filmes fantásticos, como Bróder. Ele faz um recorte racial e social muito interessante para o cinema e também aborda a diversidade da qual eu falo tanto. A gente tem uma geração mais jovem ainda que é a Viviane Ferreira, baiana, cineasta que eu gosto e admiro muito, e que eu tive a sorte de cruzar nesses caminhos da produção audiovisual. Ela também é uma grande cineasta, dirigiu o curta-metragem O dia de Jerusa e acabou de produzir o longa-metragem, que também tem todo um trabalho de militância dentro do audiovisual, de reivindicação desse espaço do cinema negro.

CNB - Como as atuais e novas tecnologias de informação e comunicação têm beneficiado o trabalho de cineastas negros(as) na Bahia? LA - A partir do momento que a digitalização do audiovisual possibilitou o acesso ao equipamento. Quando eu comecei na área, a minha primeira grande dificuldade foi ter dinheiro para comprar equipamentos profissionais. Existia uma separação muito grande, que hoje não existe mais, entre equipamentos profissionais e amadores. Por exemplo, você pode fazer uma imagem em Full HD ou 4k com um simples aparelho celular, com uma câmera pequena, chamada hand cam, que era considerada uma câmera amadora, ou com uma câmera grande, que naquela época não era tão acessível financeiramente. Com a digitalização do audiovisual, aconteceu algo muito fantástico, que foi o acesso mais fácil à tecnologia, fundamental para que muitos cineastas negros iniciassem suas trajetórias, que ofereça uma boa imagem na gravação, assim como a uma boa ilha de edição, já que você passa a concentrar todos os equipamentos em um PC, por exemplo, até mesmo em um notebook, sendo que antes a gente precisava ter, no mínimo, uns cinco equipamentos profissionais diferentes para poder algo parecido.

CNB - Recentemente tem surgido várias mostras de cinema negro, em especial na Bahia, e sessões especiais sobre cinema negro em festivais. Qual a leitura que você faz sobre isso? LA - Como toda indústria oferta e demanda. A gente sempre quis se ver, então bastou dar

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oportunidade para que isso acontecesse. Eu posso te dizer que a dificuldade que a gente tinha de se ver de forma positiva no cinema brasileiro era muito grande. Então se você fizer um apanhado do cinema baiano, mesmo com Glauber Rocha, mesmo considerando que alguns cineastas brancos incluíram atores negros no elenco como protagonistas, dando a eles até uma visibilidade, a gente sempre teve a necessidade de se ver de forma positiva, no tamanho e na proporcionalidade do que a gente é. O próprio Joel Zito Araújo dirigiu um documentário sobre a ausência do negro na televisão, que apesar disso, chama atenção para nossa vontade de se ver representado. Eu acho que o cinema negro tem provado isso. São histórias que a gente queria ver, mas não tinha, talvez, o acesso devido. Então, produzir e distribuir cinema negro possibilita que a população preencha essa lacuna, essa carência que a gente tinha de poder sentar e ver um filme nosso na tela.

CNB - A maior parte dos filmes produzidos por cineastas negros(as) aqui na Bahia são em formato de curta-metragem. Você tem acompanhado alguma dessas produções? Se sim, avalia contribuições efetivas desses curtas-metragens para a história do cinema baiano, na sua opinião? LA - Eu acho que o documentário tem a possiblidade de a gente poder registrar o cotidiano, algo que faça parte da nossa história e que a gente ache importante registrar ou resgatar. Eu gosto muito que a gente mesmo possa contar as nossas próprias histórias, a partir do nosso olhar, da nossa vivência, então o documentário ocupa muito esse lugar. É diferente da ficção que você demanda uma equipe e um custo muito maior, às vezes, e na maioria das vezes, o documentário tem um custo menor em geral e a equipe geralmente é mais reduzida até para, talvez, criar uma intimidade com o objeto da gravação. O curta-metragem também tem uma equipe menor e custos reduzidos, que pode ser um caminho, um degrau para o início profissional. Muitos grandes cineastas, inclusive, começaram com o curta, tiveram primeiro os curtas produzidos, valorizados e premiados para depois trilharem outros caminhos, ou até mesmo produzindo curtas, longas e documentários simultaneamente. Além da questão dos recursos, considerando a linguagem, assim como o documentário, o curta também preenche esse espaço do cinema de contar uma história de uma forma mais rápida, direta, em poucos minutos.

CNB - O Observatório do Audiovisual Baiano tem realizado um importante mapeamento da participação feminina nas produções cinematográficas do estado. no primeiro boletim temático, identificou-se um crescimento no número de mulheres influentes no mercado audiovisual baiano, se comparados os dados dos períodos de 1993-2008 e 2008-2020. Apesar desse avanço, a análise da participação feminina nas funções técnicas dos longas-metragens baianos, entre os 110 longas-metragens e telefilmes mapeados no último período, revela um cenário de desigualdade. Há uma baixa representação das mulheres nos cargos de maior prestígio, como no caso da direção – com apenas 23%. Na opinião de vocês, o que poderia ser feito para ampliar a participação das mulheres no cinema baiano, principalmente de mulheres negras, por trás das câmeras? LA - Um quadro complexo como esse, com certeza, não vai ser solucionado apenas com uma ação. É preciso que diversas ações sejam feitas para que a gente consiga dirimir essa desigualdade. Isso que passa por políticas públicas, como as cotas, por exemplo, e por acesso à formação, através da oferta de cursos por faculdades e organizações não-governamentais. Eu sou um exemplo claro disso, uma garota da avenida Peixe, que naquela época tinha, talvez, como maior expectativa trabalhar em uma loja de departamento e, de repente, o cinema veio e me fisgou. Então imagine quantas Lindiwês existem por aí, que poderiam também ter sido fisgadas se fossem dadas as devidas oportunidades. Não tem como desconsiderar isso. É preciso oferecer, oportunizar e viabilizar, sempre insisto nessas palavras, um tanto repetitivas, mas fundamentais para proporcionar para mulheres negras,

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como eu, a possibilidade de estar na direção, por exemplo. Eu sempre falo que na minha primeira formação como videomaker, eu desempenhei funções em diferentes áreas e ainda assim costumam atribuir para a gente a função que acham que nos cabe. No caso do homem, tentam empurrar para ele a função de cinegrafista, de eletricista, aqueles trabalhos mais manuais, e para a mulher, a produção, por exemplo. Se a gente não se rebelar, acaba realmente seguindo o fluxo do mercado. Então esse contrafluxo é importante, você entrar na área e ocupar um espaço que normalmente não é atribuído a você. Quando eu participei do pregão da Secretaria de Cultura para o documentário Dona Dalva, a doutora do samba eram onde concorrentes, todos homens, todos brancos. Eu era a única mulher, única mulher negra concorrendo com eles e isso provocou um desconforto tão grande que os funcionários, às vezes, tinham que intervir para que eles se acalmassem na agressividade em relação a mim, que tive a simples ousadia de sentar-me àquela mesa com eles para concorrer. E eu ganhei. Então observando o quanto a gente tem que enfrentar, obstáculos que não são inerentes a nossa profissão, mas sim a nossa raça e nosso gênero, como não possibilitar que outras mulheres tenham acesso à formação? Não tem como descartar isso, é educação, educação e educação.

CNB - Para finalizar, que conselho você daria para as mulheres que querem trabalhar no cinema? LA - Eu que fui uma aprendiz, só posso dizer que é o tempo todo aprender fazendo, é fazer, fazer, fazer e fazer. É estudar, se informar, se apropriar das ferramentas, dos softwares, dos equipamentos e dos modos de produção do audiovisual, estudando e praticando para poder se familiarizar. É como andar de bicicleta, depois que você aprende, pode até mudar a marca, mas você vai continuar sabendo pedalar. Audiovisual é isso, depois que você aprende a base, você acaba impulsionando que outros elementos surjam. Tudo que aparecer nesse caminho que levar você para o audiovisual, abrace porque, por experiência própria, eu posso dizer que dá certo. Foi o que eu fiz, abracei todas as oportunidades que surgiram e consegui com isso trilhar um caminho e produzir a base que é o meu trabalho hoje.

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“CINEMA É ISSO, TRANSFORMAR SONHOS EM REALIDADE, E TUDO QUE SE SONHA JUNTO PODE VIRAR REALIDADE” ENTREVISTA COM GABRIELA BARRETO Por Lecco França CNB - Fale um pouco sobre a sua trajetória profissional no cinema, o que te levou para essa área? GB - Eu comecei no cinema muito nova, com 16 anos, meu primeiro set de filmagem foi durante a retomada do cinema baiano, atuando como assistente de produção de elenco. Antes dessa função, eu participava de campanhas publicitárias como modelo e fui elenco de apoio na minissérie Dona Flor e seus dois maridos, da Rede Globo, rodada aqui em Salvador. Lembro que fiquei muito encantada com um set de filmagem, desejando estar ali também por trás das câmeras. Durante as gravações da minissérie, eu conheci o produtor de elenco Péricles Palmeiras e, como eu era muito comunicativa, pedi para ele uma oportunidade para trabalhar como sua assistente. A primeira oportunidade que ele me colocou para atuar nessa função foi no filme Três histórias da Bahia (1997, direção de Edyala Yglesias, José Araripe Jr. e Sérgio Machado). Foi muito importante para mim essa experiência e o contato com esses três diretores, com os quais eu tive a oportunidade de aprender vendo, assim como foi marcante ver uma mulher na direção, como Edyala Yglesias, porque

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dali nasceu a vontade de ser diretora, de também estar naquele lugar. Em relação à negritude, naquele momento eu me vi uma das únicas negras dentro de um set de filmagem e eu acho que é realmente muito difícil para uma pessoa negra estar em um lugar envolta de pessoas brancas, essas eram as únicas referências que tinha. Então foi uma forma de resistência estar ali enquanto mulher preta. Fora isso, como eu fazia também publicidade, não só cinema, a produtora que eu trabalhava também recebia campanhas de fora da Bahia, a exemplo da Conspiração Filmes, do Andrucha Waddington e Breno Silveira, responsáveis por comerciais da cervejaria Brahma, do cigarro Derby e da Sadia. Por conta desses trabalhos que eu fiz com a Conspiração Filmes, eles me convidaram para integrar a equipe dos filmes Eu tu eles (2000), de Andrucha Waddington, À beira do caminho (2012) e Gonzaga, de pai para filho (2012), estes dois de Breno Silveira, que para mim foi uma outra escola. Em seguida, eu fui para a faculdade, entrei na primeira turma de Cinema da Faculdade de Tecnologia e Ciências (FTC), se não me engano, ela foi a primeira turma de Cinema do NorteNordeste, apesar de ser uma faculdade particular. Na época, os estudantes vieram com muita sede de aprender cinema, assim como os professores, de ensinar. Quando surgiu esse curso de cinema, eu achei muito importante essa formação para toda uma nova safra de cineastas que surgiria, já que os das antigas normalmente eram formados em Jornalismo ou Direito e aprenderam cinema através da prática, ou seja, não tiveram o acesso que nós tivemos da educação cinematográfica. Dentro da faculdade, por exemplo, éramos obrigados a fazer um filme por semestre, então a cada semestre, você formava uma equipe e ia fazer um filme. No meu caso, quando eu entrei na faculdade, eu já sabia o que era um set de filmagem, já tinha experiência e entrei com muita vontade de ser diretora. Eu nunca queria estar no grupo de ninguém, eu queria formar o meu e queria dirigir, a história e o roteiro eram meus e quem quisesse participar seria bem-vindo, senão eu ia seguir meu rumo sozinha. Então, nesse período, eu fiz alguns curtas, como Bitola, Cabeça Super 8 (2005), Braulesidade nagô (2003), Maria das Cabras (2005) e Umbigada (2006). Com Bitola, Cabeça Super 8, que fala sobre a memória do movimento superoitista na Bahia, eu me destaquei como cineasta, já que ele circulou em alguns festivais do Brasil e ganhou alguns prêmios. Eu tive sorte de alguns professores, por gostarem do trabalho, me orientarem a inscrever o filme em festivais de cinema, enquanto ainda era estudante, porque eu tinha condições de concorrer nesses eventos. Na época, eu não tinha noção disso, da obra que eu estava fazendo, de ter essa autocrítica, porque, até então, eu tinha trabalhado apenas nos filmes dos outros. Então, eu competi com cineastas profissionais, o que me deixou muito surpresa, enquanto estudante, ganhar prêmios e trazê-los para Salvador. A FTC também me apoiou para que eu participasse dos festivais e buscava alternativas para resolver a situação dos meus estudos. Era importante para a faculdade que a gente participasse desses eventos como forma de promover seu nome, não só do curso de Cinema, mas de toda uma nova geração que estava surgindo. Já Braulesidade nagô, que fala do comportamento “braulesco” que só existe na Bahia, foi meu segundo filme. Assim como o Rio de Janeiro tem o malandro carioca, aqui temos o “brau” [do inglês brown]. Com ele eu fechei todas as notas da faculdade, justamente pela originalidade que falava sobre o povo baiano. Também na faculdade nós sempre fazíamos um filme em película, através de uma espécie de edital, como forma de nos preparar para, quando formados, sabermos como concorrer nessas seleções. Então, no sétimo semestre de curso, houve essa seleção e quem ganhasse iria rodar seu roteiro em película, era nossa prática em 16mm, fazendo cinema mesmo. Eu consegui ganhar esse edital com o roteiro de Maria das Cabras e fizemos um curta de quinze minutos, uma ficção baseada em fatos reais, com Claudia di Moura no elenco. Foi o meu primeiro contato com ela, que é uma grande atriz baiana negra. Eu me apaixonei pela entrega dela no filme e me orgulho muito de ter possibilitado esse espaço a uma atriz negra, no intuito de escurecer a cena do cinema baiano. O filme também aborda a questão ambiental, já que Maria das Cabras foi protetora dos animais e do meio ambiente, no Parque Metropolitano de Pituaçu. Nós gravamos o filme todo lá e foi muito bacana essa experiência, inclusive de fazer um filme em película, foi perfeito. Maria das Cabras foi selecionado em alguns festivais também. Outro curta-metragem importante foi Umbigada, que fala sobre o samba de roda no Recôncavo baiano. Nele eu já consigo

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sair um pouco do território da faculdade, apesar de ter sido um projeto de Trabalho de Conclusão de Curso, e ir para um outro universo fora de Salvador, mas sempre ali transitando pela memória. Na sequência, terminei a faculdade e fui trabalhar nas produtoras como freelancer. Dirigi Mãe preta (2008), que conta a história de uma ex-prostituta que veio de Andaraí, na Chapada Diamantina, para Salvador, na década de 1970, e viveu muito tempo na Ladeira da Montanha. Lá ela tinha um abrigo que acolhia os filhos das prostitutas, onde ela cuidava e dava comida, como um projeto social de uma mulher preta que já tinha passado por esse processo, marginalizada pela sociedade, apoiadora de outras mulheres. Filmei ela com mais ou menos 80 anos de idade, no intuito de trazer um olhar de dentro da mulher na prostituição naquela região de Salvador. Também trabalhei durante algum tempo na produtora Santo Guerreiro, onde dirigi diversas campanhas políticas e o meu projeto mais importante, a minissérie Música da minha vida minha, minha primeira série de ficção exibida em rede nacional.

CNB – Então, fale-me um pouco mais sobre esse projeto, o Música da minha vida minha. GB - Música da minha vida minha foi um projeto muito bonito porque trabalhamos com jovens da periferia. Para isso, fizemos testes de elenco para poder selecionar esses atores, que precisavam saber tocar algum instrumento musical para que ficasse o mais real possível. A minissérie conta a história de cinco jovens que têm um sonho de viver com dignidade através da música, sonho de vários jovens da periferia, e formam uma banda, a “Faivela”. Contudo, ao mesmo tempo, eles são seduzidos pelo dinheiro fácil do tráfico de drogas, então contamos um pouco desse processo do sonho versus pesadelo da juventude periférica. Ela foi importante na minha carreira porque me projetou nacionalmente, minha estreia dentro de uma série nacional com acesso em todo o Brasil, por isso o tempo todo a minha preocupação era não apresentar uma Bahia caricata, como normalmente encontra-se em produções audiovisuais. Ainda sobre o elenco, além dos jovens selecionados nos testes, convidamos alguns nomes como Claudia di Moura, que já tinha trabalhado comigo no filme Maria das Cabras, Psit Mota e Luiz Pepeu. A minissérie, inclusive, foi o trampolim para trabalhos posteriores de muitos atores. Logo depois dela, o diretor Denis Carvalho, da Rede Globo, e a produtora de elenco da emissora pediram para fazer um teste com todo o elenco para poder participar da novela Sol nascente, então fiquei feliz com essa projeção também.

CNB - Que outros filmes você ainda destacaria na sua trajetória profissional? GB - Eu também dirigi três curtas sobre a capoeira, Tributo a Mestre Bigodinho (2007), A capoeiragem de um mestre e seu bando anunciador (2009), sobre o Mestre Lua Rasta, que foi aluno de Mestre Bimba e Canjiquinha, e Mestre Felipe e Faca de Ticum (2010), e tenho muito carinho por essa trilogia porque eu sou capoeirista angoleira. Depois que eu dirigi essa trilogia sobre a capoeira e o Umbigada, sobre o samba de roda no Recôncavo baiano, eu percebi que estava faltando abordar uma outra vertente importante, o candomblé. Foi aí que surgiu o convite do Xavier Vatin, etnomusicólogo e professor de antropologia da Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB), e do Cassio Nobre, músico e etnomusicólogo, para o projeto Memórias afro-atlânticas (2019), que explora a saga do linguista negro norte-americano Lorenzo Turner, que veio para o Brasil na década de 1940 pesquisar as línguas de matrizes africanas. Ele ficou durante um ano na Bahia e no Rio de Janeiro, captando, gravando e fotografando várias personalidades do candomblé, como Joãozinho da Gomeia, Mãe Menininha Manuel Falefá e Martiniano do Bonfim. Depois que eles lançaram o livro, sentiram a necessidade de produzir um filme também, então eu fui convidada para assumir a direção, conseguindo fechar o ciclo em relação ao que estava faltando no meu trabalho. Após ler o roteiro, percebi o quanto seria bom estar naquele time, porque a pesquisa de Xavier

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era maravilhosa e eu poderia transformá-la em imagem. Então, desde o início, eu fui criando a linguagem do filme, de como ele seria esteticamente, porque por ser um documentário, a minha preocupação era que eu tinha que fazê-lo da forma mais leve possível, por estar mexendo com a memória, o que exigia manter o respeito aos nossos ancestrais. Filmamos em duas semanas, com sets de filmagem incríveis e narrativas que ficaram marcadas na nossa memória. A ideia do filme era transmitir realmente essa memória afetiva de tentar emocionar as pessoas e trazer uma leveza com isso. Depois fizemos um lançamento maravilhoso em São Paulo, patrocinado pelo Itaú Cultural. O filme percorreu alguns festivais, o que até hoje continua, e ganhou prêmios de Melhor Direção, Melhor Roteiro, Melhor Filme do Júri Popular e Melhor Filme da Crítica, no Festival de Cinema de Pernambuco, o que foi para mim uma surpresa, fiquei muito feliz em estrear com meu primeiro longa-metragem documentário, e ter ganhado muitos prêmios. O filme é toda uma afirmação dessa saga de Lorenzo e também da vontade coletiva de tentar apresentar, valorizar e preservar nossa ancestralidade, então acho justo todo merecimento coletivo mesmo. Agora estamos partindo para a segunda parte, porque, na verdade será uma trilogia, demos uma pausa durante a pandemia, mas vamos fazer a segunda etapa, a ideia é essa, não parar porque tem muito conteúdo ainda.

CNB - Como você avalia a situação atual do mercado audiovisual na Bahia? Para um(a) realizador(a) negro(a) é mais difícil? GB - Hoje eu vejo que o mercado está abrindo espaço, ou melhor, a negritude está invadindo o mercado cinematográfico, a publicidade, a web e a televisão, com muita vontade. Dentro desse processo de profissionais do audiovisual, existe muita herança genética, quem entra com sobrenome já entra com peso, o tio que chama o sobrinho, a filha que tem o sobrenome de alguém importante, que vai logo ocupar o espaço de assistente de direção, por exemplo, e que vai ter mais oportunidades. Sou filha de pais que vieram do interior da Bahia na pobreza e venceram aqui na capital e é nessa ancestralidade de luta que eu levo para o cinema. A minha herança é de luta e conquistas. Há mais espaço agora, principalmente para o cinema, porque eu que também sou da publicidade, vejo que ela ainda é muito fechada. São poucos diretores negros na publicidade aqui na Bahia, por isso é preciso abrir ainda mais espaço nesse campo, principalmente pelas prefeituras e estados, terem a sensibilidade de contratar diretores negros nas produções institucionais. Já o cinema, por ser mais livre, é de mais fácil acesso e sinto que está crescendo. CNB - Como você avalia a questão da formação profissional? Você sentiu necessidade de buscar uma formação? Se sim, quais foram as suas formações nessa área até então? GB – Quando eu entrei na faculdade, na FTC, por ser uma faculdade particular, tinha poucos estudantes negros, eram quatro ou cinco, diferente de hoje com a Universidade Federal do Recôncavo Baiano, por exemplo, que deu mais oportunidades para esses estudantes. Entretanto, existe um diferencial entre elas, na FTC a gente tinha muito acesso a equipamentos, eram várias ilhas enormes de edição, rodávamos em película. Na UFRB também, mas por ser pública, por vir de uma geração de professores teóricos, tem um outro tipo de formação dentro do profissionalismo, ou seja, são experiências e formações profissionais diferentes. A FTC formou muita profissional da prática, o pessoal da UFRB é mais da teoria, apesar de ter muitos que dirigem também, o que eu acho legal, ter esse equilíbrio de trabalhar os dois lados. Na FTC, como fomos com muita sede de meter a mão na massa e fazer a prática, não tivemos esse balanço. Depois que eu me formei, em 2006, que foi criada a UFRB, então já tinha uma safra de estudantes formados na área. Sobre a formação, eu acho que essa prática na minha trajetória me ajudou bastante a já sair sabendo mais ou menos o que eu queria ali para aplicar. Não teve na minha faculdade esse caminho de fazer Mestrado e Doutorado, as pessoas já saiam pensando em fazer um filme, diferente da UFRB que o pessoal

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já planeja emendar uma pós-graduação. Penso que é interessante esse tipo de formação, termos tanto formação intelectual quanto prática, isso favorece muito o mercado para o profissional negro. Tanto que você encontra hoje um profissional negro na Academia, quanto no set de filmagem.

CNB - Sobre a questão do cinema negro no Brasil, o que você pensa sobre essa discussão? Para você essa categoria tem alguma importância e por quê? GB - Eu acho que é uma herança cultural nossa reivindicar o que não é igual. Se você for comparar o cinema, por exemplo, percebe que ele não é justo, que realmente é liderado historicamente por uma elite de homens brancos heterossexuais. Por isso, acho importantíssimo aqui na Bahia termos a política de cotas raciais também na cultura, porque senão vai ser sempre o mesmo grupo de privilegiados. Na verdade, tinha que inverter o processo, cineastas negros sendo contemplados em sua maioria e as cotas reservadas para os outros grupos. Isso sim é reparação. Desde o início do cinema aqui na Bahia, o negro é muito representado como algo folclórico, na capoeira, no candomblé, no samba de roda, tem-se muito de fantoche diante da câmera. Se for olhar para trás, você vai ver grandes cineastas brancos, como Alexandre Robatto, Glauber Rocha e Roberto Pires, sempre trazendo a cultura negra, mas não vê cineastas negros de destaque como eles. O negro até era protagonista na frente das câmeras, como ator, a exemplo de Antonio Pitanga, mas nunca protagonista dentro de um set de filmagem, encabeçando e liderando os setores. A partir de Antônio Olavo, Henrique Dantas, e outros, veio um movimento mais forte, invadindo esse espaço, para mostrar que estamos preparados para ocupar funções de liderança também. Além disso, enquanto negro e negra na direção temos uma intimidade com as temáticas abordadas, com a nossa verdade, com a nossa vivência, já que o olhar de um diretor negro sobre a nossa realidade é bem diferente do branco, assim como não posso, por exemplo, maquiar, fingir que eu moro na Bahia e produzir uma campanha publicitária só com pessoas brancas, não existe isso, isso não é real, estaria embranquecendo a nossa cultura, a nossa produção audiovisual tem que ser o que é o

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negro e sua cultura aqui. Eu realmente espero que possamos ter cada vez mais cineastas negros no nosso estado.

CNB - Você considera que tem um trabalho de militância em torno das questões raciais ou crítica social? Se sim, de que forma isso é trabalhado? GB - Eu acho que o meu trabalho está sempre falando sobre negritude, e o cinema é importante justamente por ter essa liberdade de você falar o que quer, de ouvir as pessoas, de abordar vários temas relevantes para discutir na sociedade, diferente da publicidade, que tem o redator e o diretor de criação que vão dizer o que não quer ou vão te valorizar, dependendo da sua criatividade. O grande lance do cinema é que ele é uma forma leve de ensinar, o que faz com que você tenha mais espaço para poder dialogar sobre um tema abordado. A partir daí, você pode fazer a sua militância abordando através do cinema a questão racial, por exemplo, falando sobre o cabelo da mulher, sobre a violência contra a mulher, sobre o menino que é seduzido pelo tráfico de drogas, mas ao mesmo tempo quer viver o sonho da música, ou seja, abordando temas de forma mais profunda do que normalmente vai conseguir encontrar em uma matéria jornalística de alguns minutos. Ainda na faculdade, eu tive uma história de militância muito bacana, nós fundamos o Centro Acadêmico de Cinema (CACINE), que na época idealizou o Cine Capão - Mostra de Cinema na Chapada Diamantina. Fizemos cinco edições dessa mostra, sempre durante o intervalo de um semestre para outro. Nas três primeiras edições durante o período em que ainda éramos estudantes, a faculdade apoiou. Pegávamos os equipamentos da faculdade, fazíamos a curadoria dos filmes e íamos para a Chapada Diamantina. Durante a semana do evento, fazíamos um convênio pedagógico com as escolas municipais e usávamos o cinema como uma ferramenta de educação, ensinávamos literatura, meio ambiente, história, etc. Foi uma experiência maravilhosa porque entendo que nossa militância também está na democratização da distribuição do filme. Muitos dos que vivem no Capão, por exemplo, nunca tiveram acesso ao cinema, de ir a uma sala de exibição e assistir filmes com os quais se identifiquem. Fazendo isso, estávamos valorizando o nosso próprio cinema, e criando uma via alternativa, saindo do circuito comercial, para tentar levar cinema até as pessoas que não tinham acesso. Depois que nós nos formamos, conseguimos apoio do governo do Estado e seguimos com o projeto.

CNB – Recentemente, inclusive, tem surgido várias mostras de cinema negro e sessões especiais sobre cinema negro em festivais. Qual a leitura que você faz sobre isso? GB - Esses eventos são importantíssimos, porque vivemos agora um momento histórico dentro do cinema preto da Bahia. São muitos diretores e diretoras, muitos atores e atrizes, nunca tínhamos vivido isso antes, com tanto fervor, então acho que é fundamental dar visibilidade ao nosso trabalho, possibilitando que outros pretos e pretas se reconheçam enquanto diretores, roteiristas e pesquisadores, porque senão ficaremos para trás, mantendo a tradição da herança de sobrenome, dessa genética cinematográfica. Contudo, acredito ser relevante também invadirmos os grandes festivais, que não tenham temática negra, porque neles a visibilidade é muito maior, a exemplo do Festival de Gramado, de Brasília, o Cine Pernambuco, onde você concorre com todo mundo e quando você ganha tem um destaque todo diferente. É importante fortalecer as mostras e festivais temáticos, mas também ter a visibilidade dos grandes festivais, porque um fortalece o outro, um projeta o outro de uma certa forma.

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CNB - Na sua opinião, o que poderia ser feito para ampliar a participação das mulheres no cinema baiano, principalmente por trás das câmeras? GB - Eu acho que enquanto mulher negra e diretora, a minha missão, quando monto um set de filmagem, é tentar trazer o máximo de mulheres negras, é uma questão de militância nossa, um ato político, uma mulher chamar outra mulher. Eu sei o quanto foi difícil estar aqui, são mais de vinte anos de carreira, foram muitos processos que eu tive que passar até chegar aqui e, se eu estou aqui hoje, posso facilitar para quem está chegando agora, para que surjam novas Gabrielas Barreto, novas Cecís Alves, novas Juh Almeida, novas Cintias Maria. Eu sempre falo isso nas entrevistas, porque penso que é um ato político quando você convida um profissional negro e monta uma equipe só de pessoas negras. Infelizmente nem sempre consigo, nem sempre é possível, mas deve ser a primeira coisa que devemos pensar quando montamos uma equipe assim, esse é o meu sonho, chegar em um set de filmagem só com pessoas pretas, quando eu alcançar nesse nível eu acho que eu consegui cumprir a minha missão no cinema.

CNB - Para finalizar, que conselho você daria para as mulheres que querem trabalhar no cinema? GB - O conselho que dou é o seguinte: Estamira, que é uma mulher negra que viveu em um lixão, inclusive tem um filme sobre a história dela, falava: “Tudo que é imaginário, tem, existe e é”, então eu acredito que temos uma resistência ancestral, que traz sede e raça para corrermos atrás dos nossos objetivos e não desistirmos. Cinema é isso, transformar sonhos em realidade, e tudo que se sonha junto pode virar realidade. Pode não sair bonito no primeiro filme, mas no segundo com certeza já vai estar melhor, porque cinema é pratica, por isso é importante também ter o conhecimento técnico, se você quiser ser diretor, conhecer fotografia, montagem, edição, para conseguir dialogar com todos os setores dentro de um set de filmagem e estar seguro sobre o que quer. Esse pulso firme do conhecimento, com uma boa dose de carisma, sabendo usufruir do melhor de todo mundo, vão fazer com a equipe te respeite e admire.

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LINHA DO TEMPO (PÓS-2000) Jamile Coelho O que não se registra, o tempo e o vento levam. (Mãe Stella de Oxóssi, 2013)

Alguns fatores foram determinantes para ter os anos 2000 como ponto de partida para essa Linha do Tempo: o primeiro deles, sem dúvidas, foi a “democratização” das produções audiovisuais após a chegada das câmeras DSLR. Coloco a palavra democratização entre aspas, pois tenho consciência de que, sem as políticas públicas que garantiram, pela primeira vez na história, o nosso ingresso nas universidades e acesso a recursos públicos para o audiovisual, o cinema feito no Estado considerado mais negro fora da África continuaria sendo dominado por homens brancos. Todavia, mesmo dentro deste recorte temporal, não poderia deixar de citar alguns profissionais que vieram antes e nos deram “régua e compasso”, como Antônio Olavo e Lindiwe Aguiar, que já estavam produzindo durante a década de 1990; Roque Araújo que ocupa funções técnicas desde 1959, tendo participado do primeiro longa metragem baiano, Redenção; Antônio Pitanga e Luíza Maranhão, responsáveis por dar vida a tantos personagens que permeiam nosso imaginário; Luiz Orlando, cineclubista, conhecedor e guardião de um dos maiores acervos de filmes negros do nosso país. Essa cronografia é fruto de um trabalho delicado, extremamente cuidadoso e por vezes desafiador, principalmente pelo desconhecimento de outro material ou catálogo que aborde temporalmente as questões étnicas dentro das produções audiovisuais na Bahia. Parafraseando Mãe Stella de Oxóssi, o que não se registra, o tempo e o vento levam. Convido a todes a mergulhar nessa linha do tempo. Axé!

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2000 MUNDO NEGRO Lindiwe Aguiar | 3’49’’| DOC Vídeo clipe da música “Que bloco é Esse?”, de Paulinho Camafeu e interpretado pelo Rappa, produzido durante a Oficina de Vídeo da Fundação Cidade Mãe por jovens negros de Salvador em 2000, interpretando a letra da música com imagens de revistas. MISÉRIA/ MILAGRES Lindiwe Aguiar | 3’42’’| DOC Interpretação da letra da música Miséria/Milagres, de Cazuza, que traz uma crítica sobre a miséria no Brasil e os contrastes sociais, além da apatia da sociedade, à mortalidade e à fome. Este vídeo foi o resultado da Oficina de Vídeo da Fundação Cidade Mãe. PODRES PODERES Lindiwe Aguiar |04’42’’| DOC Interpretação da música de Caetano Veloso realizada pelos alunos da Oficina de Vídeo da Fundação Cidade Mãe, a partir de recortes de revistas da época. ORIXÁS DA BAHIA Lázaro Faria |40’47’’| DOC Com narração de Harildo Déda, o documentário traz as histórias de orixás de origem iorubá na Bahia, com consultoria de Mãe Stella de Oxóssi. ÀKARA ONJÉ Lázaro Faria |04’52’’| 2001 NOVÍSSIMA ONDA BAIANA Início da “Novíssima Onda Baiana”, movimento de retomada do cinema baiano, de acordo com o jornalista e crítico de cinema André Setaro. 2002 PROGRAMA UNIVERSIDADE NOVA O Programa Universidade Nova é lançado pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), cujo objetivo é ampliar o acesso e diversificação na política de admissão de estudantes, tendo como base a proporção de participação dos grupos que compõem a sociedade.

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2003 O SILÊNCIO DAS COISAS ANÔNIMAS Dayanne Pereira e Niejila Brito | 5’08’’| EXP Deixar que os olhos vejam os pequenos detalhes lentamente, criando significados para o anonimato do corpo. NOVA SECRETARIA DO AUDIOVISUAL (SAv) Em 2003, ao assumir o Ministério da Cultura, Gilberto Gil traz uma nova orientação para as políticas culturais do país: operando com um conceito ampliado de cultura, o Minc defende a ideia de uma política culturaL focada na sociedade como um todo. Em consonância com esta proposta, o cineasta baiano e crítico de cinema Orlando Senna, ao assumir a SAv, trabalha em uma política do audioviosual estruturado em quatro eixos temáticos: formação e memória, produção, difusão e política externa com ênfase na democracia e diversidade. No mesmo ano, é realizado o lançamento do “Programa Brasileiro de Cinema e Audiovisual: Brasil um país de todas as telas”. 2004 POLÍTICAS AFIRMATIVAS NA UFBA O Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Consepe) da UFBA aprova a implantação de política de ações afirmativas, publicada na resolução n°01/04. No final do mesmo ano, sairia o edital para o vestibular de 2005, o primeiro que trouxe a opção de reserva de vagas para alunos pretos e pardos que estudaram em escola pública. MANDINGA EM MANHATTAN Lázaro Faria |55’| DOC Narra como a capoeira se espalhou pelo mundo. Filmado na Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo, Nova Iorque, Los Angeles, Chicago e na Universidade de Notre Dame e Universidade de Michigan, apresenta depoimentos de mestres e capoeiristas. MÁRIO GUSMÃO, 1° ATO Élson Rosário | 4’59’’ | DOC | A vida e a obra do ator baiano Mário Gusmão. QUILOMBOS DA BAHIA Antônio Olavo |98’| DOC| Centenas de comunidades negras, muitas delas seculares, vivem espalhadas por todo o estado da Bahia. No início de 2004, durante 90 dias, a equipe deste filme percorreu 12.000 km e visitou 69 destas localidades, registrando um pouco das suas histórias, buscando assim, contribuir para a visibilidade e valorização da memória negra na Bahia.

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2005 A CIDADE DAS MULHERES Lázaro Faria | 72’| DOC | O filme Cidade das Mulheres é uma resposta à Ruth Landes, antropóloga norte-americana que, no ano de 1939, esteve na Bahia pesquisando a raça negra e se surpreendeu com a força e a soberania que as mulheres do candomblé exerciam numa organização matriarcal. Seu pensamento será um dos fios condutores deste documentário, ilustrado por imagens das festas populares e dos cultos africanos, das famosas mães de santo e da beleza exuberante da cidade de Salvador (Quartas Baianas). IOIÔ DA PROFESSORA – UM DEPOIMENTO SOBRE CANUDOS Antônio Olavo | 36’ | DOC| MARIA DAS CABRAS Gabriela Barreto | 5’ | FIC Uma mulher guerreira e ambientalista...Salve a lagoa! COTAS NA UFBA Primeiro vestibular com o sistema de cotas na Universidade Federal da Bahia (UFBA). 2006 MÁRIO GUSMÃO: O ANJO NEGRO DA BAHIA Élson Rosário | 55’| DOC| Através dos depoimentos de personagens de destaque no cenário baiano que conviveram com ele, e da utilização de fotos e materiais de arquivo, a vida de Mário é reconstruída em três linhas temáticas: a artística, a militância política no movimento negro e a espiritual. 2007 I BAHIA AFRO FILM FESTIVAL (BAFF) Tem como objetivo divulgar as novas produções do cinema afrodescendente que atua à frente ou atrás das câmeras, seja através da produção industrial ou da produção independente de trabalhos audiovisuais. NINGUÉM, O HERÓI DO POVO Augusto Mattos e Adriano Dias* | 04’39’’ | ANI| O bicho tá pegando em Salvador. A população encontra-se refém do seu próprio medo. Eis que surge o herói, ou melhor, o anti-herói da selva de pedra, o cabra da peste que não toma sopa de letras para não comer H! Ele é Ninguém, o herói do povo. SAMBADEIRAS DO RECÔNCAVO

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Gabriela Barreto | 05’| FIC 2008 II BAHIA AFRO FILM FESTIVAL (BAFF) Com o tema “Imagine Todo o Povo Negro Juntos”, a segunda edição do evento ocorreu de 16 a 21 de dezembro de 2008, na Senzala do Barro Preto (sede do bloco Ilê Aiyê), em Salvador – Bahia. CURSO DE CINEMA E AUDIOVISUAL NA UFRB Criação do curso de Cinema e Audiovisual na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB). ABDIAS NASCIMENTO - MEMÓRIA NEGRA Antônio Olavo | 95’35’’| DOC| O filme registra passagens importantes da trajetória de vida de Abdias em defesa do povo negro, intercalando sua narrativa com fatos marcantes da organização do Movimento Negro no Brasil, que se tornou referência para várias gerações. Ao contar a história de Abdias Nascimento, considerado um ícone da cultura negra, o documentário registra parte significativa da história de lutas do negro brasileiro. Abdias Nascimento faleceu em maio, aos 97 anos. DOIDO LELÉ Ceci Alves | 17’ | FIC Salvador, década de 1950. Caetano, pobre e mestiço, sonha em ser cantor de rádio, para deleite da mãe e contrariedade do pai. Ele foge todas as noites de casa para tentar, sem sucesso, a sorte no programa de calouros. EBOMI CIDÁLIA - 70 ANOS DE CONSAGRAÇÃO RELIGIOSA Lindiwe Aguiar| 04’58’’| DOC| Ebomi Cidália Soledade é uma religiosa do Candomblé. Foi iniciada ainda criança e é consagrada como filha de Iroko, um orixá raro na nação de que ela faz parte: Ketu. É filha de santo de Mãe Menininha do Gantois, a quem tem um imenso carinho e respeito. Este vídeo é um recorte sobre o jeito singular de Ebomi Cidália. Seu jeito fácil, engraçado e direto de falar do Candomblé e seus ancestrais, faz com que as pessoas tenham ainda mais prazer em escutá-la. Fala da simplicidade da beleza da fé e apenas resume a grandeza desta personagem única. PRETA É A MÃE Gabriela Barreto | 5’ | DOC Uma pesquisa sobre a prostituta mais antiga da Ladeira da Montanha, em Salvador.

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TRIBUTO A MESTRE BIGODINHO Gabriela Barreto | 15’50’’ | DOC O documentário intercala trechos dos depoimentos de mestre Bigodinho com imagens da rica cultura de Acupe - Recôncavo Baiano. 2009 BACHARELADOS INTERDISCIPLINARES NA UFBA Através do Programa Universidade Nova, a Universidade Federal da Bahia (UFBA) cria o Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos (IHAC), responsável pela implantação dos Bacharelados Interdisciplinares (BI) e, consequentemente, da área de concentração em Cinema e Audiovisual. A CAPOEIRAGEM DE UM MESTRE E SEU BANDO ANUNCIADOR Gabriela Barreto | 26’ | DOC O documentário apresenta as múltiplas experiências realizadas pelo Mestre Lua que colocaram como evidência a interface da capoeira com o teatro. EBONY GODDESS: QUEEN OF ILÊ AIYÊ Carolina Moraes Liu | 19’38’’ | DOC | Três jovens mulheres competem pelo título de Deusa do Ébano em Salvador, Bahia. MANDINGA IN COLOMBIA Lázaro Faria | 25’56’’ | DOC Narra o encontro da capoeira com a cultura afro-colombiana. MESTRE FELIPE E A FACA DE TICUM Gabriela Barreto | 5’ | DOC O documentário retrata a tradição cultural de Santo Amaro e mostra a atmosfera em que o Mestre Felipe vive. 2010 CINECLUBE MÁRIO GUSMÃO Projeto de Extensão da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), vinculado ao curso de Cinema e Audiovisual da universidade, que busca incentivar a prática cineclubista e a formação de plateia a partir da discussão em torno de importantes obras da cinematografia brasileira que podem ser assistidas de forma gratuita.

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III BAHIA AFRO FILM FESTIVAL (BAFF) A terceira edição do festival de cinema internacional Bahia Afro Festival (BAFF), que reúne obras de diretores ligados à temática afrodescendente de todo o mundo, aconteceu em Cachoeira, de 13 a 23 de maio de 2010. O INTERCÂMBIO DE LAMPIÃO Ivonilto Gomes, Mateus Souza, Ranaelson Gouveia, Ranael Miranda e Jamile Coelho | 2’ | ANI Lampião sai do sertão em busca de uma vida melhor na cidade grande. CONTOS DE UMA LAVADEIRA Gabriela Barreto | 5’ | DOC É através da preservação de sua identidade cultural que um povo reafirma seus valores, desenvolve tradições e vai, ao longo dos anos, sendo inserido no contexto sócio histórico mundial. As comunidades sertanejas da região de Itaparica trazem na história da origem do seu povo um vasto universo cultural que envolve encontros étnicos que traduzem a origem do povo brasileiro. TERRA MARCADA Gabriela Barreto | 26’ | DOC O filme documenta a preservação da identidade cultural da mulher sertaneja que vive na região da barragem de Itaparica. Com animações inspiradas na literatura de cordel, o documentário conta com a participação de lavadeiras, tecedeiras, trabalhadoras rurais, importantes personagens das comunidades sertanejas que contribuem com depoimentos e histórias sobre as peculiaridades da região. 2011 ANO INTERNACIONAL DE POVOS AFRODESCENDENTES A Assembleia Geral da ONU proclamou 2011 como o Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes, citando a necessidade de fortalecer as ações nacionais e a cooperação internacional e regional para assegurar que as pessoas de ascendência africana gozem plenamente de direitos econômicos, culturais, sociais, civis e políticos. O Ano visa ainda promover a integração de pessoas de ascendência africana em todos os aspectos políticos, econômicos, sociais e culturais da sociedade, e promover maior conhecimento e respeito pela sua herança e cultura diversificadas. O Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes foi lançado no Dia dos Direitos Humanos, 10 de dezembro de 2010, pelo Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon. TALVEZ FUTURO Jamile Coelho e Carol Aó | 3’ | ANI| Após um tiroteio em seu bairro, menino sonha com o seu talvez.

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2012 IV BAHIA AFRO FILM FESTIVAL (BAFF) A quarta edição do festival de cinema afro aconteceu em Salvador, de 16 a 21 de novembro de 2012. EDITAL DE APOIO PARA CURTAS-METRAGENS AFIRMATIVOS Em novembro foi lançado o Edital de Apoio para Curta-Metragem – Curta Afirmativo: Protagonismo da Juventude Negra na Produção Audiovisual, pela Secretaria do Audiovisual vinculada ao Ministério da Cultura, pela ministra da cultura Marta Suplicy, em parceria com a Secretaria de Políticas de Ações Afirmativas da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República. COLETIVO TELA PRETA Criado, em Cachoeira, com o objetivo de pautar a representatividade negra na cena audiovisual baiana e brasileira, e formado por Larissa Fulana de Tal, Everlane Moraes, David Aynan, Thamires Vieira, Evelyn Sacramento e José Carlos, alunos da UFRB. BAHIA COM P Jamile Coelho |5’ min| DOC Em visita a Salvador, o rapper brasiliense GOG apresenta-se no auditório da faculdade de letras da Universidade Federal da Bahia, e uma nova versão de “Brasil com P” surge a partir das desigualdades na Soterópolis. 2013 DÉCADA INTERNACIONAL DO AFRODESCENDENTE Em Assembleia Geral, a Organização das Nações Unidas (ONU), por meio de sua Resolução n. 68/237, de 23 de dezembro de 2013, proclamou a Década Internacional Afrodescendente, para o período entre 1º de janeiro de 2015 e 31 de dezembro de 2024, com o tema “Reconhecimento, Justiça e Desenvolvimento”. IMPUGNAÇÃO DOS EDITAIS FEDERAIS AFIRMATIVOS Em 21 de Maio de 2013, a decisão do juiz federal José Carlos do Vale Madeira – Tribunal Regional Federal 1ª Região/TRF – determinou pela impugnação dos concursos (edital Prêmio Funarte Arte Negra; do edital Edital – Curta-Metragem – Curta-Afirmativo: Protagonismo da Juventude Negra na Produção Audiovisual da SAv, e do edital Edital de Apoio a Pesquisadores Negros da FBN). V BAHIA AFRO FILM FESTIVAL (BAFF) A quinta edição do festival, que tem como temática central o povo afrodescendente com ênfase na diáspora africana e sincretismo cultural, humanismo e preservação das raízes e ancestralidade, aconteceu em Salvador, de 4 a 8 de dezembro de 2013.

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NINGUÉM O HERÓI DO POVO - A ORIGEM Augusto Mattos | 2’13’’ | ANI Ninguém, o herói baiano tem a sua origem revelada. Conheça um pouco mais do cotidiano deste personagem que faz justiça na terra do axé. O MENINO INVISÍVEL Murilo Deolino, Uiran Paranhos e Danilo Umbelino | 8’42’’ | FIC| Um ensaio sobre a invisibilidade da infância: um menino morador de rua ignorado pelos passantes. Mas a pobreza e o abandono não conseguem destruir o desejo infantil de sonhar O VELHO REI Ceci Alves | 9’48’’ | FIC A partir de um pedido inusitado de sua filha Cleonice, que vive fora do país, Climério passa a gravar tudo o que vê à sua volta, com a câmera enviada por ela, contando uma história através das memórias do passado e o encantamento do presente. 2014 EDITAL CURTA AFIRMATIVO 2014 O segundo edital (Curta Afirmativo 2014: Protagonismo de Cineastas Afro-Brasileiros na Produção Audiovisual Nacional) de políticas afirmativas no audiovisual foi lançado pela Secretaria de Audiovisual do Ministério da Cultura (SAv – MinC), com o objetivo de apoiar a produção de obras audiovisuais brasileiras inéditas e originais, dirigidas ou produzidas por cineastas negros e negras. LANÇAMENTO DA PESQUISA “A CARA DO CINEMA NACIONAL” O GEMAA (Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação Afirmativa) é um núcleo de pesquisa com inscrição no CNPq e sede no IESP-UERJ. Criado em 2008 com o intuito de produzir estudos sobre ação afirmativa a partir de uma variedade de abordagens metodológicas, o GEMAA ampliou sua área de atuação e hoje desenvolve investigações sobre a representação de raça e gênero na política e em diversas instituições e mídias (jornalismo, cinema, telenovelas, revistas, videogames). A COR DA LIBERDADE Gabriela Barreto | 26’ | DOC A COR DO TRABALHO Antônio Olavo | 74’ | DOC Documentário sobre a história do trabalho negro na Bahia, desde o tempo da escravatura

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até os dias atuais. O filme mostra também experiências vitoriosas de negros e negras que romperam com o estigma do preconceito racial e, por meio da educação ou da abertura de negócios próprios, tiveram êxito em sua trajetória profissional. BIKUDOS Tom Pinheiro | 45’ | DOC Média-metragem focado na Consciência Negra, aborda a trajetória do Instituto Cultural Steve Biko, localizado na cidade de Salvador, Bahia. Mostra a contribuição histórica e social dada à vida das pessoas que passaram pelo Instituto. Revela também experiências de vida dos professores, colaboradores e de jovens estudantes que ao vivenciarem a Consciência Negra da “família Biko”, tiveram suas vidas mudadas para sempre. DONA DALVA - UMA DOUTORA DO SAMBA Lindiwe Aguiar |52’| DOC Nascida no dia 27 de setembro de 1927, Dalva Damiana de Freitas é filha do sapateiro e músico Antônio José de Freitas, e de Maria São Pedro de Freitas, charuteira. Dona Dalva, como é conhecida, há quase 60 anos fundou e mantém em atividade um dos grupos de Samba de Roda mais tradicionais do Recôncavo baiano, o Samba de Roda Suerdick. É considerada uma lenda viva e uma referência da identidade cultural popular. LÁPIS DE COR Larissa Fulana de Tal |14’| DOC O documentário aborda a representação racial no universo infantil e a maneira como o padrão de beleza eurocêntrico afeta a autoimagem e autoestima de crianças negras, revelando a ação silenciosa do racismo. Lápis de cor faz referência a uma cor de lápis, conhecida como “cor de pele”, que, na verdade, é de tonalidade bege. É essa cor que as crianças utilizam para representar a si mesmas e as pessoas do seu convívio, compondo, nos desenhos, um fenótipo de pessoas brancas - olhos claros, cabelos louros e pele bege – mesmo quando são negras as pessoas representadas. MOCAMBO AKOMABU João Paulo Diogo |26’| DOC A narrativa homenageia as mulheres que contribuíram na luta quilombola do Alto Tororó, localizada em São Tomé de Paripe, no Subúrbio Ferroviário de Salvador, abrilhantado pela belíssima trilha sonora do querido Tiganá Santana. O TEMPO DOS ORIXÁS Eliciana Nascimento |20’| FIC| Uma menina descobre sua missão com os seus ancestrais africanos ao visitar a sua vó no interior. Ao chegar na vila, ela embarca em uma aventura mística com os Orixás e a sua vó lhe ajuda a entender a sua missão.

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2015 DÉCADA INTERNACIONAL AFRODESCENDENTE O principal objetivo é promover o respeito, a proteção e a garantia de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais dos afrodescendentes, como estabelecidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos. O estado da Bahia foi o primeiro do Brasil a aderir oficialmente à proposta. O decreto que cria a Década Estadual Afrodescendente foi assinado, no dia 21 de setembro de 2015, pelo governador Rui Costa e pela secretária de Promoção da Igualdade Racial, Vera Lúcia Barbosa, com presença da ministra de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Nilma Lino Gomes. VI BAHIA AFRO FILM FESTIVAL (BAFF) A sexta edição do festival de cinema de cineastas, produtores e conteúdos negros aconteceu na cidade de Cachoeira, no Recôncavo Baiano, de 23 a 28 de novembro de 2015. CINZAS Larissa Fulana de Tal |15’| FIC| “Cada favelado é um universo em crise”, e com Toni não é diferente. Ele vive mais um dia de rotina: ônibus lotado, salário atrasado, exploração no trabalho, descrença nos estudos, falta de grana, polícia e solidão. As angústias de Toni, semelhantes com as de tantos outros personagens da vida real, são contadas em Cinzas. FROM THE BUS Camila Hepplin | 2’55’’ | DOC Um vídeo feito de dentro do ônibus, pela janela, no meu caminho para o trabalho e na minha volta para casa. A ideia era usar meu smartphone, Samsung Core 2, para mostrar o que vejo na minha rotina diária, com os “problemas” visíveis (vídeo balançando, porque é como a gente balança nos ônibus), os problemas das grandes cidades como trânsito congestionado, ônibus cheios e a espera por eles. O DIA EM QUE ELE DECIDIU SAIR Thamires Vieira |17’| DOC Meu avô Tuiú decide pela segunda vez sair de sua casa e começar uma vida em outro lugar, convivendo com as dificuldades da rua, o fato de sair está ligado a depredação deste lugar. ÒRUN ÀIYÉ - A CRIAÇÃO DO MUNDO Jamile Coelho e Cintia Maria |12’| ANI Òrun Àiyé mostra a trajetória de Oxalá (Carlinhos Brown) em sua missão para criar o Mundo.

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NUBAS Criação do Núcleo Baiano de Animação e Stop Motion (NUBAS) como um núcleo de formação audiovisual negro itinerante, com o objetivo de promover formação de pessoas negras na área de animação e audiovisual em comunidades tradicionais e instituições de ensino do Brasil. 2016 CRIAÇÃO DA APAN A Associação de Profissionais do Audiovisual Negro (A.P.A.N) é uma instituição de fomento, valorização e divulgação de realizações audiovisuais protagonizadas por negras e negros bem como a promoção de profissionais também negros para o mercado audiovisual. Desta forma, são pilares estruturantes de formação, constituição e política da A.P.A.N a valorização da negritude e a defesa dos interesses de uma perspectiva inclusiva com atenção ao recorte racial em relação a todos os elos da cadeia produtiva audiovisual, sendo eles a concepção, produção, distribuição e exibição. EDITAL LONGAS AFIRMATIVOS A Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura (SAv/MinC), em parceria com a ANCINE, por meio do Programa Brasil de Todas as Telas – Ano 2 lança o Edital Longa Afirmativo tem como objeto a realização de três filmes de ficção de baixo orçamento, com temática livre, dirigidos por cineastas negros. AINDA TE AMO Susan Kalik |03’| FIC Uma mulher, decidida a ter seu amor de volta. AVESSO Julia Morais | 8’57’’ | FIC As memórias de Teresa nos permitem adentrar no universo underground de Salvador. O ECLIPSE Danilo Umbelino, Murilo Deolino, Lorena Sales e Uiran Paranhos |18’| FIC O filme com a história de Mateus, Jana, Claudinha e Juninho, crianças de classe média que se reúnem no playground do prédio para assistirem ao eclipse solar, mas depois de perceberem que os arranha-céus em volta do lugar bloqueiam a visão do sol, precisam se aventurar fora dos limites do prédio e enfrentar os obstáculos que a cidade oferece para tentarem ver o tão esperado fenômeno. REFLEXIVA Clarissa Brandão | 3’ | DOC

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Nas inúmeras pilhas materiais que soterraram até a mais ínfima reflexão sobre as memórias e acontecimentos que mudaram minhas escolhas e tornaram cotidiana minha natureza cumulativa, busco a razão dos excessos. No amontoado de objetos que me consome e sufoca, reflito. SETUP Camila Hepplin | 1’| FIC Usar o banheiro no meio da noite pode ser uma armadilha. 2017 I MOSTRA OUSMANE SEMBENE DE CINEMA Idealizado pelo Coletivo CineMalês, em parceria com a Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), a mostra busca, entre outros objetivos, desenvolver trabalhos cinematográficos na região do Recôncavo Baiano e regiões metropolitanas de Salvador, a partir de oficinas, exibição de filmes e rodas de conversa: “A importância da MOSC tange na democratização do cinema no Recôncavo Baiano, bem como na vinculação de trabalhos audiovisuais de média e alta produção, realizados por negros e negras, tanto do continente africano como da diáspora”, detalha a equipe do Projeto de Extensão. A CAIXA DE 4 CÔMODOS Ana do Carmo |13’| FIC Regina, uma mulher introspectiva e determinada, vive sozinha em seu apartamento. Ela tem a fotografia como única companhia e se sente protegida por de trás das lentes. Mas, contra o que ou quem ela precisa de proteção? A Caixa de 4 Cômodos é um filme feito por mulheres que busca trazer uma compilação de sensações do que é ser mulher frente às inúmeras formas de violência a que somos submetidas cotidianamente. CAFÉ COM CANELA Glenda Nicácio e Ary Rosa* |1h42’| FIC Após perder o filho, Margarida vive isolada da sociedade. Ela se separa do marido Paulo e perde o contato com os amigos e pessoas próximas, até Violeta bater na sua porta. Tratase de uma ex-aluna de Margarida, que assume a missão de devolver um pouco de luz àquela pessoa que havia sido importante para ela na juventude. DO QUE APRENDI COM MINHAS MAIS VELHAS Onijasé e Susan Kalik |26’| DOC Do que aprendi com minhas mais velhas é um documentário sobre a fé no Candomblé e como essa fé é transmitida de geração em geração. Um filme onde Egbomis, Nenguas e Yalorixás contam como aprenderam com seus mais velhos e como ensinam seus mais jovens. Um filme sobre tradição, amor e religiosidade.

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EM BUSCA DE LÉLIA Beatriz Vieirah | 15’ | DOC Lélia Gonzalez. Seguindo os passos desse nome, começo a busca pela minha ancestralidade e por retratá-la. Professora e antropóloga, mulher à frente do seu tempo, protagonista na militância junto ao Movimento Negro nos anos 1970/1980, período no qual percorreu diversas cidades e países, sempre afirmando sua identidade e denunciando o mito da democracia racial. Um símbolo de resistência e da luta pelos direitos de indígenas, negros e mulheres. Os afetos de Lélia me guiam por toda caminhada. ILÚ Rebeca Thaís |2’20’’| EXP Ilú remete a ilusão das matas. Ilú também é um tambor ancestral. Ilú é fruto do mistério e encantamento. MERÊ Urânia Munzanzu |5’| DOC Une religiosas da Bahia e de Benim (África) em torno da tradição de Jeje Mahi - que compreende as culturas de diversos povos, como: os Fon, Ewe, Mina, Gan, dentre outros, unidos em torno do culto aos Voduns. O ARRANJO Camila Hepplin |12’| FIC Quatro indivíduos que vivem uma vida solitária, mesmo tendo outras pessoas ao redor, são conectados através de alucinações. O SOM DO SILÊNCIO David Aynan |18’| FIC Separados pela vida, pai e filho são desconhecidos. Quando não há comunicação, o silêncio é um grito O som do silêncio narra a tentativa de aproximação entre Binho, um menino de 10 anos, e Osvaldo, seu pai, um homem surdo com quem ele nunca conviveu. REVERSE Ana do Carmo |1’04’’| FIC Nano-metragem, vencedor do Festival do Minuto. SUJEITO OBJETO Djalma Calmon | 13’| FIC | Pedro e Renata, mais um casal em meio à multidão de sujeitos. Ele é um artista de rua, estátua viva que se tornou seu próprio personagem: calado e duro. Ela é viva, mas está

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morrendo por dentro. TRAVESSIAS NEGRAS Antônio Olavo |SÉRIE| DOC Com cinco episódios, apresenta histórias de vida de estudantes negros que entraram na UFBA pela Política de Cotas, adotada pela instituição desde 2005. Na série, os jovens narram suas próprias histórias, estimulados a compartilhar suas experiências de vida. VARAL Carla Caroline | 4’ | FIC Um filme sobre sutileza. 2018 EDITAL FEDERAL COM COTAS RACIAIS E DE GÊNERO Acordo de Cooperação, firmado em 2014 entre a Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura (SAv/MinC) e a Agência Nacional do Cinema (ANCINE), que determinava que no mínimo 50% dos projetos selecionados deverão ter roteiristas por mulheres cisgênero ou transexual/travesti; no mínimo 50% dos projetos selecionados deverão ter novos roteiristas, e; no mínimo 25% dos projetos selecionados deverão ter roteiristas negros e/ ou indígenas. 1798: REVOLTA DOS BÚZIOS Antônio Olavo | 1h53’| DOC | Em 1798, na Cidade do Salvador, Província da Bahia, centenas de homens negros influenciados pelos ideais iluministas da Revolução Francesa, organizaram um movimento com o objetivo de derrubar o Governo Colonial, proclamar a independência e implantar uma República democrática, livre da escravidão. O Levante foi denunciado antes da deflagração e o governo instalou uma Devassa que atingiu centenas de pessoas com ameaças, prisões e condenações de açoites públicos, degredos, até a pena de morte, sentença máxima que abateu quatro homens negros: Luiz Gonzaga, Lucas Dantas, João de Deus e Manuel Faustino, enforcados e esquartejados em 8 de novembro de 1799 na Praça da Piedade. II MOSTRA OUSMANE SEMBENE CINEMA A segunda edição do evento ocorreu de 24 a 26 de outubro de 2018. Além dos 22 filmes de produção da diáspora africana, foram também exibidas 6 produções do continente: Cabo Verde, Guiné Bissau, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor Leste, dinamizados pelo Projeto de Cooperação PALOP-TL. I MOSTRA ITINERANTE DE CINEMAS NEGROS MAHOMED BAMBA (MIMB) A Mostra homenageia o professor e cineasta Mohamed Bamba. Nascido em Costa do

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Marfim, Bamba era docente da Faculdade de Comunicação da UFBA e pesquisador na área de Cinema e Audiovisual, atuando também no Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação, onde contribuiu para elencar a discussão sobre cinema negro na instituição. O cineasta foi responsável pela formação de estudantes de cinema que construíram uma nova leitura sobre as narrativas fílmicas, destacando as produções do continente africano, estimulando uma nova forma de pensar e fazer cinema. A primeira edição do evento aconteceu em Salvador, entre os dias 11 e 15 de abril de 2018, com exibições regulares na Sala Walter da Silveira (DIMAS), no bairro dos Barris, e exibições itinerantes nos bairros do Cabula, Uruguai e Garcia, reunindo mais de 35 obras de longas e curtas metragens realizados entre 2015 e 2017, produzidos por cineastas negros do Brasil e de países africanos de língua portuguesa e da diáspora. A BARRACA DE CAPETA Djalma Calmon | 15’ | FIC Enquanto espera pela morte da mãe que está internada, Angélica começa a se virar sozinha em casa. Tonho do Capeta é alcoólatra há mais de 15 anos e nunca participou da criação de sua filha. Há 12 anos eles não têm nenhum contato, ela é dura como pedra de gelo, ele é puro álcool. Tim-Tim. AIUÊ - ESCUTANDO OS QUILOMBO Donminique Azevedo, Léo Rocha e Danilo Umbelino | MINI SÉRIE | DOC| Em Kimbundo, língua da família banta, “Aiuê” - palavra que dá nome ao filme -, é também uma expressão de espanto, alegria e festa. Assim, partindo de uma abordagem etnográfica, linguística e musicológica, a minissérie com cinco episódios é uma experiência imersiva que revela as mais diversas expressões sonoras e musicais presentes em comunidades remanescentes de quilombos. AQUALTUNES Jamile Coelho e Cintia Maria | MINI SÉRIE | DOC | Dividido em cinco episódios, conta a história de Comunidades Quilombolas localizadas em Salvador e Região metropolitana. A partir da narrativa da história de vida das lideranças femininas dessas comunidades é que conhecemos os Quilombos: Rio dos Macacos, Alto do Tororó, Quingoma, Pitanga e Porto dos Cavalos. AFOGO Carla Caroline | 8’ | FIC | Uma casa, uma mulher. CINECLUBE TELA PRETA O projeto é mais uma idealização do Coletivo de Cinema Negro Tela Preta, uma organização que pauta a representatividade negra no campo do cinema e audiovisual, aprovado pelo Edital Setorial de Audiovisual - Desenvolvimento e Difusão do Fundo de Cultura, da

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Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, e produzido pela Rebento Filmes, uma produtora de mulheres negras. CINECLUBE CINEMALÊS Cineclube coletivo e projeto de extensão que atua em São Francisco do Conde tendo sua sede na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira – UNILAB / Campus dos Malês, discutindo através da linguagem audiovisual as questões de gênero e raça, fortalecimento identitário do povo negro a partir da apreciação de obras audiovisuais representativas, bem como outras pautas do povo negro. Desenvolve através dos seus encontros debates e exibições de filmes nas escolas e comunidades do recôncavo baiano; oficinas, vivências e workshops além de realizar anualmente a Mostra Ousmane Sembene de Cinema. CIRCUITO NEGRO Jamile Coelho e Cintia Maria | SÉRIE| DOC | Série de 10 episódios de 10 minutos, apresentando os blocos: Cortejo Afro, Alvorada, Didá, Ilê Àiyé, Bankoma, Reggae, Filhos do Congo, Filhos de Korin Efan, Aspiral do Reggae e Amor & Paixão. DIÁSPORA CONECTA É uma plataforma que articula ações de inovação e criatividade, promovendo atividades de experimentação, capacitação e reflexão em torno da produção artística afro diaspórica. Ê, NA MATA! Rebeca Thaís | 14’09’’| DOC Resistência, musicalidade e comunidade. “Ê, na Mata!” retrata os cotidianos e memórias do “Centro Cultural Mata Inteira”, uma alternativa autossustentável de ensino. Aulas instrumentais fazem o chamado para a ancestralidade e respeito à natureza. ILHA Glenda Nicácio e Ary Rosa* | 1h36’ | FIC Emerson é um jovem da periferia que quer fazer um filme sobre sua história na Ilha, um lugar onde quem nasce não consegue sair. Para realizar o plano, ele sequestra um cineasta e, juntos, os dois reencenam a sua vivência no local. MAESTRINA DA FAVELA Falani Afrika | 1h22’ | DOC | Desde criança, Elem Jesus da Silva dirige sozinha um grupo infantil de percussionistas no Pelourinho, a banda Meninos da Rocinha do Pelô. A diretora Falani Afrika acompanhou Elem durante dez anos, durante os quais a menina passou por experiências intensas, como a morte de sua mãe e de amigos e a transformação do lugar em que ela cresceu. Tudo isso

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sem nunca desistir do sonho de se tornar maestrina e de transformar a vida daqueles que a rodeiam para melhor. MOTRIZ Taís Amordivino | 15’| DOC | No interior de Minas Gerais, onde o tempo passa devagar e a saudade teima a andar depressa, Bete, uma mulher de olhos caudalosos e sorriso largo, convive com a distância das filhas. Apesar disso, mãe e filha encontram no amor, a força motriz que as aproximam. NÁUFRAGA Juh Almeida | 5’| EXP| No batuque das ondas a mulher náufraga desemboca no mar, suas memórias. POESIA AZEVICHE Tom Pinheiro | 20’| DOC | Documentário que conta, através das memórias dos compositores e letristas de destaque dos Blocos Afros Tradicionais da Bahia, da década de 1970 aos anos 1990, a importância histórica de suas canções para valorização da identidade negra e da luta contra o racismo na Bahia e no Brasil. ÒPÁRÁ DE ÒSÙN: QUANDO TUDO NASCE Pâmela Peregrino | 4’| ANI| Esta é a história da orixá das águas doces, que no candomblé é Òsùn - a deusa da fertilidade que faz tudo crescer na força do Axé. PUNHO NEGRO Murilo Deolino |WEBSÉRIE| FIC | Tereza é uma mulher que passa o dia enfrentando vilões ao se transformar na justiceira Punho Negro, mas ser uma heroína não elimina as cobranças para cuidar da casa, do marido e dos filhos. A narrativa é construída sob olhar crítico para o universo dos superheróis, que é majoritariamente masculino e branco, e questiona padrões impostos pela sociedade machista. Além de enfrentar vilões, Tereza também precisa conciliar a carreira de heroína com os desafios da vida pessoal. UM ENSAIO SOBRE A AUSÊNCIA David Aynan |15’| DOC| Uma investigação sobre o homem negro a partir de Rômulo, um homem de 40 anos, morador da periferia de Salvador, estudante de História na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia.

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2019 I MOSTRA DE CINEMA NEGRO DE SÃO FELIX É uma realização da Corvo Vermelho Produções e Odé Produções e conta com o apoio do Departamento de Turismo de São Félix em parceria com a Prefeitura Municipal de São Félix. III MOSTRA OUSMANE SEMBENE DE CINEMA A terceira edição do evento ocorreu na cidade de São Francisco do Conde, Bahia, de 4 a 8 de dezembro de 2019. A Mostra recebeu mais de 200 filmes inscritos, de toda parte do Brasil e de regiões da América Latina e África, tendo sido 78 filmes selecionados. A ESCRITA DO SEU CORPO Camila de Moraes | 13’57” | DOC Aborda a questão racial e de gênero feminino a partir da poesia. A MULHER NO FIM DO MUNDO Ana do Carmo | 20’ | FIC Ambientado em um cenário pós-apocalíptico, conta a história de Benedita e da garota Lua, duas mulheres negras que viram o velho mundo sucumbir e agora são as únicas sobreviventes no novo mundo. A VOAR Matheus Leite | 3’ | EXP Por mais que você lute, o racismo não para e atinge desconhecidos, pessoas próximas ou mesmo alguém de destaque. CARTAS PARA ANA Carla Caroline |17’ | FIC Júlia e Ana precisam se reencontrar. CASA NUBAS A CASA NUBAS destaca-se por ser um centro cultural e espaço colaborativo, por onde circulam artistas de diversas linguagens (teatro, dança, performance, audiovisual, música e artes visuais). O espaço promove cursos, oficinas, workshop, exposições, exibições de filmes e debates de todas as linguagens, mas com foco prioritário em cinema, audiovisual e inovação tecnológica, através de ações afirmativas com ênfase na negritude, juventude, mulheres e LGBTQi+.

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CORAÇÕES ENCOURAÇADOS Cintia Maria e Jamile Coelho |15’ | ANI Década de 1950, 2019 ou futuro? João vive no Sertão nordestino enfrenta o desafio de encontrar água deixando em casa sua esposa Ana sozinha e grávida de nove meses. No cenário fascinante de um Brasil esquecido, Ana reza à espera de um milagre: a chuva. Enquanto isso, João atravessa o sertão na esperança de conseguir levar água para casa. DOWNPRESSION Assaggi Piá e Rodrigo Mends |10’10”| Iroko é um homem trans negro e artista que tem em seu cotidiano o desafio de suprir as expectativas da sociedade ao mesmo tempo que tenta lidar com seus conflitos internos configurado em medo, ansiedade, crise de pânico e depressão. ENQUANTO EU FOR LEMBRADO Állan Maia |30’ | FIC Meados dos anos 90, Jonas, um violonista cachoeirano vive o dilema da mudança de comportamento de sua avó Sueli em meio a descobertas importantes para sua vida. LEMBRANÇAS DE UM NÃO EU Fanny Oliveira | 6’20’’| DOC Um álbum de fotos, muitas memórias e uma identidade em eterna construção. REBENTO Vinícius Eliziário | 17’| FIC Zói, ao saber da gravidez de sua namorada, desata em si, sentimentos suspensos. Pedro, só queria terminar o desenho de sua família TEM UM MONTE DE OXUM NO SUS Aline Brune | 3’ | EXP| Parir no SUS dói mais que as dores. Mas ali nos viramos em deusas, juntas. E o amor em nós converteu também o lugar, encharcou tudo, transformou cada maca em cachoeira abundante. MEMÓRIAS AFRO-ATLÂNTICAS Gabriela Barreto | 76’ | DOC Memórias Afro-Atlânticas segue os passos do linguista afro-americano Lorenzo Turner em suas pesquisas conduzidas na Bahia no início dos anos 40 em terreiros de candomblé de Salvador e do Recôncavo. Turner produziu preciosos registros em áudio e fotografias, retratando a experiência linguística e musical de diversas personalidades religiosas.

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Apresentando imagens e sons raros, o documentário revisita terreiros de candomblé registrados por Turner em busca de memórias e remanescentes vivos. 2020 COTAS RACIAIS EM EDITAIS DE CULTURA Pela primeira vez na história, a Secretária de Cultura do Estado da Bahia estabelece cotas raciais na seleção de projetos através dos prêmios da Lei Aldir Blanc no Estado. À BEIRA DO PLANETA MAINHA SOPROU A GENTE Bruna Barros e Bruna Castro | 13’ | DOC | Através de imagens de arquivo pessoal e reflexões sobre as ambivalências que às vezes se imprimem em relações cheias de amor, “à beira do planeta mainha soprou a gente” apresenta recortes de afeto entre duas sapatonas e suas mães. CINECLUBE ANTÔNIO PITANGA Criado em 2020, a ideia do cineclube é exibir e discutir obras protagonizadas e dirigidas por realizadores negros no Brasil, na Diáspora Latino-Americana, Caribenha e na África. ACERVO ZUMVI - O LEVANTE DA MEMÓRIA Iris De Oliveira | 36’ | DOC Trata da história do ZUMVI Arquivo Fotográfico, sua luta por preservação e a trajetória profissional do fotógrafo Lázaro Roberto, o “Lente Negra”, um dos pioneiros da fotografia documental na Bahia. O acervo contém mais de 30 mil fotogramas – um precioso e pouco conhecido conjunto de registros de importantes e definidores momentos da história da luta por justiça social da população negra na Bahia reunidos desde a década de 1970. ATÉ O FIM Glenda Nicácio e Ary Rosa* | 93’’ | FIC Geralda trabalha em seu quiosque em uma praia no Recôncavo Baiano quando recebe uma ligação do hospital dizendo que seu pai pode morrer a qualquer momento. Ela avisa suas irmãs Rose, Bel e Vilmar. O encontro delas à espera da morte do pai se torna um momento de desabafo e reconhecimento das irmãs, que não se reúnem desde que a mãe morreu, há 15 anos. BAILE DE MÁSCARAS Ana do Carmo |2’29’’| FIC Uma senhora costureira, que além de ser parte do grupo de risco na pandemia do Covid-19, precisa lidar com as diversas máscaras simbólicas da terceira idade e confeccionar suas próprias verdades.

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DIÁRIO DE ARTISTA SUBURBANO Fanny Oliveira | WEBSÉRIE | DOC Quando um é território historicamente marginalizado, sua população possui os acessos básicos negados e parece não existir alternativas, como utilizar a arte para comunicar aos demais que existem outras possibilidades? Artistas da região do Subúrbio Ferroviário de Salvador narram suas trajetórias a partir das vivências no território onde moram e como suas expressões artísticas são utilizadas como dispositivos de politização dos espaços. FACÃO Camila Hepplin | 22’| FIC Um jovem reservado e solitário, passando por um momento de dificuldade, se arrisca em pequenos delitos para sobreviver. Ao assaltar Pietra, uma jovem apaixonada por cinema, tem sua vida transformada pelos filmes que encontrou na mochila roubada. GBAGBE – ÁRVORE DAS MEMÓRIAS Nando Zâmbia | 21’42” | HÍBRIDO Gbagbe, que em Iorubá significa esquecimento, é um espetáculo que se debruça sobre essa metáfora, uma performance que literalmente gira em torno da ancestralidade afrobrasileira. MANUAL DE COMO CONTER UMA RAÇA PODEROSA Marcelo Ricardo e Vagner Jesus | 18’19’’ | HÍBRIDO | Em quatro cenas, o filme aborda situações de imobilização contra a população preta, exigindo uma reação do personagem. MARVIN.GIF PART II Marvin Pereira | 4’ | HIBRIDO Toda imagem é uma súplica para o futuro. NEGRA OBSIDIANA Rebeca Thaís | 2’ | FIC | Natasha, uma jovem negra e lésbica, experiência em sonhos seu maior medo: viver sozinha durante um longo período de isolamento social. Com a ajuda de uma misteriosa pedra preta ela encontra sua verdadeira realidade. O ABEBÉ ANCESTRAL Paulo Ferreira | 19’15” | DOC | 2020 A partir das vozes de Mãe Darabi/Alba Cristina Soares (Ialorixá), Olúkóso/Luzi Borges (Kolabá de Xangô) e das performances da atriz Izadora Guedes, o documentário aborda a

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história de Mejigã, sacerdotisa nigeriana que sofreu diáspora no século XIX e foi escravizada no Engenho de Santana (Ilhéus – BA), do qual escapou, resistindo e se tornando símbolo de empoderamento ao gestar uma dimensão Ijexá no Sul da Bahia. O RETRATISTA Gean Almeida e Jaitan Almeida | 16’24” | DOC | Nascido e criado na zona rural de Feira de Santana, no município de Jaguara, o apaixonado pela atividade de vaqueiro, José Alves dos Santos, 67 anos, conta sobre seus quase 40 anos de profissão como fotógrafo lambe-lambe, partilhando o início de sua trajetória nessa arte até os dias atuais no documentário. ORÍKÌ Pamela Peregrino | 6’ | ANI | É uma animação de desenhos que apresenta uma poética sobre a morte, a doença e a cura, para valorizar e fortalecer a cosmovisão de Povos Tradicionais de Terreiro num contexto de pandemia. No filme, Iku (a morte) circula no mundo inteiro. Os Òrìsàs se unem para encontrar a cura e dividir com a humanidade. PROCESSO NU Clarissa Brandão | 4’ | FIC Inconstâncias dos processos criativos em meio ao caos diário. RUAS DA DISCÓRDIA Gean Almeida | 15’57’’ | DOC | Por que homenageamos algozes com seus nomes batizando ruas? As cidades de Salvador e Feira de Santana, compõem o cenário da nossa investigação urbana, para refletir acerca desses nomes e o que essas personalidades representaram e/ou representam para a história do Brasil e do seu povo. Os nomes de logradouros serão o fio condutor para recontar a história do Brasil, através da “memória” contida nos nomes de alguns logradouros presentes na cidade de Feira de Santana e Salvador. 2021 II MOSTRA DE CINEMA NEGRO DE SÃO FELIX Com o tema “Nossas vidas na tela”, a segunda edição do evento aconteceu de 25 a 28 de fevereiro de 2021. IV MOSTRA OUSMANE SEMBENE A quarta edição do evento ocorreu entre os dias 17 e 21 de março de 2021 com programação de exibição dos filmes selecionados, palestras e rodas de conversas em uma versão totalmente on-line em plataformas virtuais.

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IV MOSTRA ITINERANTE DE CINEMAS NEGROS MAHOMED BAMBA Com o tema “Caminhos: contando histórias das diásporas negras do mundo”, a quarta edição da MIMB ocorreu de 31 de março a 9 de abril de 2021. 5 FITAS Vilma Martins e Heraldo De Deus | 15’ | FIC | Em Salvador (Brasil), todo ano acontece a grande e tradicional festa para Senhor do Bonfim, onde fiéis, turistas e foliões, peregrinam até a famosa igreja para amarrar fitas e fazer pedidos. Dois irmãos, Pedro e Gabriel, ouvem desde cedo as histórias e rezas de sua avó ao Senhor do Bonfim e decidem fugir no dia da lavagem, se aventurar entre a multidão, para tentar pedir por uma bola de futebol, já que cresceram sem uma figura paterna. Lá confrontam as narrativas de sua avó, com a lavagem atual, trazendo questões sobre religiosidade, sincretismo, manifestação popular, e importância da família. PORTO RAIZ Pamela Peregrino | 6’34’’| ANI | A Capoeira Angola e suas raízes através de imagens, olhares, sons e movimentos que o Mestre Pé de Chumbo nos apresenta com a profundidade de quem vive a vida pela Capoeira, seguindo os ensinamentos de seu Mestre João Pequeno de Pastinha.

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CATÁLOGO DE PROFISSIONAIS DO AUDIOVISUAL NEGRO BAIANO Mile Silva e Lecco França Este catálogo foi desenvolvido a partir da chamada pública virtual realizada entre os dias 13 e 21 de março de 2021 pela Editora Emoriô. Foram convidados a participar profissionais negros e negras do cenário audiovisual das mais variadas funções (diretores, roteiristas, produtores, motadores, etc.), que fossem baianos ou com atuação comprovada no estado da Bahia. A intenção primordial deste catálogo é dar visibilidade às produções e produtores locais negros, ratificando as potencialidades do cinema baiano na contemporaneidade. Pois, guiados pelas palavras de Mãe Stella de Oxóssi, sabemos que “o que a gente não registra, o vento leva”.

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AILTON PINHEIRO (TOM PINHEIRO) Cidade: Salvador-BA Contato: (71) 99108-5082 Portfólio: https://www.linkedin.com/in/ailtonpinheiro https://www.behance.net/ailtontom http://oriimagem.com.br/ori/sobre-nos/ https://vimeo.com/ailtonpinheiro https://www.youtube.com/channel/UCc0HXEwOWZQMM7g8Ju2M89g

Minibio: CEO da produtora Baiana Ori Imagem e Som Produção Cinematográfica. Cineasta, Produtor Executivo, criativo e Roteirista, atua no mercado audiovisual a 15 anos. Mestre em Estudos Étnicos e Africanos (UFBA), com pesquisa nas áreas de Cinema Africano, Cinema e Narrativas. Graduado em Comunicação e Multimeios pela PUC-SP. Assina a direção de dois longas-metragens, “Um percurso sobre o Corpo e Ancestralidade” e “Vovó Cici vai ao Benim” ambos em parceria com FSA/ANCINE. Ao longo da carreira dirigiu cinco curtas e um média-metragem, está em finalização do seu sexto curta e primeiro no gênero de terror. Produtor executivo da série de animação Afro futuristas, de Marcelo Lima. Coordenou durante três anos o “Núcleo de Conteúdo” da produtora Mandacaru Filmes, responsável pela criação de mais 46 conteúdos, alguns subsidiados por editais públicos. E como produtor executivo acumula na bagagem a produção de 18 curtas, 5 telefilmes, 4 séries e 10 médias-metragens para a TV. Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Diretor e Produtor, Um percurso sobre o Corpo e Ancestralidade, 2021. Longa-metragem. Diretor, Produtor Executivo e Roteirista, Vovó Cici Vai ao Benim, 2020/2021. Documentário de longametragem. Diretor e Produtor Executivo, Bikudos, 2014. Documentário de Média-metragem. Diretor, Roteirista e Produtor Executivo, Poesia Azeviche, 2014/2015. Documentário de curta-metragem. Diretor, Roteirista e Produtor Executivo, Mbanza, 2011. Documentário de curta-metragem. Diretor e Roteirista, Cinestezia Central, 2010. Curta-metragem de ficção. Diretor, Roteirista e Produtor Executivo, Contágio 19, 2020. Documentário de curta-metragem em Animação. Diretor, Roteirista e Produtor Executivo, Re – Ação, 2020. Curta-metragem de ficção. Diretor e Consultor de Roteiro, O Medo Além da Tela, 2021. Curta-metragem de ficção. Produtor Executivo, Estamos sozinhos, 2021/2022. Curta-metragem de ficção. Produtor Executivo, A Menina que Queria Voar, 2021/2022. Curta-metragem de ficção Produtor Executivo, Motriz, 2018. Documentário. Produtor Executivo e Assistente de Direção, O Menino e o Louco, 2016. Curta-metragem de ficção. Produtor Executivo, Marlindo Paraíso e a Kombi do Amor, 2016. Curta-metragem de ficção. Produtor Executivo, Cinzas, 2015. Curta-metragem de ficção. Produtor Executivo, Lápis de Cor, 2014. Documentário de curta-metragem.

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ALESSANDRA NOVAES (NINA NOVAES) Cidade: Salvador - Bahia/ Contato: (71) 98118-8433 IG da Produtora Nina: https://www.instagram.com/nina_produtora/ IG pessoal de Nina Novaes: https://www.instagram.com/ninatobita/ https://www.instagram.com/pedroeapedrasecreta/ https://www.instagram.com/pequenogigante.serietv https://www.instagram.com/projetoafroformacao/ Curso Pra Começar (EPA): https://www.instagram.com/pracomecar.curso/ Minibio: Nina Novaes é Produtora Audiovisual atuante na produção executiva, de campo e impacto. Fundadora da produtora brasileira independente “Nina Produções Artísticas”, como mulher negra atua trazendo em seus trabalhos toda responsabilidade e representatividade de seus ancestrais, buscando caminhos para potencializar e dar visibilidade ao seu povo no audiovisual. Colaborou na fundação da TV Kirimurê (Canal 10.2) - Primeiro canal da cidadania do país. É produtora do Cine Arts Projeto de Extensão – UNEB, e assina trabalhos com as produtoras Mantra Filmes, Cine Artes, Ori Imagem e Som, Salamandra Produções. É também umas das representantes do Produtores Executivos Associados (EPA), agrupamento de três produtores negros e suas empresas de audiovisual, que surge para alavancar e equilibrar a atuação de profissionais negros no mercado audiovisual brasileiro. Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Produtora Executiva e Produtora de Impacto, Medo Além da Tela, Ailton Pinheiro, 2021. Curta-metragem. Assistente de Produção Executiva e Produtora de Impacto, Pedro e a Pedra Secreta, Anderson Soares e Leonardo Silva, 2021. Série de animação 3D em produção. Assistente de Produção Executiva e Produtora de Impacto, Floradas - Na Trilha da Agroecologia, Anderson Soares, 2022, Série doc. desenvol. de 8 episódios. Assistente de Produção Executiva e Produtora de Impacto, Reino da Bahia, Anderson Soares, 2022. Série de ficção (comédia) com 13 episódios. Assistente de Produção Executiva e Produtora de Impacto, Portão Mágico, Anderson Soares e Leonardo Silva, 2022. Série de animação infantil. Assistente de Produção Executiva e Produtora de Impacto, Kirimuré uma Aventura na Baía de Todos os Santos, Anderson Soares, 2023. Assistência de Produção, Produção de Locação e Produção de Impacto, Pequeno Gigante, Anderson Soares, 2020. Série de ficção, 13 episódios para a TVE e TV Cultura. Produção de Impacto Local, Temporada, André Novais, 2018. Longa-metragem – Sessão Vitrine Petrobras. Produção de Impacto Local, Djon Àfrica, Filipa Reis e João Muller Guerra, 2018. Longa-metragem - Sessão Vitrine Petrobras. Produção de Impacto Local, A Cidade do Futuro, Claudio Marques e Marília Hughs, 2018. Longametragem. Produção de Impacto Local, Quem te Penteia, Nana Prudêncio, 2018. Média-metragem. Produção de Impacto Local, Café com Canela, Ary Rosa e Glenda Nicácio, 2017. Longa-metragem de ficção. Produção de Impacto Local, O Caso do Homem Errado, Camila de Moraes, 2017. Documentário longa.

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ANA DO CARMO Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99235-1252 Portfólio: www.vimeo.com/saturnema

Minibio: diretora, roteirista, vencedora de dezoito prêmios. É CEO na Saturnema Filmes, membra da Black Femme Supremacy Film Festival (EUA) e da Organization of Black Screenwriters (EUA), integra a Rede de Talentos do Projeto Paradiso, é membra da APAN, coordenadora audiovisual do projeto literário Lendo Mulheres Negras e coidealizadora do Películas Negras Lab. É graduada em Cinema pela UFBA, fez curso de cinema no Sundance Institute (EUA), teve mentoria de escrita de séries na Usina do Drama (BA), estuda escrita de longas e séries na Roteiraria (SP) e realizou oito curtas exibidos em onze países. Seu primeiro projeto de longa é financiado pelo prêmio de desenvolvimento Jorge Portugal das Artes, selecionado para oito laboratórios como o FRAPA, ganhando sete prêmios, dentre eles credenciais para o programa Diversity & Inclusion no European Film Market da Berlinale, para a Marché du Film do Festival de Cannes e para a SXSW – South by South West (Texas, EUA), além de ter sido vencedor do Prêmio Cabíria e de receber mentoria da Netflix e Telecine. Fez trabalhos freelancers como Staff Writer na Mahin Produções, assistente de roteiro na RT Features e roteirista colaboradora na Patala Filmes, foi curadora do ROTA, Cinetranse, e jurada do Cinefone e do Panorama Internacional Coisa de Cinema. Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Direção, roteiro, direção de fotografia e edição, Baile de Máscaras, 2020. Direção, roteiro, direção de fotografia e edição: Solstícios, 2020. Direção e co-roteiro: Teaser da Mostra Itinerante de Cinemas Negros Mohamed Bamba, 2019. Direção, co-roteiro e coedição, A Mulher no Fim do Mundo, 2019. Codireção e co-roteiro: De Amando a Paulo Isidoro, 2018. Codireção, Frutos da Lua, 2018. Direção e roteiro, A Caixa de 4 Cômodos, 2017. Direção e roteiro, Reverse, 2017. Direção de fotografia e edição, Tubarão de Água Doce, Ariel L. Ferreira, 2022. Still e Making Of, A Menina Que Queria Voar, Taís Amordivino, 2022. Still e Making Of, Quando o Lastro Derruba a Flor, Lucas Caroso e Tainah Paes, 2022. Still e Making Of, O Último Grão de Areia, Marcos Alexandre, 2022. Direção de fotografia, Facão, Camila Hepplin, 2020. Direção de fotografia e coedição, A 7 Tragos do Chão, Ariel L. Ferreira e Cláudia Sater, 2019. Colorização, Barraca de Capeta, Djalma Calmon, 2018. Direção de fotografia, co-montagem e co-roteiro, Ê, na Mata!, Rebeca Thaís, 2018. Direção de fotografia e edição, Ilú, Rebeca Thaís, 2017. Finalização, Noturnos, Ariel L. Ferreira, 2016. Finalização e edição, Cantos Dessa Cidade, Ariel L. Ferreira, 2016.

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BEATRIZ VIEIRAH Cidade: Cachoeira-BA Contato: (75) 98342-5028 Portfólio: https://linktr.ee/beatriz.vieirah

Minibio: Iniciou no Teatro em 2007, participando de diversos espetáculos em Sergipe. Em 2011 iniciou sua graduação em Cinema e Audiovisual, na UFRB - Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Foi integrante e militante do Benditas Telas Filmes, Tela Preta - Movimento de Cinema Negro, Coletivo de Comunicação da Marcha Mundial das Mulheres, Movimento Negro Unificado e dos grupos de pesquisa e extensão Direitos Sexuais das Mulheres Negras e Lésbicas em Situação de Prisão, Cineclube Itinerante Kilombo’s, Cineclube Mario Gusmão, PET Cinema e o Cineclube Itinerante Kilombo’s. Atua como pesquisadora, desde 2012, no campo dos Cinemas Negros, em especial com recorte de gênero. Aliada às leituras e às análises, desenvolve também projetos enquanto cinegrafista, roteirista, diretora, produtora, montadora, curadora e educadora. Radicada em Cachoeira, atualmente, é formada em Cinema, coordenadora do Seminário Cinema Negro Brasileiro e produtora do Cinemando no Quilombo. Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Montagem e Finalização, Memórias de um povo, 2020. Documentário de média-metragem, produzido pelo projeto Cinemando no Quilombo, sob realização de Maria Abade e Mariane Silva Santos. Fotografia, O Foguete, Ricardo Sena, 2018. Curta-metragem de ficção. Direção de Produção, O mundo de dentro, Adelia Sampaio, 2018. Curta-metragem de ficção. Roteiro e Direção, Em busca de Lélia, 2017. Documentário de curta-metragem, realizado através do Edital de Curtas Universitários do Canal Futura, em parceria com a Globo e a ABTU. Câmera, Encruzilhada das águas - A vida de Mãe Beata de Yemanjá, Aderbal, 2015. Documentário de longa-metragem. Preparação de Atores, Noite de baile, Artur Dias, 2015. Curta-metragem de ficção. Câmera 2, O corpo é meu - Samba de Moça, Luciana Oliveira, 2015. Clipe da banda Samba de Moça. Assistente de Direção e Câmera, Lápis de cor, Larissa Fulana de Tal, 2014. Documentário de curtametragem realizado através do Edital de Curtas Universitários do Canal Futura, em parceria com a Globo e a ABTU. Preparação de Atores, Sambares, Ruy Dutra, 2013. Curta-metragem de dicção. Assistente de Direção e Preparação de Atores, O milagre dos pássaros, Adolfo Rosenthal, 2012. Telefilme de ficção produzido para a TV Record. Preparação de Atores e Assistente de Produção, entre passos, Ellen Linth, 2012. Curta-metragem de ficção. Atriz, O cadeado, Leon Sampaio, 2012. Curta-metragem de ficção. Preparação de Atores, Partida, Luara Dal Chiavon, 2011. Curta-metragem de ficção. Direção e Preparação de Atores, Estação, 2011. Curta-metragem de ficção realizado pela ABCV Associação Baiana de Cinema e Vídeo. Atriz, Socorro Meu Deus!, Leon Sampaio, 2011. Videoclipe da banda Escola Pública. Realização, Sinfonia de uma pequena cidade, 2011. Documentário de curta-metragem, com direção coletiva, apresentado à disciplina de Linguagem e Expressão cinematográfica I - UFRB.

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BRUNA CASTRO Cidade: Salvador-BA Contato: (71) 99211-4640 Portfólio: sites.google.com/view/breu

Minibio: Realizadora audiovisual. Graduanda no B.I. em Artes com concentração em Cinema e Audiovisual, na UFBA, onde integra o grupo de pesquisa “Vi-Vendo Imagens: novas confabulações no documentário baiano contemporâneo” e foi integrante do grupo “Vi-Vendo Imagens: Cinema baiano em tela”, tendo como principal objeto de pesquisa a colaboratividade e afetividade presentes nos coletivos audiovisuais baianos. Codirigiu o curta Pra Jorrar (2018) e em 2020 lançou o curta documental à beira do planeta mainha soprou a gente, filme que codirigiu com Bruna Barros, que apresenta recortes de afeto entre duas sapatonas e suas mães. Com ele ganhou os prêmios de melhor direção e edição, no 15º Fest Aruanda do Audiovisual Brasileiro, de melhor filme na 4ª Mostra Cinema Negro Pelotas e o prêmio especial do júri no XVI Panorama Internacional Coisa de Cinema. Através da Movida Conteúdo, participou da produção audiovisual da 27ª edição do Prêmio Braskem de Teatro (2020) e do Festival Oferendas Online (2021).

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Diretora e roteirista, Pra Jorrar, 2018. Diretora, Clarice, 2019. Diretora e roteirista, à beira do planeta mainha soprou a gente, 2020.

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CAROLINE FREITAS (CAROL AÓ) Cidade: Salvador-BA / São Paulo-SP Contato: (71) 99249-6890

Minibio: Carol Aó é realizadora audiovisual, soteropolitana, atualmente residente em São Paulo. Formada no Bacharelado Interdisciplinar em Artes - Cinema pela Universidade Federal da Bahia e em Comunicação Social pela Universidade Católica do Salvador. Tem na fotografia e nas artes visuais, das mais variadas vertentes, suas principais ferramentas de pesquisa e investigação de cena. Atua na construção de narrativas cinematográficas exercendo funções na direção e no roteiro em cinema, além de trabalhar como continuísta, diretora assistente e consultora de roteiro auxiliando na construção de narrativas de forma mais emotiva e sensível a história. Já firmou parceria em projetos de diretores como Jeferson De, Karim Ainouz, Fernando Meirelles e com René Guerra. Atualmente, caminha na busca de realizar seus projetos autorais como roteirista e diretora, na intenção de ampliar as aprendizagens adquiridos em seu percurso cinematográfico, que intensificou seus processos de construção de histórias através das memórias.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Continuísta e consultora de roteiro, Lili e as Libélulas, René Guerra, 2021. Continuísta, Turma da Mônica – Lições, Daniel Rezende, 2021. Continuísta e consultora de roteiro, Prisioneiro da Liberdade, Jeferson De, 2021. Continuísta e consultora de roteiro, Cidade Invisível – 1ª. Temporada, Carlos Saldanha, 2021. Continuísta, Alemão 2, José Eduardo Belmonte, 2021. Continuísta e consultora de roteiro, M8 - Quando a Morte Socorre a Vida, Jeferson De, 2020. Continuísta, Pico da Neblina – 1ª. Temporada, Fernando e Quico Meirelles, 2020. Continuísta, A Vida Invisível, Karim Ainouz, 2019. Continuísta, (DES)encontros – 1ª. Temporada, Rodrigo Bernardo e Bel Valiante, 2019. Assistente de direção, As Boas Maneiras, Marco Dutra e Juliana Rojas, 2018. Continuísta, Escola de Gênios – 1ª. e 2ª. temporadas, Marcelo Cordeiro e Jeferson De, 2017. Codireção, direção de fotografia e montagem, Campanha Catarse Luedji Luna - Um Corpo no Mundo, 2017. Continuísta, Música da Minha Vida – 1ª. Temporada, Gabriela Barreto, 2017. Continuísta, Não se Aceitam Devoluções, André Moraes, 2016. Continuísta, Manual para se defender de Aliens, Ninjas e Zumbis – 1ª. Temporada, André Moraes, 2016. Continuísta, O Caseiro, Julio Santi, 2016. Diretora de fotografia, Num parque, um pôr-do-sol, Henrique Ajala, 2016. Continuísta, Destino: Salvador, Fabio Mendonça, 2015. Diretora de fotografia, Os atrasos de Sol, Ale Martins, 2015. Continuísta, Felizes para sempre – Minissérie, Fernando Meireles, 2015. Continuísta, Irmã Dulce, Vicente Amorim, 2015. Assistente de direção, Malamém, Sandoval Dourado, 2015.

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CECI ALVES Cidade: Salvador - Bahia Contato: Av. Cardeal da Silva, 2171, apto 2, Rio Vermelho – CEP: 41.950495, Salvador - Bahia.

Minibio: Cineasta negra, que lida com questões de protagonismo dos excluídos de uma forma afetiva e política. Tem larga experiência na área de Comunicação, com ênfase em Jornalismo e Cinema. É diretora da ¡Candela! Produções; documentarista e curta-metragista com premiações no Brasil e exterior. Mestra em Artes Cênicas/ UFBA, é editora formada pela Escuela Internacional de Cine y TV, de Cuba; e tem Master 2 em Direção pela École Supérieure d’Audio-Visuel, unidade da Université de Toulouse, França. Ceci é corroteirista de Avôhai – a Peleja de um Trovador, cinebiografia do cantor e compositor paraibano Zé Ramalho, desenvolvida no PRODAV 04/2014, da Ancine; além de desenvolver as séries Ua Bem Bum!, dentro do Núcleo de Criação Usina do Drama 2020, atividade de extensão da Universidade Federal da Bahia, e Cem Horas, selecionada do Laboratório de Narrativas Negras para Audiovisual 2020, organizado pela Flup – Festa Literária das Periferias, em parceria com a Rede Globo.

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CINTIA MARIA Cidade: Salvador - Bahia Contato: [email protected]

Minibio: Cineasta, premiada nacional e internacionalmente. Atua como produtora executiva, diretora, animadora em stop motion. Gestora do espaço multiartístico afrocentrado e de formação audiovisual Nubas. Desenvolve e gerencia projetos inovadores, criativos e de impacto social na área do audiovisual com foco nas populações invisibilizadas e culturas identitárias na Estandarte Produções. Pioneira no desenvolvimento de filmes multiplataformas com aplicação em 3D, realidade virtual e aumentada na Bahia. Cineclubista e fundadora do Cineclube Antônio Pitanga. É uma das idealizadoras do Cine Janela, que durante a quarentena tem projetado filmes, poesias e frases de esperança para vizinhos, através da janela do apartamento casa. Palestrante sobre suas áreas de atuação. Acumula mais de 30 prêmios durante a sua trajetória como curtametragista de animação. Contribui para a descentralização do audiovisual através da realização de oficinas em quilombos, terreiros, universidades, escolas e bairros populares tendo realizado mais 50 atividades formativas. Umas das sócias da Editora Emoriô, editora com foco em visibilizar a produção de livros para pessoas negres e LGBTQIA+.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Direção, produção executiva e roteiro, Limbo, 2021. Curta-metragem de animação. 6`. Produção executiva, direção e captação de som direto, Retrato da Bahia, 2021. Telefilme documental. Produção executiva, Victor, Bibi e o Jabuti, em fase de captação. Série de animação. Produção executiva, Òrun Àiyé, em fase de captação. Séride animação. Produção executiva, Òrun Àiyé - Os princípes do destino, em fase de captação. Longa-metragem de animação. Direção, produção executiva e captação de som direto, Encruzilhadas da Liberdade, 2021. Telefilme documental. Produção executiva, A Menina e o Rio. Curta-metragem de animação. 9`. Direção e captação de som direto, O Bando e sua memórias, 2021. Média-metragem documetal. 41’. Direção, roteiro e produção executiva, Corações Encouraçados, 2018. Curta-metragem de animação, 15’. Direção, produção executiva e animação em stop motion, Òrun Àiyé - A Criação do Mundo, 2015. Curtametragem de animação, 12`. Produção executiva, A Cartomante, Adriano Big, 2013. Curta-metragem de ficção. 20’.

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EVERLANE MORAES Cidade: Cachoeira-BA Contato: (71) 99378-2639 Portfólio: https://everlane-moraes4.webnode.com/ Reel: https://vimeo.com/413762521

Minibio: Everlane Moraes é Cineasta especializada em Direção de Documentário pela EICTV - Cuba. Graduada em Artes Visuais (UFS). Seus filmes transitam entre diferentes gêneros e formatos, evidenciando as questões sociais, filosóficas e espirituais da diáspora negra. Atua nas áreas da Direção, Roteiro, Formação, Consultoria e Assistências. Selecionada para o Encontro entre Diretores no Talents Guadalajara (2019). Bolsista da Netflix no programa Colaboratório Criativo (2020). Premiada no William Graves Film Fund - Firelight Media (EUA, 2020), no IDFA Bertha Fund (EUA, 2021) e no Sundance Institute (USA, 2021). Seus filmes foram exibidos em festivais como Sundance, Rotterdam e BFI, entre outros. Seus projetos participaram do European Film Market (Berlim, 2021), Doc Station - Berlinale Talents (2020), Talents Co Production Meeting (México, 2020), Durban Film Market (África, 2020), MiradasDoc (Espanha, 2019), Good Pitch Brasil (EUA, 2019), entre outros. Desenvolve os projetos de longa-metragem O navio e o mar, Germano Black Society, Imagine 2030, Busca e apreensão e O segredo de Sikán, recentemente premiado no BRLab 2020 para o Torino Film Lab 2021 com bolsa do Projeto Paradiso.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Direção, Pattaki, 2019. Doc. 21’, EICTV, Cuba. Direção, Aurora, 2018. Doc. 15’. EICTV, Cuba. Distribuição. Direção, Monga, retrato de café, 2017. Doc. 15’. EICTV, Cuba. Distribuição. Direção, La Santa Cena, 2016. Doc. 15’. EICTV, Cuba. Distribuição. Direção, Conflitos e abismos: a expressão da condição humana, 2014. Doc. 15’. SECULT. Brasil. Distribuição. Direção, Caixa D’água: Qui-lombo é esse? 2013. Doc. 15’. SECULT, Brasil. Distribuição.

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FRANCIELE OLIVEIRA (FANNY OLIVEIRA) Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 98330-8689 Portfólio: @zuruba.arte

Minibio: Fanny Oliveira é natural de Salvador, licenciada em Filosofia (UNEB), técnica em Administração e Logística, Educadora social, Fotógrafa e Realizadora audiovisual. Atua como idealizadora e pesquisadora do projeto Zuruba Arte que se debruça sobre produção de imagens como mediadora de relações sociais no território do Subúrbio Ferroviário de Salvador. Em suas realizações audiovisuais atuou como diretora nos documentários Lembranças de um não eu (2019), nas web séries Vidas em branco (2018) e Diário de artista suburbano (2020) e na série para o Canal Futura, Diz aí Juventudes (2021). Executou diversos trabalhos na função de Diretora de Fotografia em projetos como os documentários Viva nossa voz, produzido para o Canal Brasil e Instagram e Senhora das ruas, da diretora Larissa Fulana de Tal, nas séries Vai planeta!, da plataforma Quebrando o Tabu, Empreendedoras do Pelourinho, da Casa Respeita as Mina em parceria com a Movida Conteúdo, e na ficção O ovo, da diretora Rayane Telles. Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Direção, Lembranças de um não eu, 2019. Direção, Vidas em branco, 2018. Direção e Direção de fotografia, Diário de Artista Suburbano, 2020. Direção e Direção de fotografia, VT Festa Literária do Subúrbio, 2021. Direção e Direção de fotografia, Odoyá, 2021. Direção de fotografia, Senhora das ruas, Larissa Fulana de Tal, 2018. Direção de fotografia, Presentyzmo, Luma Nascimento, 2018. Direção de fotografia, Empreendedoras do Pelourinho, Dayse Porto, 2020. Direção de fotografia, Vai planeta!, Lais Dantas, 2020. Direção de fotografia, Viva nossa voz, Day Rodrigues, 2021. Direção de fotografia, O ovo, Rayane Telles, 2021.

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GABRIELA BARRETO Minibio: Baiana, mãe carreira solo, capoeirista, formada em Cinema, Gabriela Barreto iniciou a sua carreira realizando filmes e ganhando prêmios quando ainda era estudante de cinema. Sua carreira é marcada por abordar temas sociais, ambientais e da cultura popular afro-brasileira, com uma visão diferenciada, privilegiando pontos de vista muitas vezes negligenciados, em especial do povo negro. Os filmes que tiveram mais destaque foram Mestre Lua Rasta e o seu bando anunciados (Melhor documentário no Festival Internacional Etnográfico de Pernambuco), Mãe Preta, Umbigada, Maria das Cabras...Trabalhou com importantes nomes do cinema nacional como Andrucha Waddington, Breno Silveira, Kátia Lund, Isabel Diegues, entre outros. Com uma forte ligação com a geração de cineastas baianos proeminentes nas décadas de 1980/1990. Gabriela Barreto também se dedicou a produção de mostras cinematográficas no interior da Bahia (5 edições do Cine Capão, 1ª. edição do Cine Guarapuá e 1ª. edição do Cine Diamantina) e a realização de filmes referentes ao movimento cinematográfico baiano, como o filme Bitola Cabeça Super 8, exibido em TV e premiado em 3 festivais nacionais. Foi diretora de cena da série de ficção com veiculação nacional A Música da Minha Vida. Atualmente encontra-se em fase de lançamento do seu primeiro longa-metragem, Memórias Afro Atlânticas, premiado no Cine PE (Melhor Filme pela Crítica, Melhor Filme Júri Popular, Melhor Direção e Melhor Roteiro). Também levou Menção Honrosa no Festival Internacional Panorama de Cinema. Gabriela também dirige filmes publicitários e campanhas políticas.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Produtora de Locação, Eu, Tu, Eles, Andrucha Waddington, 2000 - Não seriado, Ficção, 118 min., Filme Bilheteria de 565 mil espectadores no cinema. Diretora, Maria das Cabras, 2005 - Não Seriado, Ficção, 5 min., Vídeo, 16 mm - Premiado no Edital FTC 2005. Exibido no XI Festival Nacional de Vídeo Imagem em 5 Minutos (Salvador, 2007). Diretora, Bitola Cabeça Super8, 2005 - Não Seriado, Documentário, 18 min., Filme - Exibido na TVE Bahia e na TV FTC, Prêmios de: Melhor Documentário do 12o Vitória Cine Vídeo 2005, Destaque em Expressão Cultural na 11a edição do Festival Brasileiro Universitário 2006, Melhor Grito no Cine Esquema Novo 2006. Diretora, Lumbráticos Nós Éramos, 2005 - Não Seriado, Documentário, 5 min., Vídeo - Exibido no X Festival Nacional de Vídeo Imagem em 5 Minutos (Salvador, 2005). Diretora, Umbigada, 2006 - Não Seriado, Documentário, 26 min., Filme - Exibido na TVE Bahia, na TV Brasil e na TV FTC. Diretora, Sambadeiras do Recôncavo, 2007 - Não Seriado, Ficção, 5 min., Vídeo - Exibido no XI Festival Nacional de Vídeo Imagem em 5 Minutos (Salvador, 2007). Diretora, Tributo ao Mestre Bigodinho, 2008 - Não Seriado, Documentário, 5 min., Vídeo - Exibido no projeto Quartas Baianas (Salvador, 2008). Diretora, Preta é a Mãe, 2008 - Não Seriado, Documentário, 5 min., Vídeo - Exibido no XII Festival Nacional de Vídeo Imagem em 5 Minutos (Salvador, 2008). Diretora, A Capoeiragem de um Mestre e seu Bando Anunciador, 2009 - Não Seriado, Documentário, 26 min, Filme - Exibido na TVE Bahia e TV Brasil. Menção Honrosa no I Festival do Filme Etnográfico do Recife 2009 e premiado pelo Edital Capoeira Viva (MINC). Diretora, Mestre Felipe e a Faca de Ticum, 2009 - Não Seriado, Documentário, 5 min., Vídeo - Exibido no Cine Capoeira (UFMT) em 2013.

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Diretora, Contos de uma Lavadeira, 2010 - Não Seriado, Documentário, 5 min., vídeo - Exibido no XIX Festival Nacional de Vídeo Imagem em 5 Minutos (Salvador, 2010) e Exibido no YouTube. Diretora, Terra Marcada, 2010 - Não Seriado, Documentário, 26 min., Filme - Exibido na TVE Bahia e na TV Brasil. Premiado pelo Edital 26 Docs do IRDEB. Diretora, Rio São Francisco, 2011 - Não Seriado, Documentário, 26 min., Exibido na TVE Bahia, TV Brasil e TV Assembleia (BA). Produtora de locação, Gonzaga de Pai para Filho, Breno Silveira, 2012 - Não Seriado, Ficção, 120 min., Filme - 500 mil espectadores no cinema. Produtora de Locação, À Beira do Caminho, Breno Silveira, 2012 - Não Seriado, Ficção, 102 min., Filme 159 mil espectadores no cinema com bilheteria total de R$ 1,5 milhão. Diretora, A Cor da Liberdade, 2014 - Não Seriado, Documentário, 26 min., Exibido em praça pública no bairro da Liberdade em Salvador e na Senzala do Barro Preto (sede do Ilê Aiyê), em 2014. Diretora de Cena, Servidor Cidadão, 2014-2017 - Série, Doc, 5 episódios de 5 min., Web série para a Secretaria de Administração do Estado da Bahia. Diretora de Cena, Boas Práticas, 2014-2017 - Série, Doc, 5 episódios de 5 min., Web série para a Secretaria de Administração do Estado da Bahia. Diretora de Cena, Na Pegada, 2017 - Série, Doc-Fic., 8 episódios de 5 min., Web série Educativa para a Secretaria de Educação do Estado da Bahia. Diretora de Cena, A Música da Minha Vida (1a Temporada), 2017 - Série, Ficção, 5 episódios de 26 min.. Diretora de Cena, Me siga na Bahia, 2018 - Série, Doc-Fic, 8 episódios de 1 min. - Veiculação nas conferencias nos países da América Latina para o Governo da Bahia (Bahiatursa). Diretora de Cena, Circuito Batatinha, 2018 - Doc, 3 min. - Veiculação TVE-Bahia. Diretora de Cena, Ouro Negro, 2018 - Doc, 3 min. - Veiculação TVE-Bahia Diretora de Cena, São João da Tradição, 2018 - Programa de TV, 4 de 35 min. - Veiculação SBT Nordeste. Diretora, Memórias Afro-Atlânticas, 2020 – Documentário de longa-metragem.

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GEAN ALMEIDA Cidade: Feira de Santana - Bahia Contato: (71) 98714-1597 Portfólio: https://geanalmeidda.wixsite.com/portfolio

Minibio: Oriundo da cidade de Feira de Santana, filho de Lindaura Almeida e José Alves. Filho de artistas, junto com mais três irmão, cresceu e viveu entre as camadas rural e urbana da cidade de Feira e seus distritos. Influenciado pelas óticas e lentes do seu pai José Alves, fotógrafo e artesão, tendo-o como principal referência artística e de vida. Em 2012 muda-se para capital, envolvido na arte de rua e na cultura do movimento hip hop começa a colaborar na construção de videoclipes de rap e de vídeos de artistas baianos. No mesmo ano ingressa na Universidade Federal da Bahia, no Bacharelado de Artes, logo em seguida concentrando na área de cinema e audiovisual. Nos últimos anos, vem realizando produções audiovisuais na capital baiana e no interior, como forma de tornar os conteúdos produzidos disponíveis e acesseis a população. Idealizou o Raízes TV, mídia orgânica independente, que nasceu em 2018 como plataforma de armazenamento e divulgação de conteúdo audiovisuais. Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Roteiro e Edição, Hip Hop Recôncavo, UH! Neto e Gean Almeida, 2021. Roteiro, Animação, Edição e Produção, O Retratista, Gean Almeida e Jaitan Almeida, 2020. Pesquisa, Roteiro e Produção, Ruas da Discórdia, Gean Almeida, 2020. Pesquisa, Roteiro, Animação, Edição e Produção, Logradouro, Gean Almeida, 2020.

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HENRIQUE DANTAS Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99335-2116 Portfólio: https://vimeo.com/369586311

Minibio: Formado em Artes Visuais e Administração de Empresas, com Mestrado em Artes Visuais, entre os seus trabalhos estão os premiados documentários Filhos de João, Admirável Mundo Novo Baiano, 2009; Sinais de Cinza, A Peleja de Olney Contra o Dragão da Maldade, 2013; A Noite Escura da Alma, 2016 e Dorivando Saravá, O Preto que Virou Mar. Está em montagem da série documental Seculares, O Mundo há Mais de Cem, realizada com centenários. Em ficção, filmou a série infantil, A Bicicleta do Vovô e prepara-se para filmar o longa-metragem Silêncio, sobre uma família negra despedaçada pela ditadura militar. Atualmente desenvolve no Núcleo Criativo da produtora, o longa Summertime da Bahia, sobre os efeitos da passagem de Janis Joplin em um grupo de amigos de Salvador, Bahia, e a série policial chamada Contra-Anistia, sobre pessoas que descobrem suas relações com a ditadura militar e são movidas por sentimentos incontroláveis de vingança ou justiça.

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HERALDO DE DEUS Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99253-2593 /[email protected] Portfólio: www.facebook.com/heraldodedeus www.instagram.com/heraldodedeus Www.instagram.com/sujeitofilmes

Minibio: Heraldo de Deus, 34 anos, natural de Salvador/BA, Ator (DRT 9842 Sated/BA), publicitário pela UCSal e estudante de Cinema e Audiovisual (BI em Artes) na UFBA. Formado pela 27ª turma do Curso Livre de Teatro da UFBA, tendo atuado em nove espetáculos teatrais, ao longo de dez anos de carreira; no cinema esteve no elenco de dez curtas e cinco longas. Criou, em parceria com Leno Sacramento, o coletivo audiovisual Ouriçado Produções, que desde 2015 cria vídeos para internet focados numa narrativa antirracista. No mesmo ano fez a sua primeira formação de roteirista para série, com Gildon Oliveira e Clarissa Rebouças. Em 2017, após participar da segunda edição do CLIC - Curso Livre de Cinema da UFBA e realização do curta-metragem Sujeito Objeto, criou o coletivo Sujeito Filmes, com Vilma Martins e Djalma Calmon. No coletivo assinou o roteiro e assistência de direção do curta Sujeito Objeto (2017), Roteiro e direção do curta Cinco Fitas (2020), em parceria com Vilma Martins, e a produção dos curtas A Barraca de Capeta (2018) e Quantos mais (2020), além de ter dirigido os videoclipes Intervemsamba (2018), do Bando Psicordelico e Alumiou de Alan Rocha (vencedor de 4 categorias no Lamv 2020). Integrante do coletivo Epa Filmes, onde atua e colabora no roteiro da web série Punho Negro (melhor ideia original Rio Webfest 2018). Fez Formação de Roteiro no Centro Afrocarioca de Cinema, em 2020, ministrada por Ana Maria Gonçalves e Viviane Ferreira, tendo como resultado final o roteiro Itan adaptado para o curta Maia (2020). Dirigiu e roteirizou as videoperformances do projeto Virtuarte CBX (2021). Na televisão apresentou o programa Corte Seco (TV Dimas e TVE Bahia) e participou das novelas Segundo Sol (Rede Globo/2018), Valor da Vida (TVI - Portugal/2018), da série Juacas (Disney Channel/2019) e da série Conquest (Netflix / O2 filmes). Fez a preparação de elenco do curta A Mulher no Fim do Mundo (Saturnema Filmes 2018). Atualmente colabora na criação do roteiro dos longas Star Video, de Vilma Martins, e O Baiano Precisa Ser Estudado; da segunda temporada da web série Punho Negro e do curta-metragem Espinho Remoso.

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IRIS DE OLIVEIRA Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99239-3832 Portfólio: https://linktr.ee/Iris_De_Oliveira

Minibio: Formada em Cinema, atua na área de audiovisual há mais de 16 anos. Possui experiência profissional em montagem, elaboração de projetos para audiovisual, criação de roteiro, arte-educação, fotografia, publicidade, TV e Web. Fez parte da equipe de editores da TV UNIFACS, TV Câmara Salvador e do IRDEB TVE - Bahia. Trabalhou nas produtoras: Santo Forte, Santo Guerreiro, Hasta Luna, Lanterninha, Fundo de Quintal, Movioca Content House, Rebento e Griot. Editou projetos para o canal E!, Canal Music Box e para o Canal Futura. Educadora no projeto OiKabum Salvador (2015-2017). Ministrou Oficina de Audiovisual - para alunos de turmas de EJA (Educação para Jovens e Adultos) dos colégios D. Pedro I em Paripe e no Conjunto Penitenciário Feminino (CPF), na Mata Escura. Dirigiu o documentário Acervo Zumvi - O Levante da Memória, sobre o trabalho do fotógrafo Lázaro Roberto. Pesquisadora do gênero Documentário, Cinema Experimental, Arte Contemporânea, Midia-ativismo e Cinema Negro.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Direção, Série Re-Encontros Fotográficos, Iris de Oliveira, 2021. Direção, Acervo Zumvi - O Levante da Memória, Iris de Oliveira, 2021. Montagem, Série Todos os Sonhos, Sofia Federico, 2021. Montagem, Web série Caminhos do Divino, Andrea Goldschmidt, 2020. Montagem, No Rastro do Pé de Bode, Marcelo Rabelo, 2020. Montagem, Samba Junino - De Porta em Porta, Dayane Sena e Fabíola Aquino, 2020 Montagem, Jaçanã, Laryssa Machada, 2019. Montagem, Aleluia, o canto infinito do Tincoã, Tenille Bezerra, 2019. Montagem, Antes que me esqueçam, meu nome é Edy Star, Fernando Moraes, 2019. Montagem, Série Dizaí, Thamires Vieira e Larissa Fulana de Tal, 2018. Montagem, Maestrina da Favela, Falani Africa, 2018. Montagem, Império da Beleza, Amadeu Alban, 2018. Montagem, Série Drag me as a queen, Amadeu Alban, 2018. Montagem, Diários de Classe, Maria Carolina da Silva e Igor Souza, 2018. Direção e Montagem, Clandestinas, Iris de Oliveira, 2018. Montagem e Finalização, Memória Expandida - 3ª Bienal da Bahia, Silvana Moura e Caroline Vieira, 2017. Montagem, Cantador de Chula, Marcelo Rabelo, 2017. Videomaker, Criativos Dissonantes, Thaís Muniz e Tarcisio Almeida, 2015. Montagem, Joelma, Edson Bastos, 2013. Direção, A máquina, Iris de Oliveira, 2011. Montagem, finalização e autoração de DVD, Coletânea Musical - Projeto Conexão Vivo 2012 - TVE Montagem, Bily e O Mundo, George Cruz, 2011.

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Montagem, Desterro, Marcelo Rabelo, 2011. Montagem, Batatinha Poeta do Samba, Marcelo Rabelo, 2009. Montagem, Zabumba, A Tradição das Bandas de Pífano no Sertão de Canudos, Marcelo Rabelo, 2009. Montagem, Pegadas, Davi Ramos, 2009. Codireção e Montagem, Cantos da Matinha, Marcelo Rabelo e Iris de Oliveira, 2008. Codireção e Montagem, Gabriel, Marcelo Rabelo e Iris de Oliveira, 2008. Direção, Poesia Urbana, Iris de Oliveira, Edson Bastos e Valnei Nunes, 2008.

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ISMAEL SILVA Cidade: Salvador - Bahia

Minibio: Fotógrafo, documentarista com formação em Direção de Fotografia. Graduado em Ciências Sociais (UNEB), Mestrando em Antropologia (PPGA - UFBA). Tem experiência na área de Antropologia Visual com ênfase em relações étnico-racial, lecionando cursos de formação na área. No ano de 2018 assinou uma exposição fotográfica intitulada Pelo direito de envelhecer, que ocorreu na Faculdade Baiana de Direito/ BA. Em 2019 foi convidado para compor a exposição coletiva O olhar: o que vemos nos afeta, que fez parte da programação Agosto da Fotografia na Caixa Cultural. recentemente esteve participando da Campanha solidária, 150 Fotos pela Bahia, Foto em Pauta e na Campanha solidaria Foto Pró Rio.

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JAMILLE SODRÉ Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99685-4946 E-mail: [email protected] Instagram: @jamillesodreoficial Portfólio: http://jamillesodre.blogspot.com/

Minibio: Nascida em Salvador, em 21 de outubro 1980. Figurinista, produtora RTVC e produtora cultural. Atuou na Agência de Publicidade Propeg-BA (2007-2009) como Produtora RTVC e Produtora no Cineclube Fruto do Mato da Chapada Diamantina.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Figurinista (assinando como Mille Sodré), O Crime de Aristóteles, Juca Badaró, 2018. Figurinista, Quadro Cotidiano do Instituto Anísio Teixeira (IAT) - Série de TV produzida pela N5 Filmes, exibição na TVE.

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JESSICA SILVA Cidade: Salvador - Bahia Contato: [email protected] Portfólio: https://vimeo.com/user128021749 http://lattes.cnpq.br/7111311891808588

Minibio: Formada em Produção Audiovisual pela Centro Universitário Jorge Amado (UNIJORGE), participou do grupo de iniciação científica Modo de Produções Audiovisual, onde desenvolveu como linha de pesquisa Produção de Videoclipe na Bahia (2012-2013), possui curso de Computação Gráfica pela SAGA, já participou, na condição de instrutora, do curso de Edição de Vídeo voltado para mulheres, na Escola Popular de Imagem, e ministrou a oficina de Edição de Vídeo no II Festival Tela Universitário de Cinema na UFBA. Atua como editora de vídeo desde 2012.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Edição, Me Usa, Ceci Alves, 2019. Edição, Qualisalvador, Ceci Alves, 2019. Operação de câmera, Lápis de Cor, Larissa Fulana de Tal, 2014. Edição e Assistente de direção, Candel Beat, Gil Alves, 2013. Assistente de direção e Produção, Tabuada, Gil Alves, 2013. Assistente de direção / Produção, Em Minha Poesia, Gil Alves, 2013. Direção, Denise Para de Fumar, Jessica Silva, 2012.

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JOELMA GONZAGA Cidade: Salvador - Bahia Contato: (21) 97627-9661 E-mail: [email protected] / [email protected] Portfólio: https://www.imdb.com/name/nm8491142/

Minibio: Joelma Oliveira Gonzaga é produtora criativa e sócia da Laranjeiras Filmes. É colaboradora de produtoras como Paranoid Filmes, Bananeira Filmes, Coqueirão Pictures, Preta Portê, Varzovia Films (Argentina), Arte Mecanica (México) e Tu Vas Voir (França). Produziu os filmes Cinema Novo (2016), direção de Eryk Rocha, vencedor do prêmio L’Oeil D’Or no Festival de Cannes, Breve Miragem de Sol (2019), direção de Eryk Rocha, première no BFI de Londres; e Todos os Paulos do Mundo (2017), direção de Rodrigo de Oliveira e Gustavo Ribeiro, indicado a melhor documentário no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. Tem atuado como consultora de projetos e jurada de fundos e festivais como BrLab, Spcine, Cabíria Festival e Fundação Cesgranrio. É conselheira do Instituto Nicho 54 e integra a rede de talentos do Projeto Paradiso. Atualmente produz Incubo, ópera-prima de Renata Martins com roteiro de Jaqueline Souza, selecionado para o Rotterdam Lab 2020. Estudou Arte com ênfase em Cinema na UFBA e Roteiro na EICTV, em Cuba.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Produtora Executiva, Regra 34, Julia Murat, 2020 (Em finalização). Produtora Executiva, O Prisioneiro da Liberdade, Jeferson De, 2019 (Em finalização). Produtora Executiva, A Última Festa, Matheus Souza, 2019 (Em finalização). Produtora Executiva, AmarElo - É Tudo para Ontem, Fred Ouro Preto, 2020. Produtora Executiva, Breves Miragens de Sol, Eryk Rocha, 2020. Produtora Executiva, Todos os Paulos do Mundo, Rodrigo de Oliveira e Gustavo Ribeiro, 2016. Coordenadora de Produção, Cinema Novo, Eryk Rocha, 2016. Assistente de Produção, Exilados no Vulcão, Paula Gaitán, 2016. Coordenadora de Pós-Produção, Campo de Jogo, Eryk Rocha, 2015. Coordenadora de Produção, Série Os Resistentes - 1ª Temporada, Eryk Rocha e Paula Gaitán, 2015. Produtora Executiva, Série Intervalo, Harrison Araújo e Bruno Safira, 2013.

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LETÍCIA PORTELA Cidade: Vitória da Conquista - Bahia Contato: (77) 99840-2107 E-mail: [email protected] /

Minibio: Fotógrafa, estudante de jornalismo e produtora de audiovisual, mulher negra LGBTQI+. Atuante na fotografia há 10 anos. Em 2018 foi uma das selecionadas para participar do Projeto Geração Futura na Rede Globo, com quinze dias vivenciando uma imersão no audiovisual. Em 2019 produziu um documentário como trabalho de conclusão de curso sobre o aplicativo Couchsurfing, que gera hospedagem solidária e intercâmbio cultural. Em 2020, dirigiu o curta-metragem A falta que a rotina faz, sobre as sensações dos amigos na pandemia, que, através de áudios de WhatsApp colocaram um pouco do sentimento de cada um. O projeto foi inscrito no Itaú Cultural, no edital Arte Como Respiro, e foi um dos premiados. Também produziu o documentário Diário de uma Idosa em Quarentena, que conta um pouco do dia-a-dia da sua avó enquanto sobrevivente dessa pandemia tão cruel. O filme foi premiado pelo Circuito Cine Éden e exibido na TVE. Através de edital da Lei Aldir Blanc, pode executar a série fotográfica Maria Felipa, que apresenta narrativas de mulheres negras, através da fotografia e do audiovisual.

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MARCELO NEPOMUCENO Nome artístico: Cello Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99311-0713

Minibio: Bacharel em Desenho Industrial, já realizou trabalhos diversos como Freelancer na área de Ilustração e Design gráfico (SECULT-BA), produziu ilustrações para periódicos do Grupo A Tarde (2013), Editora RV Cultura e Arte, Agência Publicitária SIMMKT (2014-2016) e é Colaborador da Estandarte Produções desde 2013. Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Storyboard, Òrun Ayé - A criação do Mundo, Estandarte Produções, 2015. Storyboard, Corações encouraçados, Estandarte Produções, 2015. Storyboard, Òrun Ayé - As águas de Oxalá, em produção, Estandarte Produções, 2016. Storybord, A Menina e o Rio, em produção, Estandarte Produções, 2018.

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MARCOS ALEXANDRE Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99186-6185 Portfólio: vimeo.com/granmaitrefilmes; vimeo.com/marcosalexandre

Minibio: Marcos Alexandre é Diretor, Roteirista e Produtor. Formado no curso superior de Tecnologia em Produção Audiovisual no Centro Universitário Jorge Amado. É fundador do coletivo/produtora Gran Maître Filmes, fundada em 2019, em Salvador, um dos idealizadores do Cineclube Cultura e associado à Associação de Profissionais Negros (APAN). Escreveu e dirigiu os curtas-metragens O Vizinho de Frau Kutner (2019), exibido em festivais nacionais e internacionais e O Último Grão de Areia (2021), que está sendo inscrito em festivais; além disso, dirigiu e escreveu o videoclipe Água de Meninos, da Orquestra Afrosinfônica. Seu próximo projeto, o curta-metragem A Face, teve consultoria de Gildon Oliveira no GranLab, da Gran Maître Filmes. Atualmente está desenvolvendo seu primeiro roteiro de longa-metragem chamado Insônia e atuando como produtor executivo e diretor da 2ª Edição do GranLab - Laboratório Audiovisual.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Diretor, Roteirista e Produtor, O Vizinho de Frau Kutner, Marcos Alexandre, 2019. Produção, Ele Foge, Dino Galeazzi, 2019. Produção Executiva, A Sete Tragos do Chão, Ariel L. Dibernaci e Cláudia Satter 2019. Produção, A Mulher no Fim do Mundo, Ana do Carmo, 2019. Diretor, Roteirista e Produtor, O Último Grão de Areia, Marcos Alexandre, 2021. Produtor Executivo e Som Direto, Quando o Lastro Derruba a Flor, 2022.

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MARISE URBANO Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99366-7360 E-mail: [email protected] Portfólio: https://drive.google.com/drive/ folders/1ZLgvoQWpgR93DRKKiUB 7WbkFLw49dYx?usp=sharing

Minibio: Mãe Preta Periférica Candomblecista, filha de Logunedé e Canceriana. Mestra pelo Programa Multidisciplinar em Cultura e Sociedade (POSCult), da Universidade Federal da Bahia. Mestranda pelo Programa Interdisciplinar de Pós-graduação em Cinema (PPGCINE), da Universidade Federal de Sergipe. Bacharela em Artes com concentração em Cinema e Audiovisual, Licenciada em Pedagogia, ambos pela UFBA. Participa do Coletivo Periférico de Cinema (COPECINE) e responsável pela Gira Pomba Produções. Dedica-se aos Orixás e às crias - Mwana e Adili -, conciliando com projetos que desenvolve para a periferia de Cajazeiras, onde mora, como Mostra Cine Dendê, 2017; Cajartitude, 2019 e Misture-se, 2021. Escrita de roteiros; Direção; Pesquisas; trabalhos de som direto; edição de podcasts; Curadorias; Júri, Oficinas, Lives e Sonhos.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Diretora, Sonoplastia, Marise Urbano, 2021. Diretora, Com os Pés no Chão, Marise Urbano, 2017. Diretora, Sentinela, Marise Urbano, 2014. Som direto, Mãe Solo, Camila de Moraes, 2021. Som direto, O canto Griô: além mar, Danilo Stael e Marcos Dias, 2021. Som direto, Memorial Biblioteca Zeferina Beiru, Biblioteca Zeferina Beiru, 2021. Som direto, Egbé Alaketu, Jazz da Silva, 2021. Som direto, Quantos Mais, Lucas de Jesus, 2020. Som direto, Cinco Fitas, Heraldo de Deus e Vilma Martins, 2020. Som direto, O arco do tempo, Juan Rodrigues, 2019. Som direto, A Mulher no fim do mundo, Ana do Carmo, 2019. Som direto, Essa é minha filosofia de vida, Dona Joca, 2018. Som direto, Presente da mãe D´agua, Malaika KB, 2015.

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MARVIN PEREIRA Cidade: Cachoeira - Bahia Contato: E-mail: [email protected] Portfólio: http://www.marvinpereira.com/

Minibio: Marvin Pereira, natural de Cachoeira (BA), é graduado em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB). No cinema atua como diretor, roteirista, produtor, diretor de arte e montador. Atualmente Marvin é diretor de planejamento e sócio da Odé Produções, CEO, diretor de arte e produtor da Corvo Vermelho Produções, Idealizador e CEO da festa Baile TBT, idealizador e coordenador da Mostra de Cinema Negro de São Félix (BA) e membro do VISU - Pesquisa e Extensão em Arte, Imagem e Visualidades da Cena (UFRB). Como realizador, foi diretor e roteirista de projetos como marvin.gif PART II (2020), Banana (2017) e A Vida É Pra Valer (2018), assistente de direção dos curtas Ilhas de Calor (2019) e CorpoStyleDanceMachine (2017), diretor de arte dos curtas Assombramitos (2019) e marvin.gif (2017). Seus filmes já foram exibidos em mostras e festivais do Brasil, México, Peru, Estados Unidos, Canadá, Portugal e Nigéria. Atualmente é vencedor de mais 50 prêmios, entre eles: 7º. FECIN, Festival Visões Periféricas 2017, IV Cine Tamoio, entre outros.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Codiretor, O Artista Suburbano, Vagner Jesus, 2021. Roteirista, Montador e Diretor de Arte, marvin.gif PART II, Marvin Pereira, 2020. Roteirista e Produtor, Tempo de Pipa, Breno Silva e Marvin Pereira, 2020. Diretor de Arte e Continuísta, Assombramitos, Elizângela da Silva, 2019. Assistente de direção, Ilhas de Calor, Ulisses Arthur, 2019. Produtor Executivo, Enquanto Eu For Lembrado, Állan Maia, 2018. Diretor de Arte, Roteirista e Montador, A Vida É Pra Valer, Marvin Pereira, 2018. Assistente de direção e Produtor, CorpoStyleDanceMachine, Ulisses Arthur, 2017. Diretor de Arte, Roteirista e Montador, Banana, Marvin Pereira, 2017.

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NAIRA ÉVINE Cidade: Valença - Bahia Contato: [email protected] Portfólio: https://drive.google.com/file/d/1oaIrxuDE8mVgX9qklG_ tB9ZXoqCI1yf2/view?usp=sharing

Minibio: Naira Évine é natural de Valença, região da Costa do Dendê na Bahia. Graduada em Comunicação – Rádio e TV pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), onde foi bolsista de iniciação científica Fapesb duas vezes; especialista em Cinema pela Unesa e mestranda em Cinema pelo PPGCine da Universidade Federal Fluminense (UFF). É documentarista e tem se dedicado à pesquisa do cinema correlacionado a raça, gênero e sexualidade. Dirigiu O lado de cima da cabeça (2014), Como Somos (2015), O dia que resolvi voar (2019), além de outras obras audiovisuais. É fotógrafa há 12 anos, mas também trabalha com montagem, edição, pesquisa e docência. Pensa cinema na teoria e na prática.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Direção, Roteiro, Direção de Fotografia e Edição, Como Somos, Naira Évine, 2015. Direção, Fotografia, Roteiro e Edição, O lado de cima da cabeça, Naira Évine, 2014. Roteiro, Direção e Edição, O dia que resolvi voar, Naira Évine, 2019. Câmera, Assistente de fotografia, Da Flor ao fruto, Taiana Matos, 2014. Câmera e Fotografia, Sonativo, Aialla Andrade e Alanna Sousa, 2015. Câmera e Direção de Fotografia, Além do corpo, Abel Oliveira, 2016. Direção de Fotografia, Corpos Invisíveis, Quézia Lopes, 2020. Assistente de Fotografia, Blackout, Rossandra Leone, 2019. Continuísta, Uma paciência selvagem me trouxe aqui, Érica Sarmet, 2021. Still, Legenda e Tradução, Aldeia, Violeta Martinez, 2021.

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PAMELA PEREGRINO Cidade: Porto Seguro - Bahia Contato: (21) 99595-9019 E-mail: [email protected] Portfólio: https://www.coroflot.com/pamelaperegrino https://www.instagram.com/itan.cinema/ https://www.facebook.com/itan.cinema/?ref=py_c

Minibio: É animadora, cenógrafa, professora de Artes da Universidade Federal do Sul da Bahia e tem buscado a realização de curtas de animação em processos educativos comunitários, de imersão e vivência em comunidades tradicionais negras e indígenas. Realizou a animação em tinta a óleo sobre vidro Partir (2012, premiado em primeiro lugar no concurso de curtas da Deutsches Symphonie-Orchester), o curta em stop motion Òpárá de Òsùn: quando tudo nasce (2018, menção honrosa no Festival de Cinema de Triunfo e no Festival de Cinema de Vitória entre outros, recebeu Medalha de Ouro como Melhor Curta Internacional no Festival de Cinema Stop Motion, Irã; o curta 2D Oríkî (2020, Troféu Enel de Sustentabilidade no Festival Noia de Audiovisual Universitário, prêmio de Melhor Roteiro de Audiodescrição na Mostra Editando Sonhos, prêmio Cine Éden da Mostra Cinema em Casa e menção honrosa na Mostra de Cinema Cultural de Huntington Beach) e o curta de técnicas mistas Porto e Raiz (2021).

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Diretora e Animadora, Não Basta Votar e Esperar, Pâmela Peregrino, 2011. Diretora e Animadora, Partir, Pâmela Peregrino e Antonio Terra, 2012. Animadora, Filmes de Amor | Ep.1 Victor, Direção: Fernanda Ferrari, 2014. Cenografia e bonecos, Série Quem sou eu?, César Coelho e Aída Queiroz, 2017. Diretora de Arte, Quilombo Favela Rua, Vladimir Seixas, 2018. Diretora de Arte, Primeira Pedra, Vladimir Seixas, 2019. Cenografia, Contra-Filé, Pedro Iuá, 2019. Diretora e Animadora, Òpárá de Òsùn: quando tudo nasce, Pâmela Peregrino, 2018. Diretora e Animadora, Oríkì, Pâmela Peregrino, 2020. Diretora e Animadora, Porto e Raiz, Pâmela Peregrino, 2021. Diretora e Animadora, As folhas Sagradas de Osanyin, Pâmela Peregrino (em execução)

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PAULO FERREIRA Cidade: Itabuna - Bahia Contato: (73) 99100-8245 E-mail: [email protected] Portfólio: www.instagram.com/pauloferreiracriativo | www.instagram.com/pauloferreirafotografia Minibio: Negro, candomblecista e estudante de Comunicação Social - Rádio e TV (UESC). Iniciou a sua trajetória no audiovisual registrando o cotidiano no Ilê Axé Odé Omopondá Aladê ljexá (Banco da Vitória, Ilhéus - Bahia), Terreiro no qual é Babalossain, sacerdote responsável pelo culto ao Orixá Ossain. Além disso, ao longo da graduação, fez Som Direto no curta-metragem de ficção Ipupiara: o chamado das águas, vencedor do prêmio Expocom Nacional 2019 e hoje tem se concentrado nas áreas de Direção Geral e Fotografia, com enfoque a comunidades de terreiros da tradição Ijexá, tendo em 2019-2020 dirigido o seu primeiro documentário, intitulado O Abebé Ancestral, premiado pelo júri popular da 2ª. Edição do Festival Recanto do Cinema na Mostra competitiva de curtas brasileiros. Além disso, em 2020-2021 fez o Sound Design e Produção de Trilha Sonora do longa-metragem Alba Darabi in Candomblé, coprodução britânica que compõe o projeto Brazil, the untold story, divulgado internacionalmente. Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Direção Geral, Direção de Fotografia, Direção de Som, Edição, Produção e Roteiro, O Abebé Ancestral, Paulo Ferreira, 2020. Sound Design e Produção de Trilha Sonora Musica, Alba Darabi in Candomblé, Everton Barreiro, 2021. Série: Brazil, the untold story. Som Direto, Ipupiara: o chamado das águas, Florisval Elias Neto, 2018.

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PEDRO GARCIA Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99955-4148 Portfólio: diariodemicrofonista.wixsite.com/somdireto

Minibio: Pedro Garcia, 36 anos, é natural de Salvador - Bahia e atua na área de som direto desde 2009, especialmente em cinema e documentário, acumulando experiência como microfonista, 1° assistente e técnico de som. Graduado em Comunicação Social/Jornalismo pela UNIME (2010), sua primeira experiência com audiovisual foi no set de filmagem, quando exerceu a função de microfonista nos curtas-metragens Joelma (2011), A Descoberta (2011), Balú (2012), Sonhos (2013), entre outros. Como técnico de som direto, seus principais trabalhos são os curta- metragens Fonte Nova (2017), O filme de Carlinhos (2014), Dela (2018), Balizando 2 de julho (2019), os longa metragens Filho de Boi (2019), Diário da Primavera (2019), Dr. Ôcride (2018), Jonas e o Circo sem Lona (2016), A professora de música (2016), e o telefilme Samba Junino – de porta em porta (2019) e o documentário Neojibá (2020).

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Técnico de som direto, Neojibá – Música que transforma, Sérgio Machado, 2020. Técnico de som direto, Fundo do Céu, Matheus Vianna, 2019. 18min., ficção. Técnico de som direto, Tabuh, DocDoma Filmes/Benditas, 2019. 26min., série TV, ficção. Técnico de som direto, Filho de Boi, Plano 3 Filmes, 2019. 90 min, ficção. Técnico de som direto, Samba junino, Obá Cacauê Produções, 2019. 52 min, documentário. Técnico de som direto, Balizando Dois de Julho, Obá Cacauê Produções, 2019. 20min, documentário. Técnico de som direto, Dr. Ôcride, Voo Audiovisual 2018. 85 min., documentário. Técnico de som direto, Sem Descanso, Santa Luzia Filmes, 2018. 70 min., documentário. Técnico de som direto, A professora de música, Voo Audiovisual, 2017. 52min., ficção. Técnico de som direto, Jonas e o circo sem lona, Plano 3 Filmes, 2016. 83 min., documentário. Técnico de som direto, O filme de Carlinhos, Voo Audiovisual, 2014. 18 mim., ficção.

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RIDSON REIS Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 98764-4151 Portfólio: https://drive.google.com/file/d/1voZy1dIQ8gTCWIlDI07Rkdq99 F7YZgV/view?usp=sharing

Minibio: Ator, produtor cultural, músico e diretor iniciou sua carreira artística em 2002. Integrante do Bando de Teatro Olodum desde 2006, atua em diversas produções como: Ó Paí, ó, Sonho de uma noite de verão, Áfricas, Cabaré da Raça e Bença, dirigidos por Márcio Meireles, Chica Carelli, Zebrinha e Jarbas Bittencourt, e Dô, dirigido por Tadashi Endo. Sua carreira no audiovisual começou no filme Ó Paí, Ó!, em 2006. Daí participou de diversos comerciais para empresas privadas, já atuou até como repórter para o programa Aprovado (Rede Bahia) no quadro “Repórter por um dia”. Trabalhou com diretores premiados no cinema nacional e internacional, como Ary Rosa, Glenda Nicácio, Bernard Attal, Mauro Lima, Olívia Guimarães, Monique Gardenberg, dentre outros. Mais recentemente co-protagonizou um longa do Marcelo Gomes que está para ser lançado. Além de atuar no curta-metragem O Artista Suburbano - que foi lançado em Abril de 2021 estreou como produtor executivo.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Ator, Ó Paí, Ó! – Filme, Monique Gardenberg, 2006. Ator, A Coleção Invisível, Bernard Attal, 2012. Ator, Ó Paí, Ó! – Série, Monique Gardenberg, Mauro Lima, Olívia Guimarães e Carolina Jabor, 2008-2009. Ator, Ilha, Glenda Nicácio e Ary Rosa, 2018. Ator, Vestido Branco, Véu e Grinalda, Marcelo Gomes, a ser lançado. Ator e Produtor Executivo, O Artista Suburbano, Vagner Jesus, a ser lançado.

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CÁSSIA VALLE Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99185-3028 Portfólio: https://drive.google.com/file/ d/1ibzgYDxgiRY1wVxD50t4AaO8SVMT_gFI/view?usp=sharing

Minibio: Atriz e membro do colegiado gestor do Grupo de Teatro Bando de Teatro Olodum, escritora, produtora cultural. Professora, Historiadora, Psicopedagoga, Mestre em Preservação e Patrimônio Cultural. Coordenadora e diretora do Grupo de Teatro Jovem da Moinhos. Coordenadora Administrativa do Centro de Pesquisa Moinhos Giros de Arte (organização não governamental que tem como missão por meio da arte, cultura e comunicação e do despertar de sensibilidades, provocar nas crianças e jovens atitudes transformadoras de si e da sociedade em que vivem). Coautora do Projeto Patrimônio Cidadão programa que visa à sensibilização para apropriação e preservação do Patrimônio cultural. Recentemente recebeu o prêmio APCA da Associação Paulista de críticos de arte com o livro Calu uma menina cheia de histórias, em coautoria com Luciana Palmeira. Também lançou o Bloquinho de poemas e canções da Calu, em parceria de Luciana Palmeira e Cell Dantas.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Atriz, Jenipapo, Monique Gardenberg, 1995. Atriz, Tieta, Caca Diegues, 1996. Atriz, Eu me lembro, Edgar Navarro, 2005. Atriz, O Paí Ó, Monique Gardenberg, 2007. Atriz, Jardim das folhas sagradas, Pola Ribeiro, 2007. Atriz, Quincas Berro d’água, Sérgio Machado, 2010 Atriz, Marli do Paraíso e a Kombi do amor, Max Gaggino, 2016. Atriz, Tungstenio, Heitor Dhalia, 2018. Atriz, Bando, Um filme de, Lázaro Ramos e Thiago Gomes, 2018. Atriz, Sobre nossas cabeças, Susan Kalik e Thiago Gomes, 2020. Atriz, As verdades, José Eduardo Belmonte (ainda não foi lançado).

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ROBSON PEREIRA SANTOS (DINHO NEGRYNE) Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 98810-2981 Portfólio: https://drive.google.com/file/d/1sPAnA_ GEiVVU9wxHzMjVNezU_jqWsQ9v/view?usp=sharing

Minibio: Graduado em Letras pela UNIME, professor, Dinho Negryne fez curso livre de Cinema na UFBA, participou coletivamente da produção, roteiro e captação de som direto do curta-metragem Frutos da Lua, aceito em Cannes em 2017; escreveu e dirigiu A Cura, selecionado no Festival do Minuto, também em 2017, bem como Falha Justa (2018), seleção oficial do XIV Panorama Internacional Coisa de Cinema, WSTL Global Festival (EUA), e FestFilm Online, festival pela plataforma FestFilm, e em 2019, seleção oficial no V Festival de Cinema de Três Passos. Em 2020, realizou o filme Mere, la Mère, com a atriz Tânia Toko no papel principal, selecionado para a IV Mostra Ousmane Sembene de Cinema, em São Francisco do Conde - Bahia.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Diretor e Roteirista, Mere, la Mère, 2020. Diretor e Roteirista, Cem Atalhos, 2019. Diretor e Roteirista, Falha Justa, 2018. Diretor e Roteirista, A Cura, 2017.

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RODRIGO ARAÚJO Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 98148-4926 Portfólio: https://drive.google.com/file/d/1RvG5xD7QnUqIG61VqMw9W 9GOGPDuw0JB/view?usp=sharing

Minibio: Nasci na comunidade de Saramandaia, Salvador, onde despertei à magia do cinema: “Não conseguirei falar de referências sem citar minha mãe e meu pai, que são responsáveis pela minha forma de estar no mundo. A Saramandaia, é um berço cultural, que me deu como herança a possibilidade de vivenciar o contexto da cultura popular afro-baiana. Essa paixão pela cultura popular me presenteou com o desejo do registro desse encanto. Nesse meio tempo, conheci o Centro Cultural Mata Inteira, onde dei continuidade a minha imersão na fotografia. Além disso, os Encontros de Cinema Afro Latino Americano e a formação em Empreendedorismo e Edição, da TV Pelourinho me marcaram muito, por ter conhecido dois profissionais referências para minha trajetória, Alex França e Daiane Rosário. Hoje eu me sinto realizado e realizando, com o objetivo de viabilizar a produção cinematográfica para pessoas que, assim como eu, buscam seguir nessa caminhada quebrando paradigmas raciais”. Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Diretor, Labuta, Rodrigo Araujo e Gean Almeida, 2017. Diretor, DZOBDÇA, Rodrigo Araujo e Gean Almeida, 2017. Diretor e Diretor de Fotografia, Série Pauta Musical, Rodrigo Araujo e Gean Almeida, 2018. Diretor e Diretor de Fotografia, Mundo Avatar, Saramandaia-BA, Rodrigo Araujo, 2018. Diretor de Fotografia, Clipe Sementes, Militância Poética, Dricca Silva e Gean Almeida, 2018. Diretor, Diretor de Fotografia, Edição e Montagem, Boxe, Transformação Social e Saúde, Rodrigo Araujo, 2019. Direção de Fotografia, Clipe O Reggae é Africano, Mata Inteira, Ana Lícia e Mestre Luizão, 2020. Direção de Fotografia, Clipe Uma Luz, Zavan Liv, Zavan Liv, 2020. Diretor e Diretor de Fotografia, Série Na Pele Preta, Rodrigo Araujo e Gean Almeida, 2020. Diretor de Fotografia, Diáspora In Cena, Gean Almeida, 2020. Edição e Montagem, Preta Infância, Carol Santos, 2020. Diretor de Fotografia, Ruas da Discórdia, Gean Almeida, 2020. Diretor, Diretor de Fotografia, Edição e Montagem, Ares que Curam, Dani de Iracema, 2020. Diretor, Diretor de Fotografia, Edição e Montagem, Sagrado Oficio, Dani de Iracema, 2020. Diretor, Diretor de Fotografia, Edição e Montagem, Guerreiro de Palmares Saramandaia, 25 anos de Tradição, 2020. Diretor, Direção de Fotografia, Edição e Montagem, Saraumandaia - A resistência continua, Mc Xabath, 2020

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SUSAN KALIK Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99999-0151 Portfólio: https://www.susankalik.com/

Minibio: Roteirista, diretora e produtora. Sócia da Modupé Produtora. É produtora de três longas documentários, oito curtas e trinta espetáculos teatrais. Diretora, roteirista e produtora do documentário de longa-metragem Cores e Flores para Tita, do média-metragem Do que aprendi com minhas mais velhas e dos curtas de ficção O Caso de Ester e Sobre Nossas Cabeças. Produtora dos filmes Bando, um filme de, dirigido por Lázaro Ramos e Thiago Gomes, e O Primeiro Beijo, dirigido por Urânia Munzanzu, onde também assina o roteiro. Teve roteiros selecionados no Sesc Novas Histórias, Novos Roteiristas do MINC, Residência Base de Roteiros e foi finalista do Concurso de Longas do FRAPA 2019.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Roteiro, direção e produção, Sobre nossas cabeças, Susan Kalik e Thiago Gomes, 2020 – Curta-metragem de ficção. Produção, direção assistente, direção de fotografia, câmera, Bando, um Filme de, Lázaro Ramos e Thiago Gomes, 2018 – Documentário de longa-metragem. Produção, direção assistente, colaboração de roteiro, As balas que não dei ao meu filho, Thiago Gomes, 2018 - Curta-metragem de ficção. Roteiro, Direção, Produção, Fotografia e Câmera, Cores e Flores para Tita, Susan Kalik, 2017 – Documentário de longa-metragem. Roteiro, Direção, Produção, Fotografia e Câmera, Do que aprendi com minhas mais velhas, Onisajé e Susan Kalik, 2017 – Documentário de média-metragem. Roteiro, Direção, Produção, Fotografia e Câmera, Ainda Te Amo, Susan Kalik, 2016 – Curta-metragem de ficção. Codireção, Colaboração de Roteiro, Produção, Cassiano, Thiago Gomes, 2012 – Curta-metragem de ficção. Roteiro, Direção, Produção, O Caso de Ester, Susan Kalik e Thiago Gomes, 2011 - Curta-metragem de ficção.

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THAMIRES VIEIRA Cidade: Salvador - Bahia Contato: [email protected]; [email protected] Portfólio: https://terafilme.com/

Minibio: Thamires Vieira é diretora e produtora e curadora, formada em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB), faz parte da Associação de Profissionais do Audiovisual Negro (APAN). Atua há dez anos no mercado audiovisual, realizou como produtora de diversos curtas, longasmetragens e séries, dentre eles filmes premiados e com circulação em importantes festivais do Brasil e do mundo. Em 2020 participou da curadoria de projetos como Cabíria Festival, BrLab, Nordeste Lab e foi Júri do Frapa. Atualmente coordena a Terá Filmes, onde desenvolve projetos em parcerias e coproduções. Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Produtora Executiva, Ilhas de Calor, Ulisses Arthur, 2019 - Curta Metragem. Produção: Rebento Filmes e Céu Vermelho Fogo Filmes, Local: Viçosa- AL. Produtora Executiva, Arco do Tempo, Jeronimo Juan, 2019 - Curta Metragem - Produção: Rebento Filmes, Local: Salvador. Produtora Executiva, As melhores Noites de Veroni, Ulisses Arthur, 2016 - Curta metragem - Produção: Céu Vermelho e Fogo Filme e Rebento Filmes. Local: Maceió. Direção de Produção, Deserto Particular, Aly Muritiba, 2019 – Longa-metragem - Produtora: Grafo Audiovisual, Local: Juazeiro, Petrolina e Curitiba. Diretora de Produção, Eu Empresa, Marcus Curvelo e Leon Sampaio, 2019 - Série - Produtora: Transe Filmes e Anacoluto - Local: Salvador. Diretora de Produção, Ilha, Ary Rosa e Glenda Nicacio, 2018 - Longa metragem - Produtora: Rosza Filmes. Local: Ilha Grande – Cachoeira. Diretora de Produção, A Morte do Cinema, Evandro de Freitas, 2015 – Curta-metragem - Produção: Azul Filmes. Local: Cachoeira. Diretora de Produção, Cinzas, Larissa Fulana de Tal, 2014 - Curta metragem - Produtora: Ori Filmes e Coletivo Tela Preta. Local: Salvador. Diretora de Produção, Materno, Ruy Dutra e Alequine Sampaio, 2014 - Curta metragem - Produtora: Independente. Produção de Frente, Prisioneiro da Liberdade, Jeferson De, 2019 – Longa-metragem Produtora: Paranoid. Local: Paraty – RJ. Produção de Set, Desengaveta - 4° Temporada, Laura Aragão, 2019 - Produção: Boutique Filmes. Local: Salvador. Produção Local, Panorama de Cinema, Claudio Marques e Marilia Hughes, 2014 e 2015 - Produtora: Coisa de Cinema. Local: Cachoeira. Produção Local, Paisagem Sonora - Mostra Internacional de Arte Eletrônica, Danilo Barata 2015 Produtora: Coletivo Xaréu. Local: Cachoeira. Produção Local, Cachoeira Doc - Festival de Documentário, Jeferson De, 2012, 2013, 2014 e 2015. Produtora: Paranoid. Local: Cachoeira.

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URANIA MUNZANZU Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99337-6887 Portfólio: https://uraniamunzanzu.46graus.com

Minibio: É cineasta, poeta, Mestra em Antropologia e jornalista. No audiovisual atua há mais de dez anos em projetos brasileiros, africanos e afro-americanos. Dirigiu o curta metragem Merê, filme ganhador do Prêmio de Direção e o Selo Zózimo Bulbull de Melhor Curta-Metragem (2018), uma obra produzida na costa oeste africana e no recôncavo da Bahia. Em 2021 lança seu primeiro o longa-metragem, O Primeiro Beijo, em coprodução com Lázaro Ramos. Roteirista e diretora do longa-metragem de ficção em etapa de desenvolvimento, A Orquestra. Diretora e roteirista do longa-metragem em pré-produção Mulheres Negras em Rotas de Liberdade, que será produzido nos países do continente africano: Gana, Benim, Togo e Nigéria. Assistente de direção e produtora na série musical Afroroutes, produzida no Brasil, Tunísia, Marrocos e Alemanha. Em Maestrina da Favela, coprodução entre Brasil e EUA lançada em 2018 e ganhadora do Prêmio de Melhor Filme na MIMB 2018, é assistente de direção e produtora. É fundadora da Frente Marginal de Arte Negra, que reúne artistas negres de diferentes linguagens no Estado da Bahia, com objetivo de cooperação artística e luta política pela Arte Negra. Sua trajetória profissional começou no Grupo Cultural Olodum produzindo o Festival de Música e Artes do Olodum - FEMADUM, maior festival de Artes a céu aberto do mundo entre os anos 1988 e 1996. Foi cofundadora da Escola de Música para Mulheres Negras - Didá, projeto que nos anos 1990 abriu horizontes musicais para mulheres negras na cidade de Salvador.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Direção, Merê, Urânia Munzanzu, 2018 (Benim). Direção, Primeiro Beijo, Urânia Munzanzu, 2021 (Salvador - Bahia). Direção, Lazzo Matumbi – Abô, Urânia Munzanzu, 2021 (Salvador - Bahia) Direção, Mulheres Negras em Rotas de Liberdade, 2022 (Gana, Togo, Benim e Nigéria). Prod. Executiva, O Primeiro Beijo, Urânia Munzanzu, 2021 (Salvador - Bahia). Prod. Executiva, Mulheres Negras em Rotas de Liberdade, 2022 (Gana, Togo, Benim e Nigéria). Roteiro e Argumento, Merê, Urânia Munzanzu, 2018 (Benim) Roteiro e Argumento, Lazzo Matumbi – Abô, Urânia Munzanzu, 2021 (Salvador - Bahia) Roteiro e Argumento, Mulheres Negras em Rotas de Liberdade, 2022 (Gana, Togo, Benim e Nigéria). Assistente de Direção e Produção, A Maestrina da Favela, Falani Afrika, 2018 (Salvador - Bahia). Assistente de Direção e Produção, Afroroutes, Selim Harbi, 2019 (Tunísia). Direção de Cena, Afroroutes, Selim Harbi, 2019 (Tunisia).

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VAGNER JESUS Cidade: Salvador - Bahia Contato: (71) 99374-8068 Portfólio: UCk62ovNbXF1K8AnRq2vqMjw

https://www.youtube.com/channel/

Minibio: Nascido em Salvador - Bahia, ator desde 2011, iniciou a carreira artística no Teatro É ao Quadrado, grupo de teatro da comunidade do Alto do Cabrito, onde pôde participar de oficinas e aulas de teatro, dança e percussão. Por meio do projeto teve acesso a outros coletivos que trabalhavam no segmento de audiovisual, oferecendo oficinas de roteiro, produção de curtas com celular e slow motion. Teve sua primeira experiência profissional em 2017, através do Bando de Teatro Olodum, na condição de ator e assistente de produção cultural. Em 2018, foi indicado como ator revelação para o Prêmio Braskem de Teatro da Bahia. Atualmente, estuda o curso de Bacharelados Interdisciplinares em Artes na UFBA e, para além de atuar nas artes cênicas, realiza pesquisas e produções independentes na área do audiovisual.

Filmografia (Função, filme, diretor e ano): Ator, Web série Na Rédea Curta, episódio Mainha sim que é hexa!, Thiago Almasy, 2018. Diretor, ator e editor, Nem Me Covid, 2020 - Curta-metragem independente. Ator, Série Pequeno Gigante, Anderson Soares, 2020. Ator, Café com Oliver, Douglas Oliveira e Cristiane Cândido, 2020 - Curta-metragem - Produção Coletivo Salva. Ator e diretor, Manual Como Conter uma Raça Poderosa, Marcelo Ricardo e Vagner Jesus, 2020 - Curtametragem. Ator, roteirista e diretor, O Artista Suburbano, Marvin Pereira e Vagner Jesus, 2021 - Curta-metragem.

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ORGANIZADORES LECCO FRANÇA é graduado em Letras Vernáculas (UFBA), Mestre e Doutor em Letras pelo Programa de Pós-graduação em Literatura e Cultura (UFBA), professor, pesquisador, escritor, cineclubista, curador e crítico de cinema. Foi idealizador dos Encontros Afro-latino-americanos, organizador das atividades cineclubistas Cine-debate Áfricas-Bahia e CineKanema: Mostra Itinerante de filmes de países africanos, e já atuou na curadoria de mostras e cineclubes, como a Mostra Itinerante de Cinemas Negros Mahomed Bamba, a Egbé – Mostra de Cinema Negro de Sergipe, o Festival de Cinema Baiano (FECIBA), o Cine Janela, o Cineclube Antônio Pitanga e o Sala de Cinema (UEFS). Tem poemas, resenhas e artigos publicados em livros e revistas (on-line e impresso) e no blog www. leccofranca.blogspot.com. Também escreve crítica de cinema na revista Afirmativa. MILE SILVA é graduada em Comunicação Social - Produção em Comunicação e Cultura (UFBA), licenciada em Letras Língua Portuguesa (UFPB), mestre pelo Programa de Pós-graduação em Estudo de Linguagens (UNEB), professora e produtora cultural. Realiza pesquisas relacionadas à cultura afro-brasileira e afro-diaspórica na literatura, cinema e demais linguagens artísticas. CINTIA MARIA é cineasta negra, premiada nacional e internacionalmente. Gestora do espaço multiartístico afrocentrado e de formação audiovisual Nubas. Cineclubista e fundadora do Cineclube Antônio Pitanga. É uma das idealizadoras do Cine Janela, que durante a quarentena tem projetado filmes, poesias e frases de esperança para vizinhos, através da janela do apartamento casa. Palestrante sobre suas áreas de atuação. Acumula mais de 30 prêmios durante a sua trajetória como curtametragista de animação. Contribui para a descentralização do audiovisual através da realização de oficinas em quilombos, terreiros, universidades, escolas e bairros populares tendo realizado mais 50 atividades formativas. Umas das sócias da Editora Emoriô, editora com foco em visibilizar a produção de livros para pessoas negres e LGBTQIA+ e idealizadora do livro Cinema Negro Baiano. JAMILE COELHO é bacharel em Artes com habilitação em Cinema e Audiovisual pela UFBA — premiada nacional e internacionalmente. Especializou-se em direção, direção de arte e desenvolvimentos de novas tecnologias, a partir de estudos com realidade aumentada (AR) e realidade virtual (VR), que busca modos de barateamento e acessos a essas tecnologias. Dirigiu e fez direção de arte dos premiados curtas “Òrun Àiyé: A Criação do Mundo”, “Corações Encouraçados” e “A Menina e o Rio”. CEO do Nubas. Diretora das séries “Circuito Negro” (2018) e “Aqualtunes” (2018), atualmente dedica-se a produção e finalização dos longa metragens: “Cores da Diáspora” (rodado em Angola) e “Encruzilhadas da Liberdade”, baseado no livro “Corujebó: Candomblé e Polícia de Costumes” do professor doutor Vilson Caetano. Diretora de arte do longa-metragem “Um dia com Jerusa” (2020), prêmio de Melhor Direção de Arte no Festival de Caruaru e no 15º Encontro Nacional de Cinema dos Sertões .

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